Bancos mantêm fortes ganhos em 2019, mas fintechs e open banking inspiram cautela

Além do lucro, instituições financeiras mostraram que a diversificação e o corte de custos podem gerar ganhos aos acionistas

Anderson Figo Ricardo Bomfim

SÃO PAULO – Depois de resultados que decepcionaram os investidores no segundo e terceiro trimestres de 2019, os grandes bancos voltaram a animar na temporada do quarto trimestre. Analistas entendem que a diversificação das operações e a digitalização dos serviços, tornando a parte de atendimento físico mais enxuta, foram os destaques do período.

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Duas das maiores instituições financeiras privadas do País viram suas ações se valorizarem expressivamente no dia seguinte à divulgação de seus balanços do quarto trimestre — os papéis preferenciais do Itaú Unibanco (ITUB4) subiram 2,3% e os do Bradesco (BBDC4), 1,93%.

Já as ações ordinárias do Banco do Brasil (BBAS3), que haviam subido cerca de 5% nos dois pregões anteriores à divulgação do resultado, corrigiram o movimento e caíram 1,55% no pregão seguinte ao balanço.

Parte desse movimento se explica pelo desempenho das ações em relação ao Ibovespa nos últimos meses, na avaliação de Carlos Daltozo, da Eleven Financial Research. “Os bancos estavam atrasados e não viveram o rali que teve a Bolsa no ano passado.” No entanto, não é só uma correção que está em jogo.

O mercado, após uma análise do que aconteceu nos trimestres anteriores, incorporou nas suas expectativas aquilo que o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari, definiu como o fim da “era de ganhos estratosféricos”, marcada pela Selic de dois dígitos e altas taxas cobradas em modalidades como o cheque especial. Diante disso, foi bem vista a estratégia das instituições financeiras de cortar custos e focar na rentabilidade a longo prazo.

Segundo Marcel Campos, da XP Investimentos, a vantagem dos grandes bancos é que eles podem se utilizar de diferentes negócios para captar o movimento de recuperação da economia. O Bradesco, por exemplo, ganha cada vez mais força no ramo de seguros, o que agrada o analista.

“O crédito deve ter menos rentabilidade, mas dá para ir para segmentos mais rentáveis. Espera-se uma chuva de [aberturas de capital de empresas] IPOs nos próximos meses e as áreas de investimentos dos bancos devem se beneficiar disso”, destaca.

Em relatório, a equipe de análise do Credit Suisse aponta que a margem financeira dos bancos deve se beneficiar em 2020 do melhor portfólio da carteira e maiores ganhos da gestão de ativos e passivos em decorrência da Selic mais baixa. As taxas de serviços também devem acelerar, com os volumes compensando a maior pressão de preços.

No entanto, nem tudo é positivo no horizonte das instituições financeiras. Os analistas Marcelo Telles, Otavio Tanganelli e Alonso Garcia, do Credit, esperam que a reprecificação da carteira de crédito baseada em juros fixos, os efeitos da elevação da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de 15% para 20% e a exposição à América Latina – com toda a instabilidade política que vem junto – prejudiquem os bancos.

Destrinchando os números

No quarto trimestre, todos os cinco maiores bancos do país mantiveram o crescimento de suas carteiras de crédito. No geral, a inadimplência permaneceu inalterada em relação ao ano anterior, com exceção do Banco do Brasil, que viu o índice subir de 2,5% para 3,3%.

Ainda assim, no trimestre, o único que elevou substancialmente as provisões para crédito de liquidação duvidosa foi o Itaú. Já a Caixa, que não tem ações listadas na B3, reduziu suas reservas para eventuais calotes (acima de 90 dias) consideravelmente no período.

Veja e compare, no gráfico abaixo, as principais linhas dos balanços dos cinco maiores bancos do país no quarto trimestre de 2019.

No acumulado de 2019, além do aumento nas carteiras de crédito, todos os bancos também registraram crescimento de lucros. O que mais subiu foi o da Caixa — uma alta de 103,4%. Entre as companhias de capital aberto, o Banco do Brasil teve o maior crescimento de lucro no ano, de 41,21%, na comparação com 2018.

Veja e compare, no gráfico abaixo, as principais linhas dos balanços dos cinco maiores bancos do país no acumulado de 2019.

Análises

Um resultado muito elogiado pela equipe do Credit foi o do Banco do Brasil, projetou números considerados interessantes em seu guidance — as previsões da administração para o futuro de uma série de indicadores financeiros.

“O ponto médio do guidance indica um crescimento do lucro líquido de 9% em 2020. Este patamar representaria uma das melhores performances entre os grandes bancos e também fica bastante alinhado com nossas projeções”, escreveram os analistas.

A equipe da XP colocou BB como sua top pick no setor, graças à melhora na rentabilidade, que ocorreu mesmo em um cenário de declínio na carteira de crédito. Esse avanço foi obtido por um melhor mix de crédito e menores despesas com custo nesse segmento.

Em relação ao Bradesco, a XP viu melhora na qualidade do ativo e nos lucros. “Embora a margem financeira continue crescendo menos que o crédito, mesmo com um mix mais voltado para o varejo, tivemos boas notícias das outras linhas”, disse a equipe da XP. Um destaque no resultado foi o avanço no segmento de seguros e receitas de outros serviços.

Confira todas as recomendações de casas de análise para cada uma das ações de bancos segundo dados da Bloomberg

Empresa Ticker Recomendações de compra Recomendações neutras Recomendações de venda Preço-alvo médio (R$) Potencial de valorização
Banco do Brasil BBAS3 15 5 0 63,29 30,71%
Bradesco BBDC4 14 5 1 43,20 36,49%
Itaú Unibanco ITUB4 11 7 2 39,94 23,08%
Santander SANB11 8 11 0 50,49 24,08%

O Itaú, por sua vez, teve como destaque positivo a sustentabilidade dos resultados, mas a XP enxerga deterioração na qualidade dos ativos no quarto trimestre. “A maioria das receitas e custos surpreenderam positivamente, mas não acarretaram em maiores ganhos, uma vez que o banco aproveitou os melhores resultados operacionais para realizar provisões.”

O analista Victor Schabbel, do Bradesco BBI, avalia que o bom resultado do Itaú no quarto trimestre é ofuscado pelas preocupações com 2020. “Apesar de esperarmos que os bancos brasileiros se alavanquem em um portfolio de varejo crescente notamos que a contribuição das linhas de alto rendimento como empréstimos a descoberto e rotativos do cartão de crédito já está elevada e os spreads tendem a cair”, escreve em research.

Por fim, o Santander (SANB11) teve como destaque o Retorno sobre o Patrimônio Líquido (ROE) de 20%, que para Marcel Campos, da XP, era uma métrica improvável de ser atingida há alguns anos “quando a operação brasileira não tinha tanta eficiência”.

“Com sua divisão de varejo crescendo, o banco conseguiu engajar os clientes e aumentar significativamente a venda cruzada e satisfação de sua base. Entretanto, nossa recomendação Neutra tem sido principalmente relacionada a seus múltiplos altos, visão que mantemos no momento”, disse o analista.

“Para mim, quem está mais preparado para capturar o crescimento da economia é o Bradesco, o BB é a ação mais barata das quatro em múltiplos, e Itaú é algo em que eu poderia pensar no longo prazo.”

Fintechs

“Não temos resposta para o que queremos e isso nos angustia toda noite… Fintechs estão batendo na nossa porta todo dia”, disse o presidente do Itaú, Roberto Setúbal, em setembro de 2019.

A admissão acendeu uma luz de alerta no mercado, pois veio do topo da maior instituição financeira privada do país. No entanto, ao se analisar os resultados do quarto trimestre, não há por que acreditar, pelo menos por enquanto, que os grandes bancos não possam coexistir com as fintechs por um bom tempo ainda.

Daltozo acredita ser difícil que as empresas que combinam tecnologia com finanças concorram com a experiência que os bancos têm em segmentos como empréstimos. “Não dá para sobreviver só de receitas de serviços e não é simples tirar esse atraso no crédito apesar das facilidades trazidas pela tecnologia”, explica.

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Se este cenário se confirmar, as fintechs não só não matariam os bancos como poderiam até ajudar o setor, defende Daltozo. “As fintechs, atuando em nichos específicos de serviços, permitem que os bancos continuem a ganhar naquilo em que são melhores.”

O analista da Eleven ressalva que isso não significa os bancos digitais não tenham impacto, ainda mais no curto prazo, no qual o ruído costuma ser mais forte do que os fundamentos. Daltozo lembra que o segmento de cartões de crédito já vive uma competição muito maior do que há alguns anos, assim como o mercado de adquirência.

Por outro lado, os grandes bancos já teriam se movimentado, na opinião dele, para enfrentar o boom de bancos de investimentos. “Hoje já estão melhores nisso, assim como em administração de recursos de terceiros e seguros.”

Marcel Campos, por sua vez, não vê ainda real visibilidade do impacto das fintechs nos bancos, e acha que o resultado do quarto trimestre não é o suficiente para que seja tirada alguma conclusão sobre o assunto.

“Temos um calendário definido para a implementação do open banking [conjunto de regras e processos autorizado pelo Banco Central que permitirá troca de informações sobre clientes entre as instituições financeiras], e isso será muito importante para sabermos como evolui essa questão. O resultado do quarto tri é perfeito, mas ainda não vejo reação ao que as fintechs estão fazendo.”

Já Fernando Sampaio, da Brasil Capital, argumenta que o futuro dos grandes bancos depende da capacidade que mostrarem em usar o open banking para melhorar suas capilaridades no mundo digital. “Os bancos precisam melhorar a experiência para o cliente.”

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Anderson Figo

Editor de Minhas Finanças do InfoMoney, cobre temas como consumo, tecnologia, negócios e investimentos.