Datena tucano, Paes soberano e “troca-troca” em BH: o vaivém da “janela partidária”

Em São Paulo, PSDB vê sua bancada na Câmara Municipal se dissolver, mas consegue atrair José Luiz Datena; no Rio, o PSD de Eduardo Paes deve ser o maior vencedor; em BH, ⅓ dos vereadores mudarão de partido

Fábio Matos Marcos Mortari

José Luiz Datena deixou o PSB após quatro meses e se filiou ao PSDB (Foto: Reprodução/TV Globo)

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A partir desta sexta-feira (5), os partidos políticos brasileiros começaram a organizar o quebra-cabeças que definirá o tabuleiro político eleitoral do país em 2024. Com o fim do prazo da chamada “janela partidária”, a movimentação nas Câmaras Municipais dos principais colégios eleitorais do país indica o fortalecimento de partidos como o PSD, principalmente no Rio de Janeiro (RJ), e o enfraquecimento de legendas como o PSDB, que enfrenta grave crise em São Paulo (SP) e em nível nacional.

A “janela partidária” é o período no qual os vereadores podem trocar de legenda sem o risco de perderem seus mandatos. Ela teve início em 7 de março, e, desde então, tem gerado uma intensa “dança das cadeiras”. Além do prazo para quem já exerce mandato eletivo, o próximo sábado (6) marca o prazo limite para que qualquer novo ingressante na política esteja filiado à legenda pela qual pretende participar das eleições − seja para o Poder Legislativo, como vereador, ou para o Poder Executivo, como prefeito.

São Paulo: MDB cresce e PSDB definha

Em São Paulo, maior colégio eleitoral do país, os holofotes se voltaram para o PSDB na reta final do prazo para as mudanças de partido. Vivendo a maior crise em seus quase 40 anos de história, os tucanos assistiram a uma verdadeira “debandada” de vereadores na Câmara Municipal, em represália à decisão tomada pelo diretório municipal da legenda de não apoiar a candidatura à reeleição do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

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Em 2020, quando o tucano Bruno Covas (PSDB) foi eleito prefeito da capital paulista, Nunes era o vice na chapa. Ele assumiu o posto máximo da maior cidade do país após a morte de Covas, em 2021. Ao rechaçar o apoio à reeleição do emedebista, o PSDB desagradou a uma corrente relevante do partido, capitaneada por secretários tucanos do atual governo, que defendiam o apoio a Nunes sob o argumento de que se trata da continuidade da gestão Covas.

Na semana passada, os oito vereadores do PSDB em exercício na Câmara Municipal de São Paulo anunciaram a saída do partido: Aurélio Nomura (rumo ao PSD), Rute Costa (PL), Sandra Santana (MDB), Beto Social (Podemos), além de Gilson Barreto, Fábio Riva, João Jorge (todos rumo ao MDB) e Xexéu Trípoli (que ainda não definiu seu destino). O único representante do PSDB que, em tese, ainda pode permanecer no partido é o atual secretário municipal de Assistência Social da gestão Nunes, Carlos Bezerra Júnior, que está licenciado do mandato parlamentar, e deixou para a última hora o anúncio sobre sua permanência ou saída do ninho tucano.

“A crise se aguça no PSDB. Os sinais são de que o poder político que o partido tinha está se esvaindo”, observa o cientista político Carlos Eduardo Borenstein, da consultoria Arko Advice. Para ele, no momento, as figuras dos governadores Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, e de Raquel Lyra, de Pernambuco, não são vistas internamente como lideranças capazes de conduzir a legenda, ao mesmo tempo que a crise em São Paulo (historicamente um reduto de peso para o tucanato) expõe um vácuo. “É um partido que, quando você olha, não consegue enxergar um líder que tenha condições nacionais.”

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Em contrapartida, já no apagar das luzes da “janela”, o PSDB surpreendeu ao filiar o apresentador de TV José Luiz Datena, que estava no PSB, na última quinta-feira (4). A tendência é a de que os tucanos integrem a chapa liderada pela deputada federal Tabata Amaral (PSB), pré-candidata à prefeitura de São Paulo – com Datena na vice.

“Em São Paulo, que foi seu grande reduto, o PSDB, para ter condições de indicar um vice com potencial, precisou buscar quase um representante da antipolítica. Datena nunca teve cargo público, volta e meia flerta com candidatura, mas cai no PSDB – partido com o qual ele não tem muito a ver”, avalia Borenstein.

Enquanto o PSDB definha, o MDB de Nunes ganha corpo e deve fechar a “janela partidária” como a sigla que teve mais adesões em São Paulo. A bancada emedebista na Câmara Municipal deve aumentar de 6 para 9 vereadores. O PSD, comandado pelo ex-prefeito Gilberto Kassab, também atraiu alguns nomes – como a vereadora Thammy Miranda, que deixou o PL. O partido do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), por sua vez, filiou a vereadora licenciada Sonaira Fernandes (ex-Republicanos), que ocupa a Secretaria Estadual de Políticas para a Mulher no governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos).

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Apesar do intenso troca-troca partidário em São Paulo, a base aliada de Ricardo Nunes não deve sofrer grandes alterações – girando em torno de 38 dos 55 vereadores da capital. O prefeito conta com o apoio de MDB, União Brasil, PSD, Republicanos, Podemos, PL, PP e do Partido Novo, além dos vereadores que deixaram o PSDB.

Rio: domínio do PSD de Eduardo Paes

Franco favorito à reeleição – em busca daquele que seria seu quarto mandato como prefeito do Rio de Janeiro –, Eduardo Paes (PSD) deve aparecer como o grande vitorioso da “janela partidária” na Cidade Maravilhosa. Como se esperava, seu partido é o que mais deve crescer a 6 meses da disputa na capital fluminense.

Até quinta-feira (4), véspera do fim do prazo para as trocas de partido, o PSD viu sua bancada na Câmara de Vereadores subir de 8 para 11 representantes (de um total de 51 parlamentares). A chegada mais badalada é a do ex-prefeito Cesar Maia, hoje vereador, que estava no PSDB.

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Eleito em 2020, ainda pelo DEM (que se fundiu com o PSL e deu origem ao União Brasil), Paes migrou para o PSD em 2021 e, desde então, vem organizando a legenda no Rio ao seu feitio. O atual presidente da Câmara Municipal, Carlo Caiado, também mudou-se recentemente para o partido (antes mesmo da “janela”), vindo do antigo DEM.

Nas últimas eleições municipais, a sigla elegeu apenas três vereadores no Rio. As estimativas, para 2024, apontam para 15 eleitos. Embora negue a intenção de deixar a prefeitura antes do fim do mandato, aliados de Paes apostam que, em 2026, ele se lançará novamente candidato a governador – em 2018, foi derrotado por Wilson Witzel (PSL) no segundo turno.

A provável saída antecipada de Paes da prefeitura, caso se reeleja para mais um mandato, torna a vaga de vice ainda mais cobiçada por aliados. O PT, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), já anunciou apoio ao prefeito e pleiteia o posto. Na quarta-feira (3), Lula filiou a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, ao PT, mas disse que ela “não tem nenhuma pretensão” de disputar um cargo eletivo em 2024.

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Neste momento, os postulantes petistas mais cotados à vaga de vice de Paes são o secretário municipal de Assistência Social, Adilson Pires, e o secretário de Assuntos Federativos da Presidência, André Ceciliano. O prefeito, por sua vez, gostaria de indicar ao posto um nome de seu circuito mais próximo, como o deputado federal Pedro Paulo (PSD), no que seria uma chapa “puro-sangue”.

“Fala-se muito da eleição em São Paulo, mas Lula tem dado peso para a eleição no Rio de Janeiro. Primeiro porque é o reduto eleitoral de Jair Bolsonaro”, aponta Borenstein. Para ele, independentemente de conseguir ou não indicar a vice na chapa de Paes, Lula se movimenta no Rio de olho em uma construção de longo prazo. Além de impor uma derrota ao seu principal adversário político, o petista também abre um importante flanco de diálogo com o PSD, que pode fazer contraponto à participação da sigla na gestão de Tarcísio de Freitas (Republicanos) no governo de São Paulo.

“O PSD tem uma relação com Tarcísio. Se ele sair como candidato à presidência, o partido herda o governo de São Paulo, provavelmente com [o atual vice] Felicio Ramuth sendo candidato, o que pode amarrar o PSD no projeto nacional de Tarcísio. Por isso, o movimento de Lula [no Rio] é importante para manter um canal com o partido na segunda maior cidade do Brasil”, pontua o analista político.

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BH: ⅓ dos vereadores devem mudar de partido

Em Belo Horizonte, projeções iniciais indicam que pelo menos ⅓ dos 41 vereadores da Câmara Municipal devem trocar de legenda para as eleições de outubro (15 ou 16). O PSD, do prefeito Fuad Noman, pode perder até 3 representantes no Legislativo municipal: Ramon Bibiano, Fernando Luiz e Cláudio do Mundo Novo, que são alinhados a Noman, estão de partida. Ramon e Fernando Luiz são ligados ao presidente da Câmara, Gabriel Azevedo, opositor do prefeito, que estava sem partido e recentemente se filiou ao MDB. Mundo Novo, por sua vez, deve seguir rumo ao PL.

Outras prováveis mudanças que devem mexer com a Casa envolvem o atual vice-líder do governo, Wagner Ferreira, que deve trocar o PDT pelo PV; Marilda Portela (esposa do deputado federal Lincoln Portela), que pode desembarcar do Cidadania em direção ao PL; além de Reinaldo Gomes (que deve deixar o MDB, mas ainda não definiu seu destino), Gilson Guimarães (de saída da Rede) e Henrique Braga (possível baixa do PSDB).

Fábio Matos

Jornalista formado pela Cásper Líbero, é pós-graduado em marketing político e propaganda eleitoral pela USP. Trabalhou no site da ESPN, pelo qual foi à China para cobrir a Olimpíada de Pequim, em 2008. Além do InfoMoney, teve passagens por Metrópoles, O Antagonista, iG e Terra, cobrindo política e economia. Como assessor de imprensa, atuou na Câmara dos Deputados e no Ministério da Cultura. É autor dos livros “Dias: a Vida do Maior Jogador do São Paulo nos Anos 1960” e “20 Jogos Eternos do São Paulo”.