Força feminina: a fórmula da MAYA Capital para mais mulheres criarem startups

Fundo de Lara Lemann e Mônica Saggioro tem inscrições abertas para Female Force, que dá mentorias e networking a empreendedoras

Mariana Fonseca

Voluntárias do Female Force (Maya Capital/Divulgação)

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SÃO PAULO – As mulheres representam 50% dos empreendedores em estágio inicial e 43,5% dos empreendedores estabelecidos no Brasil, de acordo com o Global Entrepreneurship Monitor. Porém, essa grande representação ainda tem de chegar aos negócios escaláveis, inovadores e tecnológicos. Segundo a plataforma de inovação Distrito, a participação de mulheres como sócias de startups fica apenas entre 11% (fintechs) e 25% (legaltechs).

A MAYA Capital busca que mais startups sejam criadas por mulheres: o fundo de capital de risco criado por Lara Lemann e Mônica Saggioro está com inscrições abertas até 15 de maio para o Female Force. O programa gratuito é focado em conexões entre empreendedoras e capacitação em temas essenciais para a tração de startups.

A MAYA Capital foi criada há menos de três anos, mas está por trás de negócios como GupyThe Not Company e Oico. O fundo de venture capital já captou US$ 41 milhões com family offices brasileiros, americanos e europeus para administrar 27 aportes em startups em estágio inicial na América Latina.

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Estrutura social e vieses afetam fundadoras de startups

O quadro econômico de 2020 gerou uma piora no mercado de trabalho brasileiro – e impactou as mulheres com mais força. O percentual de mulheres que estavam trabalhando ficou em 45,8% no terceiro trimestre de 2020, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Esse foi o nível mais baixo desde 1990, quando a taxa ficou em 44,2%.

O InfoMoney conversou anteriormente com especialistas para elencar alguns motivos que levaram à menor da presença das mulheres no mercado de trabalho.

A segregação ocupacional ficou ainda mais evidente, porque as atividades que geralmente são ocupadas por mulheres foram mais afetadas na pandemia. A suspensão das aulas nas escolas também impactou diretamente as mulheres no mercado de trabalho – a “punição pela maternidade” se intensificou durante a pandemia.

Segundo uma pesquisa do Datafolha, divulgada em agosto de 2020, 57% das mulheres que passaram a trabalhar remotamente disseram ter acumulado a maior parte dos cuidados domésticos. Entre homens, o percentual foi de 21%. Ainda segundo a pesquisa, intitulada “Sem parar: o trabalho e a vida das mulheres na pandemia”, metade das mulheres se responsabilizou pelo cuidado de outra pessoa ou ofereceu algum tipo de apoio, seja um familiar (80,6%), um amigo (24%) ou um vizinho (11%).

Essa estrutura social de divisão de papéis afeta não apenas mulheres funcionárias, mas também empreendedoras. Além da quantidade pequena de fundadoras de startups em relação à sua presença na população, como apontamos no começo desta matéria, elas também recebem menos investimento e têm menor presença entre os avaliadores de aportes de capital de risco.

Em 2020, apenas 2.3% do capital foi para startups que tinham ao menos uma mulher no quadro de fundadores, segundo a empresa de pesquisas em inovação Crunchbase.

O Banco Mundial também aponta que apenas 8% dos fundos de venture capital ou private equity na América Latina têm mulheres na liderança. Isso faz com que os fundos até mesmos façam perguntas diferentes a fundadores e fundadoras, segundo a Harvard Business Review.

Aos homens, investidores fazem perguntas sobre potencial de ganhos. Às mulheres, as questões eram sobre potencial de perdas. Empreendedores que receberam perguntas promotoras receberam duas vezes mais investimento do que os que receberam perguntas preventivas.

Esses fundos acabam perdendo a chance de boas oportunidades de negócio: 2,5 vezes mais receita é gerada por negócios fundados por mulheres, segundo o Boston Consulting Group.

“Sermos investidoras mulheres nos dá ciência dos vieses de avaliação. Tentamos assumir posições mais neutras, fazendo as mesmas perguntas para as empresas”, diz Mônica. Não há uma cota de participação feminina dentro do portfólio da MAYA Capital. Mesmo assim, quatro em cada dez empresas do portfólio têm ao menos uma fundadora.

Como mais mulheres podem criar startups?

O Female Force começou em março de 2019, com mentorias ocasionais. “Lançamos uma plataforma manual e simples, com pessoas próximas e que dedicavam algumas horas por mês para fazer reuniões pontuais. Recebemos um feedback positivo, mas a gente fazia isso no nosso final de semana. Queríamos ter um alcance muito maior, fazendo o projeto de forma profissional e atraindo mais mulheres”, explica Mônica.

A MAYA Capital impulsionou a iniciativa no meio de 2020, recrutando 11 voluntárias com experiências variadas, mas focadas em melhorar as lacunas entre fundadores e fundadoras. Além de Lara e Mônica, as mentoras incluem investidoras, executivas e empreendedoras como Fernanda Caloi (Google), Helen Andrade (Nestlé) e Itali Collini (500 Startups).

Em dezembro de 2020, o Female Force teve seu segundo piloto. 12 mulheres passaram por sessões em grupos e individuais durante um mês. A MAYA Capital mapeou quais eram os temas mais demandados pelas fundadoras, além de começar uma comunidade de empreendedoras que se ajudam em desafios diários.

A próxima versão do Female Force deve selecionar em torno de 20 mulheres. O programa busca mulheres que queiram empreender ou já empreendem. Elas também devem mostrar engajamento com a causa do empoderamento feminino, estando dispostas a dar e receber conselhos.

As inscrições podem ser feitas até 15 de maio. As empreendedoras devem falar sobre sua trajetória, estágio na jornada empreendedora e motivação para participar do Female Force. As selecionadas passarão por entrevista e o resultado final será divulgado no início de junho.

O programa não terá um prazo fechado para as mentorias e trocas de conteúdos e experiências. As mentorias terão seis grandes pilares: MVP e produto; go to market; finanças; jurídica; liderança; e fundraising. O Female Force está atuando apenas com encontros virtuais por meio de e-mails e apps como Slack e WhatsApp. Após a pandemia do novo coronavírus, pretende realizar atividades presenciais.

“Temos poucas fundadoras de startups por vários fatores, inclusive os relativos à estruturação da sociedade, como a divisão desigual de tarefas domésticas parentais e que leva à falta de tempo para se dedicar a uma profissão”, diz Mônica. “Queremos ajudar as empreendedoras nesse caminho de montar o plano de negócio, testar o produto e obter investimentos. Elas costumam falar com outras fundadores antes de chegar aos fundos, então criamos primeiro uma rede para troca de experiências e visibilidade, com foco em inspiração e progresso contínuo.”

Mas o objetivo também é trazer mais diversidade para a própria indústria de venture capital. A MAYA Capital pretende não apenas avaliar o potencial dessas fundadoras para seu próprio portfólio, mas apresentar as oportunidades a outros fundos de venture capital e private equity. Todas as iniciativas têm como objetivo aumentar aquela proporção de 11% a 25% de mulheres no quadro fundador das startups brasileiras – pouco para as quase 110 milhões de mulheres no país.

Mariana Fonseca

Subeditora do InfoMoney, escreve e edita matérias sobre empreendedorismo, gestão e inovação. Coapresentadora do podcast e dos vídeos da marca Do Zero Ao Topo.