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A bomba relógio do setor automotivo

Quando o mercado se normalizar, as montadoras lançarão bônus, campanhas, descontos, prazo e taxas de financiamento subsidiadas para retomar a produtividade
Por  Raphael Galante -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Caros leitores; digníssimas leitoras; em tempo de pandemia com o comércio praticamente fechado, a pergunta de um milhão de dólares é: quando o comércio vai abrir?

Imagino que a grande maioria já deva ter visto o gráfico que o pessoal da JP Morgan fez sobre o quanto durariam os mais variados negócios.

jp morgan levantamento crise economia coronavírus
(JP Morgan)

Como toda a economia está meio parada – e já cansamos de jogar CSGO – decidimos tentar saber quanto tempo duraria uma concessionária de veículos.

E por qual motivo uma concessionária?

Pois, quando você fala de uma montadora, o planejamento estratégico (de payback) é far far away… Basta ver o exemplo que os japoneses da Honda fizeram. Quando o mercado “estava bom”, eles decidiram por uma nova fábrica; iniciaram a construção; o mercado começou a sua descida ladeira abaixo e, quando a fábrica ficou pronta, o que eles fizeram?

Deixaram-na fechadinha por quase três anos, até o mercado melhorar. Em 2019, começou a melhorar, eles abriram a fábrica e, agora, danou-se tudo de novo!

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Já o comércio varejista (seja qual for) depende muito da dinâmica (e principalmente do humor) do consumidor. Por isso, neste momento, o que percebemos é a forte queda que o comércio vem registrando, segundo levantamento da ELO.

variação de faturamento em lojas físicas

O conceito do mercado varejista é como “andar de bicicleta”. Você tem sempre que estar pedalando. No momento que você para de pedalar, ainda consegue andar por mais alguns metros… mas, depois, o tombo é certo!

Entrando no adorável mundo de revender carros: fizemos uma amostragem com quatro marcas que correspondem a pouco mais de 30% das vendas de veículos.

Pegamos o DEF (Demonstrativo Econômico Financeiro) de cada uma destas marcas com as suas redes de concessionárias e fizemos o seguinte:

Somamos o lucro líquido dos últimos 12 meses e dividimos pelo custo médio (dos últimos 12 meses) das despesas fixas (operacionais). Por exemplo, o custo com “comissão de venda” (uma despesa variável) não foi considerado, já que neste modelo, como não teremos venda de veículos, não haverá o pagamento de comissão de vendas.

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Ou seja, o conceito aqui seria mostrar por quanto tempo uma concessionária conseguiria manter as suas atividades antes que fosse exaurida toda a lucratividade dos últimos 12 meses.

Últimas considerações: o DEF é uma média das concessionárias, logo, existe algumas em situação muito melhor, da mesma forma que existem outras em uma situação muito pior; o resultado leva em consideração que todo o lucro líquido da operação (dos últimos 12 meses), ficou dentro da concessionária, o que – convenhamos – seja pouco provável.

Da mesma forma que isso não que dizer que quando “se zerar” todos os recursos, a concessionária fechará. Não foi levado em conta – por não termos acesso – o valor das multas trabalhistas que cada um teria que pagar; logo o prazo para o encerramento total das atividades seria bem menor. Entre outros fatores.

Pois bem, o resultado encontrado foi que uma concessionária conseguirá sobreviver por apenas 117 dias. Sendo que, na nossa amostragem, tivemos marcas que conseguiriam se manter por 171 dias (o nosso melhor resultado) e marcas com 63 dias (o pior resultado).

Ou seja, na média, uma concessionária consegue ficar por 4 meses em coma até que seja decretada a morte dela.

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Mas, como não existe nada tão ruim que não possa piorar, pioraremos!

O lucro dos últimos 12 meses serviria para manter a concessionária por 04 meses. Mas existem outros fatores que agravam ainda mais a situação delas. Um deles é o estoque de veículos usados. Em geral, não existe uma linha de crédito (para esse tipo de operação) como é na de veículos novos. Ou seja, o investidor (no caso o concessionário) tem que fazer o desembolso de seus recursos para bancar o carro no chão da concessionária.

E como andam as vendas de veículos usados? Bem, segundo a Auto Avaliar (aqui), que é a maior plataforma de transação de veículos no esquema B2B de veículos usados, o estoque dos concessionários subiu assustadoramente.

O conceito é: o ideal é que o estoque gire em 21 dias. E, ao longo dos últimos meses, ele vinha nessa trajetória. Mas, no mês de março, os dias de estoque dispararam. Com o volume de estoque alto e com as vendas paradas, o prazo alcançou a marca de 61 dias (antes de aparecer algum chato falando do resultado do mês de novembro, ele foi um mês alto para se preparar para o mês de dezembro – excelente mês de venda):

estoque de veículos usados nas concessionárias

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E qual é o “pobrema” de tudo isso?

No exemplo que obtivermos com a Auto Avaliar, existiam quase 35 mil carros usados nas concessionárias em seu sistema. A um valor de mercado na ordem de R$ 1,5 bilhão. Quando o mercado se normalizar, uma das primeiras medidas que será implementada pelas montadoras será lançar bônus, campanhas, descontos, prazo e taxas de financiamento subsidiadas para retomar a produtividade. E, aí, o impacto mais que imediato será a desvalorização do estoque de usados.

E aqui não rola “circuit-break”.

No caso dos carros que estão na Auto Avaliar, estimamos que haja uma perda de R$ 290 milhões. Ou seja, uma desvalorização próxima de 19%, isso sem considerar o custo financeiro que esse carro vem gerando.

O que veremos nos próximos meses (no ramo automotivo – e, também, em outros ramos do mercado varejista) é uma gincana muito grande!

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O mercado automotivo continua (e continuará) sendo rentável, basta ver que um dos principais sócios das Casas Bahia vem investindo neste ramo. Mas o que percebemos é que muita gente não possui o fôlego necessário para aguentar essa turbulência (afinal de contas, essa pandemia – e as consequências causadas por elas – vieram como se fosse uma voadora no peito).

Quem não tiver: caixa, liquidez e (acesso a) capital – vai rodar…. e vai rodar feio!

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E aí, o que achou? Dúvidas, me manda um e-mail aqui. Ou me segue lá no Facebook, Instagram, Linkedin e Twitter.

Raphael Galante Economista, atua no setor automotivo há mais de 20 anos e é sócio da Oikonomia Consultoria Automotiva

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