Congresso tenta salvar “orçamento secreto” com resolução em meio a risco no Supremo

Ontem, Rosa Weber, presidente do STF, votou pela inconstitucionalidade do dispositivo; desfecho pode afetar andamento da PEC da Transição na Câmara

Marcos Mortari

O plenário da Câmara dos Deputados (Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados)

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O Congresso Nacional deve votar, nesta quinta-feira (15), uma resolução para alterar regras de distribuição das emendas do relator-geral do Orçamento. A sessão está marcada para as 10h (horário de Brasília).

O movimento ocorre um dia depois de a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, votar pela inconstitucionalidade do dispositivo em julgamento sobre quatro ações que tramitam na corte.

O julgamento será retomado nesta tarde com as manifestações dos demais magistrados. O próximo ministro a votar é André Mendonça. Mas é possível que não se alcance um desfecho para a questão antes do recesso do Poder Judiciário, que começa em 20 de dezembro.

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O ministro Ricardo Lewandowski, que se aposentará até maio, indicou que pode adiantar o voto caso o julgamento não seja concluído nesta semana.

Inicialmente, a avaliação nos bastidores é que a Corte abriria espaço para uma modulação, o que permitiria a sobrevivência do instrumento desde que com ajustes e limitações. Mas há uma percepção que o voto de Rosa Weber pode ter dificultado tal encaminhamento.

A magistrada defendeu a tese de que as emendas de relator devem ser usadas apenas para corrigir omissões ou erros na peça orçamentária e que a Constituição Federal proíbe o uso para inclusão de gastos ao longo do ano fiscal. A posição é considerada mais dura do que a expectativa de parlamentares e outros ministros do tribunal.

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Logo no início de seu voto, Rosa Weber frustrou intenções de parlamentares em reverter uma decisão desfavorável do Supremo ao dizer que a proposta do Congresso Nacional para estabelecer critérios de distribuição das emendas (veja detalhes da resolução ao final da reportagem) não prejudica o julgamento das ações apresentadas por PSB, PSOL, Cidadania e PV.

As emendas de relator são feitas pelo deputado ou senador que, em determinado ano, foi escolhido para produzir o parecer final sobre o Orçamento − o chamado relator-geral. Na peça de 2023, o cargo é ocupado pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI).

Apesar de levarem a assinatura do relator, tais emendas representam sugestões feitas por diversos parlamentares, negociadas ao longo da tramitação do Projeto de Lei Orçamentário Anual (PLOA).

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Mas as impressões digitais dos autores originais dos pedidos que deram origem a essas emendas não são passíveis de monitoramento.

O apelido “orçamento secreto” vem justamente da falta de transparência na execução das despesas e, sobretudo, na autoria do pedido para a alocação dos recursos, que representam cada vez uma fatia maior das despesas públicas em um exercício.

O desfecho do julgamento pode ter forte impacto sobre as disputas sucessórias nas mesas diretoras das duas casas legislativas.

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Atualmente, Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados, e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado Federal, são favoritos nas respectivas casas, mas o jogo pode mudar com uma decisão do tribunal.

A peça orçamentária de 2023 estima que as despesas com emendas do relator cheguem à cifra de R$ 19,4 bilhões – montante que abocanha parcela significativa das despesas discricionárias, aquelas que o gestor público tem maior liberdade de alocação.

E foi exatamente a percepção de risco de mudança na correlação de forças, sobretudo entre Congresso e Palácio do Planalto a partir da próxima legislatura que levou Lira a travar a tramitação da PEC da Transição e retomar negociações com o governo eleito.

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Para o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o reconhecimento da inconstitucionalidade das emendas de relator pode dar mais poder à sua gestão e menor dependência do Congresso Nacional na execução orçamentária.

Por outro lado, há riscos de uma eventual decisão do Supremo nesse sentido prejudicar o andamento da PEC da Transição no parlamento, levando à aprovação de um texto mais modesto na Câmara dos Deputados ou mesmo o engavetamento da proposta.

Na prática, caso o movimento se confirme no Poder Judiciário, Lula será mais cobrado por ceder espaços na Esplanada dos Ministérios e oferecer cargos públicos com orçamento para formar uma base majoritária no Congresso.

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O caminho do Congresso

O projeto de resolução 3/2022 é assinado pelo próprio presidente do Congresso Nacional, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e é o 55º item da pauta desta sessão, atrás da análise de vetos do presidente Jair Bolsonaro (PL) a projetos aprovados pela casa legislativa.

O dispositivo a ser analisado por deputados e senadores busca “ampliar a transparência da sistemática de apresentação das emendas de relator-geral, estabelecendo critérios de proporcionalidade e impessoalidade na aprovação e execução dessas emendas”.

O texto determina que o relator-geral da Lei Orçamentária Anual faça indicações para execução de programações cadastradas por parlamentares, obedecendo a seguinte proporção:

1) Até 5% oriundas de indicações conjuntas do Relator-Geral e do Presidente da CMO; 2) Até 7,5% oriundas de indicações da Comissão Diretora do Senado Federal, formalizadas pelo respectivo Presidente ao Relator-Geral;

3) Até 7,5% oriundas de indicações da Comissão Diretora da Câmara dos Deputados, formalizadas pelo respectivo Presidente ao Relator-Geral;

4) Até 23,33% oriundas de indicações cadastradas pelos senadores, obedecendo a proporcionalidade partidária e cabendo ao líder do partido a formalização ao Relator-Geral; e

5) Até 56,66% oriundas de indicações cadastradas pelos deputados, obedecendo a proporcionalidade partidária e cabendo ao líder do partido a formalização ao Relator-Geral.

Pela proposta, o relator-geral poderá realizar indicações para execução das programações “oriundas exclusivamente de indicações cadastradas por parlamentares, as quais podem ser fundamentadas em demandas apresentadas por agentes públicos ou por representantes da sociedade civil”.

O movimento é um esforço dos parlamentares para manter as emendas de relator, que correm risco de serem barradas pelo STF. Os congressistas buscaram, desta forma, responder às duas principais críticas ao dispositivo: a falta de transparência e o desrespeito aos princípios de equidade e impessoalidade.

Ao longo da atual legislatura, o dispositivo ganhou protagonismo e foi fundamental na construção de base de apoio ao governo Bolsonaro, além de ter empoderado o Poder Legislativo na relação com o Executivo.

Para o ano que vem, a expectativa é que tais emendas abocanhassem quase R$ 20 bilhões do Orçamento. Se derrubados, seriam recursos a mais à disposição do novo governo para alocação.

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Marcos Mortari

Responsável pela cobertura de política do InfoMoney, coordena o levantamento Barômetro do Poder, apresenta o programa Conexão Brasília e o podcast Frequência Política.