Tributação de dividendos: quando começa a valer? Veja 9 respostas sobre a nova fase da reforma

Segunda etapa da reforma tributária deve tramitar junto com Orçamento; o que pode acontecer com dividendos e JCP?

Katherine Rivas

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Após a aprovação na Câmara dos Deputados do texto da reforma tributária, relacionado aos impostos sobre o consumo, os olhares do mercado estão atentos à segunda fase que tratará da cobrança de impostos sobre a renda e que pode incluir uma possível tributação de dividendos e a extinção dos juros sobre capital próprio (JCP).

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), manifestou o desejo de não aguardar a tramitação da primeira fase, e dar sequência à segunda etapa da reforma tributária de forma simultânea à análise da Proposta de Emenda à Constituição que aborda os impostos sobre o consumo (PEC 45/2019) pelo Senado Federal.

Separamos essas principais dúvidas sobre a reforma tributária:

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Afinal, o que é mito e o que pode se concretizar na tributação sobre dividendos? Veja a seguir as principais apostas do mercado sobre esta segunda etapa da reforma.

Quando começa a valer a tributação sobre dividendos?

O plano do governo é que a segunda fase da reforma tributária, que abrange a taxação de dividendos, entre em vigor já em 2024. No entanto, para que isso aconteça, ela precisa ser aprovada até o segundo semestre de 2023.

É o chamado princípio de anterioridade, explica Guilherme Martins, advogado e sócio da Mazzuco Sociedade de Advogados.

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“Apenas pode surtir efeito no exercício seguinte àquele em que a lei venha a ser aprovada, observando o período mínimo de 90 dias”, reforça. Os efeitos, explica, seriam sentidos apenas no ano seguinte, dando tempo para as empresas se planejarem.

Para Luiz Rosa e Carlos Pacheco, sócio e advogado sênior do departamento Tributário do Machado Meyer Advogados, o governo está trabalhando para que a reforma sobre tributação de renda seja aprovada ainda em 2023, de modo que passe a valer em 2024.

Segundo eles, um indício desta intenção estaria presente no texto da PEC sobre o consumo que foi aprovada na Câmara. Os advogados destacam que, no artigo 18, menciona que o Poder Executivo deverá encaminhar ao Congresso Nacional um projeto de lei que reforme a tributação sobre a renda no prazo de 180 dias da promulgação da Emenda Constitucional da reforma tributária sobre o consumo, no entanto, o governo não precisa esperar esse prazo.

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“Os 180 dias é um prazo máximo que terminará em 2024, mas o governo não precisa esperar até o último dia do prazo para apresentar a proposta. Nossa expectativa é que o governo deve se movimentar para aprovar a reforma da tributação da renda ainda neste ano”, apontam.

2ª fase da reforma pode mesmo ser aprovada ainda em 2023?

Na visão de Rosa e Pacheco, o atual ambiente político é favorável para aprovação de uma reforma sobre a renda ainda este ano. “Esta certamente incluirá o fim da isenção dos dividendos pagos pelas empresas brasileiras”, afirmam.

Contudo, os advogados observam que o governo ainda não enviou o seu projeto de lei ao Congresso Nacional. “Alterações no cenário político poderiam impactar as chances de aprovação dessa reforma ainda em 2023”, advertem.

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De quanto será o imposto sobre dividendos?

A maioria dos especialistas consultados pela reportagem acredita que os dividendos de ações deverão ser tributados em 15%.

Na Machado Meyer Advogados, a crença é que embora o governo vai formular sua própria proposta, esta pode ter influências de outra já existente, o Projeto de Lei 2.337/2021 (“PL 2337”) elaborado na administração anterior que estabelecia uma alíquota de 15% para os dividendos de empresas brasileiras.

“É necessário aguardar o envio do novo projeto para identificar a alíquota, mas não se pode afastar a possibilidade de replicar a que estava no PL 2337”, destacam Rosa e Pacheco.

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Felipe Paletta, sócio-fundador e analista da Monett, defende que o mercado está mais receptivo com uma alíquota de 15%, porque é a que existe em outros ativos e classes de investimento, e uma equalização de taxas faria mais sentido. “A probabilidade é grande de que seja 15% a proposta tramitada”, observa.

Empresas vão pagar impostos duas vezes?

Segundo Cassiano Menke, sócio coordenador da área de Direito Tributário da Silveiro Advogados, a expectativa do mercado é que a tributação de dividendos em 15% seja acompanhada de uma redução nos impostos para pessoas jurídicas de 15% para 8%, considerando ainda o adicional de 10% para renda superior a R$ 20 mil.

“Ou seja, se a alíquota da pessoa jurídica é de 25%, seria reduzida para 18% acompanhada da tributação dos dividendos”, destaca.

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O advogado especializado em direito tributário Vinicius Carneiro defende que tributar os dividendos sem reduzir a carga tributária seria uma “dobradinha tributária ou bitributação” da mesma renda.

“Uma empresa que já pagou mais de 34% de impostos na atividade empresarial, somado à tributação ao investidor de 10% ou 15% nos dividendos, seria uma tributação sobre a mesma base de quase 50%, insustentável para qualquer mercado globalizado”, aponta.

Mas não se trata apenas da redução de alíquotas, há outros pontos que devem ser contemplados, segundo os especialistas consultados.

Menke, do Silveiro Advogados, cita compensações no caso de dividendos de holdings. “Se uma holding recebe lucros de uma operativa vai ter a tributação dos 15%. Depois, ao distribuir dividendos aos acionistas e sócios, poderia compensar o que foi pago na etapa anterior de distribuição de lucros”, destaca.

Para Rosa e Pacheco, da Machado Meyer, deveria haver algum mecanismo que mitigue uma tributação “em cascata” sobre os dividendos distribuídos dentro da cadeia societária de um mesmo grupo econômico. É o caso de isenção de dividendos pagos a controladoras. “A tributação efetiva dos dividendos ocorreria somente quando pagos a não controladores ou sócios no fim da cadeia de participação”, defendem.

O que pode acontecer com os juros sobre capital próprio (JCP)?

Os advogados da Machado Meyer destacam que as propostas que visam reinstituir a tributação de dividendos no Brasil costumam prever a extinção da figura dos JCP. “É possível que o projeto a ser apresentado pelo governo atual estabeleça a extinção dos JCP”, afirmam.

Para Felipe Pontes, sócio da L4 Capital, os JCP foram criados no passado como uma forma de dar incentivo ao mercado de capitais e a captação de recursos por investidores, para as empresas aplicarem no longo prazo. Contudo, hoje não haveria mais necessidade desse incentivo.

Segundo Pontes, com o tempo, o JCP se tornou uma aberração para compensar a utilização de lucros “fictícios” elevados para a tributação. “O JCP era dedutível da base de cálculo do Imposto de Renda por isso, porque a Receita percebeu o problema que foi criado”, lembra.

Por esse motivo, ressalta, a extinção dos JCP precisa vir acompanhada de uma redução na carga tributária das empresas.

Como o fim dos JCPs afetaria as empresas?

Fabrício Gonçalvez, CEO da Box Asset Management, acredita que o fim dos JCPs impactaria no lucro de algumas companhias, porque este mecanismo é uma forma de remuneração que afeta o resultado financeiro das empresas. “A extinção dos JCPs também pode ser prejudicial para os investidores que contam com essa forma de remuneração”, destaca.

Segundo um levantamento do TradeMap para o InfoMoney, nos últimos cinco anos oito empresas da Bolsa só pagaram proventos na forma de JCP. Um exemplo é o Banco ABC (ABCB4) que desde 2008 só paga juros sobre capital próprio aos acionistas.

Para Vinicius Carneiro, o JCP impacta atualmente em uma redução de carga tributária das empresas e caso seja extinto e os dividendos não adquiram a mesma natureza jurídica, as empresas acabariam pagando mais impostos na prática e deixariam de aproveitar as reduções permitidas por legislação.

A reforma reduzirá a remuneração aos acionistas?

Felipe Pontes, sócio da L4 Capital, acredita que as empresas tenderão a distribuir apenas o dividendo mínimo obrigatório – de 25% do lucro ou o estabelecido pela companhia no seu estatuto. “Quando há aumento de tributação, as empresas passam a pagar menos dividendos”, diz.

Para Rosa e Pacheco, o fim dos JCPs pode incentivar uma redução da distribuição de lucros pelas empresas ou até mesmo incentivar estas a manter seus recursos investidos em outras atividades. “Não necessariamente isso será prejudicial aos investidores, pois pode resultar em empresas mais saudáveis e com maior volume de recursos, o que pode implicar valorização das ações”, defendem.

Paletta, da Monett, destaca que outro movimento que deve ser muito comum é o aumento de recompra de ações, muito popular nos Estados Unidos, onde a tributação de dividendos chega a 30%. “Vimos as recompras aumentando no começo da pandemia em virtude dos descontos e isso pode voltar a acontecer como forma de equalizar a estrutura de capital das companhias”, avalia.

Contudo, Rosa e Pacheco lembram que operações associadas à remuneração dos acionistas também podem vir a ser tributadas.

Empresas podem antecipar dividendos antes da reforma?

Tudo depende, explicam Rosa e Pacheco, da redação do projeto que for aprovado.

Na antiga proposta do PL 2337, havia dúvidas sobre a possibilidade de tributação dos lucros acumulados em anos anteriores, lembram os advogados. Dessa forma, existia o receio de que, se aprovada, a reforma abriria espaço para tributação de lucros acumulados antes da vigência da lei, mas distribuídos após a sua entrada em vigor, encorajando companhias a anteciparem o pagamento de proventos.

Mas, segundo os advogados da Machado Meyer, é provável que o texto abranja apenas os lucros apurados a partir de 2024, deixando de lado distribuições com base nos lucros acumulados em anos anteriores.

“Caso o novo projeto utilize uma redação clara e não ambígua, trazendo mais segurança jurídica, é possível que as empresas não vejam a necessidade de acelerar a distribuição de dividendos”.

O contrário, no entanto (tributação de lucros acumulados), incentivaria uma corrida nas distribuições.

Para Pontes, empresas com uma estrutura familiar podem acabar antecipando dividendos para remunerar as famílias pagando menos impostos. Entre estas, cita Grendene (GRND3), Itaúsa (ITSA4), Itaú (ITUB4) e Klabin (KLBN4).

Dividendos de FIIs e fiagros também serão tributados?

A maioria dos especialistas consultados acredita que fundos imobiliários e fiagros não deverão ser alvo da tributação de dividendos.

Segundo Menke, do Silveiro Advogados, tanto os fundos imobiliários como os fiagros serão preservados da nova regra de tributação porque o agronegócio e o segmento imobiliário são setores incentivados pelo governo.

“Até mesmo na reforma tributária do consumo, tanto o agronegócio quanto as atividades imobiliárias estão tendo um tratamento diferenciado e beneficiado”, aponta.

No caso dos fiagros, Carneiro reforça que o agronegócio já demonstrou que pode fazer muito barulho e prejudicar a balança comercial se seus desejos não forem atendidos.

“Acredito que não serão taxados porque o agro contribui para a balança comercial e uma tributação afetaria também o preço final dos produtos”, avalia.

Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.