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House of Cards do Brasil: o golpe anti-impeachment

O pedido de impeachment em essência não pertence a Eduardo Cunha, mas ao povo, a sociedade civil brasileira representada pelo Congresso Nacional.
Por  Alan Ghani
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Para quem acompanha política americana, sabe que a aclamada série “House of Cards” retrata muito bem o jogo de poder na política, marcado por intrigas, construção de calúnias e vazamentos de informações para a imprensa. No Brasil não é diferente. Aliás, no House of Cards tupiniquim, estamos a um passo à frente: as instituições estão à serviço dos interesses governistas.

Se de um lado 68% da população clamam por impeachment, do outro, o governo monta uma verdadeira operação anti-impeachment com utilização de instituições de Estado e consentimento de parte da imprensa brasileira.

Primeiro, construíram a tese de que não poderia ter impeachment porque era necessário preservar as instituições em nome da governabilidade. A presença de milhares de pessoas nas manifestações pró-impeachment de março, abril e agosto mostraram que a estratégia não foi bem sucedida. Mais: a população e parte do mercado começaram a entender que o impeachment seria a única forma do Brasil sair da crise econômica para preservar as instituições (já tratei do assunto aqui). Depois, veio a tese de que impeachment era golpe. Também não colou dado que a o impeachment  é um instrumento previsto na Constituição. 

Dado que o discurso do governo e do PT parecia ser inócuo para frear o avanço do processo de impeachment, o governo sai da retórica e vai para a ação. Fecha uma acordo com o PMDB na distribuição de ministérios,  interfere no processo do TCU, no qual 3 ministros (Luís Inácio Adams, José Eduardo Cardozo e Nelson Barbosa) pedem o afastamento de Augusto Nardes da relatoria. Na mesma semana, vaza na imprensa indícios de que o relator do TCU poderia ter recebido 1,65 milhão de uma empresa envolvida em fraudes fiscais. Nada disso adiantou: o TCU reprovou as contas do governo Dilma, respondeu à tentativa de interferência institucional (veja vídeo aqui) e abriu uma avenida para o impeachment com a comprovação das “pedaladas fiscais”.

O governo, então encurralado, dá a sua cartada final. Constrói-se a tese de que o impeachment não poderia ser acionado pelo presidente da Câmara, uma vez que ele estaria envolvido no Petrolão. É claro que Eduardo Cunha deve ser investigado e punido pelo seu envolvimento no Petrolão, mas uma coisa não tem nada a ver com a outra. Essa tese é absurda, uma vez que o pedido de impeachment em essência não pertence a Eduardo Cunha, mas ao povo, à sociedade civil brasileira representada pelo Congresso Nacional (Eduardo Cunha só é responsável pelo rito formal em colocar ou não os pedidos em votação).

Mas mais absurdas que a tese em si são as coincidências e as estratégias usadas pelo STF e pelo ministério Público. Já era sabido que Eduardo Cunha reprovaria todos os pedidos de impeachment para a oposição recorrer ao pedido em Plenário por maioria simples. Antes que isso ocorresse, os ministros do STF, Rosa Weber e Teori Zavascki, concederam liminares, sem embasamento constitucional, proibindo o rito e passando por cima das regras da Câmara.  É por essas e outras que o STF já entrou no hall da fama das manifestações populares (veja aqui).

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Se de um lado o STF trabalhava na operação anti-impeachment, do outro, o Ministério Público Federal (MPF) também tem sua contribuição. Estranhamente o Ministério Público tem uma certa seletividade na abertura de inquéritos, colocando Eduardo Cunha como o personagem principal do Petrolão, como observou o jornalista Reinaldo Azevedo. Não se trata de negar seu envolvimento, mas por que essa seletividade? Por que o MP não abriu inquérito contra Lula e seu filho diante da acusação feita por Fernando Baiano em sua delação premiada? Aos poucos vai se passando a ideia de que o Petrolão era um esquema de corrupção entre empreiteiras e o Congresso, sob o comando de Eduardo Cunha, sem envolvimento do Executivo. Por mais que esta tese fira a lógica, a racionalidade e o bom senso ao poupar o poder Executivo, parte da imprensa endossa a ideia, conforme demonstrado nessa entrevista com Hélio Bicudo (veja aqui).

No House of Cards tupiniquim, além de termos nossas Zoe Barnes de plantão, temos a presença das instituições de Estado como personagens ativos do roteiro e aliadas de Francis Underwood. Resta saber quem é o nosso Francis Underwood.

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Alan Ghani É economista, mestre e doutor em Finanças pela FEA-USP, com especialização na UTSA (University of Texas at San Antonio). Trabalhou como economista na MCM Consultores e hoje atua como consultor em finanças e economia e também como professor de pós-graduação, MBAs e treinamentos in company.

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