Merge do Ethereum: tudo o que você precisa sobre a atualização

Evento é considerado o mais importante da história das criptomoedas; saiba todos os detalhes do upgrade

Paulo Barros

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Desde junho, o Ethereum (ETH) navega na expectativa de uma importante atualização que enfim está entre nós: a Merge (fusão, em português) foi finalizada na madrugada desta quinta-feira (15), às 3h43.

A atualização é considerada por alguns especialistas como a mais importante da história das criptomoedas. Em parte pelo tamanho do Ethereum, que é a segunda cripto com maior valor de mercado (US$ 198 bilhões em 26 de agosto), mas também porque nunca ninguém havia tentado algo parecido.

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Planejada há pelo menos cinco anos, a atualização muda a regra que norteia o sistema de mineração, com impactos ecológicos, pela redução drástica da energia consumida pela rede; e econômicos, com uma nova dinâmica de uso do ETH, que ganha uma ferramenta oficial de renda passiva.

Mas, como quase tudo em cripto, o tema é complexo e muitas dúvidas podem surgir em torno do assunto. Confira, a seguir, tudo o que você precisa saber sobre a novidade.

1) O que é a Merge do Ethereum?

A atualização envolve uma mudança no modelo de consenso da blockchain do Ethereum, alterando as regras do mecanismo de verificação de dados.

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A rede passará de um modelo de prova de trabalho (Proof-of-Work, ou PoW) similar ao do Bitcoin, para um de prova de participação (Proof-of-Stake, ou PoS), considerado mais ecológico.

Esperada há pelo menos cinco anos, essa novidade começou a ser implementada ainda em 2020, com o lançamento da Beacon Chain, uma rede que roda em paralelo desde então já no modelo de Proof-of-Stake.

Essa rede foi unificada à principal, daí o nome de “fusão”.

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2) Mas, afinal, o que a mudança de PoW para PoS significa?

A mudança altera completamente o modelo de participação na rede, abandonando o sistema tradicional de mineração. Nele, mineradores precisam concorrer uns com os outros por uma chance de verificar dados e serem recompensados em ETH. Para isso, é preciso usar equipamentos super potentes que gastam muita energia.

O PoS, que o Ethereum está prestes a implantar, tem uma lógica diferente. Em vez de exigir que os participantes comprem máquinas de mineração sofisticadas, o algoritmo pede para eles “armazenarem” no mínimo 32 ETH na rede para credenciar o computador a trabalhar na confirmação de transações. Em troca, o validador recebe unidades de ETH como recompensa.

3) Por que ela é importante?

Um dos argumentos mais fortes para a atualização é ambiental. De acordo com desenvolvedores do Ethereum, a migração para o modelo PoS fará a rede consumir 99,9% menos energia, já que a exigência de poder computacional será muito menor.

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“Os validadores não vão mais precisar fritar o seu computador para fazer uma prova de trabalho (cálculo matemático complexo), mas sim ter uma quantidade de moedas para participar da validação dos blocos”, explica Solange Gueiros.

Segundo o pesquisador de Ethereum Justin Drake, a atualização contribuirá para queda de 0,2% no consumo energético global, valor equivalente ao consumo da rede antes da mudança – o Bitcoin gasta 0,5% da energia do mundo.

No entanto, há também consequências para a economia interna do projeto, com a introdução do sistema de staking.

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4) O Proof-of-Stake é melhor que o Proof-of-Work?

De acordo com a Ethereum Foundation, a organização sem fins lucrativos que financia o desenvolvimento do ecossistema Ethereum, o modelo de Proof-of-Stake é melhor que a mineração tradicional porque não centraliza o controle nas mãos daqueles que podem comprar equipamentos sofisticados de mineração de criptomoedas, chamados ASICs.

Os defensores da atualização  dizem que o PoS – que entrega o controle da rede para aqueles que fazem staking de ETH com a rede – torna os ataques economicamente inviáveis e autodestrutivos.

Por outro lado, quem defende o Proof-of-Work argumenta que o staking traz sua própria centralização e riscos de segurança, possibilitando que atores mal-intencionados possam “comprar” o controle da rede. Eles também apontam que o PoS é um sistema menos testado do que o PoW, que se mostra resiliente há quase 14 anos, desde que o Bitcoin nasceu.

5) O que é o staking e por que ele muda o Ethereum?

O staking cria um incentivo para que a criptomoeda ETH se mantenha “trancada” no software de validação, criando uma solução oficial de renda passiva. Em troca do ETH bloqueado na conta, o validador aumenta suas chances de conseguir verificar transações a cada 12 ou 13 segundos, em tese aumentando suas recompensas ao longo do tempo – ou seja, quem tem ETH pode deixar o criptoativo rendendo.

O mínimo para participar é 32 ETH, mas as chances de obter recompensas aumentam conforme o valor depositado. Por isso, espera-se que os validadores tranquem muito mais ETH na rede para se credenciarem e participarem da validação.

Como consequência, especialistas apontam que a oferta da criptomoeda no mercado deve cair, o que pode favorecer um aumento de preço se a demanda se mantiver a mesma ou aumentar ao longo do tempo.

“Do ponto de vista financeiro, a emissão líquida de oferta [de ETH] será líquida negativa”, disse ela. Em outras palavras, há esperança de que o ETH possa se tornar um ativo deflacionário, tornando-o mais valioso ao longo do tempo, afirmou Katie Talati, diretora de pesquisa da empresa de investimentos Arca, em entrevista ao CoinDesk.

“Você verá a oferta circulante de [ETH] aumentar com o staking, mas na verdade não estará disponível para venda”, disse ela.

6) É possível se tornar um validador da rede Ethereum?

Mesmo antes da atualização ser concluída, já era possível fazer o staking pelo menos 32 ETH e ganhar recompensas por ajudar a validar a rede de testes do Ethereum, chamada de Beacon Chain. O ETH deixado na rede paralela, no entanto acumulou recompensas que não poderão ser sacadas até uma nova rodada de atualizações previstas para seis a 12 meses após a Merge.

Agora, com a Merge completa, qualquer pessoa já pode realizar staking do próprio computado. No entanto, é preciso algum conhecimento prévio – se o investidor cometer algum erro, como deixar a máquina brevemente offline, pode ter seus ativos confiscados.

Por outro lado, aqueles com menos experiência em blockchain podem fazer staking por meio de serviços de terceiros, como a Lido.

7) O que muda para o usuário comum?

Quem é investidor de Ethereum não precisou fazer nada para participar da atualização, já que ela foi realizada nos bastidores pelos participantes da rede, e deverá ser acompanhada pelas plataformas que conversam com ela, como exchanges, carteiras e aplicativos.

Segundo especialistas, no entanto, é recomendável, como precaução, evitar realizar transferências em momentos críticos da atualização – como na madrugada do dia 15 se setembro. A medida vale tanto para o ETH quanto para moedas que rodam na rede, como LINK, UNI, entre outras no padrão ERC-20.

Algumas exchanges adotaram precauções de antemão e suspenderam transações de ETH e tokens ERC-20 – então é preciso ficar atento quando sua corretora avisar que as movimentações já estão liberadas.

Os tokens ETH já existentes também se tornam automaticamente compatíveis com a nova rede após a atualização. Desse modo, quem tem a criptomoeda hoje não precisa fazer nada. No entanto, é possível que detentores do ativo percebam a chegada de uma nova moeda na carteira logo após a conclusão da atualização, proveniente do possível surgimento de uma nova rede.

8) Por que pode surgir uma nova rede?

Mineradores dissidentes, insatisfeitos com o abandono do sistema atual de mineração, planejam continuar trabalhando mesmo após a atualização. Na prática, eles farão uma alteração em seu software e manterão as máquinas ligadas normalmente, como se nada tivesse acontecido. Como consequência, criarão uma nova rede bifurcada da atual – o processo é chamado de fork, ou hard fork.

A possível nova rede deverá ter o nome de Ethereum PoW. Se de fato vier à tona como prometido, a rede duplicada deverá entregar seu token ETHW para todos os detentores atuais de ETH, em uma paridade de um para um, logo após o surgimento dessa blockchain, 24 horas após a Merge.

“É muito difícil que essa moeda tenha uma sobrevida muito longa, por conta da falta do ecossistema onde ela será utilizada. Os casos de uso migrarão junto com o Ethereum”, explicou o engenheiro especialista em blockchain, Edilson Osorio, em entrevista ao Cripto+.

9) Como ganhar os tokens ETHW?

Não há garantias de que a criptomoeda nova tenha algum valor, mas o usuário também não perde nada se a mantiver na carteira esperando que seu preço eventualmente suba no futuro.

Para ganhar os tokens ETHW, a plataforma que hospeda o ETH deverá oferecer suporte para o novo criptoativo. Por ora, as exchanges Poloniex, Bitfinex e Binance já anunciaram que vão oferecer suporte ao token – seus usuários, portanto, deverão receber o ETHW de graça automaticamente.

Além disso, a Coinbase anunciou que estudará a possibilidade de oferecer suporte a tokens derivados do Ethereum após a atualização. Mas, ainda não está claro se carteiras como a MetaMask, assim como demais corretoras, irão facilitar a distribuição (airdrop) do novo ativo digital caso ele surja.

10) O Ethereum vai valorizar?

O ETH chegou a disparar quase 100% desde junho, quando o principal desenvolvedor por trás do Ethereum aventou que a atualização chegaria em setembro. Seu preço já recuou desde então, mas ainda acumula alta de cerca de 60%.

Especialistas ouvidos pelo InfoMoney acreditam, no entanto, que a criptomoeda pode não valorizar ainda mais no curto prazo. “Eu acredito bastante que logo após a Merge podemos ter uma queda considerável”, falou Ney Pimenta, CEO do marketplace de criptomoedas BitPreço, no programa Cripto+.

Por outro lado, alguns especialistas apontam que poderá haver um short squeeze no ETH após a Merge. Short squeeze é o fechamento forçado de posições vendidas, causando uma cascata de liquidações e uma alta repentina no preço de um determinado ativo.

Segundo um levantamento da Kaiko, o evento seria possível no ETH justamente porque muita gente espera que o preço caia e, por isso, aposta nisso abrindo posições em derivativos – o excesso de posições do tipo, portanto, seria o catalisador do squeeze.

No longo prazo, no entanto, existe um consenso maior de que a criptomoeda irá valorizar. Pimenta disse que após a Fusão o mercado pode ver um crescimento proporcionado pela atualização, especialmente em aplicações de finanças descentralizadas. Além disso, falou, novas mudanças planejadas para o futuro do projeto deverão impactar nos custos de operação da rede, e atrair mais usuários.

Portanto, finalizou ele, o Ethereum continua na lista de criptoativos com alto potencial de valorização ao longo dos anos. Os mais otimistas dizem até mesmo que o ETH pode superar o valor de mercado do BTC em 12 meses.

11) Vai ficar mais barato usar o Ethereum?

O Ethereum é conhecido por cobrar alto para transacionar na sua rede: em momentos de alta do mercado, é possível pagar até US$ 100 por uma operação de contrato inteligente. A promessa é que isso seja resolvido também com uma atualização – mas não com a Merge.

A atualização do Ethereum que ocorre em setembro também não deixará o Ethereum mais rápido. Após a Fusão, a rede deverá ficar apenas cerca de 1 segundo mais veloz para confirmar transações (de 13 para 12 segundos por bloco de dados), mas sequer esse ganho é certo, pois depende de outros fatores.

Tanto a redução nas taxas de rede quanto a velocidade da blockchain serão afetadas por mudanças planejadas apenas para 2023, em uma série de cinco atualizações. Essas alterações no projeto, assim como o lançamento da Beacon Chain em dezembro de 2020 e a Merge de setembro deste ano, fazem parte do que se chama de Ethereum 2.0.

12) Quando exatamente aconteceu a Merge?

A atualização do Ethereum teve data marcada pelos desenvolvedores – mas não foi tão simples assim saber exatamente quando ela seria finalizada, porque foi feita em etapas. A Merge começou em uma rede paralela que, mais tarde, foi fundida à principal – daí o nome de “fusão” – chamada Beacon Chain, que existe desde dezembro de 2020.

A atualização Bellatrix, que deu o gatilho para o processo, foi ativada na Beacon Chain por volta das 8h30 (horário de Brasília) do dia 6 de setembro. A partir daí, teve início um processo gradual que foi, enfim, finalizado na madrugada de 15 de setembro.

Alguns sites monitoraram o processo e apontaram o horário exato em que a fusão ocorreria.

13) Por que a Merge requer etapas?

As inúmeras etapas que envolvem a Merge estão relacionadas ao alto nível de complexidade da atualização.

Para abandonar a mineração, o Ethereum requeria uma mudança em um software difícil de alterar, porque foi criado para ser inviolável.

Ao contrário do que acontece com o sistema operacional do celular, por exemplo, que é atualizado diretamente pela fabricante, o software do Ethereum precisa ser atualizado individualmente por todos os participantes da rede – em resumo, eles precisam entrar em consenso de que usarão a nova versão, desenvolvida em código aberto.

Atualizações em blockchains são chamadas de forks, termo que se refere a uma bifurcação da rede. Na prática, é isso o que acontece: quando os participantes concordam em atualizar, todos migram juntos para uma nova rede, trazendo consigo a cópia do que já havia sido registrado na cadeia anterior.

No entanto, no caso da Fusão do Ethereum, o procedimento é um pouco distinto: é a primeira vez que uma blockchain muda apenas o mecanismo de validação, e mantém todo o resto, incluindo aplicativos de NFTs e DeFi, intactos.

“Estão trocando o pneu do carro com o carro andando. É para ser demorado mesmo, para tomar cuidado”, explicou a desenvolvedora e professora de blockchain Solange Gueiros, da Chainlink Labs, durante participação no Cripto+.

14) O que poderia acontecer se desse errado?

A chance de a Merge dar errado era remota, segundo especialistas, mas existia. Não à toa, a exchange Bitfinex havia anunciado um plano para evitar possíveis problemas e garantir que os usuários não seriam afetados por uma possível falha na atualização.

Como precaução, a corretora lançou novos tokens sintéticos de Ethereum que permitem que os usuários negociem normalmente mesmo sem saber se a Merge daria certo: “ETH PoW” e “ETH PoS”, nomes que fazem referência aos sistemas antigo e novo do Ethereum.

A corretora terá pares de negociação desses dois tokens. Com tudo correu bem, o primeiro poderá expirar sem valor, com o segundo trocado por ETH “original” após a atualização.

Caso houvesse algum problema e a migração não acontecesse, o ETH PoS seria levado a zero, e o ETH PoW seria substituído por ETH.

Em um terceiro cenário, ainda possível, ocorre com a atualização bem-sucedida acompanhado pelo surgimento da nova rede promovida por mineradores: nessa situação, ambos os tokens são mantidos nas contas dos usuários. Eventualmente, eles serão trocados por versões originais de cada ativo digital.

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Paulo Barros

Editor de Investimentos