Pilar de credibilidade do governo com mercado, o ajuste fiscal está ameaçado?

Um passo em falso poderia provocar desconfiança ainda maior no mercado financeiro, uma das principais forças da coalizão formada desde o impeachment

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – Desde que assumiu o comando do governo em meio ao processo de impeachment de Dilma Rousseff, o presidente Michel Temer tem levado como uma das prioridades de seu governo a aplicação de medidas que possibilitem o ajuste das contas públicas brasileiras. Em torno deste e outros elementos construiu-se uma coalizão capitaneada por importantes agentes econômicos e membros do Congresso Nacional, que, em meio à crise gerada pela delação dos empresários da JBS, tem tido seus limites testados.

O chamado “Friboigate” enfraqueceu o governo semanas antes do que os ensaios indicavam como a primeira votação da proposta de emenda constitucional da reforma da Previdência no plenário da Câmara dos Deputados e já impõe obstrução à pauta impopular tocada pelo peemedebista. Desde então, a prioridade do governo, apesar das tentativas de se dar ares de normalidade à conjuntura dramática, tem sido manter-se no poder.

A substituição do comando no ministério da Justiça e a absolvição da chapa Dilma-Temer no Tribunal Superior Eleitoral em julgamento que podia determinar sua cassação são alguns dos exemplos mais claros dos novos esforços do governo peemedebista. Mas, como tem sido dito nos últimos dias, a crise está longe de chegar ao fim, embora o momento para Michel Temer hoje seja muito mais favorável — ou melhor, muito menos desfavorável — em comparação com semanas antes, visto que há um nítido congelamento nas tratativas de bastidores sobre eventual sucessão em caso de eleições indiretas. Nada, porém, que não possa ser retomado nos próximos dias, a depender das circunstâncias.

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A vitória no caso que ameaçava cassar a chapa eleita em 2014 e, por tabela, remover Michel Temer da presidência deslocou o campo de batalha do governo do TSE para o Supremo Tribunal Federal e a própria Câmara dos Deputados. Isso porque já é dada como certa apresentação de denúncia contra o peemedebista por parte do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Não se sabe quando isso ocorrerá, mas a certeza é que agora o tempo joga contra Temer. Caso as expectativas se confirmem, a tramitação se daria na forma de ação penal contra o presidente e não caberia emendas posteriores pela acusação. A bala de prata de Janot é julgada pelo STF, mas, antes de ser instaurado, o processo dependeria de autorização pelo plenário da Câmara por maioria de 2/3 — derrota hoje muito difícil de ser sofrida nesta dimensão pelo governo.

Nesse sentido, o governo já atua para garantir o apoio mínimo a evitar a abertura do processo no Supremo, o que culminaria no afastamento do presidente por até 180 dias. Para tal, ampliou-se o leque de concessões na área econômica. O “pacote de bondades” avaliado inclui desde parcelamentos de débitos de contribuintes com descontos em multas e juros (os chamados Refis) até propostas de crédito subsidiado e estudos conduzidos pela ala política sobre possíveis alterações no Imposto de Renda Pessoa Física.

Quaisquer dessas medidas têm impacto no quadro fiscal da União, seja com redução de receitas, seja com gastos adicionais, justamente em um momento em que o governo encontra dificuldade para cumprir a meta. A Instituição Fiscal Independente do Senado divulgou ontem um relatório em que prevê déficit de R$ 144,1 bilhões este ano, mais do que o projetado pelo governo, um resultado negativo em R$ 139 bilhões. Em reunião com 16 governadores, o Temer ofereceu uma renegociação de dívidas com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), transformando débitos em títulos negociáveis. O desconto negociado é de R$ 6 bilhões.

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Como se não bastasse, nesta quarta-feira (14), o jornal Valor Econômico informou que uma nova frustração de receitas foi registrada em maio e a baixa arrecadação coloca em risco o cumprimento da meta fiscal de 2017. Com base em dados do sistema eletrônico de despesas e receitas da União, a reportagem conta que o último mês registrou resultado negativo mesmo com o ingresso de cerca de R$ 2,5 bilhões do Programa de Regularização Tributária. Nos quatro primeiros meses do ano, houve uma frustração de R$ 19,6 bilhões dos tributos federais, sobretudo daqueles mais relacionados com a atividade econômica — caso da Cofins e o Imposto sobre Produtos Industrializados.

A prova da fragilidade do governo desde a crise envolvendo o encontro entre Temer e o empresário Joesley Batista é que antes as flexibilizações no texto original da reforma da Previdência enviado ao parlamento eram o tema principal das discussões. Agora, as regras nas aposentadorias estão em stand-by e já se especula sobre o não cumprimento da meta fiscal estabelecida para o ano. Um passo em falso no ajuste fiscal poderia provocar desconfiança ainda maior no mercado financeiro.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.