Na prática, PP e PDT já romperam com Dilma e governo tem menos de 50% da Câmara

Perdendo o apoio de PP (40 deputados) e PDT (19 deputados), o Planalto passaria a contar com 244 parlamentares, em tese, governistas - menos da metade dos 513 deputados em atividade na Câmara

Marcos Mortari

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SÃO PAULO – As recentes votações pela aprovação de medidas provisórias para o ajuste fiscal do governo na Câmara tornou ainda visíveis os conflitos internos na base aliada nos últimos dias. Ao contrário da rebeldia que antes se via sobretudo no comportamento do PMDB, principal sigla governista, responsável por impor grandes derrotas ao governo, outros partidos também começaram a se opor às indicações do Planalto e provocar dores de cabeça à presidente da República, Dilma Rousseff e sua equipe econômica.

Aparentemente, a epidemia iniciada com as movimentações de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) antes mesmo de sua eleição como presidente da casa, se alastrou e hoje põe em xeque a governabilidade da presidente. Hoje, a briga com o governo se alastrou por PP e até mesmo o PDT, que já chegou a ser um fiel escudeiro pela governabilidade de gestões petistas no passado. De acordo com dados do Basômetro, ferramenta desenvolvida pelo Estadão Dados para medir a fidelidade de parlamentares às orientações do Planalto, os trabalhistas apresentam uma média de alinhamento de 51% durante o segundo mandato de Dilma, contra 76% nos quatro anos anteriores.

Já no PP, a queda foi de 80% para 55%. As duas siglas apresentaram movimento baixista mais expressivo que o próprio PMDB, alvo de grandes preocupações dos articuladores do governo. A fidelidade do partido do vice-presidente Michel Temer minguou da média de 79% durante o primeiro mandato de Dilma para 68% nesses cinco primeiros meses de 2015.

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Ampliação na fidelidade partidária no comparativo entre as duas gestões de Dilma foi vista apenas nos recém-criados PSD e PROS – a explicação mais racional seria o clássico toma lá dá cá: em troca de auxílio para o registro das siglas, cresce o apoio ao governo. Nos dois principais partidos de oposição – PSDB e DEM -, ocorre movimento similar ao visto durante os dois mandatos de Lula. O alinhamento das duas siglas oscila entre 25% e 40%.

As tabelas abaixo mostram um pouco melhor esse cenário. Primeiro, o comportamento dos partidos que formam a teórica base aliada (usando como critério o apoio à reeleição de Dilma no ano passado):

Partido Deputados em 2015 Fidelidade
Lula I Lula II Dilma I Dilma II
PT 63 95% 97% 94% 93%
PMDB 67 83% 90% 79% 68%
PSD 34 69% 72%
PP 40 83% 90% 80% 55%
PR 34 91% 76% 78%
PROS 12 77% 78%
PDT 19 77% 91% 76% 51%
PCdoB 13 92% 94% 91% 87%
PRB 20 25% 93% 83% 82%

A seguir o comportamento dos principais partidos da oposição:

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Partido Deputados em 2015 Fidelidade
Lula I Lula II Dilma I Dilma II
PSDB 53 39% 27% 36% 25%
DEM 22 35% 31% 38% 35%

Fontes: Basômetro/Estadão Dados; Câmara dos Deputados

Para o economista e professor das Faculdades Integradas Rio Branco Carlos Eduardo Stempniewiski, existe um processo inexorável e permanente de desgaste e perda de apoio em curso na base do governo no Congresso, que se explica pela queda de popularidade e credibilidade de Dilma junto à população, perda de capital político, elevada longevidade da gestão petista, além dos problemas econômicos e a ampliação da fragmentação partidária. “Hoje, o governo está fraco e sendo atropelado pelas alianças que estabeleceu ao longo desses últimos doze anos com relativo sucesso. Ele acaba se tornando refém da estrutura que montou. Os partidos políticos estão deixando a coligação para buscar outras opções, visando sua sobrevivência”, explicou.

O resultado dessa combinação de fatores seria a ingovernabilidade e uma maior ousadia dos partidos da base, que agora passam a exigir mais em troca de apoio. Ficar do lado de um governo fragilizado torna-se caro em termos políticos. “A tendência nesses três anos e meio de governo Dilma é a relação piorar. À medida que ele vai se fragilizando, o espaço de manobra para chantagem dos partidos da base aliada aumenta. Como, por exemplo, uma maior fatia do bolo na repartição de cargos públicos. Mas não tem bolo para todo mundo. Em última instância, esses partidos podem romper”, argumentou Pedro Costa Júnior, professor de Relações Internacionais e Economia das Faculdades de Campinas (FACAMP) e das Faculdades Integradas Rio Branco.

A rebeldia de PP e PDT
Os efeitos, como foi observado nas tabelas acima, já começaram a ser sentidos. Nas últimas duas semanas, o PDT votou em bloco contra as MPs 665/14 e 664/14, sobre mudanças em direitos trabalhistas e previdenciários, enquanto o comportamento dos parlamentares do PP foi dividido.  No caso da primeira sigla, a decisão tem como pano de fundo questões ideológicas na identificação com os direitos dos trabalhadores brasileiros. Em paralelo a isso, corre nos bastidores de Brasília o boato de que o governo estaria negociando o Ministério do Trabalho, hoje ocupado pelo pedetista Manoel Dias, com o PMDB. As informações provocaram a ira de diversos escudeiros do PDT na Câmara e no Senado. O partido já estuda abandonar formalmente a base aliada.

No caso do PP, observa-se um comportamento mais fisiológico, conforme apontam os analistas. “A divisão interna é fruto de um descontentamento pelo partido não ter direito à distribuição de cargos no segundo e terceiro escalões que foram prometidos a ele, mas não foram entregues ainda”, afirmou Costa Júnior. Recentemente, o novo articulador político do governo, Michel Temer, tem empenhado esforços para agilizar o processo de nomeações em uma tentativa de acalmar os ânimos. O PP também ameaça deixar formalmente a base aliada, porém os riscos aparentemente são menores.

Base fragmentada, mais problemas
Apesar de ambos os partidos ainda fazerem parte do grupo de siglas governistas neste segundo mandato de Dilma Rousseff, a dupla de professores não acredita mais em uma real base aliada. Para eles, PP e PDT já romperam com o governo na prática, mas não anunciam isso – e talvez não anunciem. Desta forma, os partidos mantém cargos conquistados na partilha dos ministérios e ainda têm condições de se opor com relativa propriedade às pautas de interesse do Planalto. 

“O governo já não tem esses votos. Eles já estão fora da base, só falta anunciar. O fato de colocar o Michel Temer e precisar, a cada nova Medida Provisória, negociar indica que, embora no marketing e na cabeça de muita gente possa parecer que não, isso deixou de ser uma base governista há muito tempo”, declarou Stempniewiski. Costa Júnior não descarta a possibilidade de ruptura formal: “Mais adiante, é possível”, comentou.

Em termos teóricos, levando em conta os partidos que declararam apoio à reeleição de Dilma, o governo conta com 303 votos (em um total de 513) favoráveis na Câmara. Perdendo o apoio de PP (40 deputados) e PDT (19 deputados), o Planalto passaria a contar com 244 parlamentares, em tese, governistas. Evidentemente, na prática o cenário não é tão simples e dificilmente os partidos votam inteiramente contra ou favoráveis a projetos. Vale lembrar que, nas últimas MPs votadas em plenário, houve infidelidade até de petistas, enquanto alguns deputados do DEM chegaram a apoiar interesses do governo.

O resultado de um maior embate com os partidos da base, dizem os especialistas, gera imobilismo no governo. “É uma situação que não permite a passagem dos principais projetos de interesse do Planalto. Será um governo que irá se arrastar se conseguir completar esses quatro anos”, analisou Costa Júnior. Para ele, a única saída seria a retomada da economia, o que recuperaria parte da popularidade do governo e devolveria capital político importante para negociar com o Legislativo. No entanto, para ele, os ajustes propostos pelo ministro da Fazenda Joaquim Levy caminham no sentido de mais recessão – o que deve complicar ainda mais as coisas para Dilma.

Como o cenário não dá sinais de melhora no plano político, Stempniewiski fala no diálogo constante com Câmara e Senado. “A vida já está sendo levada a cada dia. A cada novo projeto, lei, portaria, CPI, o governo já está sendo obrigado a negociar. Esse é um processo muito desgastante, que isola pessoas, cria inimizades, desconfianças e assim por diante. Não tem mais como ter uma única política ou único caminho a ser observado. Podemos considerar que essa aliança não mais existe”, concluiu o professor.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.