BB (BBAS3) e Itaú (ITUB4) foram destaques positivos em temporada marcada por piora na qualidade do crédito

Carteiras de crédito dos "bancões" cresceram apesar dos juros altos, mas inadimplência testou rentabilidade das instituições

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A temporada de resultados dos grandes bancos listados na Bolsa brasileira confirmou as previsões dos analistas de mercado. De fato, a safra foi marcada por uma grande diferença entre os balanços. Enquanto os números de Santander (SANB11) e Bradesco (BBDC3;BBDC4) desapontaram, os do Itaú (ITUB4) e, sobretudo, do Banco do Brasil (BBAS3) confirmaram e superaram boas expectativas.

Entre os meses de julho e setembro deste ano, os “bancões”, juntos, somaram carteira de crédito de R$ 3,525 trilhões, volume 14,5% maior que o do mesmo período do ano passado, apesar do salto na taxa básica de juros nesse intervalo de tempo. Na mesma base de comparação, o lucro líquido das quatro instituições financeiras cresceu 7,6%, para R$ 24,784 bilhões.

Banco Lucro 3T22 ROE 3T22 Carteira de crédito Inadimplência 90+
Santander  R$ 3,1 bi 15,6% R$ 484,252 bi 3%
Bradesco  R$ 5,2 bi 13% R$ 878,6 bi 3,9%
Itaú  R$ 8,079 bi 21% R$ 1,11 tri 2,8%
Banco do Brasil  R$ 8,3 bi 21,8% R$ 969,2 bi 2,34%

Os empréstimos podem não ter desacelerado no ritmo esperado, mas a inadimplência cobrou sua conta com a guinada para cima nos juros. Os atrasos para pagamento de empréstimos aumentaram em todos os bancos – em alguns mais do que em outros – assim como as provisões para devedores duvidosos. Juntas, as instituições financeiras provisionaram R$ 26 bilhões, 60% a mais que um ano antes.

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Ainda que as provisões não sejam prejuízos concretizados, têm impacto negativo no balanço e sobre a rentabilidade das companhias. Nesse quesito, a surpresa veio do Banco do Brasil, com retorno sobre patrimônio líquido (ROE) de 21,8%, superando seus pares privados.

Para Pedro Gonzaga, sócio da Mantaro Capital, o BB foi o principal destaque da temporada – e o Itaú não está muito atrás. “Como Santander e Bradesco não foram bem, o fato do Itaú ter mantido as tendências que estava indicando trouxe uma empolgação pelo contrate”, afirma.

Segundo Gonzaga, no caso de Santander e Bradesco, ambos correm risco de balanço, caso a inadimplência não normalize conforme o esperado. “Pelos resultados do terceiro trimestre, ficou mais evidente que se houver uma piora no cenário macroeconômico, vai haver uma deterioração maior no número desses dois bancos”, diz o sócio da Mantaro.

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Santander

Responsável por abrir a temporada de resultados para os grandes bancos, o Santander Brasil (SANB11) decepcionou com a entrega de um lucro líquido consideravelmente inferior ao consenso, decorrente de uma deterioração da margem financeira combinada com um crescimento robusto do provisionamento para perdas.

“Em linhas gerais, o Santander apresentou um resultado decepcionante, novamente. Mesmo com uma inadimplência relativamente em linha com o esperado, o banco está sofrendo com a tendência de juros e seus impactos na margem com o mercado. Em paralelo, a margem com clientes apresentou uma considerável contração de spread, o que está em linha com a estratégia de redirecionamento de carteira do banco, pautada em maior originação de crédito para linhas de menor risco – menos rentáveis -“, escreveram os analistas da Levante.

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Com um aumento de carteira de 6,1% em grandes empresas, o banco vem crescendo a exposição em um segmento que está com nível de inadimplência extremamente abaixo da média histórica, mas que ainda não mostra sinais de incremento na margem, segundo os últimos relatórios do Banco Central.

“Dito isso, para os próximos releases. deveremos acompanhar a manutenção dessa estratégia em detrimento dos spreads e se de fato o banco poderá surfar alguma vantagem por já estar se posicionando em um segmento de menor risco frente a um cenário esperado de crédito mais adverso para o segmento pessoa física”, apontam os analistas da casa.

“Do lado positivo, a inadimplência manteve-se em níveis controlados (3,0%), levando a um índice de cobertura estável e saudável de 226%”, avaliam os analistas da XP, mantendo a visão conservadora em relação ao Santander, com recomendação de venda e preço-alvo de R$ 32.

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Para o Bradesco BBI, o Santander Brasil apresentou tendências negativas no 3T22 em várias linhas do balanço, como margem com clientes, devido a uma abordagem de crédito mais conservadora, enquanto as provisões tiveram crescimento ainda significativo no trimestre, refletindo a qualidade dos ativos ainda desafiadora.

O BBI mantém recomendação neutra para SANB11, com preço-alvo de R$ 34, ainda um potencial de alta de 13% frente o fechamento da véspera.

Para o Citi, os resultados do Santander reforçam a visão de que o período de ROE de 20% do banco ficou para. A principal questão é sobre o novo nível de retorno sustentável para o banco.

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“Nós vemos os resultados refletindo um ajuste depois de um longo período de crescimento, o que deve levar a retornos sobre o patrimônio mais baixos. Na nossa visão, o valuation ainda não reflete o novo nível de ROE”, aponta o Citi, justificando a recomendação neutra para o nome.

Em teleconferência com analistas sobre os números do terceiro trimestre, os executivos do Santander admitiram que os resultados ficaram abaixo do esperado, mas disseram que a qualidade dos ativos é consistente com as projeções do banco. Segundo Mário Leão, CEO do Santander Brasil, o banco está sendo capaz de “antecipar ciclos econômicos com sucesso”.

Bradesco

O mercado reagiu tão mal aos resultados do Bradesco, que as ações do banco caíram mais de 17% no dia seguinte à divulgação do balanço, maior queda diária em 24 anos.

“Os resultados fracos do Bradesco no 3T22 foram impactados principalmente pela margem financeira (NII) com o mercado abaixo do esperado e maior provisionamento, que levou seu resultado para R$ 5,2 bilhões e um ROE médio de 13% no período. Além disso, o banco revisou para cima seu guidance de provisões em 2022, o que implica em resultados ainda pressionados no 4T22”, apontou a XP, que possui recomendação neutra para as ações, com preço-alvo de R$ 22,00 por ativo.

Após o resultado, o Credit Suisse fez um duplo rebaixamento de recomendação para as ações BBDC4, de outperform (desempenho acima da média do mercado) para underperform (desempenho abaixo da média do mercado), enquanto reduziu o seu preço-alvo de doze meses para BBDC4 de R$ 23 para R$ 19.

“Embora acreditemos que o baixo ROE de 13,5% não deva ser visto como o nível sustentável para o banco, o aumento das provisões e o ainda fraco NII de mercado devem continuar pesando na rentabilidade, levando o Bradesco a apresentar um ROE abaixo do potencial nos próximos trimestres, o que justifica o rebaixamento”, avaliam os analistas Marcelo Telles e Daniel Vaz, do banco suíço.

A Eleven Financial também cortou a recomendação de compra para a neutra, com preço-alvo de R$ 21 ao atualizar as premissas macro, além de incorporar o novo guidance de provisões. Para os analistas, as receitas de serviços seguem pressionadas com apenas a renda com cartões apresentado evolução tanto no comparativo trimestral quanto anual.

CEO do Bradesco, Octavio de Lazari Jr admitiu uma surpresa com a Provisão para Devedores Duvidosos (PDD) no terceiro trimestre, afirmando que o banco não esperava que houvesse uma aceleração tão rápida.

Com uma visão mais pessimista para as operações de crédito, o Bradesco fez uma provisão para perdas de cerca de R$ 1 bilhão no terceiro trimestre. De julho a setembro, essa provisão do banco deu um salto de 116,4% ano a ano, para R$ 7,27 bilhões.

O índice de inadimplência do acima de 90 dias subiu na base sequencial pelo quinto trimestre consecutivo, chegando a 3,9%, voltando ao maior nível em quatro anos.

“Eu acho que é um movimento que acabou acontecendo pelas características de uma clientela de baixa e pequenas e micro empresas, que acabam sofrendo com juros e inflação mais altas”, disse, sobre a inadimplência.

“O movimento está identificado e estamos tomando medidas necessárias. O quarto trimestre vai ser um momento de preocupação com inadimplência e teremos cautela e prudência”, completou, durante teleconferência com analistas.

Banco do Brasil

“Resultados fortes de cima a baixo”, “um trimestre para ser lembrado”, “22% de rentabilidade e projeções para cima”, “os humilhados serão exaltados” foram apenas algumas das classificações dos balanços em relatórios divulgados após o balanço.

A XP destacou que os resultados positivos do Banco do Brasil no 3T22 foram beneficiados, principalmente, por um robusto incremento em sua margem financeira bruta, que se deve principalmente ao robusto crescimento de sua carteira de crédito, à reprecificação de suas operações de crédito nos últimos trimestres e aos melhores resultados de sua tesouraria.

Além disso, o banco também revisou seu guidance para 2022, implicando em outro conjunto de fortes resultados para o quarto trimestre.

“Apesar do aumento da inadimplência e do aumento das provisões no período, seu índice de inadimplência permanece em níveis baixos e o índice de cobertura [que representa a proporção que a provisão para risco de crédito é capaz de cobrir os créditos inadimplentes] permanece saudável”, avaliaram os analistas Renan Manda e Matheus Guimarães, que assinam o relatório, destacando que esses números levaram ao forte lucro. A XP tem recomendação de compra para os ativos, com preço-alvo de R$ 57.

O Bradesco BBI reforça que os resultados do BB mostraram novamente fortes tendências, com o banco se beneficiando da elevação das taxas de juros e da expansão da carteira. Enquanto isso, as taxas de serviços e despesas operacionais continuaram a apresentar um desempenho sólido. O preço-alvo do BBI para os ativos é de R$ 52.

O JPMorgan ressaltou que as projeções para o BB só sobem, avaliando ainda que a qualidade dos ativos ficou substancialmente acima do Bradesco. Na qualidade dos ativos, contudo, os analistas do banco avaliaram que houve uma piora em cartões de crédito, o que pode levantar uma bandeira amarela para o Nubank (NUBR33).

Para o Itaú BBA, o Banco do Brasil apresentou outro conjunto de ótimos resultados, sendo que a alta do lucro de 7% na base trimestral mostrou que os bons fundamentos para o BB são rígidos e a instituição está num momentum completamente diferente (e melhor) do que alguns pares privados. Praticamente todas as linhas do balanço melhoraram e ficaram acima das suas estimativas, com melhorias notáveis ​​na NII de mercado e receitas de crédito ao cliente.

O BBA tem recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado, equivalente à compra) para BBAS3, com preço-alvo de R$ 53.

O Credit Suisse, que também possui recomendação outperform para os ativos, com preço-alvo de R$ 55, reiterou o Banco do Brasil como sua escolha preferencial junto com o Itaú.

“Estamos otimistas com o operacional do banco caso consiga dar continuidade a estratégia corrente. No entanto, com o novo mandato presidencial começando, podemos ver mudanças no alto escalão do banco. Se não fosse esse risco político, certamente a diferença de valuation iria fechar rapidamente estimulados pelos bons resultados”, ressalvaram os analistas da Genial.

Em teleconferência com analistas, Fausto Ribeiro, CEO da instituição financeira, afirmou que “os resultados devem seguir crescendo com base em decisões técnicas”.

Segundo ele, além do governo, “existem 1 milhão de acionistas privados no banco que geram equilíbrio na tomada de decisões”. “O resultado do banco deve seguir crescente, porque há um processo muito forte de governança na casa e as decisões tender a ser exclusivamente técnicas, buscando o melhor para os nossos acionistas”, afirmou.

Itaú

O crescimento da carteira de crédito, aliado a um controle da inadimplência, foi o principal aspecto de destaque nos resultados trimestrais do banco. Também chamou a atenção a capacidade do Itaú de crescer em linhas de crédito de maior risco, enquanto a concorrência pisou no freio nesse sentido.

Milton Maluhy Filho, presidente-executivo do banco, garante que o Itaú fez ajustes relevantes e reduziu de forma “vigorosa” a concessão em determinados produtos, como cartão de crédito, empréstimos para não correntistas e financiamento de veículos.

“Isso mostra que estamos conseguindo fazer ajustes necessários. O mais importante é que as safras estão enquadradas dentro do nosso apetite”, explicou, em teleconferência com analistas sobre os resultados.

Segundo ele, não haverá revisão do apetite em expandir em linhas de maior risco. “A menos que sejam clientes, com histórico, bom relacionamento e uma boa penetração”, afirmou. O executivo diz que o Itaú tem conseguido aumentar o “share of wallet” desses clientes.

Na avaliação da XP, os resultados do banco continuaram a se beneficiar do crescimento da carteira de crédito, para R$ 1,1 trilhão, e de uma gestão de risco equilibrada, que permitiu o banco manter uma inadimplência (de 2,8% sob controle.

O ativo ITUB4 é o atual top pick da XP no setor, com recomendação de compra e preço-alvo de R$ 31.

De maneira geral, a Levante Ideia de Investimentos avalia que o balanço trimestral reafirmou o papel de liderança de Itaú e o prêmio na avaliação de múltiplos entre os grandes bancos, em meio a um cenário desafiador.

Para a Levante, o banco mostra a força de suas verticais na entrega de resultados e retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) acima da média e com qualidade.

“Os investimentos em inovação do banco geram resultados diretos no equilíbrio direto de sua receita de serviços, em um contexto no qual a tendência do mercado é de declínio, dada a entrada de novos players aumentando a competividade”, diz a análise.

Na avaliação da casa, o Itaú é a melhor opção do setor para atravessar o atual momento de incertezas e os resultados reafirmam essa escolha.

“Dentre os grandes, o Itaú parece ser o mais blindado a esta volatilidade, ao mesmo tempo que tem mostrado competência em manobrar sua carteira de crédito de modo eficiente, enquanto apresenta execução nos resultados de sua tesouraria”, diz a equipe de análise.

O Credit Suisse foi além nos elogios, afirmando que o balanço de trimestral do Itaú foi uma “aula de excelência operacional e de execução”, colocando o banco em um patamar acima das outras instituições financeiras. Os analistas destacaram a expansão relevante da carteira, com ativos saudáveis, e uma forte expansão de margem com os clientes.

“Acreditamos que o resultado vai ajudar a responder às preocupações do mercado sobre o problema sistêmico de qualidade de crédito no varejo, reforçado pelo crescimento das linhas de crédito ao consumidor sem garantia do Itaú”, diz a análise do banco.

O Credit diz perceber que os participantes do mercado estão passando por um crivo, especialmente em cartões de crédito e empréstimos pessoal, com Itaú e Nubank “claramente” se saindo melhor.

Assim como a Levante, o Credit acredita que o Itaú é o “melhor veículo para enfrentar o ambiente cada vez mais incerto no Brasil”, principalmente considerando que as taxas de juros permanecerão altas por um bom tempo.

ITUB4 também é top pick da casa, com avaliação outperform (desempenho acima da média do mercado, equivalente à compra) e preço-alvo de R$ 36.

Já o Bradesco BBI teve reação moderada aos resultados, afirmando que o banco teve um trimestre decente, mostrou tendências sólidas e não entregou grandes surpresas.

“Mesmo seguindo preocupados com a qualidade de crédito, acreditamos que o banco foi capaz de compensar maiores custos de risco com uma margem financeira líquida (NII) forte, mantendo um índice de cobertura estável, em linha com a média de 2019 [pré-pandemia”, escreveram os analistas da casa.

No entanto, o BBI questiona o quão sustentável é o crescimento da carteira do Itaú em linhas mais arriscadas, como cartões de crédito e empréstimos pessoais, nos próximos trimestres.

O BBI mantém recomendação outperform para ITUB4, com preço-alvo de R$ 38.

Assim, dois “mundos” ficaram claros na divulgação dos balanços, enquanto Santander e Bradesco decepcionaram, Itaú animou e BB foi o grande destaque, mas este último podendo sofrer em meio à incerteza sobre os rumos da instituição estatal com o novo governo.

Mitchel Diniz

Repórter de Mercados