Invasão no DF afastará investidor estrangeiro? Foco dos “gringos” é economia, mas golpismo se soma a riscos

Parte dos gestores alega que atos bolsonaristas são casos isolados logo debelados, enquanto outros defendem que eventos aumentam percepção de instabilidade

Wellington Carvalho Bruna Furlani

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Um dia após a destruição provocada por bolsonaristas golpistas em Brasília, gestores e economistas se dividem sobre os possíveis impactos imediatos dos atos no mercado financeiro. No entanto, há quase um consenso de que a percepção de instabilidade no País pode afastar, no médio prazo, os investidores estrangeiros do Brasil.

Para evitar a fuga, especialistas ouvidos pelo InfoMoney afirmam que uma resposta efetiva do governo federal é necessária.

Insatisfeitos com o resultado das eleições, um grupo de radicais invadiu e depredou, neste domingo (8), os prédios do Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio do Planalto, sede executiva do governo federal.

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Diante da demora na atuação das forças policiais de Brasília, Alexandre de Moraes, ministro do STF, determinou o afastamento do governador local, Ibaneis Rocha, pelo prazo de 90 dias. Antes disso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já havia decretado intervenção na segurança pública do Distrito Federal, que seguirá até o dia 31 de janeiro.

Embora não descarte possíveis efeitos no comportamento do investidor estrangeiro no futuro, a gestora Rio Bravo avalia que o impacto do episódio é mínimo no curto prazo.

“No curto prazo, o impacto deverá ser contido, dado que a situação já está sob controle”, destacou análise da gestora nas redes sociais. “Entretanto, a possibilidade de instabilidade política pode afastar investidores estrangeiros no médio prazo”.

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Luiz Alves, gestor de portfólio da Versa Asset Management, concorda e diz que o evento de domingo em Brasília não tem força suficiente para influenciar a tomada de decisão de curto prazo do investidor, especialmente o estrangeiro.

Segundo ele, o movimento foi debelado de forma rápida – e não deve ser replicado. Além disso, os atos não representaram um risco para o atual governo, diferentemente do que ocorreu em gestões anteriores, afirma.

“Não dá para relacionar, por exemplo, com as manifestações que derrubaram a [então presidenta] Dilma Rousseff em 2015”, compara. “Naquela época, o País inteiro estava em convulsão – inclusive o Congresso – contra o governo”.

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Alves reforça que, hoje, os atos golpistas foram protagonizados por uma minoria de vândalos e não indicam fraqueza do atual governo. “É vida que segue”, tranquiliza. “O evento importante dessa semana será mesmo o anúncio das primeiras medidas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad”.

Fernando Antunes Marinho, gestor de crédito e sócio da Valora, adota o mesmo discurso e avalia que, isoladamente, o vandalismo em Brasília “não faz preço” nos negócios.

Na opinião dele, a tentativa de golpe verificada na capital federal representa apenas a continuidade de um cenário de incertezas presente no País desde o início do período eleitoral.

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“Independentemente de quem ganhasse a eleição, a resistência seria grande dado o resultado apertado do pleito”, explica. “[Portanto,] isoladamente, o ato de ontem não interfere na tomada de decisão dos investidores estrangeiros”, sugere.

Na opinião do gestor, o que prevalece de fato são as incertezas em relação à política fiscal do novo governo – que tem elevado há bastante tempo a curva de juros, aponta.

“Ainda falta clareza sobre o modelo econômico que será adotado pelo atual governo”, prega. “Ainda se discute se o governo terá um perfil ultrarradical, um estimo moderado como o Lula I [entre 2002 e 2006] ou um meio termo entre os dois”.

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Nenad Dinic, estrategista de ações da Julius Baer, vai na mesma linha. Ele explica que o foco dos investidores continua nas questões macroeconômicas, especialmente na formação do novo quadro fiscal do Brasil. Apesar disso, o executivo não esconde que os estrangeiros devem reduzir um pouco o otimismo com o Brasil após os acontecimentos de ontem, dada a forte cobertura da mídia internacional sobre os atos golpistas.

O pessimismo em números e nas curvas

Com uma visão mais pessimista, Adriana Dupita, economista de Brasil e Argentina da Bloomberg Economics, alerta que os graves acontecimentos ocorridos na capital federal acrescentam um “risco imediato” de queda para os mercados do País e ressaltam a “luta” de Lula para cumprir uma agenda política desafiadora.

Segundo cálculos feitos pela Bloomberg Economics, o aumento na incerteza política pode enfraquecer o real em 1,8%, reduzir o preço das ações em 3% e diminuir em cerca de 0,7 ponto percentual a atividade econômica em janeiro.

Os dados têm como base um modelo que leva em conta a relação entre a incerteza política, os preços dos ativos e o crescimento econômico. “A suposição crucial que sustenta os resultados é que a incerteza política sobe para o nível visto no segundo trimestre de 2017”, diz Adriana, referindo-se ao escândalo de corrupção que afetou o governo de Michel Temer logo após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

Para a especialista da Bloomberg Economics, o cenário atual não ajuda a “acalmar” as preocupações de estrangeiros, que já pareciam desconfortáveis com as muitas “pontas soltas” nas perspectivas fiscais do Brasil. Na visão da profissional, a volta mais forte do investidor de fora vai depender de como o Executivo debelará a questão para voltar à agenda que interessa ao mercado.

“Quanto mais tempo demorar para o Governo tirar esse assunto da pauta, mais tempo levará para que o investidor volte a considerar seriamente investir nos ativos brasileiros”, resume.

Bons preços na bolsa, mas falta estabilidade

Outro gestor de uma casa renomada, que preferiu não se identificar, também colocou em dúvida a volta massiva dos estrangeiros após os episódios de Brasília.

O executivo defende que as manifestações pioram o cenário e fazem com o que Brasil continue perdendo relevância no cenário global. “O mundo desenvolvido está apresentando taxas interessantes e os preços estão descontados. A competição agora está mais difícil. Vamos ficar no meio do caminho e perder o bonde”, alerta.

De olho em medidas de governo voltadas ao aumento de gasto público e menos favoráveis a privatizações, a casa agora zerou a posição na Bolsa brasileira, mantendo uma alocação em ativos locais bem mais baixa do que a do ano passado.

“Está complexo iniciar e aumentar posição em Bolsa brasileira agora. Os preços estão interessantes, mas o investidor está em compasso de espera por uma estabilidade maior”, defende o gestor.

Para Lorena Laudares, head de estratégia da Órama Investimentos, os rumos dos mercados nos próximos dias serão definidos pela capacidade das instituições brasileiras de conseguir evitar novos atos de vandalismo e impedir a adesão de categorias importantes, como os caminhoneiros.

“O restabelecimento da ordem pública com demonstração de controle e coordenação política se mostram mais importantes do que nunca”, pontua.

Wellington Carvalho

Repórter de fundos imobiliários do InfoMoney. Acompanha as principais informações que influenciam no desempenho dos FIIs e do índice Ifix.