Teto do ICMS pode reduzir preço de combustíveis e conta de luz? Veja respostas e impactos ao seu bolso

Aprovado no Congresso, o PLP 18/2022 foi sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) em 24 de junho

Lucas Sampaio

O Congresso Nacional já concluiu a votação do projeto de lei complementar nº 18 (PLP 18/2022), que limita a alíquota do ICMS sobre bens e serviços relacionados a combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo ao piso do imposto estadual (atualmente entre 17% e 18%).

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O texto foi sancionado com vetos pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), mas ainda há várias dúvidas em relação ao PLP 18 (e se ele vai, de fato, reduzir o preço dos combustíveis e da conta de luz). Veja abaixo um perguntas e respostas sobre o assunto:

  1. O que é o ICMS?
  2. O que muda com a aprovação do PLP 18? O que falta para o projeto entrar em vigor?
  3. Por que o governo federal quer reduzir o ICMS?
  4. Por que os governadores criticam o PLP 18?
  5. Como o preço do combustível é calculado? Como o ICMS entra na conta?
  6. Quanto os estados cobram de ICMS sobre a gasolina e o diesel atualmente ? E sobre o etanol?
  7. Qual é a relação do ICMS com o preço dos combustíveis?
  8. Quanto a gasolina e o diesel têm de tributos federais?
  9. O PLP 18 vai diminuir o preço dos combustíveis?
  10. E quais serão os impactos na conta de luz?
  11. Quanto os estados cobram de ICMS sobre a conta de luz atualmente?
  12. Há outros projetos que vão ajudar a diminuir o preço da conta de luz? Quais?
  13. A mudança no ICMS pode afetar a inflação?

O que é o ICMS?

O ICMS (Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação) é um tributo estadual e a principal fonte de arrecadação dos estados. Além disso, parte do imposto arrecadado é repassado às prefeituras.

Esse dinheiro é usado para custear as despesas dos governos estaduais e municipais, como saúde, educação e segurança (pagamento de policiais civis e militares, professores, profissionais de saúde, entre outros).

Em estados como São Paulo, uma parte do ICMS também é destinado às universidades estaduais. O imposto é a principal fonte de sustento da USP, da Unesp e da Unicamp (elas recebem 9,57% do ICMS arrecadado no estado e devem perder R$ 1,03 bilhão por ano com a aprovação do PLP 18).

O que muda com a aprovação do PLP 18? O que falta para o projeto entrar em vigor?

O PLP 18 limita a alíquota máxima de ICMS que pode ser cobrada sobre bens e serviços relacionados a combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo. O projeto determina que esses setores são bens e serviços essenciais, proibindo estados de cobrarem uma alíquota acima do piso estadual do ICMS (que atualmente é de 17% ou 18%, dependendo do estado).

O Supremo Tribunal Federal (STF) já havia decidido que energia elétrica e telecomunicações são bens e serviços essenciais (e, portanto, estados não poderiam cobrar mais que 17% a 18% de ICMS). Mas a decisão só passaria a valer em 2024, e o Congresso aproveitou o PLP 18 para antecipar a medida para agora e incluir combustíveis, gás natural e transporte coletivo entre os bens e serviços essenciais.

O texo entrou em vigor na sexta-feira (24), após a sanção de Bolsonaro, que vetou o trecho que previa compensação parcial aos estados devido à queda na arrecadação que eles terão (veja mais abaixo).

Por que o governo federal quer reduzir o ICMS?

O governo federal quer diminuir o preço dos combustíveis e da conta de luz e tentar frear a inflação, pois ambos os problemas econômicos estão afetando a polularidade do presidente Jair Bolsonaro (PL) e suas chances de reeleição.

Deputados federais começaram um movimento em abril para suspender reajustes de até 24% nas contas de luz que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) estava autorizando em diversos estados.

Eles foram concedidos na mesma época em que a bandeira tarifária escassez hídrica foi suspensa e reduziram — e em alguns casos até anularam — o impacto da mudança para a bandeira verde na conta de luz (o governo dizia que as contas de luz ficariam cerca de 20% mais baratas).

Ao mesmo tempo, o preço dos combustíveis segue em trajetória de alta, devido aos sucessivos reajustes da Petrobras (PETR3;PETR4). Desde 2016, a estatal passou a adotar no governo Michel Temer (MDB) uma política de preços que acompanha a cotação internacional do petróleo e a variação do dólar, além dos custos de importação, para definir o valor que cobra da gasolina e do diesel nas refinarias.

Apesar das diversas trocas na presidência da estatal (e até no Ministério de Minas e Energia), de ameaça de CPI e críticas aos reajustes, Bolsonaro nega interferência na Petrobras e tem tentado dividir o ônus da alta nos preços dos combustíveis com governadores.

Mas o preço da gasolina aumentou 155,8% nas refinarias; o do diesel, 165,6%; e do gás de cozinha, 119,1%, desde o início do governo Boslonaro (entre janeiro de 2019 e maio de 2022), segundo cálculos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). No mesmo período, a inflação medida pelo IPCA foi de 25,7% e o salário mínimo foi reajustado em 21,4%.

Por que governadores criticam o PLP 18?

O ICMS é a principal fonte de arrecadação dos estados (e também dos municípios, pois parte do imposto é repassado às prefeituras), por isso governadores e prefeitos dizem que a redução do ICMS vai afetar a arrecadação e prejudicar o funcionamento dos serviços públicos.

Os estados dizem que vão perder quase R$ 100 bilhões em arrecadação por ano com a mudança e por isso exigiam do governo federal uma compensação (o secretário de Fazenda de São Paulo, Felipe Salto, diz que só o estado perderá R$ 15,4 bilhões sem nenhuma compensação). A Consultoria de Orçamentos do Senado estima que o impacto para os estados será de até R$ 26,8 bilhões apenas em 2022.

O PLP 18 previa uma compensação aos estados se a arrecadação total do ICMS do estado cair mais de 5% neste ano, mas os governadores diziam que, na prática, teriam de arcar com as perdas de arrecadação sozinhos, pois esse gatilho dificilmente será acionado por causa da inflação em alta. Além disso, ao sancionar a lei, Bolsonaro vetou o trecho que previa a compensação aos estados.

Como o preço do combustível é calculado? Como o ICMS entra na conta?

O preço da gasolina e do diesel é formado basicamente por 4 custos, segundo a Petrobras:

    1. A parte da Petrobras;
    2. Os impostos federais e estaduais (os federais são a Cide, o PIS/PASEP e a Cofins; o estadual é o ICMS)
    3. O custo de distribuição e revenda;
    4. O custo da adição de biocombustíveis (a gasolina comum tem 27,5% de etanol e a premium, 25%; já o diesel tem 10% de biodiesel).

A Petrobras diz que é responsável por 38,9% do preço do litro da gasolina e 63,2% do diesel (e que o restante é formado pelos outros custos). Para fazer o cálculo, estatal usa o preço médio dos combustíveis coletado semanalmente pela ANP (entre 29 de maio e 4 de junho, o litro da gasolina custava R$ 7,22 em média no país e o do diesel, R$ 7,01).

Segundo a Petrobras, atualmente um terço do preço da gasolina é formado por tributos (33,8%, ou R$ 2,44), sendo 24,2% estaduais (R$ 1,75) e 9,6%, federais (R$ 0,69). Já o diesel tem 11,7% de ICMS (R$ 0,82) — no momento não há cobrança de tributos federais, que já estão zerados até dezembro.

Portanto, o ICMS é responsável por R$ 1,75 do preço do litro da gasolina e R$ 0,82 do diesel atualmente.

Composição do preço da gasolina cobrada nos postos, segundo a Petrobras*:

Petrobras  R$   2,81 38,9%
Custo do etanol anidro  R$   0,98 13,6%
Distribuição e revenda  R$   0,99 13,7%
Imposto estadual (ICMS)  R$   1,75 24,2%
Impostos federais  R$   0,69 9,6%
Total  R$   7,22 100%

* Elaboração da estatal a partir de dados da ANP e do CEPEA/USP, baseados nos preços médios realizados pela Petrobras (gasolina A) e nos preços médios ao consumidor final (gasolina C) nos 26 estados e no Distrito Federal.

Composição do preço do diesel cobrado nos postos, segundo a Petrobras**:

Petrobras  R$   4,43 63,2%
Custo do biodiesel  R$   0,74 10,6%
Distribuição e revenda  R$   1,02 14,5%
Imposto estadual  R$   0,82 11,7%
Impostos federais***  –
Total  R$   7,01 100%

** Elaboração da estatal a partir de dados da ANP, baseados nos preços médios de diesel S-10 da Petrobras (diesel A) e nos preços médios de diesel S-10 ao consumidor final (diesel B) nos 26 estados e no Distrito Federal.
*** Os impostos federais do diesel e do biodiesel estão temporariamente zerados desde março. A medida vale até 31 de dezembro de 2022.

Quanto os estados cobram de ICMS sobre a gasolina e o diesel? E sobre o etanol?

As alíquotas variam de um estado para outro (e entre os combustíveis também), segundo levantamento do jornal O Estado de S. Paulo com base em dados fornecidos pela Fecombustíveis:

Qual é a relação do ICMS com o preço dos combustíveis?

Como o ICMS é cobrado com uma alíquota sobre o valor do combustível, o imposto arrecadado sobe quando a Petrobras reajusta a gasolina e o diesel nas refinarias (e os preços sobem nas bombas). Isso estava beneficiando só a arrecadação do imposto estadual (e dos estados), mas também dos tributos federais (PIS/PASEP e a Cofins), que seguem a mesma lógica de um valor percentual sobre o preço.

O governo federal já tentou limitar a cobrança do ICMS do diesel a um valor fixo. Aliados chegaram a aprovar um projeto de lei no Congresso, mas um impasse sobre a interpretação da Lei Complementar 192/22 fez com que o tema fosse parar no Supremo Tribunal Federal (STF). O relator do caso é o ministro André Mendonça, que até ser indicado ao cargo era ministro de Bolsonaro.

Quanto a gasolina e o diesel têm de tributos federais?

A gasolina tem cerca de R$ 0,69 em tributos federais (Cide, PIS/PASEP e Cofins) e R$ 1,75 de ICMS, segundo a Petrobras. O diesel e o biodiesel não têm nenhum imposto federal no momento (eles foram zerados em março, até dezembro) e 11,7% de ICMS (R$ 0,82).

O governo anunciou recentemente que também vai zerar até dezembro os tributos federais sobre a gasolina, o etanol e o gás natural veicular (GNV), além de compensar os estados que zerarem o ICMS sobre o diesel.

O PLP 18 vai diminuir o preço dos combustíveis?

Teoricamente sim, mas o corte dos tributos precisa ser repassado ao consumidor. Tatiana Nogueira, economista da XP, diz que a redução chegará ao consumidor final apenas parcialmente (com uma fatia das reduções sendo internalizada pelas cadeias do mercado). No caso de combustíveis, a XP estima que o repasse ficará entre 60% e 80%.

Além disso, futuros reajustes da Petrobras podem reduzir — e até anular — o corte dos tributos. Zerar o ICMS sobre o diesel até o fim do ano, por exemplo, pode reduzir o preço do combustível em até R$ 0,82 temporariamente, mas apenas o último reajuste da estatal aumentou o preço nas refinarias em R$ 0,70. Já a alta no preço da gasolina foi de R$ 20.

“Novos reajustes são previstos para o futuro próximo, seja por conta da pressão cambial ou do preço internacional dos combustíveis”, afirmou a economista da Tendências Consultoria e pesquisadora associada do Ibre-FGV, Juliana Damasceno, ao jornal O Estado de S. Paulo. Ela diz também que a política de desonerações de certa forma evita uma inflação hoje, mas que pode ser devolvida no ano que vem.

E quais serão os impactos na conta de luz?

O PLP 18 vai reduzir as tarifas de energia elétrica em até 12% em alguns estados, segundo a diretora-geral interina da Aneel, Camila Bomfim. A agência, no entanto, não diz em quais estados haverá a redução nem de quanto será essa queda.

Procurada pelo InfoMoney, a agência não explicou o cálculo de Bonfim e se limitou a dizer que não tem a estimativa por estado. “Temos o efeito médio. Essa medida [a limitação da alíquota do ICMS] acarreta uma redução média de 12% que vai variar para cada estado”.

O Banco Inter calcula que o PLP 18 pode acarretar em uma redução média de 12,6% na tarifa de energia residencial, mas o tamanho da queda varia muito de um estado para outro (o impacto será nulo em Roraima e de 18,1% no Rio).

O relatório diz também que o efeito prático da mudança para empresas do setor elétrico é pequeno, pois a pressão inflacionária aumenta a propensão a “gatos” (perdas não técnicas), mas a redução das tarifas pode elevar a eficiência do sistema.

Ilustração mostra oscilação no preço da energia elétrica

Quanto os estados cobram de ICMS sobre a conta de luz atualmente?

As alíquotas de ICMS mais recorrentes na conta de luz residencial nos estados são de 25%, segundo levantamento do jornal O Estado de S. Paulo com base em dados fornecidos pela Abradee (associação de distribuidoras de energia). Ela chega a 32% no Rio, e em Roraima ela já está no piso mínimo estadual.

A Aneel diz que 30,5% do valor da conta de luz é formada por impostos. O ICMS responde por 21,3% e o PIS/Cofins, por 9,2% (tributos federais que não sofrerão nenhuma alteração com o PLP 18).

Há outros projetos que vão ajudar a diminuir o preço da conta de luz? Quais?

A Câmara aprovou neste mês um projeto que disciplina a devolução de PIS e Cofins recolhidos a mais dos consumidores pelas distribuidoras de energia. O projeto aguarda sanção presidencial e, segundo dados da Aneel, a devolução integral de créditos tributários de PIS e Cofins cobrados indevidamente têm um impacto médio potencial de redução de 5,2% nas contas de luz.

A medida já vem sendo adotada desde 2020 pela Aneel nos processos de reajustes tarifários, mas a agência diz que a aprovação de um projeto de lei específico sobre o tema dá mais segurança jurídica para a utilização desses recursos.

Além disso, a capitalização da Eletrobras prevê que a empresa e suas subsidiárias façam aportes na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) nos próximos anos (a CDE é fundo setorial que é bancado pelos consumidores por meio da conta de luz e financia subsídios para alguns segmentos e para políticas públicas, como o programa Tarifa Social).

A Eletrobras vai injetar R$ 5 bilhões no fundo somente neste ano, o que deve reduzir as contas de luz em 2,3%, em média, segundo a Aneel. Serão depositados R$ 32 bilhões na CDE ao todo, que devem ter um impacto de 15 pontos percentuais na conta de luz, segundo cálculos do professor Edvaldo Santana, ex-diretor da agência.

A mudança no teto do ICMS vai afetar a inflação?

Sim. Tanto em 2022 quanto em 2023.

A Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal, estima que o PLP 18 e outras medidas devem reduzir o IPCA em 2,8 pontos percentuais neste ano, mas elevar a inflação de 2023 em 1,0 p.p. e aumentar o risco fiscal do governo brasileiro, além de levantar dúvidas sobre a disposição dos políticos de reverter futuramente os estímulos concedidos em 2022.

Atualmente, a IFI projeta um Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 8,6% neste ano e de 4,2% no próximo, mas esses números não incorporam o possível efeito da redução dos impostos.

O Banco Central afirmou na ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada na terça-feira (21), que os projetos diminuem “sensivelmente” a projeção da inflação para 2022, mas elevam “em menor magnitude” a dos próximos anos. “As medidas tributárias em tramitação reduzem sensivelmente a inflação no ano corrente, embora elevem, em menor magnitude, a inflação no horizonte relevante de política monetária”.

O PLP 18 e os outros projetos também aumentam o risco fiscal do governo brasileiro, segundo especialistas. A implementação das medidas já anunciadas envolvem cortes de tributos que significam uma perda de receita de pelo menos R$ 110 bilhões para os cofres federais em 2022.

Lucas Sampaio

Jornalista com 12 anos de experiência nos principais grupos de comunicação do Brasil (TV Globo, Folha, Estadão e Grupo Abril), em diversas funções (editor, repórter, produtor e redator) e editorias (economia, internacional, tecnologia, política e cidades). Graduado pela UFSC com intercâmbio na Universidade Nova de Lisboa.