Com eleição ‘aberta’, Lula e Bolsonaro devem fazer movimento ao centro, dizem analistas

Candidatos disputarão votos de Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT), que devem decidir eleição mais apertada do que as pesquisas apontavam

Fábio Matos

A disputa entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno das eleições presidenciais, programado para o dia 30, está totalmente aberta e seu resultado final dependerá do movimento dos dois candidatos em direção ao centro do espectro político. A avaliação é de analistas ouvidos na edição especial desta segunda-feira (3) do InfoMorning, programa exibido pelo canal do InfoMoney no YouTube.

Com 99,99% das urnas apuradas em todo o país, Lula somou mais de 48% dos votos válidos (cerca de 57,3 milhões), enquanto Bolsonaro registrou mais de 43% (51,1 milhões) – uma diferença de pouco mais de 6 milhões de votos entre os dois finalistas do pleito.

Segundo os analistas políticos Mário Braga, da consultoria internacional Control Risks, e Rogério Schmitt, da Empower Consultoria, o comportamento dos eleitores que fugiram da polarização no votação de domingo (2) e optaram por Simone Tebet (MDB) ou Ciro Gomes (PDT) será determinante para definir o próximo presidente da República.

“A votação da Simone e do Ciro havia sido superestimada [pelas pesquisas]. Se houve voto útil, foi dos eleitores do Ciro e da Simone no Bolsonaro”, afirmou Schmitt durante o painel apresentado pelo especialista de mercado Henrique Esteter e que também contou com a participação do jornalista Marcos Mortari, editor de política do InfoMoney. “Isso dá ao presidente a esperança de que no segundo turno esse movimento de captação do voto não petista o beneficie mais do que ao ex-presidente Lula.”

“No segundo turno, Lula precisa dar uma importância muito grande à figura do seu vice, Geraldo Alckmin. Tanto Lula quanto Bolsonaro precisam fazer movimentos em direção ao centro, ao eleitor que não entrou nessa polarização”, prossegue o analista político. “A figura de Alckmin será imprescindível não só no segundo turno, mas também na hipótese de o Lula ser eleito. Se eleito, Lula terá mais dificuldade que Bolsonaro para formar maioria no Congresso. Bolsonaro, em um eventual segundo mandato, está em uma situação muito mais confortável na correlação de forças no Congresso”, completa.

Segundo Mário Braga, a tendência é que Tebet anuncie apoio a Lula no segundo turno, enquanto a posição de Ciro ainda é uma incógnita. “A Tebet já vinha dando sinais em um cenário de segundo turno de que apoiaria o ex-presidente. Ciro dinamitou pontes com a esquerda tentando fazer sinalização à direita. Fica mais difícil ele apoiar alguém ou estar em algum palanque, mas é provável que o PDT faça um aceno ao Lula”, aponta.

Para Braga, a simples declaração de voto dos candidatos e partidos derrotados no primeiro turno pode não bastar para convencer a parcela do eleitorado que não votou em Lula nem em Bolsonaro. “Talvez essa questão da chamada frente ampla em defesa da democracia não seja suficiente para conquistar os eleitores. Lula e Bolsonaro são candidatos que despertam paixões e ódios, apoio e rejeição. Os outros candidatos têm uma capacidade mais limitada de influenciar o voto dos próprios eleitores”, afirma.

Apesar de ainda apontar um leve favoritismo de Lula na rodada final, Schmitt destaca a imprevisibilidade do quadro eleitoral, principalmente diante da votação mais expressiva de Bolsonaro em relação aos prognósticos dos institutos de pesquisa.

“A eleição presidencial está totalmente aberta. Bolsonaro teve uma votação surpreendente. Candidatos ligados a ele tiveram bons desempenho nos estados. Mas a votação do ex-presidente Lula veio dentro do esperado”, pondera. “Você tem 8%, 9% dos eleitores que votaram em candidatos que não foram para o segundo turno. Desse grupo, Lula precisa de cerca de 2%. Lula ainda está em uma situação confortável, mas é uma eleição de prognóstico bastante difícil.”

Bolsonaro pragmático e acenos de Lula ao mercado

De acordo com Braga, o ambiente econômico mais favorável nos últimos meses pode exercer impacto sobre o eleitorado nas próximas quatro semanas antes do segundo turno da eleição – o que, em tese, beneficiaria Bolsonaro.

“Há um possível impacto da melhora da economia, especialmente para o eleitorado de baixa renda. A deflação finalmente chegando a desacelerar preços de alimentos, o mercado de trabalho que segue melhorando… São mais quatro semanas para o Bolsonaro capitalizar em cima de melhorias na economia”, avalia.

Segundo Braga, em seu primeiro pronunciamento após o anúncio dos resultados do primeiro turno, o presidente da República demonstrou pragmatismo e abandonou a retórica virulenta que caracterizou sua campanha. “Pela declaração que ele deu ontem à noite, vemos um candidato bastante pragmático. Em momento nenhum ele questionou a integridade das urnas. E também falou em conversar com as pessoas que tiveram uma piora na qualidade de vida.”

Por outro lado, Lula – que ainda não divulgou detalhadamente suas propostas para a economia – pode ser levado a fazer acenos mais concretos ao mercado. Nesse sentido, a aproximação com o ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central (BC) Henrique Meirelles, que declarou apoio a Lula, é vista como um trunfo.

“O mercado gostaria de ver indicações de política econômica, eventualmente um nome mais alinhado para o Ministério da Fazenda. Mas isso pode significar também um custo de mobilização junto à base do PT”, conclui Braga.

Fábio Matos

Jornalista formado pela Cásper Líbero, é pós-graduado em marketing político e propaganda eleitoral pela USP. Trabalhou no site da ESPN, pelo qual foi à China para cobrir a Olimpíada de Pequim, em 2008. Além do InfoMoney, teve passagens por Metrópoles, O Antagonista, iG e Terra, cobrindo política e economia. Como assessor de imprensa, atuou na Câmara dos Deputados e no Ministério da Cultura. É autor dos livros “Dias: a Vida do Maior Jogador do São Paulo nos Anos 1960” e “20 Jogos Eternos do São Paulo”.