Conteúdo editorial apoiado por

Brasil tem a ganhar com desânimo no México pós-eleição? Para mercado, é preciso mais

Brasil pode se apresentar como uma janela de oportunidades para investidores focados em emergentes, mas também precisa fazer lição de casa

Lara Rizério

Publicidade

“O Brasil pode ganhar por W.O. [sem oponentes] a disputa pelos investidores globais para mercados emergentes”. Por algum tempo, principalmente entre o fim de 2022 e o início de 2023, não era raro ouvir esse discurso entre gestores e estrategistas de capital sobre a capacidade de atração de capital para o país.

Mas havia uma ressalva: que o Brasil não cometesse erros. Eis que alguns fatores de aversão de risco (alguns sinais de intervenção na Petrobras PETR4, fiscal pressionado, incertezas sobre a nova composição do Banco Central, por exemplo) levaram os investidores a ficarem mais reticentes com o Brasil, enquanto o cenário de juros mais altos por mais tempo nos EUA drenou maior otimismo com os ativos por aqui. Ao mesmo tempo, o México, grande parceiro comercial dos Estados Unidos e um dos maiores ganhadores com a tese do nearshoring por lá (deslocamento da produção para um local mais próximo de onde a mercadoria é vendida, para reduzir custos e dificuldades logísticas), aparecia sempre como uma alternativa para quem quisesse alocar em emergentes, ainda que os seus ativos fossem vistos como já bastante “esticados” (ou seja, com preço alto).

Eis que junho de 2024 chega e acontece a eleição na segunda maior economia da América Latina, que não agradou o mercado ao eleger a indicada pelo presidente López Obrador, Claudia Sheinbaum, para ser sua sucessora. Mais importante ainda, a visão da coalizão governista garantindo uma maioria constitucional no Congresso, o que abre caminho para aprovar leis que aumentam poderes presidenciais e elevar gastos, impactou o mercado e levou a uma saída de capital do México.

Continua depois da publicidade

Nesse cenário, os questionamentos pairam sobre se o Brasil pode voltar a ganhar força como um bom destino para o investimento destinado aos emergentes dada a falta de “concorrentes”- ou se outros fatores devem pesar mais para os ativos por aqui.

“A instabilidade fiscal no México pode levar os investidores a redirecionar seus investimentos para outros mercados emergentes considerados mais estáveis, sendo o Brasil o potencial favorecido por ser maior economia da América Latina. Mas, para que isso, aconteça o Brasil precisa manter uma política fiscal e regulatória estável. Com isso, os investidores estrangeiros podem buscar o nosso país como alternativa de investimentos”, avalia Rafael Meyer, Gestor do Solutions MFO.

O especialista ressalta que esse movimento só será percebido quando de fato houver uma queda na taxa de juros nos países desenvolvidos, principalmente nos EUA. No cenário atual, aponta, os investidores estão preferindo manter recurso em renda fixa e outros ativos nesses locais a recorrer a países emergentes. Cabe destacar que maio marcou mais um mês de saída de capital estrangeiro da Bolsa brasileira.

Continua depois da publicidade

Para Meyer, a situação no México pode criar uma janela de oportunidade para o Brasil atrair mais fluxos de capital, mas condicionada à estabilidade política e econômica interna do Brasil, bem como às políticas monetárias das economias desenvolvidas. “Manter uma trajetória de responsabilidade fiscal e promover reformas estruturais são essenciais para que o Brasil se beneficie desse potencial realocação de investimentos”, pontua.

Brasil “overweight” – com cautela…

Em relatório de estratégia para a América Latina, o Morgan Stanley abandonou sua visão positiva sobre as ações mexicanas após a eleição e passou a ter uma visão relativa mais positiva para o Brasil na região. “O México encontra-se numa situação sem precedentes e estamos em modo de ‘esperar para ver’ as principais medidas”, escreveram numa nota os estrategistas liderados por Nikolaj Lippmann, rebaixando as ações do país de overweight (exposição acima da média) para equalweight (exposição em linha com a média) em sua carteira para a América Latina.

A recomendação overweight do Morgan para o México existia desde o fim de 2022. O banco reduziu a exposição a nomes ligados ao ciclo de investimento do país, como a fabricante de cimento Cemex SAB de CV e o fundo de investimento imobiliário com foco em propriedade industrial Prologis Property Mexico SA de CV. “Estamos cortando risco no país devido à falta de visibilidade no nearshoring”, escreveram os estrategistas, acrescentando que estão favorecendo nomes que beneficiam de um peso mais fraco e obtêm uma “parcela substancial” das suas receitas fora do México.

Continua depois da publicidade

O Brasil seguiu com o overweight, mas os estrategistas reforçaram estarem cautelosos em todas as ações da América Latina. “As taxas podem permanecer mais altas por mais tempo e o impacto continuará a pressionar os mercados acionários da América Latina, e do Brasil em particular”, avaliaram.

Em meio a riscos como ​​declínio do crescimento, falta de progresso na política interna e taxas mais altas, o banco apoia três temas seculares principais que podem impulsionar alguns papéis: 1) digitalização, 2) energização do mundo e 3) expansão das fronteiras agrícolas do Brasil.

O banco tem alta exposição ao Nubank  (NYSE:NU; B3: BDRs ROXO34) e Mercado Livre (MELI34), mas ainda tem baixa exposição a ações ligadas ao mercado doméstico, ao não ver um case claro de investimento. “Acreditamos que o risco político relacionado às empresas estatais e ao Comitê de Política Monetária (Copom) deverá pesar no mercado local. No Brasil, vemos um argumento muito forte para uma transformação de longo prazo através da expansão das suas fronteiras energéticas e agrícolas, o que poderia acrescentar 22-30% às exportações brutas até ao final da década, de acordo com os nossos analistas. No entanto, hoje estes são melhores temas para escolhas micro de ações do que macro”, aponta a equipe de estratégia.

Continua depois da publicidade

O Bank of America, por sua vez, já tinha exposição equalweight no México e seguiu com ela após as eleições, ressaltando que a cautela recente se justifica, mas que há diversas opções mais defensivas. Em sua carteira, o banco adicionou Vesta e Fibra PL, de construção, e América Móvil (de telefonia, dona da Claro), enquanto retirou o banco Gentera, Kimberly e a aérea Volaris.

Para o Brasil, o banco manteve o overweight e ressaltou preferência por bancos (especificamente Itaú ITUB4 e BTG BPAC11), bond-proxies, ou ações que se comportam como títulos (principalmente dentro de utilities) e nomes de qualidade. O BofA ressaltou gostar de ter alguma exposição ao consumo com Renner (LREN3) e Arezzo (ARZZ3), enquanto removeu Suzano (SUZB3), PRIO (PRIO3), adicionou Enauta (ENAT3) em sua carteira e segue neutro em Vale (VALE3).

No mercado de câmbio, as tendências também foram incertas no pós-eleição mexicano para a divisa brasileira. Se na segunda-feira pós-eleição no México o real registrou resiliência frente o dólar com busca por alternativas ao peso mexicano, na terça houve uma queda expressiva da moeda brasileira, aproximando-se dos R$ 5,30, com um desmonte generalizado de apostas em moedas emergentes que teve como gatilho o tombo do peso mexicano. As preocupações com a política fiscal brasileira também jogam contra o desempenho do real.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.