Para analistas, debate sobre privatização da Petrobras é ‘espuma’ do governo

A quatro meses da eleição, Bolsonaro dobra aposta nas críticas à política de preços da companhia e busca resposta midiática contra inflação

Fábio Matos

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Em mais um capítulo da queda de braço entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o comando da Petrobras (PETR3 ; PETR4), a eventual privatização da estatal voltou ao debate público por iniciativa do próprio chefe do Executivo. Segundo analistas que participaram do Timing Político, exibido pelo canal do InfoMoney no YouTube, trata-se de uma nova tentativa do governo federal de reagir politicamente diante da preocupação generalizada com a inflação.

Em entrevista ao apresentador Carlos Massa, o Ratinho, divulgada nesta semana, Bolsonaro reiterou suas críticas aos reajustes nos preços dos combustíveis e afirmou que uma eventual privatização da Petrobras levaria alguns anos para ser concretizada.

Uma ideia era fatiar a Petrobras. Realmente, não está dando certo atualmente. Apesar de estar na nossa Constituição a sua função social, ela não está cumprindo”, disse o presidente da República. “A Petrobras não pode continuar a usar a paridade de preço internacional, sendo que nós somos autossuficientes – não somos autossuficientes em refino –, sempre repassando isso para o povo”, completou.

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A política de preços dos combustíveis está vinculada à flutuação do valor praticado no mercado internacional. No dia 23 de maio, houve mais uma troca no comando da Petrobras, com a saída de José Mauro Coelho e a indicação de Caio Paes de Andrade para o cargo. No mandato de Bolsonaro, já haviam passado pela presidência da empresa o economista Roberto Castello Branco e o general Joaquim Silva e Luna.

“O nome disso é espuma. Não vai privatizar neste governo. Sabe-se lá se este governo será o mesmo do próximo mandato”, afirmou o cientista político Carlos Melo, professor do Insper. “O Congresso Nacional não se reunirá para discutir isso. É um tema complicado. Há muitos interesses contra e lobbies por todos os lados”, prosseguiu.

Para Melo, “privatização não pode ser um dogma” e deve ser tratada com seriedade. “Não é assim. De repente, por contingência, começa a falar em privatizar. Talvez o melhor até fosse [a privatização]. Quando o mercado puder fazer bem, é melhor que faça. Quando houver falha de mercado, o governo não tem outra alternativa a não ser fazer. E ninguém acredita que vai privatizar e diminuir o preço. Não é essa a questão”, apontou.

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O publicitário Lula Guimarães, consultor de marketing político e eleitoral, destacou o caráter midiático da fala de Bolsonaro. “Já que o governo não pode baixar o preço do combustível à força, atitudes como essa são, de fato, uma espuma. É uma tentativa de sinalizar à população que uma possível privatização poderia resultar em queda de preço. Não necessariamente isso vai acontecer”, disse.

“Não tenha dúvida nenhuma de que, se houvesse chance de o presidente utilizar a mão pesada do governo para baixar o preço da gasolina, já teria feito. Outros governos, em momentos pré-eleitorais, já tiveram atitudes eleitoreiras com essas intervenções”, completou Guimarães.

Paulo Gama, analista político da XP, lembrou que Bolsonaro vem tentando se eximir de qualquer responsabilidade sobre a escalada de preços. “Não é um movimento estruturado de início. É o estresse de um movimento. Já que ele não consegue interferir e há uma série de blindagens na Petrobras, ele agora fala em se desfazer da companhia. O que me parece é que há uma estratégia para continuar terceirizando a responsabilidade para a Petrobras”, afirma.

Com base nas pesquisas, Gama pontua que a defesa da privatização da empresa “não encontra respaldo no eleitor médio”. “A maioria da população não se mostra favorável à venda da estatal. A percepção é que a privatização acarretaria uma alta de preços”, diz. “A aprovação a uma eventual venda da companhia só se torna majoritária se houver clareza de que o preço se reduzirá. Talvez seja essa a batalha de comunicação do governo.”

Choque com governadores

Uma das apostas da base governista no Congresso é a aprovação, pelo Senado, do Projeto de Lei Complementar (PLP) 18/2022, que fixa um teto para a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis e energia.

A proposta, já aprovada na Câmara, define, para fins de tributação, que combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo são itens essenciais e indispensáveis. O objetivo é impedir que essas categorias sejam equiparadas a produtos ou serviços considerados supérfluos, que têm maiores alíquotas de tributos. O projeto desagrada governadores – que temem uma perda substancial de arrecadação dos estados – e pode ser judicializado.

Segundo Paulo Gama, a tendência é que o texto passe no Senado. “Há uma pressão dos governadores e a perspectiva de que possa haver alguma mudança ou uma calibragem mais favorável aos estados. Mas não uma decisão que desconfigure completamente o projeto”, explica. “É mais difícil fazer campanha com a gasolina a R$ 7 do que a R$ 5.”

Carlos Melo, por sua vez, pondera que um novo choque entre Bolsonaro e os governadores pode ser prejudicial para o governo neste momento. “Você pode comprar briga com governador, pode mexer no ICMS… Mas se isso não baixar o preço na bomba, não tem efeito algum. Você só comprou briga, se desgastou e não resolveu nada”, aponta. “O presidente está lavando as mãos. Se é verdade que o preço internacional não é culpa dele, em grande medida a apreciação do dólar é resultado de todos esses abalos e turbulências que o governo não tem conseguido diminuir.”

Na avaliação de Lula Guimarães, a prioridade da campanha de Bolsonaro nos próximos meses será aproveitar as inserções publicitárias na TV para tentar diminuir a rejeição.  “O grande desafio do presidente é que agora ele terá uma exposição grande, a partir de agosto, com a propaganda eleitoral. Ele vai procurar mostrar para os brasileiros sua agenda positiva, para se contrapor à desaprovação que recebe”, projeta. “O que não se sabe é se dará certo falar dessa agenda positiva e se ela terá peso suficiente para encobrir a realidade da inflação”, conclui.

Assista, na íntegra, ao Timing Político desta semana no vídeo acima ou clique aqui. O programa é exibido ao vivo sempre às quartas-feiras, às 18h (horário de Brasília), no canal do InfoMoney no YouTube.

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Fábio Matos

Jornalista formado pela Cásper Líbero, é pós-graduado em marketing político e propaganda eleitoral pela USP. Trabalhou no site da ESPN, pelo qual foi à China para cobrir a Olimpíada de Pequim, em 2008. Além do InfoMoney, teve passagens por Metrópoles, O Antagonista, iG e Terra, cobrindo política e economia. Como assessor de imprensa, atuou na Câmara dos Deputados e no Ministério da Cultura. É autor dos livros “Dias: a Vida do Maior Jogador do São Paulo nos Anos 1960” e “20 Jogos Eternos do São Paulo”.