Persistência de alta dos preços de alimentos eleva risco de fome e de turbulência política no mundo

Para o BNP Paribas, até mesmo países produtores de alimento, como o Brasil, sofrem com elevação de preços e podem ser palcos de protestos

Mitchel Diniz

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Os preços dos alimentos se equiparam e até mesmo superam os valores registrados entre os anos de 2007 e 2008, período no qual o mundo enfrentou uma grave crise alimentar, causando uma série de protestos em países emergentes.

É o que mostram os cálculos do BNP Paribas: no primeiro trimestre deste ano, a inflação dos alimentos nas nações em desenvolvimento avançou 10% na comparação anual, acima da alta de 5,5% da inflação mais ampla. Os emergentes são os mais afetados pela escalada de preços, mesmo aqueles que são conhecidos por produzir alimentos, como é o caso do Brasil.

Países envolvidos diretamente na guerra na Ucrânia não só são grandes exportadores de grãos para os emergentes, como também têm relevância no fornecimento de fertilizantes para as nações produtoras de alimentos. “Como resultado, a guerra tem ameaçado a segurança alimentar ao redor do mundo, e os preços dos alimentos estão em suas maiores altas em décadas”, diz a análise do BNP, escrita por Luiz Eduardo Peixoto, economista para países emergentes do banco, e Nic Borain, analista político.

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Turquia e Egito, importadores dos grãos e cereais produzidos no leste europeu, são os países onde os preços mais subiram no primeiro trimestre do ano, segundo o banco francês. Os turcos encararam uma inflação de quase 50% no período, enquanto os egípcios lidaram uma alta de 20% nos preços comparando com um ano atrás. A Colômbia não fica muito atrás, mesmo sendo um produtor de alimentos.

Riscos maiores na América Latina

Para o BNP Paribas, os países da América Latina estão em situação de maior vulnerabilidade, por terem maior exposição à variação de preços e menores chances de receberem subsídios dos governos. “Os preços de produtos básicos locais como milho, trigo e óleos subiram nos últimos meses, com impactos sobre a inflação doméstica”, observam os analistas do banco.

Aqui no Brasil, a inflação dos alimentos, segundo última prévia do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA-15), está em 14,02% no acumulado de 12 meses. Nesse período, apenas 13 dos 153 itens alimentícios pesquisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) diminuíram de preço.

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Para piorar o cenário, além das restrições de exportações entre os países envolvidos na guerra, como Rússia, Ucrânia e Belarus, outras nações estão limitando vendas para o exterior, com o objetivo de priorizar o abastecimento interno. A Indonésia, responsável por 40% das exportações de óleo de palma, suspendeu o fornecimento do produto para outros países. Há pouco mais de dez dias, a Índia proibiu exportações de trigo, por conta de uma onda de calor que reduziu drasticamente sua produção.

Na avaliação do BNP Paribas, a inflação dos alimentos deve se manter como uma preocupação pelo restante do ano. “Na verdade, vemos os preços subindo ao longo do segundo e terceiro trimestres na maioria dos principais mercados emergentes, com insumos mais caros elevando a inflação de bens e os preços das commodities agrícolas mais altos mantendo os preços dos alimentos pressionados”, diz a análise do banco.

Os riscos de uma inflação arraigada e prolongada também aumentam as chances de turbulências políticas, da mesma forma que aconteceu entre 2007 e 2008. Os altos preços de bens de consumo básicos são uma potencial fonte de instabilidade, pois diminuem a disponibilidade de renda e aumentam a desigualdade. Nos cálculos do banco francês, as famílias, nos países emergentes, gastam 22% da renda com alimentos. O aumento dos preços, que tem ocorrido desde 2021, pode elevar esse percentual para acima de 30%. Soma-se a esse cenário, o aumento da pobreza durante a pandemia

“A maioria dos países emergentes tem espaço limitado para subsídios às famílias em resposta aos preços mais elevados dos alimentos, com muitos governos tentando reduzir seus déficits fiscais. É o caso de grande parte da América Latina, em particular, onde os países enfrentaram pressões de preços de alimentos já antes da guerra”, explicam os analistas do BNP Paribas.

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Para o banco francês, a América Latina é também onde há maior risco de agitação social, sobretudo no Chile e na Colômbia, onde protestos foram registrados recentemente e os programas de bem-estar social são limitados. No Brasil, o BNP vê riscos antes das eleições de outubro, com a polarização política.

“O governo respondeu aos riscos de paralisação dos caminhoneiros gerenciado os aumentos de preços de combustíveis, como também reduziu tarifas de importação, além de turbinar auxílio para famílias de baixa renda”, ressaltam os analistas.

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A gestora global de investimentos Schroders faz uma análise semelhante sobre os impactos da guerra na Ucrânia na cadeia global de alimentos. O relatório assinado por Felix Odey, Alexander Monk e Mark Lacey diz que a situação pode se agravar ainda mais caso as nações mais ricas, como os países da União Europeia, passem a subsidiar o preço de alimentos para amenizar a inflação.

“Isso poderia levar a um cenário em que a diferença de disponibilidade de alimentos entre nações mais ricas e mais pobres aumentaria ainda mais, à medida que os preços são elevados acima do que as pessoas podem pagar em países que já sofrem com a escassez de alimentos”, explicam.

Os analistas lembram que a cadeia de alimentos já vinha sendo impactada pelas mudanças climáticas, que reduzem a produtividade das lavouras com secas prolongadas ou chuvas em excesso ao redor do mundo.

“Se o conflito não for controlado, pode ter impactos extremamente negativos em todo o mundo. Embora a escassez neste caso seja uma consequência da guerra, a falta de segurança alimentar pode ser uma causa de conflitos em si”, alertam os analistas.

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Mitchel Diniz

Repórter de Mercados