Em sabatina ao JN, Lula reconhece casos de corrupção na Petrobras, mas acusa Lava Jato de entrar na política

Ex-presidente foi o terceiro candidato ao Palácio do Planalto a ser sabatinado pelo Jornal Nacional, da TV Globo

Marcos Mortari Anderson Figo

Lula em sabatina do JN (Reprodução/Twitter Lula)

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reconheceu, nesta quinta-feira (25), a existência de casos de corrupção durante seu governo (2003-2010), mas voltou a fazer críticas aos trabalhos da Operação Lava Jato na investigação de crimes cometidos no âmbito da Petrobras.

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“Você não pode dizer que não houve corrupção se as pessoas confessaram”, afirmou. O petista foi o terceiro candidato ao Palácio do Planalto nessas eleições a ser sabatinado pelo “Jornal Nacional”, da TV Globo.

“Se alguém comete um erro, investiga-se, apura, julga, condena ou absolve, e vai resolvendo o problema. O que foi o equívoco da Lava Jato? É que a Lava Jato enveredou por um caminho muito delicado. A Lava Jato ultrapassou o limite da investigação e entrou no limite da política, e o objetivo era tentar condenar o Lula”, disse.

Na entrevista, Lula disse que a Lava Jato “quase jogou o nome do Ministério Público na lama”. Ele também acusou os investigadores de produzir 4,4 milhões de desempregados, afastar R$ 270 bilhões em investimentos e fazer com que o Brasil deixasse de arrecadar R$ 58 bilhões.

“Você pode fazer investigação com a maior seriedade, como foi feito na Samsung, na Coreia; na Alstom, na França; na Volkswagen, na Alemanha. Você investiga, se o empresário roubou, você prende, condena, mas permite que a empresa continue funcionando. Aqui no Brasil, se quebrou a indústria de engenharia, que nós levamos quase que um século para construir”, afirmou.

Questionado sobre como evitar que escândalos de corrupção revelados durante governos do PT se repitam em uma possível nova gestão, Lula sustentou a importância de garantir liberdade a órgãos de fiscalização e controle e prometeu que suspeitas de crimes serão investigadas e julgadas.

“A corrupção só aparece quando você permite que ela seja investigada”, pontuou.

“Foi no meu governo que criamos o Portal da Transparência, que colocamos a CGU para fiscalizar, criamos a Lei de Acesso à informação, a Lei Anticorrupção, a Lei contra o Crime Organizado, a Lei contra Lavagem de Dinheiro, a AGU entrou no combate à corrupção, colocamos o Coaf para cuidar de movimentações financeiras atípicas e colocamos o Cade para combater os cartéis. Além de que o Ministério Público era independente e a Polícia Federal teve, em meu governo, mais liberdade do que em qualquer outro momento na história”, complementou.

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O candidato também afirmou que “continuará criando mecanismos para investigar qualquer delito que aconteça na máquina pública brasileira”, mas não especificou quais. “Eu quero voltar à Presidência da República, e [em] qualquer hipótese de alguém cometer qualquer crime, por menor que seja, essa pessoa será investigada, julgada e punida ou absolvida”, assegurou.

Durante a entrevista, apesar de indagado, Lula não se comprometeu a respeitar a lista tríplice oferecida pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) na indicação do Procurador Geral da República (PGR), caso seja eleito para um novo mandato.

“Eu quero que eles fiquem com a pulguinha atrás da orelha. Eu não quero definir agora o que vou fazer. Primeiro, eu preciso ganhar as eleições”, desconversou. Mas disse não querer um procurador amigo ou leal a ele. “Se eu ganhar as eleições, antes da posse, vou ter várias reuniões com o Ministério Público para discutir os critérios”, prometeu.

Economia 

Perguntado sobre o que vai fazer a respeito do quadro fiscal, se eleito, Lula desviou de uma resposta objetiva para relembrar como estava a economia do país em 2003, quando ele assumiu em seu primeiro mandato. O candidato citou os empréstimos do Fundo Monetário Internacional (FMI) e disse que o “Brasil estava quebrado”.

“Quando eu tomei posse em 2003, o Brasil tinha 10,5% de inflação. O Brasil tinha 12% de desemprego. O Brasil devia US$ 30 bilhões ao FMI. Nós tínhamos uma dívida pública de 60,4% [do Produto Interno Bruto]. O que nós fizemos? Primeiro, nós reduzimos a inflação para dentro da meta, que era de 4,5%, mais dois, menos dois [margem de dois pontos percentuais] durante todo o meu período de governo”, disse.

“Segundo, nós reduzimos a dívida pública de 60,4% [do PIB] para 39%. Nós fizemos uma reserva de US$ 370 bilhões. E nós ainda emprestamos US$ 15 bilhões ao FMI. Além do que, nós fizemos a maior política de inclusão social que a história desse país conheceu”, completou.

Lula disse que vai governar com “credibilidade, previsibilidade e estabilidade”. “Você tem que garantir que quando você falar as pessoas vão acreditar no que você fala. Quando você fala na previsibilidade, é porque ninguém pode ser pego de surpresa dormindo com mudança de governo. E a estabilidade é para você convencer. O governo cumprindo com sua tarefa, que os empresários privados do Brasil e os estrangeiros tenham condições e saibam que têm estabilidade para fazer investimentos aqui dentro.”

Governo Dilma

Perguntado sobre as decisões econômicas do governo Dilma Rousseff, sucessora de Lula em 2011, também pelo PT, o candidato afirmou que discorda de algumas das decisões da ex-presidenta, mas a elogiou quando atuava como ministra-chefe da Casa Civil de seu governo.

“A Dilma é uma das pessoas que eu tenho mais profundo respeito, pela competência e pela ajuda que ela me deu quando era chefe da Casa Civil. A Dilma fez um primeiro mandato presidencial extraordinário, porque a crise internacional se agravou, e mesmo assim ela se endividou para poder manter as políticas sociais e para poder manter o emprego em 4,5%, que foi o menor desemprego que nós tivemos na história desse país. Era padrão Noruega, padrão holandês”, disse.

“Eu acho que a Dilma cometeu equívoco na questão da gasolina. Ela sabe que eu penso isso”, disse o candidato, referindo-se à decisão do governo Dilma de segurar os preços dos combustíveis e gerar prejuízos à Petrobras para conter a inflação. “Eu acho que cometeram equívoco na hora que fizeram R$ 540 bilhões em exoneração e isenção fiscal de 2011 a 2040”, completou.

Lula, no entanto, disse que a ex-presidente foi prejudicada por ter tido “uma dupla dinâmica contra ela”, referindo-se a Eduardo Cunha, que presidia a Câmara dos Deputados na época, e ao então senador Aécio Neves. “Ela tinha uma dupla dinâmica contra ela. Eduardo, presidente da Câmara, e o Aécio no Senado, que trabalharam o tempo inteiro para que ela não pudesse fazer nenhuma mudança”, afirmou.

Relacionamento com o Centrão

Perguntado sobre o relacionamento com o chamado “Centrão” e como evitar um novo “Mensalão”, Lula tentou relativizar a questão comparando o escândalo citado com o chamado orçamento secreto — bastante citado pelos críticos do atual governo, de Jair Bolsonaro (PL). “Você acha que o ‘Mensalão’ é mais grave que o orçamento secreto?”, indagou o candidato.

Em seguida, Lula disse que nenhum presidente da República governa sem estabelecer relação com o Congresso Nacional e enfatizou que “o ‘Centrão’ não é um partido político”. “Até porque hoje só tem partido político no Brasil o PT, o PCdoB, talvez o PSOL, o PSB, porque quase todos os outros partidos são cartoriais, são cooperativas de deputados que se juntam em determinadas circustâncias”, disse.

O candidato disse que evitaria um novo escândalo “punindo as pessoas, denunciando as pessoas”. “O que eu acho maravilhoso é denunciar a corrupção. O que é grave é quando a corrupção fica escondida. Por isso que eu acho importante uma imprensa livre. Por isso que eu acho importante uma Justiça eficaz. Se tiver um problema de corrupção, tem que ser denunciado”, completou.

Lula afirmou ainda que o orçamento secreto não é moeda de troca, mas sim “usurpação de poder”. Ele criticou o atual governo e disse que Bolsonaro “não manda em nada, é refém do Congresso Nacional”. “Quem cuida do Orçamento é o Lira [atual presidente da Câmara dos Deputados]. É ele quem libera as verbas. Os ministros ligam para ele, não ligam para o presidente da República. Isso nunca aconteceu desde a Proclamação da República”, disse.

Pressionado sobre qual seria a solução para isso, Lula disse que seria trabalhar junto com seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), para eleger o maior número de deputados possíveis entre os partidos aliados e “muita conversa”. “Eu quero que você me cobre, nós vamos resolver conversando com os deputados. Eu espero que a sociedade brasileira aprenda nessas eleições uma coisa muito importante: o Congresso Nacional é o resultado da sua consciência política no dia das eleições”, afirmou.

Militância do PT x Geraldo Alckmin

Perguntado sobre a militância petista que ainda não aceitou a aproximação do partido com Geraldo Alckmin, antigo adversário político na época em que o ex-governador de São Paulo era filiado ao PSDB, Lula disse que “o Alckmin já foi aceito pelo PT de corpo e alma”. O candidato voltou a falar que a experiência de seu vice vai ajudá-lo a “consertar o país”.

Lula foi indagado sobre o discurso agressivo que muitas vezes a militância petista já adotou contra adversários políticos e se isso não estimulava a polarização. O candidato comparou a militância política às torcidas organizadas de clubes de futebol e disse que a polarização é “saudável” e “estimulante”, desde que não provoque o ódio.

“Feliz era o Brasil e a democracia brasileira quando a polarização neste país era entre PT e PSDB. A gente era adversário político. A gente trocava farpas. Mas, se a gente se encontrasse num restaurante, eu não teria nenhum problema em tomar uma cerveja com [o ex-presidente] Fernando Henrique Cardoso, com José Serra ou com o Alckmin, porque a gente não era inimigo, a gente se tratava como adversário”, disse.

“A militância é como torcida organizada. A torcida organizada não é a torcida do Flamengo, não é a torcida do Vasco. Aquela que briga, aquela que vaia o time, não”, completou. “A polarização é saudável no mundo inteiro. Tem nos Estados Unidos, tem na Alemanha, tem na França, tem na Noruega, tem na Finlândia, tem em tudo quanto é lugar.”

“Não tem polarização no partido comunista chinês, não tinha polarização no partido comunista cubano. Agora, quando você tem democracia, quando você tem mais que um disputando, a polarização é saudável. Ela é importante, ela é estimulante. Ela faz o militante ir para a rua. Ela faz o militante carregar bandeira. O que é importante é que a gente não confunda a polarização com estímulo ao ódio”, completou o candidato.

Agronegócio

Durante a entrevista, Lula disse que “nenhum governo tratou o agronegócio” como o dele. Quando questionado sobre a oposição majoritária do setor à sua candidatura, disse que alguns empresários rurais se opõem às políticas de preservação ambiental que seu partido tem defendido.

“A política em defesa da Amazônia, nossa política em defesa do Pantanal, da Mata Atlântica. Nossa luta contra o desmatamento faz com que sejam contra nós”, disse.

Mas Lula restringiu essa postura a alguns grupos que chamou de “fascistas” e “direitistas”. “Porque os empresários sérios que trabalham no agronegócio, que têm comércio com o exterior, que exportam para a Europa, para a China não querem desmatar. Esses querem preservar os nossos rios, querem preservar nossas águas, querem preservar a nossa fauna”, afirmou.

“O que nós queremos é pacificar esse país. Para mim, o pequeno produtor rural, o médio produtor rural, têm que viver pacificamente com o grande negócio. Porque o Brasil tem possibilidade de ter os dois. Um produz mais internamente, o outro produz mais externamente”, pontuou.

Relações internacionais

Questionado sobre uma possível ambiguidade entre defender a democracia internamente e ser parceiro de nações autoritárias, Lula defendeu a autodeterminação dos povos. “Cada país cuida do seu nariz. É assim que eu quero para o Brasil, é assim que eu quero para os outros”, disse.

O petista tem dito em sua campanha que pretende retomar a política externa “ativa e altiva”, lema adotado durante a gestão de seu chanceler Celso Amorim. Lula sustenta que o Brasil deve manter boas relações com o maior número de países e fazer valer seus próprios interesses como nação.

“Eu estou muito tranquilo com a minha relação internacional. Aliás, se eu ganhar as eleições, você vai ver a enxurrada de amigos que estão desaparecidos e vão visitar o Brasil, porque o Brasil vai ser amigo de todo mundo, o Brasil não tem contencioso internacional”, declarou.

Agenda

Lula foi o terceiro presidenciável entrevistado pelo Jornal Nacional nesta semana. Na terça-feira (23), Ciro Gomes foi sabatinado, e disse que poderia reavaliar o discurso agressivo à polarização.

Na segunda-feira (22), foi a vez de Jair Bolsonaro (PL) dar entrevista à TV Globo, quando falou que respeitará resultado das urnas, “desde que eleições sejam limpas e transparentes”.

Na agenda, a senadora Simone Tebet, candidata ao Planalto pelo MDB, será sabatinada por William Bonner e Renata Vasconcellos na sexta-feira (26). A ordem das entrevistas foi definida por sorteio.

Conheça a trajetória dos candidatos à Presidência:

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.