Com ruídos políticos e pandemia, investimento estrangeiro no Brasil deve cair 40% em 2020, diz Economist

Analista da The Economist disse, durante a Expert XP, que retrocessos ambientais também contribuem para afastar o capital estrangeiro do País

Giovanna Sutto

InfoMoney na Expert 2020 (Getty Images/Leo Albertino)

SÃO PAULO – Para um país emergente, como o Brasil, a capacidade de recuperar as rédeas da economia depois de uma crise é muito importante para que o investidor estrangeiro olhe com bons olhos o mercado nacional.

A injeção de recursos externos, geralmente, é direcionada para o capital produtivo, como construção de fábricas, infraestrutura, fusões e aquisições, entre outros, investimentos que ajudam no desenvolvimento do país no longo prazo.

Nesse contexto, para Robert Wood, economista especializado em América Latina da The Economist Intelligence Unit (EIU), divisão de pesquisa e análise do grupo Economist, embora o Ministério da Economia esteja com uma agenda ativa de privatizações, e esse pareça ser o caminho certo para a recuperação da economia, sozinha ela não será suficiente para colocar o Brasil nos trilhos e impulsionar uma retomada.

Wood participou do painel mediado por Fernando Ferreira, estrategista-chefe da XP Investimentos, e Rachel de Sá, economista da XP Investimentos, e intitulado “Como o mundo enxerga o Brasil hoje” durante a Expert 2020 nesta quita-feira (17).

Instabilidade política e reformas

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O economista disse que a atenção dos investidores estrangeiros está voltada aos impactos econômicos da pandemia e como o governo federal vai lidar com eles. Segundo Wood, uma recuperação saudável do país inclui “estabilidade política, social e regras previsíveis para o jogo”.

Além dos planos de privatização e concessões no setor infraestrutura, há alguns pontos positivos, como o patamar baixo dos juros, com a Selic em 2,25% ao ano, algo inédito no país.

“Mas no último ano, os investidores têm nutrido algumas preocupações, entre elas, aonde as políticas públicas do governo Bolsonaro vão levar o país. Vimos a questão do desmatamento da Amazônia recentemente e a preservação ambiental é um tema bem sensível para os investidores estrangeiros”, afirmou.

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Em outro painel da Expert 2020, Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente, também observou que a questão ambiental é vista como um retrocesso aos olhos do investidor estrangeiro.

Ela disse que, nas gestões passadas, a economia e o agronegócio estavam crescendo e o desmatamento caindo, o que deixava investidores estrangeiros tranquilos para investir no Brasil, mas esse “ciclo virtuoso” se rompeu no atual governo.

Wood afirmou que, segundo as previsões da EIU, o Investimento Estrangeiro Direto (IED) no Brasil neste ano será 40% menor do que em 2019. Dados da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad) mostram que o IED no Brasil cresceu 26% no ano passado na comparação com 2018, para US$ 75 bilhões.

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Wood ressaltou que as tensões políticas, somadas à diminuição de ritmo na agenda de reformas, podem também atrasar uma retomada saudável.

“A Reforma da Previdência foi bem recebida. Sem esse passo no ano passado, o cenário seria ainda mais incerto. No início deste ano, no entanto, houve problemas políticos, com tensões entre o Congresso e o Poder Executivo e começou a ficar claro que será difícil passar as outras reformas rapidamente, o que trouxe um certo desânimo”, explicou.

Ele lembrou que a próxima reforma na agenda seria a tributária, mas que a demora do governo para apresentar a proposta deixou os investidores menos otimistas.

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“As propostas são positivas e tentam fortalecer as contas públicas. Mas agora a agenda vai de encontro ao ciclo local de eleições estaduais e será mais um obstáculo”, afirma, se referindo às eleições municipais adiadas para 15 e 29 de novembro, respectivamente, dado a pandemia.

Apesar da análise, Paulo Guedes, ministro da Economia, anunciou na noite desta quinta-feira (16) durante a Expert 2020, que a proposta do governo para a reforma tributária está pronta e será entregue ao Congresso na próxima terça-feira (21).

No âmbito fiscal, os investidores vão acompanhar se o governo vai manter os estímulos fiscais dados às empresas e famílias. “Ainda há parcelas a serem pagas do ‘coronavoucher‘. Finalizada essa etapa não sabemos quais serão os efeitos. É possível que com o fim do auxílio os brasileiros esperem para ver o que vai acontecer, consumindo menos do que o esperado e pressionando ainda mais a dívida pública”, disse.

Recentemente, em entrevista ao InfoMoney, o agora ex-secretário do Tesouro Nacional, Mansueto de Almeida, afirmou que é preciso evitar que auxílios emergenciais se tornem permanentes. Segundo ele, não fazer o “desmame” de empresas e famílias, que passaram a depender dos benefícios do governo, seria um tiro no pé.

“Aumentaria a incerteza e entraríamos em um cenário de reversão da queda de juros, com aumento do risco-país, e possibilidade de aumento da carga tributária para fazer o ajuste fiscal. Quem perderia são os brasileiros, que pagam os impostos”, disse o secretário.

Com o aumento dos gastos por causa da pandemia, a projeção da dívida bruta do governo geral já subiu de 77,9% para 98,2% do PIB neste ano, segundo o Ministério da Economia e o rombo das contas públicas deve chegar a R$ 850 bilhões, o maior déficit da história.

A situação não agrada o ministro da Economia, Paulo Guedes, que ganhou a aprovação do mercado com a promessa de restaurar o equilíbrio das contas públicas.

O ministro, discípulo de Milton Friedman, economista liberal que simboliza a defesa do Estado mínimo, teve que se render, assim como outros governos liberais, a medidas que elevaram o grau de intervenção estatal no país. Mas ele tem deixado claro que quer voltar logo ao seu plano A.

Expectativas baixas

Levando todos os fatores citados acima em consideração, Wood afirmou que as expectativas para o Brasil não são muito otimistas. Enquanto alguns países devem devem iniciar uma recuperação mais sólida já em 2021, no Brasil ainda não se pode afirmar como ou quando a retomada da atividade econômica acontecerá.

Em março, a divisão da EIU revisou as projeções de crescimento do PIB brasileiro para baixo. “A projeção de contração do PIB era de 5,5% para o Brasil quando estávamos começando a perceber a gravidade da situação. Passados alguns meses, recentemente ajustamos para uma queda mais profunda, de 7,5%, justamente por acreditarmos que ainda faltam alguns fatores para uma recuperação plena”, diz.

O Banco Mundial divulgou um relatório no início de junho apontando uma retração de 8% do PIB do Brasil em 2020. O Fundo Monetário Internacional (FMI) tem previsões ainda mais pessimistas, com o recuo da atividade econômica chegando a 9,1%. Já o Banco Central acredita que o tombo vai ser de algo em torno de 6,4% no PIB neste ano.

Por fim, Wood acredita que mesmo em meio à crise há uma compreensão de que o cenário não vai afetar o Brasil de forma isolada.

“É uma crise global. Todo mundo está no mesmo barco e buscando soluções para atravessar o momento. Investidores têm consciência disso e estão dando um respiro para países emergentes entendendo que esse ano será especialmente difícil”, disse.

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Giovanna Sutto

Repórter de Finanças do InfoMoney. Escreve matérias finanças pessoais, meios de pagamentos, carreira e economia. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.