Mudanças no arcabouço fiscal aprovadas no Senado devem enfrentar dificuldade na Câmara, projetam analistas

Especialistas consultados pelo InfoMoney consideram retirada de despesas com ciência e tecnologia do limite de gastos a alteração mais difícil de prosperar

Marcos Mortari

Claudio Cajado, do PP da Bahia (Foto: Câmara dos Deputados)

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O conjunto de mudanças aprovadas pelo Senado Federal no projeto de lei complementar que trata do novo arcabouço fiscal (PLP 93/2023) não deve ter vida fácil no retorno da matéria para análise pela Câmara dos Deputados.

É o que esperam os analistas políticos consultados na 46ª edição do Barômetro do Poder, levantamento feito mensalmente pelo InfoMoney com consultorias e analistas independentes sobre alguns dos principais temas em discussão na política nacional. Acesse à íntegra clicando aqui.

O estudo, realizado entre os dias 28 e 30 de junho, mostra que, de seis mudanças no texto implementadas, apenas a retirada da complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) da regra de limite de despesas é vista com chance razoável de sensibilizar os deputados.

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Para 46% dos analistas consultados, são altas ou muito altas as chances de a casa legislativa manter a exceção aprovada pelos senadores a este ponto específico da nova regra fiscal. Na prática, a mudança, além de facilitar a liberação de recursos para o fundo educacional, poderia abrir espaço para o crescimento de outras despesas sujeitas às restrições impostas.

O Barômetro do Poder mostra que 31% dos entrevistados veem chances baixas de a exclusão do Fundeb ser mantida na Câmara. Outros 23% atribuem probabilidade moderada para o evento. Considerando uma escala de 1 (muito baixa) a 5 (muito alta), a probabilidade média atribuída pelos especialistas para a manutenção deste ponto incluído pelos senadores ao substitutivo é 3,23 ‒ bem perto do meio do caminho, o que indica cautela nas avaliações.

A retirada do Fundeb do limite de despesas foi vocalizada sobretudo pelos senadores Professora Dorinha Seabra (União Brasil-TO), Plínio Valério (PSDB-AM), Alessandro Vieira (PSDB-SE) e Mecias de Jesus (Republicanos-RR), e acabou acatada no próprio substitutivo do relator na casa legislativa, o senador Omar Aziz (PSD-AM).

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Também entraram no texto outras duas exceções à regra. Uma para as transferências constitucionais da União ao Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF), por pressão da bancada do DF. E outra de despesas com ciência, tecnologia e inovação, por emenda de autoria do senador Renan Calheiros (MDB-AL) ‒ adversário político do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).

Dessas duas mudanças, os analistas acreditam que a primeira tem mais chances de angariar apoio dos deputados para continuar no texto que irá para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ainda assim, a expectativa majoritária é que ambas fiquem pelo caminho.

Para 46%, são muito baixas as chances de as despesas com ciência, tecnologia e inovação ficarem efetivamente de fora do limite de despesas previsto no novo arcabouço fiscal. Outros 15% atribuem probabilidade baixa. E apenas 8% veem chances elevadas de o dispositivo ser mantido na versão final.

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Já do lado do FCDF, 23% atribuem probabilidade alta ou muito alta de os recursos entrarem no rol de exceções à regra. Outros 46%, porém, veem chances reduzidas de isso acontecer.

Considerando uma escala de 1 a 5, a probabilidade média atribuída pelos analistas para a manutenção de cada um desses pontos é de 2,00 e 2,77 respectivamente.

O relator do arcabouço fiscal na Câmara dos Deputados, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), já manifestou contrariedade às mudanças implementadas pelo Senado Federal ao texto e defendeu a retomada da versão anterior.

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Para ele, os senadores não apresentaram “justificativas técnicas” para excluir da regra fiscal os gastos com o Fundeb, o FCDF e as despesas com ciência tecnologia e inovação. “O Senado, lamentavelmente, decidiu politicamente as suas alterações, sem qualquer amparo do ponto de vista técnico”, disse.

“Se depender de mim, volto tudo ao teor do meu relatório, que foi feito, para cada ponto alterado, com justificativas técnicas”, pontuou.

O Barômetro do Poder também capturou ceticismo dos analistas políticos quando à aprovação por parte dos deputados de alteração que facilita a execução do projeto de lei orçamentária anual (PLOA) de 2024 pelo governo federal.

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Durante a tramitação da matéria no Senado Federal, o relator Omar Aziz acatou uma emenda apresentada pelo senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), líder do governo no Congresso Nacional.

O dispositivo autoriza que o governo utilize estimativa para a diferença da inflação cheia no ano e a apurada no período considerado para correção do “teto” de gastos para incluir programações de despesas primárias. Tal execução, contudo, ficaria condicionada à aprovação pelo Congresso Nacional de projeto de lei de crédito adicional com a ampliação do limite individualizado em questão.

Segundo Randolfe, a mudança evitaria o corte de aproximadamente R$ 32 bilhões no PLOA − o que, nas suas palavras, poderia afetar “investimento em rodovias, saneamento e contenção de encostas, além de despesas correntes como emissão de passaportes e funcionamento do INSS e serviços assistenciais para acesso da população mais vulnerável a benefícios sociais como Bolsa Família, BPC, aposentadoria e pensão”.

Apesar da justificativa, 53% dos analistas políticos consultados veem baixa chance de a mudança ser mantida durante nova análise pelos deputados. Apenas 8% atribuem probabilidade muito elevada de isso acontecer. Na escala de 1 a 5, a probabilidade média atribuída pelos especialistas para a manutenção do dispositivo na versão final do texto ficou em 2,46.

A taxa está levemente abaixo de outras duas modificações de mérito feitas pelos senadores no texto: 1) a criação de um Comitê de Modernização Fiscal, composto por representantes do Ministério da Fazenda, do Ministério do Planejamento e Orçamento, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Tribunal de Contas da União (TCU); e 2) a inclusão da possível alienação de ativos e privatização de empresas estatais no conjunto de medidas de ajuste fiscal previstas no texto.

A probabilidade média atribuída pelos analistas consultados para a manutenção de cada um desses pontos na versão final do projeto é de 3,00 e 2,54, nesta ordem.

Esta edição do Barômetro do Poder ouviu 10 consultorias políticas – Control Risks; Dharma Political Risk & Strategy; Empower Consultoria; Medley Global Advisors; Patri Políticas Públicas; Ponteio Política; Prospectiva Consultoria; Pulso Público; Tendências Consultoria Integrada; e XP Política – e 3 analistas independentes – Antonio Lavareda (Ipespe); Carlos Melo (Insper); e Thomas Traumann.

Conforme acordado previamente com os participantes, os resultados são divulgados apenas de forma agregada, sendo preservado o anonimato das respostas e dos comentários.

Clique aqui para acessar a íntegra.

Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.