“Kit transição”: onde investir e o que evitar nos mercados até Lula assumir a presidência?

Especialistas apontam oportunidades de investimento na renda fixa, na bolsa local e no exterior

Katherine Rivas

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Embora o novo presidente do Brasil esteja definido – Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é quem conduzirá o País a partir de janeiro de 2023 – a volatilidade deve permanecer nos mercados até que se veja um cenário mais claro sobre os futuros ministros, principalmente da área econômica, e o arcabouço fiscal que será adotado.

“O movimento do mercado nesta segunda-feira (31) é um bom exemplo do que podemos ver nos próximos meses”, diz Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos. O pré-mercado apontava para um dia de perdas na Bolsa brasileira, com o Ibovespa futuro chegando a recuar mais de 3%. Contudo, após iniciar o dia em baixa, o Ibovespa passou a operar no terreno positivo e ampliou ganhos na reta final do dia, fechando em alta de 1,28% aos 116.004 pontos – apesar do tombo de até 8% das estatais  Petrobras (PETR4) e Banco do Brasil (BBAS3). 

Para cumprir com a promessa de manter os gastos sociais, como o Auxílio Brasil, nos níveis atuais em 2023 será necessário que membros da campanha negociem com o Congresso a aprovação de emenda constitucional ainda em 2022. “Se não houver ambiente político para tal, podem adotar a alternativa de remanejar o Orçamento de 2023 a partir da não aprovação da Lei Orçamentária Anual (LOA) até o fim do ano. Não há, por ora, cenário que não contemple os gastos extras com o programa”, destaca a XP em relatório.

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Os analistas da XP também apontam para o desafio de Lula na transição de indicar pessoas para os 50 cargos de livre nomeação, de forma mais breve do que a indicação do time ministerial. “Atenções de curto prazo devem se voltar também para a possibilidade de questionamentos ao resultado – a margem estreita, de cerca de 2 milhões de votos, deve contribuir para isso”, reforçam.

Há, ainda, o fator Petrobras: até 1º de janeiro de 2023 pode haver aumento nos preços dos combustíveis, acompanhando os preços do petróleo do tipo Brent nos mercados internacionais, destaca Raphaela Oliveira, especialista de Investimentos do Simples MFO. “Muitos entenderam a diminuição nos preços dos combustíveis praticados pela Petrobras como jogada política. São cenários que embora pareçam pequenos, fazem diferença na volatilidade no curto prazo”.

Se não faltam razões para ampliar o sobe e desce dos mercados, onde investir e o que evitar até Lula assumir a presidência? Especialistas consultados pelo InfoMoney acreditam que não é necessário aguardar o novo governo assumir em 2023 para proteger a carteira ou fazer alocações estratégicas e usufruir de algumas oportunidades. Veja como eles recomendam investir no período de transição:

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Na renda fixa, pós-fixados dominam recomendações

Na renda fixa, o ponto em comum de todos os especialistas consultados pela reportagem é que os títulos pós-fixados atrelados ao CDI e à Selic são considerados opções para o momento.

Ariane Benedito, economista e especialista no mercado de capitais independente, avalia que caso o novo governo amplie gastos, o Banco Central precisaria continuar subindo os juros para conter a inflação em 2023.

Por outro lado, mesmo mantendo uma política fiscal razoável, a economista destaca que a Selic só deve começar a cair em meados do próximo ano e que o Relatório Focus, divulgado nesta segunda-feira (31), já projeta juros em 11,25% para 2023 – em ambos os cenários, portanto, os títulos pós-fixados estariam muito atrativos.

Komura, da Ouro Preto, enxerga oportunidades em títulos públicos como o Tesouro Selic e fundos DI que ofereçam em torno de 105% do CDI, para quem busca criar uma reserva de liquidez.

Já para quem pretende carregar os ativos até o vencimento, ele recomenda CDBs (Certificados de Depósito Bancário) com vencimento em até dois anos que entreguem de 120% a 130% do CDI. No caso das LCIs (Letras de Crédito Imobiliário), isentas de Imposto de Renda, a sugestão é buscar aquelas que tenham retorno de 98% do CDI para vencimentos curtos ou perto de 105% do CDI para vencimentos longos.

Komura destaca a importância de escolher ativos protegidos pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que protegem o investidor com aplicações de até R$ 250 mil, dado que com uma maior taxa de juros, aumenta o risco de inadimplência dos emissores.

“Se o investidor for escolher CRI (Certificados de Recebíveis Imobiliários), CRA (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) e debêntures (títulos de dívida de empresas) indexados ao CDI, tem que avaliar o emissor e optar somente por aqueles que tenham boa qualidade”, reforça o analista. CRI, CRA e debêntures não são cobertos pelo FGC.

Para Raphaela Oliveira e Ricardo Mello, especialistas de investimentos do Simples MFO, ter uma parte do patrimônio em caixa é relevante, dado que a Selic deve continuar em alta durante o primeiro semestre de 2023, trazendo segurança e rentabilidade ao investidor em um cenário nebuloso. Para este fim, os especialistas acreditam que o caixa deve estar alocado em Tesouro Selic ou CDB com rentabilidade de no mínimo 100% do CDI, com liquidez diária.

Já para usufruir das oportunidades, os especialistas aconselham também optar por títulos bancários atrelados ao CDI ou debêntures incentivadas, isentas de Imposto de Renda, que sejam de empresas de baixo risco. Papéis prefixados ou emitidos por empresas de alto risco são observados com cautela no momento.

Títulos atrelados à inflação

Há também quem enxergue oportunidades em títulos atrelados à inflação, diante da possibilidade de o Brasil enfrentar desafios nos gastos públicos e política fiscal a partir de 2023 – e a transição de governo poderia abrir um bom ponto de entrada neles.

Para Luciana Ikedo, sócia do escritório RV4 Investimentos, há oportunidades em papéis públicos e privados atrelados ao IPCA com vencimentos curtos e médios – de até cinco anos. Nesta categoria, ela destaca que pode ser possível investir no Tesouro IPCA+, CDBs ou até mesmo em títulos de crédito privado como CRI, CRA e debêntures, que devem ganhar destaque.

Esta visão também é compartilhada pelo time da XP Investimentos, que acredita que desafios fiscais implicariam em uma inflação mais elevada nos próximos anos, assim como taxas de juros (nominais e reais) também mais elevadas, ainda não precificadas nas curvas, segundo relatório de Rodrigo Sgavioli, head de alocação e fundos da XP.

Papéis prefixados

Os especialistas consultados pelo InfoMoney não se sentem confortáveis com investimento em títulos prefixados no momento, diante da possibilidade de o Banco Central precisar subir os juros no decorrer do novo governo.

Ariane Benedito, no entanto, acredita que o investidor pode encontrar oportunidades de curto prazo, desde que feche taxas próximas à Selic no vencimento – como é o caso de títulos prefixados que ofereçam entre 11,25% e 13,75% ao ano. “Há corretoras que oferecem títulos prefixados com retorno de 15% ao ano em três anos, que representam uma boa oportunidade”, aponta. Segundo a especialista, é importante diversificar entre o Tesouro Direto, CDBs e LCIs, sempre levando em conta o risco do investimento.

Na renda variável, consumo, educação e construção se destacam no curto prazo

Na renda variável, existe uma convergência maior entre as preferências dos especialistas. A maioria enxerga estatais como um ponto de alerta e setores de educação, consumo, varejo e construção civil como oportunidades para o curto prazo.

Vicente Guimarães, CEO da VG Research, está otimista com o setor de educação, com empresas como Cogna (COGN3), Ser Educacional (SEER3) e Yduqs (YDUQ3), ações que valorizaram antes das eleições e devem ter um bom desempenho diante da retomada de programas como o Fies (financiamento do ensino superior).

Guimarães cita também o setor de varejo, principalmente o de consumo popular, uma vez que as classes C e D – em que se concentram os eleitores de Lula – podem ser motivadas ao consumo. “Com isso ações de varejo – como Via (VIIA3), Magazine Luiza (MGLU3), Lojas Renner (LREN3), Americanas (AMER3) – e de bens de consumo de baixo valor agregado – como GRND3 ou VULC3 – podem ser beneficiadas”, aponta.

Ele também reforça que empresas de construção civil focadas no público de baixa renda, como MRV (MRVE3) e Tenda (TEND3), devem se fortalecer com programas de incentivo à moradia popular.

Fora estes setores, Felipe Simões, economista e diretor da WIT Asset, cita que a Bolsa está barata de modo geral, a não ser em setores como petróleo, já “esticado” em função da alta dos preços internacionais da matéria-prima. Simões também cita as estatais como um ponto de cautela, que devem sofrer por um período maior e apresentam baixo potencial de alta.

Para Flávio Conde, analista de ações da Levante Ideias de Investimentos, a situação das estatais varia de caso a caso. A preocupação principal do analista é com a Petrobras, dado que “Lula já sinalizou que pretende abrasileirar os preços dos combustíveis, investir em refinarias e reduzir os dividendos”. Para Conde a alternativa mais segura é reduzir posição na petrolífera.

Já em relação ao Banco do Brasil (BBAS3), Conde considera que o ativo ainda está barato e é uma opção com menos interferência do governo.

Estatais como Sabesp (SBSP3), Copasa (CSMG3), Cemig (CMIG4), Copel (CPLE6) e Sanepar (SAPR4) deveriam ser mantidas em carteira, segundo o analista, porque pagam dividendos elevados, estão descontadas e podem ser privatizadas. “Tem pouco espaço para cair porque já estão baratas, e há possibilidade de que Lula ainda apresente uma postura pró-mercado”, destaca.

Conde se mostra otimista também com o setor de bancos, com destaque para o Itaú (ITUB4), e companhias como Vale (VALE3) e Gerdau (GGBR4) – a primeira, pelo desconto da ação; a segunda, pela retomada do setor de construção civil. Conde aposta que o Ibovespa chegará aos 130 mil pontos em 2023.

Investimento no exterior para fugir do risco Brasil

Apesar da recessão global, alguns especialistas também acreditam na importância de aumentar gradativamente os investimentos expostos ao dólar, seja por meio de fundos cambiais ou fundos globais, entre outros instrumentos.

Guimarães, da VG Research, acredita que ativos dolarizados no exterior, como ações americanas e Reits (equivalentes aos fundos imobiliários brasileiros), apresentam bons pontos de entrada no curto prazo.

Ele destaca, por exemplo, ativos que pagam bons dividendos e devem sofrer menos diante de uma crise na economia global. “Existem vários Reits com yield acima de 5%, o que é excelente em termos de bolsa americana”, diz.

Já em relação às ações americanas, ele cita setores que pagam bons dividendos lá fora, como petróleo, energia, bancos, alimentos e medicamentos. “A recessão atual e a queda nos preços das ações nos EUA devem ser vistas como uma oportunidade”, afirma Guimarães.

Simões, da WIT Asset, destaca também a exposição ao índice S&P 500, por meio do ETF IVVB11 disponível na B3, que replica o desempenho do indicador, um dos mais representativos do mercado acionário americano.

Para quem se sente confortável investindo apenas na Bolsa brasileira, Raphaela, do Simples MFO, cita outras formas de dolarizar a carteira, por meio de ações de empresas exportadoras, dos setores de celulose, mineração e alimentos, ou que se beneficiam com a alta do dólar como a Weg (WEGE3).

Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.