Americanas pode falir? Dá para cancelar uma compra? Veja 10 respostas sobre os direitos do consumidor

Varejista diz que mantém atendimento normal aos clientes, apesar do rombo financeiro

Giovanna Sutto

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A Americanas (AMER3) está no centro das atenções de investidores, acionistas e órgãos fiscalizadores após a revelação da inconsistência contábil de R$ 20 bilhões, que somada com a dívida bruta da empresa, de R$ 19,3 bilhões, abre um rombo de R$ 40 bilhões em débitos. Na equação, porém, também estão os consumidores, de olho no desenrolar desse imbróglio, que coloca em xeque a credibilidade da empresa.

Entre as dúvidas sobre a situação da companhia, os clientes querem saber se ainda é possível comprar produtos, se vão receber, se a entrega pode atrasar, se é possível cancelar um pedido, entre outros pontos. Em nota ao InfoMoney, a Americanas diz que “comunicou aos clientes e parceiros que segue aberta e pronta para suas compras e entregas, nas lojas, no site e no app”. A empresa, inclusive, está oferecendo descontos de até 50% em várias categorias e cashback de até 30% em sua queima de estoque.

Para complementar e dar mais detalhes sobre a situação, o InfoMoney consultou Guilherme Farid, chefe de gabinete do Procon-SP; David Douglas Guedes, advogado da área de relacionamento com o cliente do Idec; Raphaell Marden, advogado especializado em direito do consumidor; e Fabio Melo, advogado especializado em falência e recuperação judicial, ambos do Goulart Penteado, para responder as dúvidas sobre a situação dos consumidores da Americanas neste momento.

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Confira:

1. A Americanas faliu?

Não. A empresa enfrenta uma crise diante de dívidas muito altas, mas ainda “respira” enquanto avalia os rumos a serem tomados.

Na sexta-feira (13), a companhia obteve na Justiça a suspensão por 30 dias do vencimento antecipado de suas dívidas. Especialistas veem dois caminhos possíveis a partir disso: um deles é a negociação de uma injeção de capital com os bancos. O outro seria uma preparação para o pedido de recuperação judicial, alternativa que parece mais provável na avaliação da XP Investimentos, dado o tamanho da dívida da empresa e da potencial necessidade de capital, além do número de credores envolvidos. Mas, por enquanto, nada foi decidido.

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Nesta segunda (16), o Conselho de Administração da Americanas elegeu João Guerra Duarte Neto para ser o CEO interino da companhia. Ele é atualmente o Diretor (não estatutário) de Recursos Humanos da Americanas e tem ampla trajetória na companhia nas áreas de tecnologia e recursos humanos. Ele assume o comando da varejista após os recém-empossados Sergio Rial e André Covre renunciarem aos cargos de Diretor Presidente e de Diretor de Relações com Investidores.

2. É possível comprar produtos na Americanas?

Sim, a loja, site e app estão funcionando para compras.

As compras já realizadas devem seguir o cronograma normal de faturamento e entrega que foram pré-estabelecidas no ato da compra, em atenção à previsão do Código de Defesa do Consumidor (CDC) que determina o exato cumprimento da oferta no art. 30.

Leia também: O que é recuperação judicial? Posso receber indenização da empresa?

3. Há risco de não receber o produto?

É consenso entre os especialistas que, pelo menos por enquanto, os consumidores não precisam ter o receio de não receber suas compras porque a crise que a empresa enfrenta está voltada para a área contábil e ainda em fase de investigação pelos auditores.

A empresa continua obrigada a entregar os produtos, a cumprir os prazos, a devolver os valores em eventual arrependimento (cancelamento no prazo legal), a manter um bom relacionamento com o consumidor e a cumprir todas as obrigações impostas pela lei.

Na visão dos especialistas, a empresa precisa manter a sua clientela satisfeita e interessada em seus produtos e serviços, a fim de voltar a ter saúde financeira — afinal, as vendas são parte muito significativa da receita.

A situação deve ser monitorada, mas ainda não há razão para o consumidor deixar de fazer negócios com uma empresa que ele já conhece e com a qual ele já está acostumado a comprar, a menos que ela deixe de respeitar os direitos previstos no CDC.

4. O que acontece com o cashback da Ame?

A Ame, fintech do Grupo Americanas, tem um recurso muito conhecido pelos consumidores que é o cashback. Uma das dúvidas dos clientes é se há risco de perder o valor acumulado neste recurso diante da situação da empresa.

Os especialistas entendem que o saldo do cashback da Ame não pode ser atingido pela crise contábil enfrentada pela Americanas. Caso o consumidor identifique alguma inconsistência na conta, o primeiro passo é buscar o Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) da Americanas, segundo Marden, do Goulart Penteado.

Guedes, do Idec, afirma que o cashback é um direito adquirido, e a empresa não pode bloquear esse valor da carteira digital do consumidor, por motivos alheios ao seu próprio regulamento. “De todo modo, é importante o consumidor fazer registro de seus saldos de cashback, a fim de se resguardar no caso de alguma prática abusiva”, sugere.

5. É possível cancelar uma compra na Americanas?

Sim. A crise contábil enfrentada pela Americanas, por si só, não altera as regras de cancelamento. Por isso, conforme dispõe o artigo 49, do Código de Defesa do Consumidor, o cliente poderá exercer o direito de arrependimento e cancelar a compra, no prazo de sete dias, a contar da compra ou do ato de recebimento do produto, desde que tenha realizado a aquisição através do site da empresa ou por telefone.

O cancelamento não vale para compras em lojas físicas. A devolução do valor pago deve ser imediata e, se for o caso, deve incidir correção monetária, segundo o Idec.

6. E se atrasar a entrega, posso desistir do produto?

Sim. O Código de Defesa do Consumidor impõe ao fornecedor o cumprimento da oferta, em todos os seus termos, incluindo-se o prazo para entrega.

Assim, caso a entrega não seja realizada no prazo estipulado no ato da compra, o consumidor poderá requerer o cancelamento da compra, com direito à restituição do montante pago, segundo o art. 35 do CDC. Caso queira, o cliente também pode insistir na entrega dos produtos e obter uma nova previsão de entrega e também é possível aceitar produto alternativo, com qualidade equivalente, sem acréscimo de preço.

“Se a empresa atrasar a entrega do produto por mais de 30 dias o consumidor pode, ainda, escolher entre pedir dinheiro de volta ou usar o valor como crédito”, diz Farid, do Procon-SP.

Se o cliente não quiser cancelar ou desistir da compra, a recomendação inicial é de que o consumidor contate a empresa, para apurar o ocorrido. Os especialistas ressaltam que o atendimento ao cliente da Americanas segue funcionando.

7. É possível trocar um produto?

A crise, por ora, não altera as regras de troca e devolução. O consumidor deverá observar os requisitos necessários parar realizar a troca de um produto, já estabelecidas no ato da compra.

“Observadas as políticas e prazos da loja, é totalmente possível realizar a troca, já que a empresa segue tendo de cumprir com suas obrigações legais e contratuais”, ressalta Guedes.

8. Submarino e Shoptime estão sujeitas às mesmas regras que as Americanas?

Sim, as empresas do mesmo conglomerado devem prosseguir com suas atividades normalmente e, portanto, devem seguir as regras do CDC e demais leis aplicáveis às suas atividades.

9. E se a Americanas entrar em recuperação judicial, como ficam as compras?

Fabio Melo, advogado da área de falências, explica que na hipótese de a Americanas ingressar com o pedido de recuperação judicial e ter o processamento aceito, os direitos dos consumidores permanecerão inalterados.

“Esse procedimento judicial serve para preservar a continuidade das atividades, estabelecendo novos termos e condições, exclusivamente, com seus credores. Assim, nas relações de consumo, as obrigações, o atendimento e serviços de entrega deverão ser mantidos com a mesma qualidade, não afetando o estoque já negociado”, explica

De qualquer maneira, se a recuperação judicial acontecer e o consumidor tiver qualquer intercorrência poderá adotar as medidas administrativas disponíveis, acionando o Procon da sua cidade e registrando sua reclamação formalmente junto à plataforma consumidor.gov.

Guedes, do Idec, ressalta que mesmo em um caso de recuperação judicial a empresa precisa seguir respeitando o CDC e continuar fazendo vendas. “A companhia precisa ter ‘fôlego’ durante o processo de reestruturação”, explica.

10. E se a Americanas falir?

No caso de uma eventual falência da Americanas a situação muda. “O consumidor pode perder alguns direitos, inclusive em relação a mercadorias já compradas”, diz Farid, do Procon-SP.

Isso porque no processo de falência de uma empresa, o pagamento aos credores é realizado até o limite de seus ativos e bens, respeitando uma ordem específica para o pagamento prevista no artigo 83, da Lei de Falências.

“Em síntese, a lei estabelece que, após a identificação e venda dos bens, serão pagos os credores trabalhistas em primeiro lugar, depois os credores com garantia, credores tributários e então os credores quirografários, classe em que se enquadram os consumidores”, complementa Melo.

Farid acrescenta que, como os consumidores não têm preferência na lista de pagamentos, podem perder alguns direitos. Mas vale lembrar que é uma situação bem extrema e que, por enquanto, trata-se de uma hipótese.

Mesmo assim, caso seja decretada a falência da Americanas, o consumidor pode fazer o pedido de ressarcimento, por meio de um processo judicial, contra a Americanas para reaver seu dinheiro, caso tenha comprado produtos e não tenha recebido, por exemplo.

Giovanna Sutto

Repórter de Finanças do InfoMoney. Escreve matérias finanças pessoais, meios de pagamentos, carreira e economia. Formada pela Cásper Líbero com pós-graduação pelo Ibmec.