Conta de luz cada vez mais cara: startup ajuda desde pequenas empresas até Ambev a economizarem

Clarke tem mais de 1.100 contratos fechados com companhias para adequação tributária e transição ao mercado livre de energia

Mariana Fonseca

Pedro Rio, Victor Copque e Rodrigo Camargo, fundadores da Clarke Energia (Divulgação)

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SÃO PAULO – A conta de luz tem ficado cada vez mais cara, assim como diversos custos do cotidiano. Existem startups que estão de olho no tradicional mercado de energia elétrica faz anos — e a crise atual foi o impulso de que precisavam para emplacar suas propostas.

Uma dessas startups é a Clarke, que busca reduzir a conta de luz especificamente para empresas. A startup começou a operar em janeiro de 2020, com um serviço de adequação tarifária que leva a uma redução de até 30% na conta de luz corporativa. Recentemente, a Clarke também criou uma plataforma para companhias aderirem ao mercado livre de energia: nesse marketplace, elas podem escolher fornecedores.

A proposta de economia na conta de luz tracionou com empresas que enfrentam não apenas as restrições de atividades impostas pela pandemia do coronavírus, mas também uma alta no custo da energia elétrica.

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A Clarke tem hoje mais de 1.100 contratos fechados com pequenas e médias empresas, ou com grandes empresas que têm centros de distribuição ou filiais de médio porte. Os negócios atendidos vão desde pequenas lojas até marcas como Ambev (ABEV3), O Boticário, Burger King (BKBR3) e Mobly (MBLY3). O Do Zero Ao Topo, marca de empreendedorismo do InfoMoney, conversou com o cofundador Pedro Rio sobre o crescimento da Clarke.

Tarifa branca e adequação tarifária

A Clarke foi criada pelos empreendedores Pedro Rio, Rodrigo Camargo e Victor Copque. Anteriormente, Rio foi presidente da Brasil Júnior, uma entidade que representa empresas estudantis. Copque também trabalhou na Brasil Júnior. Já Camargo trabalhou em comercializadoras de energia no Brasil e na Europa.

A Clarke foi criada com o objetivo de longo prazo de empoderar o consumidor de energia. A startup analisou 7 mil contas de luz e viu que metade delas tinham problemas tarifários, portanto poderiam economizar. “R$ 30 bilhões são desperdiçados anualmente pelo enquadramento em modalidades tarifárias menos adequadas”, estima Rio.

A startup atende empresas com contas de luz mensais que partem de R$ 2 mil em cidades como Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte e São Paulo. Seu primeiro produto foi lançado em janeiro de 2020. Empresas de pequeno e médio porte entram na plataforma web da startup e fornecem seus dados de consumo. A Clarke tem uma inteligência que analisa as informações e responde quanto a empresa poderia economizar em uma transição para a tarifa branca ou em uma alteração na quantidade de energia contratada.

A tarifa branca é indicada para estabelecimentos de baixa tensão (igual ou inferior a 1 kV). Essa tarifa branca cobra um preço maior de noite e um preço menor de dia, ideal para negócios com maior consumo no horário comercial.

Já para estabelecimentos de média tensão (superior a 1 kV e inferior a 69 kV), a Clarke identifica qual deve ser a parcela fixa de contratação de cada empresa. Contratar a parcela que realmente se adequa ao consumo da companhia pode gerar economia.

A Clarke estima que seus clientes tenham uma economia média de 10% em suas contas de luz. Esse corte de custo pode chegar a 30%. A startup de monetiza por meio de uma taxa de sucesso (success fee): fica com 30% do valor economizado pelas companhias atendidas durante o primeiro ano de adequação tarifária.

Aplicação web da Clarke (Divulgação)
Aplicação web da Clarke (Divulgação)

Pandemia e conta de luz mais cara

Durante a pandemia de Covid-19, a demanda vinda de empresas de pequeno porte caiu porque muitos estabelecimentos fecharam as portas de vez. Já a demanda vinda de empresas de médio porte cresceu. “São negócios antigos e familiares que conseguiram sobreviver aos piores meses, mas precisavam cortar custos. Por cobrarmos apenas uma taxa sobre o sucesso, tivemos uma boa aderência”, diz Rio.

Além das dificuldades trazidas pelas restrições de atividades sociais, tanto empresas quanto consumidores também enfrentaram uma conta de luz mais salgada a partir do final de 2020.

As represas brasileiras estão em níveis baixos, o que levou ao acionamento de termelétricas – que produzem uma energia mais cara. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu retomar o sistema de bandeiras tarifárias em dezembro de 2020.

Essa é uma tarifa adicional sobre o consumo de energia, crescente de acordo com as cores verde, amarela e vermelha. O sistema estava suspenso desde maio, para aliviar os consumidores durante a pandemia. “Nossos clientes veem que sua conta dobrou, mesmo que o consumo tenha aumentado menos, e temos de explicar que não é um erro da distribuidora”, diz Rio.

Em doze meses, a Clarke passou de 40 contratos para mais de 1.100. A startup atende principalmente clientes de baixa tensão, que vão desde lojas pequenas de materiais de construção até estabelecimentos de médio porte, como concessionárias de automóveis e supermercados. Também atende pequenos e médios restaurantes cadastrados no iFood.

A Clarke fechou uma parceria com o aplicativo de delivery e disponibiliza seu serviço a 30 mil restaurantes na cidade de São Paulo, com 50% de desconto em sua taxa de sucesso. Um último perfil são grandes empresas com unidades consumidoras menores – a Clarke atende centros de distribuição da Ambev e da Mobly e unidades das redes Burger King, Dr. Consulta e Volanty.

A Clarke conseguiu recentemente dar um novo passo em sua ideia de ajudar o consumidor pessoa jurídica de energia a economizar. A Clarke inaugurou há 60 dias uma plataforma na qual empresas podem escolher fornecedores e preços. Ou seja, um marketplace de fornecedores no mercado livre de energia.

O Brasil tem tanto o mercado de contratação regulada de energia elétrica quanto o mercado livre de energia. No último, demanda e oferta definem qual será o custo da luz. A Clarke já tem 10 unidades consumidoras que contrataram a transição para o mercado livre de energia, e oito comercializadores de energia limpa. A Clarke se monetiza por meio de uma comissão sobre os comercializadores.

Todos os contratos foram fechados em um regime conhecido como economia garantida. Ele prevê desconto garantido em cima do valor pago no mercado regulado, em troca de maior demanda de energia para a comercializada.

Rio estima uma média de 20% em economia na conta de luz das unidades consumidores que fazem essa transição pela Clarke. “Essa mudança começa a ser viável com uma conta de luz acima de R$ 10 mil. Atendemos principalmente o pequeno industrial ou o grande varejista”, diz o cofundador.

Um dos clientes atendidos pelo marketplace é o e-commerce de móveis Mobly. Rio estima 20 mil unidades consumidoras no mercado livre de energia atualmente, mas 100 mil outras que poderiam também aderir a essa comercialização de luz por meio de procura e oferta.

“Ou seja, 80% desse mercado tem uma demanda reprimida. Ao mesmo tempo, 20% da nossa carteira de mais de 1.100 contratos poderia aderir ao mercado livre de energia. Vamos começar por esses clientes.”

Futuro de mais aumentos, para consumidores e empresas

O preço da energia elétrica segue em alta durante este ano, tanto no mercado regulado quanto no mercado livre de energia. As bandeiras tarifárias devem ficar até o final deste ano. A Aneel prevê um reajuste nas bandeiras tarifárias que deve passar de 20% nas próximas semanas. Como medida extrema, não se descarta um futuro racionamento de energia no país.

Assim, ainda não há data para os custos deixarem de exercer pressão no orçamento de consumidores e empresas. “No mercado regulado, a ideia é permanecer com bandeira vermelha até o final de 2021. Já no mercado livre, o preço futuro para o próximo ano está batendo no teto definido por regulação.

Então temos certeza de aumento considerável na conta de luz em 2022, e já se fala em preços altos para 2023”, diz Rio. “O que pode nos proteger em partes é a maior diversificação da nossa matriz energética, com o crescimento de energia eólica e solar. A previsão também não leva em consideração políticas públicas que possam agir contra o aumento na conta de luz.”

Vale lembrar que o mercado livre de energia ainda não é uma realidade para consumidores na pessoa física. Apenas quem tem uma demanda contratada de 500 kW pode acessar esse mercado. Uma residência no estado de São Paulo consumiu em média 207 kW/h em abril de 2021, segundo dados da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente.

“O mercado residencial ainda vai demorar a se desenvolver, porque depende principalmente da regularização da portabilidade da conta de luz. Deveríamos seguir o exemplo de nações que inauguraram seus mercados livres de energia lá no começo dos anos 2000, como Estados Unidos, Japão e Reino Unido”, explica Rio. O projeto de lei 414/2021, que prevê uma expansão do mercado livre de energia, está aguardando despacho do presidente da Câmara dos Deputados.

Pelo menos nas empresas, a demanda por reduzir custos deve continuar impulsionando a Clarke. A startup espera terminar este ano com 1.600 contratos — 100 deles serão de unidades consumidoras no mercado livre de energia.

Mariana Fonseca

Subeditora do InfoMoney, escreve e edita matérias sobre empreendedorismo, gestão e inovação. Coapresentadora do podcast e dos vídeos da marca Do Zero Ao Topo.