A bolha das avaliações no esporte: o novo perfil de investidores na NFL e os desafios do mercado

A entrada de financiadores individuais e a resistência de fundos de private equity indicam um ponto de inflexão nas dinâmicas de valuation e governança das franquias esportivas

Eduardo Mendes

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

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Ao longo do primeiro trimestre do ano passado, fundos exclusivos para a NFL estavam sendo alavancados em antecipação à flexibilização das regras que permitiria a entrada de mecenas na única liga do BIG 4 dos Estados Unidos que até então não havia acenado para o investimento institucional.

Enquanto o private equity se organizava para fazer um touchdown no futebol americano, a soma do valor dos 32 times da NFL chegava a US$ 163 bilhões, com o valuation médio de uma franquia superando os US$ 5 bilhões. No segundo semestre, a atualização mais recente do Sportico apontava que esse número já havia ultrapassado a casa dos US$ 6 bilhões.

Com uma avaliação recorde para uma equipe esportiva de US$ 8,6 bilhões, o San Francisco 49ers vendeu 6% para um trio de famílias da Bay Area. A negociação selada no mês passado foi o acordo mais recente em 12 meses desde que a NFL abriu as portas para investimentos limitados de private equity.

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Segundo os jornalistas Eben Novy-Willians e Jacob Feldman, do Sportico, uma proposta inicial de um importante fundo de PE para adquirir parte dos 49ers estava US$ 1,5 bilhão abaixo do valor acordado, indicando a diferença de percepção entre o capital institucional e os investidores individuais, em sua maioria super-ricos.

Essa mudança de apetite dos financiadores privados sugere uma adaptação nos modelos de aquisição. Em vez de buscar fundos de private equity, as franquias da NFL agora têm de ceder ao desejo de vaidade e prestígio de investidores de alto poder aquisitivo, menos interessados em retornos financeiros imediatos e mais em status e influência.

A pesquisa de Novy-Willians e Feldman revela que 21 novos investidores minoritários compraram participação nas franquias no semestre passado, sendo que 18 deles eram indivíduos ou famílias. Esse perfil, cada vez mais presente, deve continuar a dominar o cenário.

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Quando o capital diz não: a desistência de Blackstone e CVC

Na semana passada, a Blackstone Partners e a CVC Capital Partners afastaram-se discretamente da NFL, de acordo com apurações do Front Office Sports. Dois dos maiores nomes do setor de PE faziam parte de um consórcio que representava um dos quatro compradores que receberam aval da liga.

O repórter Ben Horney explicou que o grupo também inclui o Carlyle Group, a Dynasty Equity e a Ludis, esta última fundada e liderada por Curtis Martin, membro do Hall da Fama do Futebol Americano Profissional.

As outras três empresas selecionadas para fazer investimentos minoritários independentes em times são a Arctos Partners, Ares Management e Sixth Street Partners.

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De maneira irônica, Novy-Willians e Feldman dizem que a NFL interpretou equivocadamente a regra fundamental da economia.

Os limites invisíveis do capital institucional na NFL

Desde agosto passado, a NFL abriu as portas para investidores de private equity adquirirem até 10% das franquias, uma política que ainda restringe os fundos de forma considerável. Ligas como a NBA e MLB permitem até 30% de participação.

Esse limite e a exigência de uma governança passiva com a proibição de influenciar diretamente as operações das franquias reduziram o interesse dos fundos. Conforme explicou o FOS, o compromisso de indenização conjunta ilimitada, que responsabiliza os investidores individualmente por possíveis passivos legais, foi uma das razões alegadas por Blackstone Partners e a CVC Capital Partners para a desistência.

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De acordo com os dados mais recentes do PitchBook, 74 equipes esportivas da América do Norte, avaliadas em US$ 229,1 bilhões, já possuem alguma forma de conexão com private equity. No caso da NBA, 20 das 30 franquias contam com o apoio de investidores privados.

Esse movimento reafirma a relevância do private equity, especialmente em mercados saturados e onde as oportunidades de crescimento rápido são mais raras.

A bolha silenciosa que ameaça os valuations das franquias

As recentes declarações de Gerry Cardinale sobre os preços elevados de avaliação das franquias, entretanto, lançam uma luz crítica sobre o mercado.

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Em entrevista à CNBC há dez dias, o fundador da RedBird Capital Partners expressou sua preocupação com o que considera ser uma bolha de ativos, alimentada por um aumento excessivo nas avaliações das franquias. Ele alertou que a valorização das equipes, sustentada por contratos de direitos de mídia, pode não ser sustentável a longo prazo.

Cardinale ainda destacou que, embora o interesse por investimentos em equipes esportivas seja evidente, ele não vê valor em adquirir participações minoritárias, pois o controle limitado não oferece retornos substanciais.

“Uma participação de 10% não me dá controle suficiente”, frisou.

Do galês ao global: o efeito Wrexham e a busca por controle emocional

No cenário global, o caso do Wrexham AFC reafirma o momento dessa bolha. Comprado por apenas US$ 2 milhões em 2021, o clube galês está agora sendo avaliado em US$ 475 milhões. Essa super valorização reflete o poder de marca e a exposição midiática proporcionada pelos donos famosos, Ryan Reynolds e Rob McElhenney.

Nick Meacham, do SportsPro Media, analisou o valor de mercado do Wrexham com base em seu múltiplo de receitas de 7x. O resultado o coloca em um patamar de avaliação que rivaliza com algumas das maiores potências europeias, como Real Madrid e Manchester United, cujas avaliações são de US$ 6,75 bilhões e US$ 6,6 bilhões, respectivamente.

Esses movimentos no mercado indicam um ponto de inflexão: os investidores estão atrás de experiências de marca, com maior envolvimento e influência sobre o time. Ou seja, o que antes era apenas um investimento financeiro passou a ser uma oportunidade para se associar à narrativa e ao prestígio de equipes esportivas

Na minha coluna de maio, abordei como a entrada do private equity nos esportes está transformando a natureza do investimento em clubes. Em um mercado saturado, a capacidade de gerar novos fluxos de receita, como dados de fãs, licenciamento e conteúdo proprietário, será o principal motor de valor para os próximos anos.

Neste cenário, há novo grupo ascendente de investidores que exige mais controle sobre o espetáculo e a marca, algo que não pode ser simplesmente quantificado em números de retorno.

A mudança na dinâmica de investimentos no esporte reflete um reposicionamento no valor de mercado das franquias. As avaliações exorbitantes, impulsionadas pelos direitos de mídia e pela demanda crescente, estão inseridas em um contexto inflado, como alertado por Cardinale.

O caminho à frente depende de como essas franquias irão navegar em um mercado no qual os direitos de transmissão, a governança e o envolvimento dos fãs são fundamentais para sustentar o valor a longo prazo.

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Eduardo Mendes

Eduardo Mendes é estrategista em conteúdo e novos modelos de negócio para esportes, mídia e economia criativa. Com quase uma década no jornalismo esportivo, hoje atua com inteligência estratégica e inovação. É cocriador das newsletters The Block Point e Creative Moves, e esteve à frente de projetos como o ecossistema digital do Atlético-MG e os primeiros colecionáveis digitais da T4F.