Puxado por Cyrela e Eztec, setor imobiliário lidera ganhos na Bolsa em 2019; ações ficaram caras?

Próximo dos 1.200 pontos, Índice Imobiliário está no maior nível desde que foi criado, com valorização de 45% no ano, quase o dobro da alta do Ibovespa
(Shutterstock)

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SÃO PAULO – A julgar pelo desempenho na Bolsa, a retomada do mercado imobiliário já está “contratada”. Juros menores, expectativa de recuperação econômica e de maior demanda por imóveis aumentaram as apostas nas ações do setor, fazendo o Índice Imobiliário (Imob) disparar 45% no ano, com a maior alta entre os índices da B3. Nesse mesmo período, até o dia 7 de novembro, o Ibovespa subiu 25%.

Composto por 14 ações, o Imob vem sendo impulsionado principalmente pelo desempenho das incorporadoras Cyrela, cujos papéis já subiram mais de 80% no ano, e Eztec, em que as ações dobraram de valor em relação ao início de 2019. A maior alta do índice foi a da Even, com avanço de 107%, mas o peso da companhia no índice é pequeno, de 4,6%.

A valorização dessas empresas é atribuída à perspectiva de maior demanda da classe média por imóveis, como consequência da redução das taxas no financiamento imobiliário. Segundo dados do Banco Central, os juros pagos por pessoas físicas no setor privado caíram de uma média de 9,29% ao ano, em janeiro, para 8,65%, em setembro.

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Fundada por Elie Horn, a Cyrela lançou R$ 1,8 bilhão no terceiro trimestre, o dobro do volume de um ano antes.  O resultado turbinou o lucro líquido da construtora no período para R$ 104 milhões. No mesmo período de 2018,  houve prejuízo de R$ 121 milhões.

Hoje cotado em torno dos R$ 28, o papel da empresa chegou a negociar na casa dos R$ 6 no início de 2016. Entre os investidores que vêm se aproveitando dos resultados da empresa está o Itaú Unibanco. A participação de fundos do banco nas ações ordinárias da empresa ultrapassou os 5% em setembro.

Na Eztec um dos destaques do ano é o lançamento do Parque da Cidade. O empreendimento ao lado da marginal Pinheiros, na zona sul de São Paulo, havia sido anunciado em 2012, mas foi lançado apenas no mês passado e deve ajudar no aumento de vendas no último trimestre.

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A ação da empresa disparou após as eleições presidenciais no ano passado, saindo de R$ 14, antes do pleito, para R$ 42 atualmente.

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A gestora Equitas, especializada em renda variável, carrega as ações da Eztec no portfólio há nove anos e segue enxergando potencial de alta nos papéis. Luis Felipe Teixeira do Amaral, fundador e gestor da casa, defende que, em meio a altas e baixas do ciclo de construção no Brasil, a empresa foi a única a gerar valor para o acionista, com disciplina de execução, foco e estrutura de capital correta.

“Este é um setor ultra cíclico e a Eztec tem uma estrutura de capital com pouco endividamento, com vantagens no ciclo, como a compra de terrenos na baixa dos preços”, diz. Com o mercado em fase de reaquecimento, são poucas as empresas com condições de se beneficiar disso, ressalta Amaral.

Ficou caro demais?

No horizonte mais próximo, a defesa das ações das incorporadoras que encabeçam o Imob é clara: dados da Bloomberg mostram que não há orientações de venda para Cyrela e Eztec. Ambas têm sete indicações de compra, de casas como Credit Suisse, BTG Pactual e J.P. Morgan.

No caso dos papéis que acumulam perdas neste ano, como da Gafisa, há três recomendações de venda e uma de manutenção, enquanto Tecnisa detém uma indicação de compra e cinco de manutenção.

Embora a visão de retomada do setor imobiliário seja uma unanimidade, o nível atual dos preços das ações deixa alguns mais cautelosos. Carta divulgada em setembro pela gestora Polo Capital dividiu opiniões ao argumentar que os preços dos papéis de incorporadoras de alto e médio padrão estão assumindo retornos muito acima da média histórica do setor.

“Há meses, já achávamos que os papéis estavam caros e hoje achamos que estão mais caros ainda”, afirma Carlos Alves, sócio da gestora Polo Capital, que está “vendida” (apostando na baixa) no segmento de alto e médio padrão. “A não ser que essas companhias inventem um processo muito mais eficiente, e assumindo que o preço do terreno vai subir, a margem bruta e o lucro vão cair de volta à média.”

Ele avalia, contudo, que o movimento não se replica para incorporadoras de baixa renda, segmento em que a Polo tem ações da Tenda. “O risco [nesse segmento] é de uma mudança drástica no Minha Casa Minha Vida, mas não é isso que vemos do governo”, afirma Alves, destacando que as empresas listadas não atuam na faixa 1 do programa (de renda familiar bruta de até R$ 1,8 mil), que seria mais afetada em uma eventual mudança.

Já o lado dos otimistas reforça que o contexto desta nova expansão vai permitir rentabilidades melhores. É o caso dos gestores de portfólio da Canvas Capital, Henrique Fischer e Alessandro Correia. “Não trabalhamos com a hipótese de que o que aconteceu no ciclo anterior seja um teto. O setor deve continuar batendo o Ibovespa”, diz Correia. A estratégia da Canvas para o setor, contam os gestores, é comprar algumas incorporadoras com foco em média e alta renda, em vez de colocar todas as fichas em uma mesma empresa.

Fischer ressalta que, na última expansão do setor imobiliário, o mercado de trabalho estava aquecido, aumentando os custos com mão-de-obra, o que não é o caso hoje. Contribuem também para uma alta mais sustentada, elenca, melhorias regulatórias e na recuperação de garantias que vêm sendo impulsionadas pelo governo, bem como a viabilização do home equity (empréstimo com garantia de imóveis) e a diminuição do crédito subsidiado.

Marcelo Motta, analista do banco J.P. Morgan, acrescenta que o financiamento atrelado à inflação é “transformacional” para o setor de incorporação. “Finalmente teremos uma fonte sustentável que não depende do FGTS, nem da poupança”, afirma.

Outra diferença importante para o analista em relação ao último ciclo é o custo com matéria-prima. “Devemos ter três, quatro anos bem positivos. Não temos nenhum gargalo dessa vez, não estamos vivendo aquele super ciclo de commodities que estava pressionando o custo do aço”.

Para a gestora Studio Investimentos, as empresas de menor capitalização do setor também representam boas oportunidades. Com cerca de 20 ações em carteira, a casa tem posições pequenas – e tidas como de maior risco – em dois papéis do setor de construção: Helbor e Trisul.

Segundo Beatriz Fortunato, gestora e sócia da casa, a Studio tem exposição ao segmento há dois anos, mas não enxerga potencial para carregar a tese para o longo prazo. “É um ciclo de dois ou três anos”, assinala, destacando que o mercado de São Paulo já está em ebulição.

O que é o Imob?

Este será o quarto ano consecutivo em que o Imob termina em alta e, se não houver um ajuste forte, será a maior valorização anual desde 2009, quando o índice triplicou sua pontuação.

O Índice Imobiliário foi lançado em 2008 para medir o desempenho dos setores de exploração de imóveis e construção civil. Entre as empresas que compõem o índice, BR Malls, Cyrela, Iguatemi, MRV e Multiplan também fazem parte do Ibovespa. Somados, no entanto, os pesos dessas companhias no principal índice de ações do país é de apenas 2%.

O nível de 1.198 pontos atingido no último dia 4 foi o recorde nominal do Imob — em dólar, o indicador ainda está na metade do caminho em relação aos US$ 690 de 2010. Do índice, apenas Iguatemi (de shopping centers), Tecnisa e Gafisa não estão batendo o Ibovespa no ano.

O setor imobiliário era negociado até 2015 por meio de um ETF (fundo de índice negociado em Bolsa) gerido pela BlackRock, mas o produto foi liquidado em meio à crise no setor imobiliário.

Para os gestores da Canvas Capital, a alta do Imob é natural, já que os investidores estão tentando antecipar os efeitos da queda de juros no país. “Dado o longo prazo do financiamento imobiliário, pequenas variações na taxa de juros têm um grande efeito nos preços. Isso desviava muita gente da compra para o aluguel”, diz Correia, ponderando que algumas empresas de fato se encontram caras. “Não é que todas estejam na mesma situação, mas, na média, faz sentido.”

Fischer destaca também que a valorização das empresas do setor se deu sobre uma base baixa, o que faz o percentual da alta chamar a atenção. “O setor foi dizimado há quatro anos”, lembra.

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Pedro Ladislau Leite

Repórter de investimentos do InfoMoney, cobre os mercados de renda fixa (Tesouro Direto e títulos privados) e de renda variável, acompanhando as movimentações dos principais gestores de fundos no país.