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Presidente da Câmara no segundo governo Lula, líder no Congresso nos governos Lula e Dilma, o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) assume agora a liderança da maioria na Câmara. Ele afirma que o projeto de anistia, apresentado pelo PL, não morreu e considera que criar uma comissão especial para analisar o tema seria um recuo. “Tem que que ficar com um olho no gato, outro na sardinha”, alerta, em entrevista ao InfoMoney.
Como líder da maioria, Chinaglia diz que precisa corresponder às expectativas da base e decidir em conjunto a orientação em relação às pautas do governo. O deputado define como prioridades projetos para distribuição de renda, como o da isenção do imposto de renda até R$ 5 mil, além da taxação dos mais ricos.
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Ele diz ainda que é preciso tirar o caráter de suspeição das emendas parlamentares. “Todo mundo critica a emenda, mas não tem nada mais popular no Congresso Nacional hoje do que emenda. Isso pode até ser uma tragédia, mas é assim”, avalia.
Chinaglia admite que o governo precisa se reconectar com as bases para recuperar a popularidade. “É uma dificuldade óbvia para o governo, nós perdemos apoio de quem votou em nós, inclusive, historicamente. Maior desafio é identificar o que está provocando isso”, afirma.
Em relação às barreiras comerciais impostas pelo governo Trump, ele acredita que pode ser uma janela de oportunidade para o Mercosul, inclusive, para o Brasil que é exportador de matérias primas para os Estados Unidos.
Confira abaixo a entrevista ao InfoMoney pelo líder da maioria na Câmara:
InfoMoney: O senhor assume agora a liderança da maioria na Câmara. É mais um líder do partido do presidente Lula, além do líder do próprio PT e do governo. Significa uma concentração da articulação política nas mãos do PT?
Arlindo Chinaglia: A minha indicação não teve nada a ver com o PT. A escolha da liderança da maioria parte da Câmara dos Deputados. Eu fui indicado pelos líderes da maioria, não apenas pela minha posição partidária. Então, eu tenho que corresponder à expectativa deles. É evidente que eu defendo pautas que representam em grande medida a concepção do próprio governo. Eu coloco como centro o seguinte: eu fui eleito por este conjunto aqui, é com este conjunto que eu começo a conversa, é com este conjunto que nós vamos analisar as matérias. Se nós orientarmos para votar com o governo, isso será feito em conjunto, até porque eles também compõem a base do governo. Me incomoda este argumento: o PT tem isso, tem aquilo. PT é o segundo maior partido da federação, tem legitimidade
IM: Na sua visão como líder da maioria, qual a pauta prioritária para votação este ano na Câmara?
AC:– Se depender da minha percepção, tudo que for para distribuir renda é prioridade, tudo que for para taxar os mais ricos, imposto de renda, quero que seja prioridade. Quero que renúncia fiscal seja debatida, porque, geralmente, renuncia fiscal é conquistada por gente que tem muito dinheiro.
IM: Com a concentração das emendas nas mãos do Congresso, o que é possível negociar com o que resta para o governo?
AC: As emendas impositivas estão sendo ajustadas num trabalho que envolve o Congresso, o Judiciário e, de certa maneira, também o governo. Quando o Judiciário entra, é o Congresso que tem que dar as respostas. As tratativas estão sendo feitas e, neste momento, o governo não tem que opinar. Mas é o Executivo que executa o Orçamento. E é claro que os valores das emendas impositivas trouxeram sim um conflito entre o Executivo e o Legislativo. Uma das hipóteses para o governo seria contar com um deputado da base, uma bancada ou um partido para colocar uma parte das suas emendas em programas do governo. Mas, mesmo sendo base do governo, o parlamentar pode não concordar com determinado programa. Como contrapartida para deputados que fizessem isso, o governo daria o crédito. Acho que seria uma conciliação, mas isso não está no horizonte. No momento, o mais importante é a negociação entre o Judiciário e a Casa, porque tem que tirar da emenda o caráter de suspeição. Todo mundo critica a emenda, mas não tem nada mais popular no Congresso Nacional hoje do que emenda. Isso pode até ser uma tragédia, mas é assim.
IM: O projeto de anistia, que a posição tenta aprovar, está morto??
AC: Não morreu. Eles mudaram a tática. Como os lideres não assinaram, agora estão buscando assinaturas individuais, por isso digo que não morreu. Se continuar no ritmo das assinaturas que colocaram, chega fácil nas 257, mas acredito que isso não vai continuar. Tem que ter uma ação imediata [para impedir]. A imprensa joga um papel importante aqui, porque temos que falar para fora. Em um dado momento, se cogitou fazer uma comissão especial, mas estou contra esta ideia. Se a gente conseguiu segurar com os lideres até agora, criar uma comissão especial seria um recuo. Tem que ficar com um olho no gato, outro na sardinha
IM: O Congresso aprovou o projeto de barreiras tarifárias. O que ainda pode ser feito tanto pelo legislativo como pelo executivo para defender o Brasil da política de tarifas do presidente americano Donald Trump?
AC: O Brasil não foi dos maiores taxados, ficou ao lado da Argentina do Milei [aliado de Donald Trump]. Eu diria que Trump entende o papel do Brasil, porque é um país economicamente forte. A economia brasileira de certa maneira complementa a economia americana, para o bem e para o mal, porque não temos tecnologia, exportamos só produtos primários. Se o mundo entrar em recessão, o Brasil vai sofrer também, mas todo mundo vai saber que a culpa é do Trump. Eu vejo uma maior oportunidade para os países do Mercosul. Apesar dos riscos, não estou tão pessimista quanto o que vai acontecer com o Brasil.
IM: O governo tem apresentado sucessivas quedas de popularidade. Ainda é possível reverter esta tendência?
AC: É uma dificuldade óbvia para o governo, nós perdemos apoio de quem votou em nós, inclusive, historicamente. Maior desafio é identificar o que está provocando isso. Todo mundo fala do preço do alimento, deve ter este efeito, mas há publicações que mostram que o reajuste do salário supera a inflação. Se a gente considerar o próprio Nordeste e a periferia de São Paulo, nós do PT estamos perdendo apoio. Tem a ver com uma insatisfação óbvia, qualquer um fica insatisfeito se espera mais e não obtém. Fica insatisfeito se nem o básico você está atingindo. Mas tem outro elemento, além da economia. Eu acho que, na disputa politica ideológica, nós estamos aquém do necessário. Você tem as plataformas digitais, você tem algoritmo, tem o dinheiro de gente muito rica e a extrema direita, como a do resto do mundo, não tem nenhum pudor. Eu não diria que eles dialogam melhor, eles mentem mais, muito mais. E as pessoas são crédulas. Nós temos um desafio, o maior de todos, que é exatamente reconectar a partir daquilo que as pessoas pensam. Isso demanda trabalho permanente e intenso.
IM: Além da comunicação tem a questão política, que o senhor coloca. O que é possível fazer a partir do Congresso??
AC: O Congresso falar para dentro é perda de tempo. Você não vai convencer um deputado bolsonarista que ele está errado. Aqui, nós temos que falar para fora. Você esta debatendo aqui, mas o olho tem que estar para fora. Aí, entra inclusive o papel dos partidos políticos, porque hoje os partidos têm uma militância de Whatsapp. Eu não acredito que as pessoas mudam de opinião pelo Whatsapp ou redes sociais. As pessoas vão ali para encontrar aquele que verbaliza o que elas já pensam. O que digo quando faço reunião com a militância do PT? Qual o trabalho que o PT faz na cidade? Porque tudo que acontece, a resposta é que o Lula esta fazendo um bom governo. A maioria dos deputados não sabe fazer um discurso para o estado onde ele atua. Todo mundo faz referencia ao governo federal. Então, eu acho que nós temos que mostrar para a sociedade o que nós estamos defendendo, o que nós estamos fazendo. Inclusive, na prática.