Trabalhar na Americanas atrapalha o futuro da minha carreira? Especialistas respondem

Veja como saber se é preciso permanecer ou sair da empresa e como falar sobre o problema em novas entrevistas de emprego

Giovanna Sutto

(Getty Images)

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Sob recuperação judicial autorizada pela Justiça, a Americanas (AMER3) tem dívidas que alcançam os R$ 43 bilhões com mais de 16 mil credores. Todas as posições serão afetadas nesse processo: de fornecedores a acionistas passando por funcionários a consumidores.

Segundo especialistas consultados, no caso dos empregados, a legislação prevê que na recuperação judicial os contratos de trabalho precisam ser mantidos, e os salários pagos mensalmente. No entanto, não dá para excluir o risco de a situação financeira da empresa piorar e, no passo seguinte, vir a decretar falência em suas operações.

Nesse “clima de incertezas” quais os caminhos que os profissionais das Americanas devem seguir para suas carreiras? É hora de sair da empresa? Veja, a seguir, as respostas para as principais dúvidas sobre o tema.

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1. Como lidar com o ambiente de pressão?

Rebeca Toyama, especialista em estratégia de carreira e educação corporativa, afirma que esse momento é desafiador para os profissionais da Americanas porque o ambiente de trabalho provavelmente está cercado de insegurança e desconfiança.

“A segurança psicológica do profissional fica afetada. Ninguém sabe o que aconteceu e há o risco de o ambiente de trabalho ficar desconfortável pela falta de respostas e cada vez mais há um nível de desconfiança sendo nutrido do funcionário pela empresa, entre funcionário e líder, entre pares, entre todos”, diz.

Elza Veloso, especialista em gestão de carreira e professora da FIA Business School, acrescenta que um risco para os funcionários é se envolver em especulações. “O caso é público. Você ouve falar disso na televisão, na roda de amigos, no trabalho. Algumas especulações e suposições vão circular e o funcionário precisa se blindar disso para não afetar ainda mais seu dia a dia de trabalho”, orienta.

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2. Trabalhar na Americanas pode afetar o currículo?

Segundo especialistas consultados, os profissionais que estão na alta gestão da empresa podem ser os mais afetados. “Não tem como desassociar o que está acontecendo dos gestores, C-level e diretoria”, afirma Paulo Amaral, especialista em carreira e gestão de pessoas.

Rudney Pereira, sócio-diretor da BR Talent, acrescenta: “um analista da controladoria não tem sua carreira tão afetada ou até manchada como um executivo supostamente envolvido no escândalo”.

Rebeca Toyama, especialista em estratégia de carreira e educação corporativa, afirma que uma crise como a da Americanas afeta a imagem pessoal e marca profissional de todos os funcionários que estão trabalhando na empresa no momento em que o problema é tornado público.

“Para cargos de confiança e alta gerência, eu já vi empresas não contratarem um profissional porque ele passou por uma empresa muito associada a um determinado escândalo. Não é sempre e nem dá para cravar que vai ser assim, mas pode acontecer porque a trajetória daquela pessoa fica conectada de alguma forma com a empresa envolvida em algum problema”, diz Toyama.

Na visão da especialista, quando o profissional está em uma empresa com muita exposição midiática, a empresa, quem trabalha nela e o problema ficam relacionados. “É inconsciente e nem todo mundo, incluindo os recrutadores, consegue separar as situações e não associar o profissional ao problema”, afirma.

Por outro lado, a maioria dos profissionais que trabalha nos andares de baixo da pirâmide, como gerentes, coordenadores e analistas, foram pegos de surpresa com o rombo financeiro.

“Em uma crise de imagem e credibilidade da empresa é inevitável que os colaboradores sofram especialmente pela incerteza. As áreas relacionadas ao problema são mais impactadas. Equipes do financeiro, do jurídico, controladoria, compliance, devem estar enfrentando momentos de muita pressão. Todos os funcionários sentem a dificuldade do momento, mas entendo que os times comerciais, logística, de marketing, por exemplo, tendem a sentir um pouco menos por serem de áreas descorrelacionadas com o problema — pelo pouco que se sabe”, diz Pereira.

Os especialistas entendem ser natural que os profissionais que trabalhem na Americanas hoje sejam questionados em momentos futuros sobre essa trajetória na empresa enquanto a crise acontecia.

“Para cargos com menor grau de responsabilidade eu vejo um impacto indireto. Eventualmente a pessoa vai ter que responder algumas perguntas sobre o tema, mas não vai deixar de ser contratada somente por isso. Nem é justo porque muitos funcionários souberam do problema quando ele se tornou público”, avalia Pereira.

Leia também: O que é recuperação judicial? Posso receber indenização da empresa?

3. É hora de pedir demissão?

Os especialistas concordam que o pedido de demissão vai depender de cada profissional. “Mas é importante se questionar sobre isso. Independentemente da área em que o profissional atua, vale perguntar se ele ainda acredita que faz sentido trabalhar lá e se acredita na cultura da empresa. É importante refletir”, diz Pereira.

Durante o processo de recuperação judicial, a empresa segue arcando com os salários e verbas mensais dos funcionários, mas advogadas trabalhistas já pontuaram que há o risco de um calote por parte da empresa, a depender do plano de ação dela.

Ao pedir demissão durante a recuperação judicial, o profissional tem direito a verbas rescisórias, como saldo de salário, férias e 13° proporcional. O trabalhador não recebe a multa do FGTS porque pediu demissão, mas entra no plano de recuperação para receber as verbas.

Paulo Amaral, especialista em gestão de pessoas, enxerga dois caminhos:

Toyama entende que o profissional só deve sair da empresa se tiver uma outra vaga de emprego engatilhada. “Para não ter nenhuma penalização financeira na transição. Nesse processo, é importante atualizar os dados nas redes sociais, conversar com pessoas e reativar o networking para possíveis novas vagas. Tudo isso, claro, antes de pedir demissão”, diz.

Elza Veloso, especialista em gestão de carreira, orienta o profissional a pensar nele primeiro antes da empresa em um momento de recuperação judicial. “Se surgir uma oportunidade de trocar de emprego, diante das incertezas, considere com calma e reflita as opções”, diz.

Gianpiero Sperati, diretor de RH da Gupy, ressalta que se a decisão do funcionário for deixar a empresa é importante também ser transparente. “Independentemente do momento que a empresa atravessa, é muito importante que a saída do colaborador seja bem comunicada à liderança e com antecedência. Além disso, é recomendável que as tarefas em execução sejam finalizadas ou delegadas a outra pessoa de maneira que a saída não afete a operação da sua área. A boa postura pode manter as portas abertas não só com a empresa, mas com os colegas”.

Para ficar na empresa, o profissional tem que tomar um risco calculado, na visão de Toyama. “Ainda não se sabe se essa crise vai se reverter em uma superação. Tudo ainda está nebuloso. Então, o funcionário que ficar deve ter em mente o risco e contornar isso com um posicionamento proativo, focado em resultados e na colaboração, esta uma das habilidades do futuro, segundo o Fórum Econômico Mundial”, avalia.

Veloso acrescenta que muitas empresas estão passando por lay-offs (demissão em massa) e isso exige uma adaptação do profissional. “Ganhar experiência durante uma crise pode ser um grande aprendizado, pensar em novas rotas, ter o sangue frio, tomar decisão sobre pressão. É uma escolha encarar um desafio deste nível. Mesmo para o currículo pode ser um ponto positivo, ainda mais se a situação se reverter”.

Nessa situação encontram-se os executivos da Americanas: Sergio Rial, que decidiu deixar o comando da empresa nove dias após assumi-lo ao descobrir o rombo de R$ 20 bilhões, e João Guerra, CEO interino, que aceitou o desafio de administrar a empresa durante esse momento.

“Tem pessoas que vão fazer um movimento de saída e outras que não. Cada um pode olhar para sua carreira e ver como ela pode evoluir a partir disso”, pontua Veloso.

4. Qual a postura na próxima entrevista?

Se o profissional decidir sair, a melhor solução em um eventual próxima entrevista de emprego é ser transparente. Toyama explica que o profissional deve se preparar porque o tema vai ser mencionado na próxima entrevista porque é um case de grande repercussão.

“O recrutador deve questionar os motivos da saída. A dica é: não caia na armadilha de ficar informando o que aconteceu com a empresa. Será mais producente explicar os aprendizados, falar dos resultados e dos desafios superados, sempre em tom otimista. E explicar que a opção por sair ocorreu porque o clima de trabalho ficou insustentável ou a gestão ficou turbulenta”, orienta Toyama.

Veloso acrescenta que o profissional não pode deixar sua confiança diminuir. “O profissional precisa ter segurança sobre sua carreira. A empresa é só o local onde essa carreira vai se desenvolver. Ao fazer isso, o profissional mostra maturidade para o entrevistador, mostra que tem repertório”, afirma.

O InfoMoney publicou, recentemente, uma reportagem sobre recolocação profissional com dicas sobre a entrevista de emprego.

5. Transição de carreira

Cuidar da transição de carreira deveria ser um trabalho frequente de todo profissional.

“A transição de carreira é qualquer movimento que o profissional faz: seja interno, seja de posição, seja de empresa, seja para fora do país. E vários são os motivos que levam um profissional a querer isso: descontentamento com a atual posição; necessidade de ter novas experiências; alguma mudança na vida pessoal; e uma demissão repentina. Independentemente da causa, ter clareza de onde estamos e aonde queremos chegar é fundamental”, afirma Toyama.

Para conseguir se realocar em um outra posição, a especialista compartilha um passo a passo. Confira:

Inventário de competências

Separe suas competências em três categorias:

Mapeamento de mercado

Elaboração e atualização de materiais

Ampliação de network

Adicione na sua rotina os seguintes passos:

Cuide de seu bem-estar

Pessoas que apresentam uma narrativa positiva de sua jornada pessoal e profissional costumam se destacar. Em um momento de crise, o importante é cuidar do bem-estar.

Giovanna Sutto

Repórter de Finanças do InfoMoney. Escreve matérias finanças pessoais, meios de pagamentos, carreira e economia. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.