Coronavoucher e a aprovação de Jair Bolsonaro

É possível inferir que, além de efeitos políticos, o auxílio de R$600 está contribuindo para evitar uma deterioração adicional da aprovação do presidente
Por  XP Política -
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Este estudo tem como objetivo testar a hipótese baseada no senso comum e anedóticos de que o auxílio emergencial de R$ 600 pagos pelo governo federal desde maio tem impactado positivamente a avaliação de Jair Bolsonaro. Na rodada mais recente da pesquisa XP/Ipespe, com campo entre 9 e 11 de junho, 34% dos respondentes afirmaram que alguém na casa havia recebido o benefício, outros 9% esperavam receber, 55% disseram que não receberão por não se enquadrar e 2% não souberam responder.

Abaixo exibimos a diferença de perfil entre os beneficiários (já receberam + esperam receber) ou não beneficiários, que bate com o que se espera do programa, com prevalência de pessoas de menor renda, menor escolaridade e mais jovens. Os fatores, claro, não são independentes.

O passo inicial foi examinar se havia diferença significativa na taxa de aprovação entre os que declaram ter recebido o benefício ou ter expectativa de recebe-lo em relação àqueles que não receberam nem esperam recebe-lo. Há diferença pequena em que entre os beneficiários e não beneficiários que avaliam o governo como regular (24% vs 21%) e como ruim e péssimo (47% vs 47%). Portanto, não há evidência de diferença significativa de aprovação entre os dois grupos.

Mas isso não quer dizer que não há efeito, pois não temos o contrafactual. Para tentar buscar identificar ou descartar o efeito, vamos recorrer a outros dois exercícios:

(i) A avaliação positiva do presidente passou de uma média de 33% entre julho de 2019 e fevereiro de 2020, que serve de base de comparação pré-pandemia, para 28% nas 8 pesquisas que conduzimos após esse período. Uma piora de 5 p.p.. A avaliação negativa aumentou de 38% para 44% (+6 p.p.) na mesma comparação.

Se o efeito do voucher fosse grande, veríamos disparidade na evolução da avaliação positiva e/ou negativa por faixa de renda, de acordo com o perfil dos beneficiários. O efeito, nesse caso, fica mais evidente entre os respondentes que ganham acima de 5 salários mínimos na comparação com os demais, mas estes correspondem a apenas 16% da amostra total e que o presidente gozava a maior aprovação entre esse segmento.

Resta saber se a piora de cerca de 10 p.p. vista entre os mais ricos que seria o contrafactual e o voucher evitou piora maior entre os mais pobres.

(ii) Não é novidade na ciência política ou na economia a necessidade de se criar um contrafactual para se comparar cenários. Nesse caso o desafio é grande, pois temos muitas partes móveis, em especial a situação econômica, a saída de Sérgio Moro e o impacto na base lavajatista de apoio ao governo e a avaliação do presidente em relação ao combate do coronavírus.

Em estudo anterior, mostramos que cerca de 5 p.p. a 10 p.p. dos apoiadores do presidente atribuía nota mais alta a Sergio Moro que a Jair Bolsonaro. Após a saída do ministro do governo, atribuímos parte da piora de meados de abril em diante a esse efeito. A avaliação do presidente em relação ao combate ao coronavírus piorou de 41% em meados de março para 23% no final de abril, mas tem ficado praticamente constante desde então.

Resta então isolar o efeito econômico, que é correlato à concessão auxílio emergencial. Há muito usamos um modelo que usa inflação, desemprego e dummies para eventos políticos para explicar e tentar antever a aprovação presidencial. Antes da pandemia, em fevereiro, a estimativa para a aprovação era de 37% e o presidente tinha 34% na média das pesquisas divulgadas no mês.

Vamos à estimação. Para inflação, usamos a projeção da XP de 0.8% para 2020, baixa portanto, o que ajuda a aprovação. Para taxa de desemprego, partimos de 11.3% em fevereiro (com ajuste sazonal) e nossa expectativa é que chegue a 15.2% em junho, reconhecendo toda a incerteza que há devido aos efeitos dos programas colocados pelo governo e do comportamento da PEA.

Com tais hipóteses a aprovação sinalizada é algo pouco abaixo de 20% em junho, podendo se deteriorar mais por piora adicional do mercado de trabalho até o fim de 2020. Portanto, é possível inferir que além de efeitos políticos, o voucher está contribuindo para evitar uma deterioração adicional da aprovação do presidente.

Conclusão
Não encontramos evidência de grande diferença de aprovação ao governo entre os que se beneficiam ou esperam se beneficiar do auxílio emergencial de R$ 600. No entanto, encontramos que, ao longo do tempo, houve uma piora proporcionalmente maior na avaliação positiva e negativa do presidente entre brasileiros com renda mais alta (acima de 5 salários mínimos) do que entre aqueles com renda mais baixa.

E nosso modelo de aprovação sugere que há um descolamento entre a aprovação efetiva, que foi de 28% na leitura mais recente, com a projetada para o fim de junho, que seria de algo abaixo de 20%. Tal diferença pode ser explicada pelo efeito dos programas de manutenção da renda, em especial o benefício emergencial de R$ 600, que é o maior deles.

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