Qual é o impacto do novo coronavírus sobre a política e a agenda de reformas?

Com o avanço do coronavírus sobre projeções econômicas, o mundo político também começa a estimar os danos provocados pela doença

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – A propagação do novo coronavírus pelo mundo, nas últimas semanas, teve forte repercussão nos mercados e provocou uma série de revisões para baixo nas estimativas de instituições financeiras para o crescimento econômico global.

A China, epicentro da doença, viu sua atividade industrial registrar em fevereiro o pior desempenho da história, enquanto as bolsas americanas tiveram a semana mais fraca desde a crise financeira de 2008. No Brasil, dois casos foram confirmados e especialistas passaram a refazer os cálculos para os impactos econômicos esperados.

Para além de indicadores menos animadores para a economia local, diversas instituições financeiras passaram a trabalhar com um cenário de efeitos mais severos do coronavírus sobre a atividade. Só na semana passada, os bancos Citibank, Safra, Bradesco e BNP Paribas cortaram projeções para o desempenho da economia brasileira. Antes, UBS, JP Morgan e Santander já o haviam feito.

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Com o avanço do coronavírus sobre projeções e indicadores econômicos, o mundo político também já começa a fazer as estimativas dos danos provocados pela doença. Neste caso, a pergunta que interessa aos investidores é como como os atores políticos devem reagir à nova conjuntura.

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A possibilidade de crescimento menor da economia deve elevar a pressão política sobre o ministro Paulo Guedes, que já vem sendo cobrado por resultados concretos. No mercado, há preocupação com os impactos da doença sobre a agenda de reformas em tramitação no Congresso Nacional.

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Estão na lista as três PECs do chamado pacote “Mais Brasil”, enviado pelo governo em novembro do ano passado: 1) Emergencial; 2) dos Fundos; e 3) Pacto Federativo. Também figuram a reforma tributária, que tramita em comissão mista no parlamento, e a reforma administrativa, ainda não encaminhada pelo governo.

Além dessas pautas, há medidas como o projeto de autonomia do Banco Central, o novo marco legal do saneamento básico, a nova legislação sobre concessões e PPPs, além das reformas nos setores de óleo e gás, elétrico e de mineração.

Apesar da preocupação de investidores, analistas da consultoria Arko Advice avaliam que o novo coronavírus deve afetar pouco o humor dos parlamentares. Para eles, o compromisso do Legislativo com essa agenda continua existindo.

“A aprovação das reformas dependerá muito mais de fatores internos, como o engajamento de lideranças políticas, o relacionamento entre o Executivo e o Legislativo, as eleições municipais e a complexidade das próprias matérias em debate”, observam.

“Nesse sentido, as tensões recentes entre o presidente Jair Bolsonaro e o Congresso Nacional têm gerado mais preocupação entre os agentes econômicos”, pontuam.

A própria Arko, em um levantamento feito com 106 deputados federais, entre 4 e 13 de fevereiro (antes, portanto, da recente onda de preocupação com o avanço da doença pelo mundo), mostrou que apenas 9,43% acreditavam o impacto na economia brasileira seria intenso ou muito intenso. Já 50% avaliavam que seria baixo ou nenhum. Para 36,79%, seria médio.

Eles acreditam, no entanto, que a queda na atividade econômica global e a nova percepção de risco dos investidores pode afetar a aposta do governo brasileiros na agenda de privatizações e concessões. “Com a economia global crescendo menos, investimentos podem ser adiados”, afirmam.

Já os analistas da Eurasia Group veem chances de o parlamento acelerar a tramitação de reformas estruturais no curtíssimo prazo, mas chamam atenção para riscos de “deslizes fiscais” ao longo do tempo.

Em uma lista de quatro riscos para a política brasileira elaborada pela consultoria, a preocupação com o baixo crescimento econômico, potencializado pelo coronavírus, é considerada a maior preocupação.  Também são levados em conta os atos anti-Congresso; a ameaça de uma onda de greves de policiais militares; e investigações sobre grupos paramilitares e possíveis conexões com a família do presidente.

“Sempre argumentamos que uma perspectiva construtiva no Congresso dependia em parte da recuperação da economia”, pontuam.

“Uma recuperação econômica em 2020 seria fundamental para os legisladores continuarem vendo a aprovação de reformas fiscais, tributárias e administrativas como sendo de seu próprio interesse. Se o crescimento vacilar e as tensões sociais aumentarem, os incentivos no Congresso podem mover em direção a propostas fiscalmente irresponsáveis”, complementam.

Eles acreditam, porém, que se o choque de crescimento vier de um quadro agudo de ameaça global, a tendência é que a primeira reação dos congressistas seja construtiva. Ao menos este tem sido o histórico do parlamento brasileiro em momentos de crise econômica, sobretudo se provocada por fatores externos.

Neste caso, os analistas dizem ser possível acreditar na aprovação da reforma tributária como uma resposta da classe política ao cenário de baixo crescimento ou mesmo a PEC da Emergência Fiscal (PEC 186/2019). Por outro lado, um risco colateral de longo prazo seria uma pressão incontrolável pelo aumento de despesas não vinculadas ao teto de gastos.

“Em outras palavras, enquanto o Congresso pode avançar mais rapidamente com reformas estruturais como a tributária, o conjunto das reformas fiscais poderia sofrer”, dizem.

Os riscos, argumentam os analistas, crescem considerando a dinâmica legislativa a partir do ano que vem, quando Rodrigo Maia (DEM-RJ), um dos fiadores da agenda de reformas, deve deixar a presidência da Câmara dos Deputados. A aproximação das eleições gerais e a possibilidade de Bolsonaro dobrar aposta na polarização com o parlamento também ampliam o risco.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.