Ibovespa: O que levou o índice de volta para os 120 mil pontos e o que esperar agora?

Queda da inflação, mudança de ciclo dos juros e melhora do cenário nos Estados Unidos são algumas explicações

Vitor Azevedo

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O Ibovespa chegou nesta quarta-feira (21) aos 120 mil pontos, patamar que não alcançava desde novembro do ano passado no intraday. Às 13h18 (horário de Brasília), o índice tinha ganhos de 0,58%, a 120.313 pontos, com as ações da Petrobras (PETR4) também registrando fortes ganhos em meio às recentes elevações de recomendação para a companhia. 

O movimento se deu com as atenções voltadas principalmente para sinais sobre os próximos passos do Comitê de Política Monetária (Copom), que divulga sua decisão de juros após o fechamento do mercado, enquanto no exterior o foco está voltado para o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell.

As apostas são de que o Copom do Banco Central deve anunciar após o fechamento do mercado a manutenção da Selic em 13,75%, enquanto o comunicado que virá com a decisão deve concentrar os holofotes, após o mercado ter migrado recentemente as apostas do primeiro corte de juros para agosto, um dos fatores que têm animado o mercado.

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Entre os fatores que especialistas veem como justificativas para a alta do principal índice da Bolsa também está, principalmente, a maior visibilidade que agora se tem para a economia brasileira e também, em parte, para a mundial.

A queda da inflação, que propicia a queda de juros, por exemplo, é uma das questões mais apontadas por analistas. A divulgação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de maio, no começo deste mês, foi gatilho para uma sequência de altas. O índice divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE) trouxe um avanço de 0,23% dos preços no quinto mês do ano, ante 0,33% do consenso.

“Acho que vários motivos podem explicar esse rali, mas o principal deles, ao meu ver, são os dados de inflação divulgados nos últimos meses. O IPCA vem mostrando desacelerações consecutivas. Está em seu menor patamar em anos”, comenta Marcelo Boragini, sócio da Davos Investimentos e especialista em renda variável. “Uma inflação mais tímida é extremamente positiva. Existe uma forte expectativa de que o Banco Central começará o corte na taxa de juros já em agosto”.

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A curva de juros brasileiro reflete isso. No começo de 2023, as taxas dos DIs para 2027, no meio da curva, estavam a cerca de 13%. Na segunda, elas fecharam negociadas a 10,51% no meio de pregão, com um recuo de mais de 2 pontos percentuais.

As expectativas para os juros influenciam diretamente nas projeções de faturamento das empresas, uma vez que o acesso a crédito impacta o consumo das pessoas. Além disso,  elas pesam no lado financeiro, com empréstimos realizados pelas companhias saindo mais caros.

Bem como a inflação, as sinalizações do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no fiscal ajudam a derrubar a curva de juros. A apresentação do arcabouço foi vista como uma sinalização de que quem está à frente do Executivo não pretende deixar a balança das contas públicas de lado, como antes era temido.

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Cenários fiscal e político com mais segurança

A aprovação do projeto na Câmara dos Deputados, ainda com a implementação de mais travas, foi ainda interpretada como uma demonstração de que o Congresso está cobrando responsabilidade de Lula e sua equipe. O texto agora tramita no Senado, sendo aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) da casa nesta quarta. 

Outros pontos, como falas e atitudes de líderes das casas defendendo o Banco Central independente e evitando mudanças realizadas em governos passados, como no caso do Marco do Saneamento e da Eletrobras (ELET3) reforçaram o otimismo de investidores nesta frente.

“O que traz receio para o mercado sempre é a falta de previsibilidade, a insegurança. No Brasil, a gente passou por uma eleição conturbada e depois da eleição, ficamos ainda alguns meses esperando para ver qual seria a estratégia do novo governo. Isso na política fiscal e na monetária, com a independência do Banco Central sendo colocada em xeque algumas vezes”, menciona Guilherme Paulo, operador de renda variável da Manchester Investimentos. “O mercado esperou esses riscos diminuírem e o governo mostrar o que fará para para diminuir sua aversão ao risco”.

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Thiago Armentano, analista chefe de Ativos Globais do Simpla Club, vai no mesmo caminho, apontando que a forte alta da Bolsa se dá, principalmente, pela expectativa de que um corte dos juros será possível ainda neste ano.

“Com maior clareza sobre as contas do governo e uma inflação razoavelmente controlada, existe a possibilidade desse corte acontecer já no segundo semestre de 2023, o que impulsiona o mercado e é positivo para os ativos de risco”, fala o especialista.

O Boletim Focus desta segunda-feira trouxe que especialistas veem 2023 fechando com uma Selic em 12,25%, contra 12,50% nas últimas oito semanas. A de 2024 recuou de 10% para 9,50%, após 17 semanas de estabilidade, e a de 2025 foi mantida em 9%, bem como a de 2026 em 8,75%.

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Ibovespa também surfa com melhora no Estados Unidos

Fora o dever de casa, o Ibovespa também é beneficiado pela melhora das expectativas que vem do exterior.

O Federal Reserve, o banco central americano, na última semana, interrompeu seu ciclo de alta dos juros, apesar de ter defendido que pode voltar a subir a fed funds nas próximas reuniões caso a inflação não ceda. A alta dos preços, porém, está enfraquecendo, ao mesmo tempo que a economia americana continua resiliente.

A percepção de grande parte do mercado é que, mesmo se as altas voltarem, elas serão pontuais. Parte do mercado já enxerga que o principal trabalho já teria sido feito e o pior, ficado para trás.

“Lá fora, o mercado tem postergado as visões de uma possível recessão que era tão aguardada para esse primeiro semestre nos Estados Unidos e na Europa. Os dados da atividade econômica estão muito mais resilientes do que se esperava. Aquele pessimismo todo que os investidores tinham com a economia global no começo do ano vem sendo empurrado para frente”, falou Fernando Ferreira, estrategista-chefe da XP Investimentos, em entrevista ao programa Radar, do InfoMoney. Confira no vídeo abaixo a entrevista completa:

Ao mesmo tempo em que o índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) nos Estados Unidos subiu 0,1% em maio, aquém do consenso de 0,2% e desacelerando frente aos 0,4% de abril, o relatório Payroll do mesmo mês trouxe a criação de 339 mil vagas, ante projeção de 190 mil vagas criadas. Os números trazem, então, uma alta dos preços arrefecendo e uma economia ainda resiliente.

Voltando para o Brasil, o Produto Interno Bruto brasileiro (PIB) do primeiro trimestre, por fim, surpreendeu para o lado bom. Puxado pelo agronegócio, ele teve alta de 1,9% entre janeiro e março, ante projeção de um avanço de 1,2%.

“A gente tem visto dados econômicos bem melhores do que o esperado não só no Brasil como em vários mercados emergentes. Isso deixa os investidores animados”, falou Ferreira. “Ainda há a questão de que a China está frustrando um pouco na sua abertura, com a retomada se dando de maneira mais gradual do que se esperava. Isso tem feito que os investidores migrem fluxos para outros países emergentes”.

Apesar de enfraquecer as empresas de commodities, com as ações ordinárias da Vale (VALE3) caindo mais de 20% no acumulado do ano, a China mais fraca pode, então, fortalecer a chegada de capital ao Brasil.

Fluxo estrangeiro

O fluxo estrangeiro, de acordo com especialistas, é um importante fator na alta acumulada do Ibovespa no ano, seja ele motivado pela falta de opção ou pela melhora do cenário local (ou por uma mistura de ambos). De acordo com relatório do Bank of America, a chegada de capital internacional teria aumentado na segunda semana de junho.

“Os fluxos estrangeiros estão de volta ao Brasil, sendo que registramos a entrada de R$5 bilhões em ações à vista. Os fluxos estrangeiros para a B3 estiveram estáveis, sendo que o rali do Ibovespa foi impulsionado principalmente pelos locais”, diz o time do banco americano.

E, para analistas e gestores, isso pode melhorar.

Para Ferreira, da XP, o fluxo estrangeiro foi perceptível no acumulado do ano até agora, mas também foi errático. “Acho que essa história de fluxo para a Bolsa ainda nem começou de fato. Quando o corte de juros, de fato, começar, veremos, aí sim, algo bem mais relevante”, debate.

Em relatório divulgado nessa segunda-feira, a Guide afirmou acreditar que a alta no mercado de ações, por enquanto, está só no começo, indo na mesma linha.

“Com os sinais cada vez mais claros de queda da Selic, os ativos de renda fixa já “andaram” bastante. Por outro lado, no mercado de ações, acreditamos que a alta ainda está apenas no começo. Acreditamos que seja hora de migrar a alocação de renda fixa para renda variável, incluindo ações (principalmente small caps) e fundos imobiliários”, diz o time da casa. “O valuation do Ibovespa está perto da mínima dos últimos anos ainda. Apesar da alta recente, os resultados do segundo trimestre foram positivos e geraram revisões positivas nas estimativas”.

Entre os principais riscos para a alta recente do Ibovespa virar um “voo de galinha” estão dados de inflação elevados, principalmente nos Estados Unidos, volta no Brasil de embates políticos envolvendo aumento de gastos ou contestando a autoridade do BC. Tudo isso pode levar a uma postergação da baixa dos juros.

No momento, o cenário é visto como positivo para a Bolsa brasileira. No fim da semana passada, os estrategistas do JPMorgan elevaram a projeção para o Ibovespa ao final de 2023 de 130 mil pontos para 135 mil, reforçando a recomendação overweight (exposição acima da média) para as ações do país no portfólio da América Latina.

O JPMorgan vê cinco pontos básicos de reavaliação de múltiplos, vendo muito espaço para altas: 1) olhando por uma perspectiva de valuation, o Brasil negocia com um desconto de 40% para mercados emergentes, em comparação com um desconto médio de 8% (dos últimos 15 anos), mais “caro” apenas do que a Colômbia, Turquia e Hungria. 2) os lucros atingiram as mínimas após o 1T23, sendo que a temporada foi melhor do que o esperado; 3) os cortes nas taxas de juros ainda serão o maior gatilho, enquanto os investidores estrangeiros não querem antecipar a flexibilização ainda, e os fluxos mostram isso; 4) o macro no Brasil tem melhorado muito mais do que os mercados de ações precificam: a atividade econômica está mais forte, o pacote fiscal está indo relativamente bem no Congresso e a reforma tributária está próxima e 5) o Congresso tem sido um suporte para iniciativas não favoráveis ao mercado.

Nas últimas semanas, diversas casas destacaram ter posição mais positiva com o Brasil. A equipe de estratégia global do Credit Suisse elevou a exposição de sua carteira ao Brasil para “small overweight” (ou uma exposição levemente acima da média dentro de seu portfólio).

O Bank of America, por sua vez, ressaltou que o cenário de “taxas mais baixas no Brasil” agora forma uma narrativa de consenso. Apesar do movimento recente de alta, os estrategistas avaliam que o Brasil continua negociando a um valuation com preços atrativos (Ibovespa ex-commodities negociando em torno de 10% de desconto versus o histórico) e veem o país como mais atrativo do que o México neste momento em seu portfólio de América Latina.

O Bradesco BBI também reforçou sua recomendação overweight para o Brasil (junto com o Chile) em seu portfólio da América Latina. “Em nossa opinião, o MSCI Brasil continua negociando com valorizações deprimidas e uma reavaliação pode ser impulsionada por riscos macroeconômicos menores, principalmente relacionados ao cenário doméstico, com expectativa de aperto fiscal e flexibilização monetária no Brasil”, avaliam os estrategistas do banco.