Haddad apresenta proposta para dívida dos Estados; entenda o que está em jogo

Texto, que também precisará do aval do Congresso Nacional, deve mudar o indexador dos juros e incentivar investimentos em setores estratégicos

Marcos Mortari Fábio Matos

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), realiza reunião com governadores do Consórcio de Integração dos Estados do Sul e do Sudeste do Brasil (Foto: Diogo Zacarias)

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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), apresenta a governadores, nesta terça-feira (26), o projeto do governo federal para renegociar a dívida dos Estados com a União. O conteúdo do texto, que precisará tramitar no Congresso Nacional, será mostrado em reunião com representantes do chamado Consórcio de Integração Sul e Sudeste (COSUD), marcada para as 8h (horário de Brasília), na sede da pasta.

Além de Haddad, participam, do lado do governo federal, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), o secretário-executivo da Fazenda, Dario Durigan, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, a secretária adjunta do órgão, Viviane Varga, e a subsecretária Relações Financeiras Intergovernamentais, Suzana Teixeira Braga.

Entre os representantes dos entes subnacionais, são esperadas as presenças dos governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos); do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL); de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo); do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB); do Paraná, Ratinho Júnior (PSD); do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB); e da vice-governadora de Santa Catarina, Marilisa Boehm (PL).

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O encontro ocorre em um contexto de crescentes queixas de governadores com os custos com o pagamento de encargos da dívida − que reduzem a capacidade de investimentos dos Estados. Eles pedem ao Ministério da Fazenda que o indexador dos juros, atualmente a Selic (a 10,75% ao ano) ou taxa real (ou seja, acima da inflação) de 4%, seja revista e recalculada retroativamente.

Segundo dados do Tesouro Nacional, o saldo devedor acumulado dos estados atinge a cifra de R$ 740 bilhões. Desse montante, São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais respondem por R$ 660 bilhões (o equivalente a 90% do estoque).

Do lado do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a ideia da iniciativa é ter maior controle das discussões para evitar a construção de um caminho mais custoso para os cofres da União − o que jogaria contra os esforços na busca pelo equilíbrio das contas públicas em 2024.

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Uma das ideias que tem circulado é que o texto mantenha um indexador para a dívida atrelado ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e leve uma taxa de juro real, que poderá cair, dependendo do nível de investimento do governo estadual em setores considerados estratégicos.

A proposta também abrirá a possibilidade de abatimento do estoque da dívida com a entrega de ativos estaduais − como chegou a ser discutida a federalização de Cemig, Copasa e Codemig, em Minas Gerais. Tal encaminhamento, no entanto, ainda é repleto de entraves políticos e econômicos que dificultam esse tipo de solução.

O encontro com governadores do Sul e Sudeste já havia sido sinalizado por Haddad há uma semana. Em março, o ministro teve reuniões com Cláudio Castro, Tarcísio de Freitas e Romeu Zema para tratar do assunto. Na última quarta-feira (20), ele disse que uma proposta da União já havia sido avalizada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

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Duas semanas atrás, Lula prometeu esforço do governo federal para resolver o assunto. A declaração foi dada durante solenidade de anúncio de investimentos federais no Rio Grande do Sul, na qual o mandatário foi cobrado por Eduardo Leite.

Em entrevista ao InfoMoney, Leite alertou para o nível de endividamento de São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro e disse que a indexação dos juros à Selic faz a dívida crescer de forma expressiva, pressionando os orçamentos.

“São Paulo consegue conviver com a dívida, mas vê serem subtraídos de seu orçamento mais de R$ 20 bilhões por ano. Se tirarmos São Paulo dessa lista, estamos falando de estados que reúnem mais de 25% do PIB [Produto Interno Bruto] nacional. Em estados nos quais está 25% da produção da economia nacional, nós temos governos com os orçamentos, como no caso do Rio Grande do Sul, com 12% ou até 15% da receita corrente líquida sendo consumida com a administração da dívida junto à União”, disse.

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Ele também salientou que os 4 Estados não contam com incentivos federais, como ocorre no Centro-Oeste, Norte e Nordeste com redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na produção de veículos ou a própria Zona Franca de Manaus. “Nós não temos isso. Nós não temos fundo constitucional com recursos que saem do Tesouro e da União, algo em torno de R$ 30 bilhões por ano, que servem para fazer subsídio a juros e empréstimos para setores econômicos através dos bancos de desenvolvimento. A participação dos nossos Estados no fundo regional da futura reforma tributária será, proporcionalmente, muito menor do que a dos estados das outras regiões. E, no caso do Rio Grande do Sul, não temos royalties de petróleo, como há no Sudeste, nem royalties de mineração que turbinem nossa arrecadação”, pontuou.

“O resultado disso é um estado com baixa capacidade de investimento. Se você tem baixa capacidade de investimento em estados que reúnem 1/4 da economia nacional, isso afeta a competitividade do próprio país e o PIB do Brasil. É como se fosse um carro de quatro rodas com uma delas presa. Por tudo isso, é muito importante que haja uma solução perene, estrutural, e não circunstancial, para essa questão da dívida”, concluiu.

Leia também: Eduardo Leite: Lula tenta reproduzir políticas que deram errado no passado

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O encontro de Haddad com os governadores para apresentar a proposta do governo federal marca o pontapé inicial de uma longa discussão, que também dependerá de debates intensos no Congresso Nacional. Os Estados que integram o COSUD reúnem as maiores bancadas na Câmara dos Deputados, mas a correlação de forças no Senado Federal é diferente − com a região Nordeste dispondo de maior capital político.

Um parlamentar nordestino da base aliada ouvido pelo InfoMoney reclamou do fato de a discussão até o momento estar muito concentrada em representantes do Sul e Sudeste e defendeu que o novo texto ofereça soluções para a totalidade dos Estados brasileiros, além de uma maior distribuição dos recursos da União para dívidas entre os entes. Ele defendeu a revisão do indexador das dívidas, mas disse que o debate também deveria passar pelo cumprimento de regras fiscais pelos governos estaduais.

No Congresso Nacional, há projetos em tramitação que tratam da dívida dos entes subnacionais. O autor de um deles é o deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG), que propõe uma mudança no indexador dos juros para uma taxa real vinculada à média de crescimento econômico do Produto Interno Bruto (PIB) do país em 5 anos.

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O parlamentar também defende a criação de um “redutor de dívida”, no qual entes com maior proporção entre volume exportado sobre a receita própria líquida terão os maiores descontos, que vão de 0,5% a 2%. “Não é por acaso que os estados que devem são os estados primário exportadores”, argumenta. “A União não pode só ficar com o bônus das reservas cambiais, e os estados, que são geradores delas, com o ônus”.

Apesar de ser contra a federalização de Cemig, Copasa e Codemig, o deputado federal acredita que alienar por 10 anos a distribuição dos dividendos dessas companhias a favor da União poderia ajudar na gestão da dívida mineira. Tal encaminhamento pode ser considerado pelos legisladores durante as discussões sobre o assunto.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.