Bolsonaro ‘joga para a torcida’ ao trocar ministro, e política de preços da Petrobras não mudará

Pressionado pela alta dos combustíveis, presidente tenta criar fato político em eleição dominada pela pauta econômica

Fábio Matos

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A queda do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que movimentou o noticiário político-econômico nesta quarta-feira (11), não levará a profundas mudanças na condução da pasta – tampouco causará qualquer ruptura na política de preços dos combustíveis seguida pela Petrobras, hoje vinculada à flutuação do valor praticado no mercado internacional. A avaliação é compartilhada pelos analistas que participaram do Timing Político, exibido pelo canal do InfoMoney no YouTube

Albuquerque – que teria deixado o cargo “a pedido”, segundo consta no Diário Oficial da União – foi substituído por Adolfo Sachsida, ex-chefe da Assessoria Especial de Assuntos Estratégicos do Ministério da Economia. Ele também foi secretário de Política Econômica da pasta e é considerado homem de confiança tanto do ministro da Economia, Paulo Guedes, quanto do próprio Bolsonaro. 

Nesta semana, a Petrobras anunciou a elevação em 8,87% do preço do diesel para as distribuidoras. O valor médio do litro vendido pela petroleira passou de R$ 4,51 para R$ 4,91. Em sua tradicional live nas redes sociais, na última semana, o presidente da República cobrou a empresa para que não houvesse novos aumentos nos preços dos combustíveis. 

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“Houve a mudança na chefia do ministério, mas a política deve permanecer a mesma. Não há o que ser feito em relação aos preços da Petrobras. Não tem medida fácil nem artimanha que se possa usar”, afirma Júnia Gama, analista política da XP. “Mexer na política de preços da Petrobras é algo que está totalmente fora do radar do Sachsida. Não há perspectiva de mudança. Talvez melhore um pouco o clima interno e o presidente fique um pouco mais aliviado porque fez a troca, mas não há nada no radar que possa indicar uma mudança.” 

Júnia lembrou ainda que o novo ministro de Minas e Energia “se tornou muito próximo do presidente Bolsonaro nos últimos anos”. “Além de ser de extrema confiança do ministro Paulo Guedes, [Sachsida] sempre se posicionava dentro do governo como um bolsonarista que ‘mandava a real’ para o presidente. Ele fazia a contraposição às ideias que saíam da fábrica dos ‘fura-teto’, se mostrava um aliado confiável e tem todo o receituário liberal que o Paulo Guedes defende”, diz.

Carlos Melo, cientista político e professor do Insper, chama atenção para a saída atabalhoada de mais um militar do governo Bolsonaro. “[Bento Albuquerque] É mais um oficial graduado das Forças Armadas, agora um almirante, que foi colocado para fora sem muito cuidado. Ainda ontem, ele se organizava para uma viagem ao exterior para participar de um fórum sobre energia”, afirma. Em março, Bolsonaro já havia demitido o então presidente da Petrobras, general Joaquim Silva e Luna.

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‘Jogando para a torcida’

Para o presidente do Instituto Locomotiva, Renato Meirelles, Bolsonaro tenta dar uma resposta política para transmitir ao eleitor a ideia de que está buscando, de alguma forma, resolver o problema da inflação. “Por que diabos alguém troca o ministro de Minas e Energia se a política não vai mudar?”, indaga. “A inflação é o grande calcanhar de Aquiles para a reeleição do presidente Bolsonaro. Se a política de preços não mudar, fica cada vez mais óbvia a questão de jogar para torcida. Ele joga para a torcida, e isso dá uma narrativa que pode ecoar para o eleitor médio do bolsonarismo”, completa. 

Melo, por sua vez, avalia que Bolsonaro errou ao apoiar de forma tão enfática o movimento grevista dos caminhoneiros, em maio de 2018, ainda durante o governo do ex-presidente Michel Temer (MDB) e já em meio à campanha eleitoral. 

“O erro começa muito antes, com uma disposição populista em relação ao movimento dos caminhoneiros [em 2018]”, afirma. “[Bolsonaro] Aproveitou aquele movimento todo antes da eleição para pegar uma carona nesse processo e prometeu mundos e fundos. E agora passa a ser pressionado por um movimento que é importantíssimo e pode causar um estrago danado, sobretudo em ano de eleição.” 

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Em represália ao reajuste no preço do diesel, um grupo de caminhoneiros autônomos do Espírito Santo anunciou que entrará em greve a partir da meia-noite de quinta-feira (12). Em nota pública, o Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens do Espírito Santo (Sindicam-ES) alega que “a situação ficou insustentável depois de tantos reajustes, seja no preço do diesel ou nos insumos que compõem o dia a dia do caminhoneiro”.

“A política é cruel. O que você fala, de uma forma ou de outra, vai ser cobrado”, diz Melo. “E agora o presidente fica em uma situação complicada. Ninguém quer que os preços aumentem, mas eles aumentam. O presidente fica pendurado em um discurso que fez lá atrás e não reviu.”

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial do país, subiu 1,06% em abril e já ultrapassa 12% no acumulado de 12 meses, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Trata-se da maior alta para o mês desde 1996 (1,26%). 

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O bolso decide

De acordo com relatório da corretora Tullett Prebon Brasil, Bolsonaro será o primeiro presidente desde 1994 a encerrar o mandato com o salário mínimo mais desvalorizado do que no início de seu governo – ou seja, com menor poder de compra. 

Se a inflação não superar a previsão atual do Boletim Focus, do Banco Central (BC), a perda no salário mínimo deve chegar a 1,7% (caindo de  de R$ 1.213,84 para R$ 1.193,37 entre dezembro de 2018 e dezembro de 2022). Até então, a menor variação havia sido atingida no segundo mandato da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), com ligeira alta de 0,42%. Durante os dois mandatos de Lula, o poder de compra do salário mínimo registrou aumento de mais de 50%. 

“O tema dessa campanha é economia. No final das contas, é uma eleição diferente de 2018, quando outros temas ganharam relevância. Há um processo de inflação e, ao mesmo tempo, você tem uma perda de renda”, aponta Melo. “A questão que vai se colocar lá na frente é a comparação entre Bolsonaro e Lula em termos de aumento do salário mínimo.” 

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Com base em dados das pesquisas do Instituto Locomotiva, Meirelles corrobora a análise do cientista político. “Economia e saúde lideram a preocupação geral dos brasileiros. E, convenhamos, nem economia nem saúde são vistos como pontos fortes do presidente da República”, afirma. “Se você perguntar para as pessoas se a vida delas era melhor antes ou depois, de um lado tínhamos o Mais Médicos e de outro a falta de compra da vacina. De um lado, tivemos boa parte dos maiores aumentos reais do salário mínimo e, de outro, o salário mínimo que rende cada vez menos”, prossegue.

“Essa comparação terá um efeito na economia muito maior do que a lembrança das denúncias de corrupção do governo Lula. O que temos visto nas nossas pesquisas é que corrupção está lá embaixo na lista de preocupações do eleitor”, conclui Meirelles. 

Assista acima, na íntegra, ao Timing Político desta semana, ou clique aqui. O programa é exibido ao vivo sempre às quartas-feiras, às 18h (horário de Brasília), no canal do InfoMoney no YouTube.

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Fábio Matos

Jornalista formado pela Cásper Líbero, é pós-graduado em marketing político e propaganda eleitoral pela USP. Trabalhou no site da ESPN, pelo qual foi à China para cobrir a Olimpíada de Pequim, em 2008. Além do InfoMoney, teve passagens por Metrópoles, O Antagonista, iG e Terra, cobrindo política e economia. Como assessor de imprensa, atuou na Câmara dos Deputados e no Ministério da Cultura. É autor dos livros “Dias: a Vida do Maior Jogador do São Paulo nos Anos 1960” e “20 Jogos Eternos do São Paulo”.