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Ao menos seis projetos de lei tramitam no Congresso Nacional sobre a aquisição de bens de pequeno valor por pessoas físicas no Brasil — atualmente contempladas pelo benefício da isenção para remessas de até US$ 50. Metade dos PLs busca fechar a brecha usada por gigantes do comércio eletrônico internacional para não pagar o imposto de importação até a criação do Remessa Conforme, segundo levantamento do InfoMoney. Mas outros 3 projetos vão na direção contrária e tentam institucionalizar a isenção atual — ou até ampliá-la —, apesar das críticas do varejo brasileiro de falta de isonomia. Um deles, inclusive, tira o poder do Ministério da Fazenda de decidir sozinho sobre o tema, pois hoje o governo federal pode acabar com a isenção sem passar pelo Parlamento.
Os PLs foram propostos por deputados federais de diferentes partidos, do PDT ao PL, passando por PP e Republicanos. Todos estão apensados ao PL 2339/2022, do deputado Félix Mendonça Júnior (PDT-BA), que está em tramitação na Comissão de Finanças e Tributação e aguarda parecer do deputado Paulo Guedes (PT-MG).
As duas primeiras audiências públicas sobre o assunto foram realizadas em outubro e novembro, e o tema voltou à tona no começo deste ano, após a edição da medida provisória da reoneração (MPV 1202/2013) pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A taxação das compras internacionais é apontada como uma alternativa para compensar a perda de arrecadação do governo caso a MPV não seja ratificada pelo Congresso — o que tem boas chances de ocorrer, dada a reação política e econômica ao texto, que mudou as regras e instituiu uma reoneração gradual da folha.
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Do ponto de vista da taxação, há uma crescente pressão de empresas, entidades setoriais e parlamentares pela cobrança do imposto de importação em plataformas internacionais, como Shein, Shopee e Aliexpress, com o discurso da isonomia com os players nacionais, que alegam concorrência desleal por pagarem elevada carga tributária no país. O setor alega que as gigantes do e-commerce internacional se aproveitam de benefício concedido a remessas entre pessoas físicas em valores abaixo de US$ 50,00 para vender produtos sem recolher o tributo sobre importados.
Foi formada uma coalização (Têxtil Brasil) com a participação de cinco frentes parlamentares (empreendedorismo, comercio e serviços, do setor coureiro e calçadista, da indústria têxtil e de máquinas e equipamentos), além de entidades como o IDV (Instituto para Desenvolvimento do Varejo), a ABVTEX (Associação Brasileira do Varejo Têxtil) e até a CNTV (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Vestuário), ligada à CUT (Central Única dos Trabalhadores).
O pleito tem ganhado corpo nas últimas semanas. Na quarta-feira (17) até as poderosas confederações da indústria (CNI) e do comércio (CNC) entraram no jogo, com uma ação no Supremo. Parte do governo também é a favor da medida, sobretudo da área econômica, mas o peso da opinião pública (e a impopularidade que a taxação pode ter) tem sido o fiel da balança até o momento. A solução de momento foi a criação do Remessa Conforme, que é elogiado pelo varejo, mas junto veio a criticada isenção do imposto de importação (quem participa do programa paga só 17% de ICMS).
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O que dizem os projetos
A maioria dos projetos de lei basicamente alteram ou revogam trechos dois decretos-lei: um que trata do imposto de importação (o número 37, de 18 de novembro de 1966) e outro da tributação simplificada das remessas internacionais (o número 1.804, de 3 de setembro de 1980). Os PLs 2339/2022, 1623/2023 e 1830/2023 são para fechar a brecha que isenta compras internacionais de menor valor e os outros três (3425/2023, 3498/2023 e 2565/2023), para institucionalizá-la. Um deles, inclusive, até tira poder do Ministério da Fazenda sobre o tema (veja mais abaixo).
O PL 2339/2022, ao qual os outros projetos estão apensados, é de autoria do deputado Félix Mendonça Júnior (PDT-BA). Ele veda a isenção do imposto de importação de produtos comprados pela internet, “ainda que o destinatário da mercadoria seja pessoa física”. Na justificativa, o parlamentar afirma que “atualmente, sites, aplicativos e plataformas digitais que importam produtos acabam burlando a arrecadação do imposto de importação”. “Essa burla gera uma concorrência desleal prejudicando as empresas que tem suas lojas físicas e recolhem os impostos de acordo com a lei”.
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Já os PLs 1623 e o 1830 são de autoria dos deputados Julio Lopes (PP-RJ) e Vicentinho Júnior (PP-TO). O primeiro só revoga a isenção do imposto de importação para bens de pequeno valor, enquanto o segundo a proíbe “para fins comerciais, industriais ou revenda”. Em sua justificativa, Lopes afirma que a não taxação gera “concorrência desleal”, “tem causado sérios prejuízos ao comércio varejista brasileiro” e “representa uma enorme perda de arrecadação tributária para o país”. “A revogação da citada isenção é uma medida necessária para garantir a concorrência justa no comércio varejista brasileiro e para garantir a arrecadação tributária necessária para financiar as políticas públicas e programas sociais do país”.
O que diz o varejo
Esta é a principal reclamação das empresas e entidades do varejo, que dizem pagar uma alta carga tributária e exigem isonomia de condições. Estudo do IDV diz que a carga tributária efetiva do varejo é de 109,9% sobre a mercadoria e que a alíquota do imposto de importação deveria ser de 74,2%, para igualar os impostos pagos pelo varejo nacional. “A taxação final junto aos cross borders deveria ser neste patamar”, afirma Edmundo Lima, diretor-executivo da ABVTEX, ao InfoMoney. “Isso precisa ser equalizado. Enquanto não atingir este patamar, não haverá isonomia. Que seja reduzida a carga tributária para nós, ou então que as plataformas paguem a mesma quantia”.
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Para o presidente do IDV, Jorge Gonçalves Filho, um imposto de importação de 30%, como chegou a ser ventilado, não resolveria o problema da isonomia com o varejo. Mas acabaria com o da arrecadação do governo. “Se for 30% e somar o ICMS, que é de 17%, a carga tributária sobre o importado vai ser de 56%. Ainda não vai ter a isonomia tributária que pleiteamos e ainda vai ser muito vantajoso paras as empresas estrangeiras, mas resolve a questão da desoneração da folha”.
A favor da isenção
Mas há também quem seja a favor da isenção do imposto, principalmente na oposição. É o caso dos PLs 2565/2023, do deputado Jeferson Rodrigues (Republicanos-GO); 3425/2023, de Júnior Mano (PL-CE); e 3498/2023, de Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP). O primeiro é o mais “simples” e apenas inclui a isenção para produtos de até US$ 50 na Lei nº 3.244 de 14 de agosto de 1957.
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O segundo amplia o limite da isenção para US$ 100 e impede qualquer flexibilização ou redução deste valor, “facilitando o acesso da população a produtos importados a preços mais acessíveis” e “simplificando o processo de importação”. O último, por sua vez, não só dobra o valor, independentemente de o remetente ser pessoa física ou jurídica, como reduz o imposto de importação de para as demais remessas (de 60% para 20%) e ainda aumenta o valor máximo das remessas expressas (dos atuais US$ 3 mil para US$ 5 mil).
A justificativa de Orleans e Bragança é que a medida “tem potencial para alavancar a atividade econômica dos Correios e das empresas de remessa expressa, com a consequente geração de emprego e renda, beneficiando ainda milhões de consumidores que poderão comprar de forma simples, segura e com preços mais acessíveis, sem comprometer a indústria nacional”.
Brecha para o governo
O PL 3425/2023, do deputado Júnior Mano (PL-CE), também fecha uma brecha que pode ser usada pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para acabar com a isenção sem precisar do Congresso. O texto inclui um parágrafo único no artigo 2º do decreto-lei n° 1.804/1980, impedindo a Fazenda de alterar o limite da isenção por legislação infralegal. Mano justifica que o limite de US$ 50 foi imposto por “normas infralegais, como a portaria nº 156/99 do Ministério da Fazenda e a instrução normativa nº 96/99 da Receita Federal”, o que segundo o deputado “tem gerado conflitos e interpretações equivocadas, restringindo o acesso a produtos importados de baixo custo”.
Esta interpretação, de que o governo poderia simplesmente alterar — ou até mesmo cancelar — a isenção com uma decisão da Fazenda ou da Receita é compartilhada pelo deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), presidente da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE). Crítico do governo, ele faz parte da coalização Têxtil Brasil e defende a taxação das compras internacionais. “É um ato normativo, uma portaria dentro do Ministério da Fazenda. Não é nem lei”, afirma o parlamentar. “Isso pode ser feito inclusive sem o Congresso. Como é uma normativa do Ministério da Fazenda, basta revogá-la. Qual é o problema? O governo não quer pagar o preço político disso e quer dividir o ônus com o Parlamento”.