Fertilizantes Heringer (FHER3) sobe 25% desde início da guerra na Ucrânia, mas avanço faz sentido?

Apesar de estar no ramo de fertilizantes, a empresa em recuperação judicial não produz a matéria-prima exportada pelos russos - é compradora dela

Mitchel Diniz

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A guerra na Ucrânia e seus impactos no mercado financeiro deram destaque a um nome que nunca foi muito popular entre os investidores. Do dia 23 de fevereiro, véspera da invasão russa ao território ucraniano, a 2 de março, a ação da Fertilizantes Heringer (FHER3), uma empresa em recuperação judicial, foi a que teve o melhor desempenho da B3, segundo os cálculos da Economática. O papel subiu 25,45% no período. Contando também até o fechamento de ontem (9), a valorização era de cerca de 25%.

A explicação para esse movimento estaria no fato de que a Rússia vende mais de 20% dos insumos agrícolas importados pelo Brasil. Uma interrupção no fornecimento, em resposta às sanções econômicas que o país vem sofrendo, tende a fazer com que o preço da matéria-prima suba, de forma similar ao que acontece com o petróleo no momento.

No caso dos insumos agrícolas, antes mesmo da invasão à Ucrânia, a Rússia já vinha restringindo o embarque de fertilizantes para garantir o abastecimento de agricultores locais.

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Segundo os últimos dados  disponíveis da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda), em 2020 o mercado brasileiro consumiu 40,6 milhões de toneladas de fertilizantes. Desses 32,9 milhões (81%) vieram de fora. Uma boa parte disso, da Rússia. A guerra na Ucrânia tem exposto a dependência brasileira por importados – e também o desconhecimento dos investidores, segundo analistas.

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Ainda que esteja no segmento de fertilizantes, como o próprio nome da empresa sugere, a Heringer não produz a matéria-prima que os russos exportam. Pelo contrário, a empresa também é compradora dos insumos e utiliza esses macronutrientes como nitrogênio, fósforo e potássio na fabricação de seus produtos.

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“Nesse ambiente de guerra e consequente escassez de fertilizantes, quem ganha é quem efetivamente produz os macronutrientes, e não quem distribui”, explica Luis Nuin, analista da Levante. Por essa lógica, a oferta restrita do insumo na verdade prejudicaria a empresa, pois eleva os seus custos com importação.

“Em nossa opinião, ações de FHER3 não são um bom veículo de exposição à parte do mercado de fertilizantes a ser impactada pela guerra”, complementa Nuin. Segundo ele, não há na Bolsa brasileira hoje uma empresa produtora da matéria-prima que pudesse fazer preço diretamente sobre a escassez do insumo.

“A Fosfertil, que tinha capital aberto até ser comprada pela Vale (VALE3), seria um excelente veículo para a escassez que provavelmente vamos vivenciar”, afirma Nuin. A Fosfertil chegou a ter a Heringer como acionista, até ser comprada pela Vale em 2010. A aquisição marcou a entrada da mineradora na extração de fertilizante, até que a operação deixou de ser economicamente viável para a empresa seis anos depois.

Histórico de oscilações bruscas

Antes mesmo da guerra na Ucrânia, a ação da Heringer já registrava fortes variações. Em 17 fevereiro último, o papel chegou a subir 10%, com a notícia de que a empresa havia protocolado pedido de encerramento da sua recuperação judicial. Historicamente, a ação nunca teve muita liquidez, o que contribui com sua volatilidade, e os maiores volumes diários foram registrados depois que a empresa entrou em RJ.

Em 14 de junho do ano passado, o papel FHER3 levou um tombo de mais de 43% e a CVM chegou a questionar a empresa sobre o que poderia ter motivado a queda. A Heringer respondeu dizendo não haver razão para o movimento, a não ser a baixa liquidez do papel. Mas até dois dias antes, a ação vinha acumulando alta de 800% no ano e chegou a ser negociada acima de R$ 46.

Nem parecia que FHER3 quase chegou a ser uma penny stock (com preço abaixo de R$ 1). “Em 2007 [quando estreou na Bolsa], a ação era negociada na faixa de R$ 20. A partir de 2015, 2016, já era ‘um papel mico’, negociado abaixo de R$ 2”, explica Thiago Alvarenga, analista da XP.

A ação ganhou fôlego a partir de 2019, quando a empresa entrou com pedido de recuperação judicial para negociar uma dívida de mais de R$ 2 bilhões. Na época, a Heringer informou ao mercado sobre a suspensão de atividades em nove unidades de produção. Com isso, a capacidade de produção da companhia, que era de 6,2 milhões de toneladas, caiu praticamente pela metade.

Operações conturbadas

A homologação do pedido de RJ saiu em fevereiro de 2020, mas quase foi impedida pela Uralkali, grupo russo que tinha interesse em adquirir o controle da Heringer por US$ 115 milhões. O negócio chegou a ser aprovado pela Superintendência do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), mas acabou não indo adiante e a relação entre as empresas terminou em troca de acusações. A Uralkali chegou a dizer que havia inconsistência nos balanços da Heringer e que os números estavam inflados.

Em fato relevante publicado dias antes da homologação, a Heringer negou qualquer irregularidade em suas demonstrações financeiras. Também afirmou que a Uralkali estava atuando de “forma retaliatória” com o objetivo de prejudicar a empresa e de “obter para si vantagem indevida, forçando a companhia uma possível liquidação de seus ativos por montantes irrisórios, que em nada são condizentes com seu efetivo valor”.

Em dezembro do ano passado, a família Heringer, que tinha 51,48% do capital social da companhia, vendeu o controle à EuroChem (coincidentemente, uma multinacional russa), numa operação de R$ 554,562 milhões, já aprovada pelo Cade. Ao concluir o negócio, o novo controlador não descarta fazer uma oferta pública de aquisição (OPA) para fechar o capital da empresa.

RJ perto do fim?

A pedido da Justiça de Paulínia, o administrador judicial da Heringer enviou ao juiz um relatório sobre a saúde financeira da companhia. No documento, informou que a distribuidora de fertilizantes alcançou receita líquida de R$ 4,29 bilhões em 2021, com destaque para um crescimento de 91% das vendas entre abril e julho, período da safra brasileira. O lucro contábil da empresa ficou em R$ 630,2 milhões no acumulado do ano, segundo o documento.

“As análises das informações disponibilizadas apontarem que a Fertilizantes Heringer vem operando normalmente, sendo que os custos continuam consumindo grande parte da receita auferida. Entretanto, vem obtendo lucros mensais no exercício de 2021, refletido no resultado superavitário acumulado até dezembro”, diz o relatório dos administradores judiciais.

Eles também avaliam que a empresa permanece com bom indicador de liquidez corrente, apresentando constante melhora no índice de endividamento geral. O Ministério Público também precisa se manifestar sobre a RJ, para que o processo seja concluído.

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Mitchel Diniz

Repórter de Mercados