Tesouro Direto: com alta dos prêmios dos títulos públicos, vale a pena investir agora? Confira as recomendações de especialistas

Taxas acima de 9% nos papéis prefixados e ao redor de 4,5% entre os indexados à inflação despertam atenção do mercado

Bruna Furlani Lucas Bombana

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SÃO PAULO – As sinalizações transmitidas pelo governo nas últimas semanas no sentido de furar o teto de gastos para financiar o aumento do Auxílio Brasil (programa de transferência de renda que substituirá o Bolsa Família), com um aumento do risco fiscal percebido pelos investidores impulsionado ainda pelo debate sobre os precatórios, têm levado as taxas de remuneração oferecidas pelos títulos públicos a alcançarem os maiores níveis desde o início da pandemia de Covid-19 no Brasil.

O movimento de aversão ao risco indica que o investidor tem pedido cada vez mais prêmio para financiar a dívida do governo.

No Tesouro Direto, programa de negociação de títulos públicos por investidores pessoas físicas, o retorno pago por papéis prefixados se aproxima dos 10% ao ano. Nos títulos com remuneração atrelada à inflação, os prêmios ultrapassam os 4,5% no caso dos vencimentos mais longos.

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No Tesouro prefixado com vencimento em 2026, por exemplo, que começou a ser negociado em fevereiro do ano passado, o juro oferecido atingiu o maior valor histórico na última sexta-feira (6): 9,50%. Mesmo com a leve queda nos prêmios vista na sessão desta segunda (9), o papel continua a pagar taxas acima de 9,40%.

Diante desse movimento, vale a pena aproveitar para ir às compras no Tesouro Direto? Na visão de alocadores de recursos, sim, dado que os prêmios estão historicamente elevados, especialmente de papéis de mais longo prazo, no caso dos indexados à inflação. Há oportunidades, contudo, também entre títulos com rendimentos prefixados, para quem busca prazos mais curtos e tem estômago para aguentar as oscilações de mercado.

Dados do Tesouro Direto divulgados no fim do mês passado mostram que, frente à pressão inflacionária, que tem corroído o retorno das aplicações mais conservadoras, o título mais demandado pelos investidores em junho era atrelado ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), com 43,4% das vendas. Na sequência, aparecem os papéis indexados à taxa Selic, com 42,8% do total, enquanto os prefixados tiveram participação de 13,8%.

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Oportunidades

Para Rodrigo Franchini, sócio do escritório Monte Bravo, o momento é ideal para o investidor aproveitar as oportunidades nos títulos públicos, uma vez que o prêmio pago por esses ativos está bastante acima da média. “É o pior estresse dos juros desde o início da pandemia. Racionalmente, é uma super oportunidade tanto para comprar prefixados quanto pós-fixados atrelados à inflação.”

Ele destaca que, mesmo que haja novo estresse no curto prazo, o mercado já antecipou um prêmio muito grande em relação à Selic. Logo, a taxa básica de juros teria que subir para além dos 7,25% previstos no relatório Focus até o fim do ciclo para que deixasse de ser vantajoso investir, frente às taxas oferecidas hoje, avalia o especialista.

O momento também representa uma boa oportunidade de entrada, a depender do perfil de risco do investidor, na opinião de Eliseu Hernandez, sócio e líder de renda fixa do escritório Blue3. Segundo ele, nos níveis atuais, os prêmios dos títulos públicos, seja entre os prefixados ou os indexados à inflação, estão interessantes.

Para quem dispõe de fôlego financeiro para manter o dinheiro alocado por bastante tempo, os papéis Tesouro IPCA+ de longo prazo, a partir de 2030, com possibilidade de chegar aos vencimentos mais distantes disponíveis, como 2050 e 2055, se mostram atraentes, diz Hernandez, que lembra que, quanto mais longo o vencimento, mais suscetível ao risco de mercado está o papel.

Dessa forma, quando o nervosismo dos investidores aumenta, são esses os papéis que mais vão ser impactados negativamente pelo efeito da marcação a mercado, que se materializa quando as taxas embutidas nos ativos cobradas pelo mercado aumentam, gerando uma consequente queda nos preços dos papéis.

“Esses títulos ainda podem passar por uma grande oscilação no curto prazo, mas, para quem tem um horizonte de longo prazo, os papéis já estão em um excelente momento de entrada”, afirma o sócio do escritório.

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Já para quem não tem conforto para colocar o dinheiro em prazos tão dilatados assim, Hernandez afirma que papéis prefixados com vencimentos entre dois e três anos, hoje com taxas acima de 9%, também podem fazer sentido para o portfólio do investidor.

Nesse caso, além de se beneficiar de uma remuneração que tende a ser maior que a da taxa Selic no fim do ciclo de alta dos juros, o investidor pode ter um ganho de capital com um eventual fechamento (queda) dos prêmios, diz o sócio da Blue3.

No Tesouro Direto, o papel com retorno prefixado de mais curto prazo disponível a qualquer investidor tem vencimento em julho de 2024 e paga uma taxa anual de 9,13% nesta segunda-feira.

Embora os riscos fiscais e políticos tenham voltado ao radar mais recentemente, o mercado é conhecido por se antecipar à confirmação, de fato, dos eventos em si.

De toda forma, com uma Selic projetada pelo mercado em 7,25% ao fim de 2022, as projeções embutidas na curva futura para meados de 2023 parecem exageradas, aponta Hernandez.

A opinião é compartilhada por Luciana Vieira, sócia da Polo Capital, que tem carregado na carteira dos fundos multimercados posições aplicadas (que ganham com a queda das taxas) nos prazos para 2022 e 2023 no mercado de juros futuros.

“Temos sofrido bastante com essa posição, mas entendemos que um juro precificado ao redor de 9,5% chegou perto do teto”, afirmou Luciana.

Na TAG Investimentos, o sócio e gestor Marco Bismarchi, também vê com bons olhos as taxas acima de 9% ao ano em papéis prefixados com vencimento em três anos.

“Nos níveis atuais, achamos que os prefixados aguentam bastante desaforo em relação ao que deve ser a taxa média da Selic até 2024”, afirma Bismarchi, que acrescenta que, caso o investidor não carregue os papéis em carteira até o vencimento, é possível incorrer em perdas, a depender da flutuação futura da curva de juros.

Não é porque é renda fixa que, se o investidor precisar do dinheiro no meio do caminho, não pode ter prejuízo, ou lucro, assinala o gestor da TAG. E embora novas aberturas de taxas nunca possam ser completamente descartadas do cenário, Bismarchi entende que o investidor pessoa física vive um bom momento para começar a se aproveitar dos prêmios nos prefixados, ou nos indexados à inflação no caso de vencimentos a partir de 2028.

Para mitigar o risco ocasionado por eventuais novas aberturas de taxa, o investidor pode optar por fazer o aporte em tranches, de modo a buscar a formação de um preço médio para o investimento em carteira, afirma Bismarchi.

Nova fase para o Tesouro Selic

Felipe Dexheimer, gestor dos fundos da família DNA da XP Asset, lembra que é importante o investidor interessado em explorar as oportunidades na renda fixa por meio de títulos públicos ter em mente que a rentabilidade esperada para os ativos de menor risco na renda fixa, como os papéis Tesouro Selic, tende a ser bem diferente mirando os próximos 12 meses, em comparação com o retorno entregue na janela de um ano, próximo de 2% ao ano.

Com a alta da taxa Selic em curso pelo Banco Central (BC) e o aumento recente da aversão ao risco, as taxas dos títulos prefixados de um ano no mercado futuro apontam para um retorno de 7,8%, aponta Dexheimer.

“Quando o BC está subindo os juros, o Tesouro Selic ou os fundos DI são um ótimo lugar para se estar, justamente porque vão capturar toda a alta da taxa Selic sem correr muito risco, e, se o BC surpreender e der uma alta maior, para quem está nesses papéis, é melhor ainda”, diz o gestor da XP Asset.

Apesar das perspectivas de ganhos mais atraentes no cenário esperado à frente para os juros de curto prazo, Luis Barone, sócio da Galapagos WM, lembra que, no intervalo dos próximos dois a três meses, o retorno esperado para a taxa Selic ainda seguirá abaixo dos níveis de inflação corrente.

Por esse motivo, Barone afirma que, para aquele investidor que quer colocar parte dos recursos em títulos públicos neste momento, sem incorrer no risco de ter um rendimento real negativo ou de uma inflação acima do esperado, a melhor alternativa parece estar hoje nos papéis indexados à inflação de menor prazo, para 2026, no caso do Tesouro Direto.

Na carteira dos fundos da família DNA da XP Asset, Dexheimer diz que tem dado preferência aos papéis indexados à inflação nos vértices de prazo intermediário na curva futura, entre 2026 e 2030.

Ele lembra que, caso o governo adote uma postura irresponsável do ponto de vista fiscal, a inflação, que o mercado espera que tenha uma desaceleração importante à frente, vai acabar se mostrando mais persistente.

“Se a inflação sai do controle, o título prefixado tem o retorno erodido, enquanto o título indexado à inflação funciona como uma espécie de boia na piscina – quando a água sobe, a taxa do papel também avança”, explica o gestor da XP Asset.

Riscos elevados ainda no radar

Apesar dos prêmios mais atrativos no Tesouro Direto, há quem ainda esteja cauteloso e acredite que nem todos os riscos foram “colocados em jogo”, deixando espaço para novas elevações dos juros pagos aos investidores.

Na avaliação de Luiz Eduardo Portella, sócio fundador da gestora Novus Capital, o melhor agora é aguardar a definição do valor do Auxílio Brasil e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios para tomar uma decisão. “Acho que a análise de curto prazo em relação ao teto de gastos já é suficiente para o mercado pedir mais prêmio. Seria prudente aguardar o desenrolar desta semana”, avalia Portella.

De qualquer forma, ele pondera que, se a questão do Auxílio Brasil e dos precatórios for resolvida, a gestora estaria mais interessada em comprar títulos públicos. “Há muito prêmio na curva. Gostamos mais da parte prefixada com vencimento em 2024 e dos pós-fixados atrelados à inflação com vencimento entre 2050 e 2055”, destaca.