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Ainda com poucos volumes de emissões, os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) Verdes têm alto potencial para ganhar espaço diante dos desafios das mudanças climáticas, metas de descarbonização e desenvolvimento da bioeconomia, que são tendências no Brasil e no mundo.
Os CRAs verdes fazem parte do conceito de green bonds. Eles são títulos de renda fixa de crédito privado, mas com a particularidade de que os recursos captados devem ser destinados para financiar projetos que gerem benefícios socioambientais. Ou seja, acabam direcionando fluxo de capital para produção responsável e soluções inovadoras.
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Resistência
De acordo com especialistas do mercado, esses ativos tendem a avançar gradativamente. Por enquanto, vigora, entretanto, muito a questão: ‘o que vem antes, o ovo ou a galinha?’.
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Isso porque ainda há poucos investidores focados em ESG, assim como, do outro lado, são poucas empresas dispostas a fazer o processo de certificação e mostrar a cara ao mercado sobre o comprometimento com critérios sustentáveis. Essa engrenagem, no entanto, deverá se fortalecer.
“O Brasil pode se destacar em crédito verde. O país tem vocação agro, conta com regras ambientais, possui muita conservação e já há iniciativas sustentáveis interessantes sendo feitas. Então, existe um potencial muito grande para destravar esse mercado”, diz Mathias Teixeira, diretor de Relacionamento Institucional e Distribuição, responsável pela criação de novos produtos do Grupo Ecoagro, principal securitizadora do agronegócio.
Líder no volume de emissões de CRAs no país, o grupo já realizou quase 400 operações somando cerca de R$ 70 bilhões. Com relação especificamente aos CRAs Verdes, desde 2020, conduziu 17 emissões, superando R$ 6 bilhões.
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Influência do macro
Segundo Teixeira, antes da pandemia, o mercado de títulos verdes em geral vinha crescendo, mas depois se retraiu devido às mudanças no cenário macro global, com alta de inflação e juros, sobretudo nos países desenvolvidos. Isso gerou um movimento aversão ao risco.
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Contudo, a conjuntura tende a ser mais propícia adiante, principalmente a partir de flexibilização da política monetária pelo Fed (Banco Central americano).
Por sua vez, o mercado de crédito privado brasileiro está em pleno desenvolvimento. Como um termômetro, no primeiro semestre de 2024, segundo a B3 (B3SA3), houve aumento de 18% no estoque de ativos de renda fixa de dívida corporativa, atingindo montante de R$ 1,7 trilhão.
“O mercado de crédito brasileiro vem crescendo. Primeiro, vem esse mercado mais genérico e, em um segundo momento, vão andar as emissões verdes”, acrescenta Teixeira.
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Gestoras no páreo
Algumas gestoras de recursos têm se destacado ao ancorar emissões de CRAs Verdes, dando cheques consistentes e sustentação para as operações.
Um dos exemplos é a JGP, que entre CRAs Verdes, já investiu mais de R$ 300 milhões em 10 empresas, o que representa 2% dos recursos captados em títulos dessa modalidade no mercado brasileiro.
“Ampliamos os investimentos principalmente com a expansão dos nossos Fiagros, o JGPT11, lançado no final de 2022, e o follow-on do JGPX11, em setembro de 2023”, explica Julia Bretz, estrategista de Agro e Crédito ESG da JGP.
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De acordo com ela, o primeiro CRA Verde investido pela gestora foi em 2021, na Fazenda Toca, referência em agricultura regenerativa e na produção de ovos orgânicos, com sede em Itirapina (SP).
Este ano, a JGP ancorou o primeiro CRA com selo social no mercado brasileiro da Grano, empresa líder no segmento de vegetais congelados (excluindo batatas), com foco em brócolis e couve-flor de pequenos produtores.
A JGP também tem um braço de assessoria financeira corporativa para auxiliar clientes em processos de emissão de títulos verdes. Julia Bretz explica que há uma série de empresas com grande potencial para projetos que externalizam impactos positivos específicos, que ainda não estão totalmente preparadas.
“Essas empresas têm buscado entender mais sobre o assunto, adaptando suas jornadas para que consigam colher frutos lá na frente, incluindo o lado reputacional”, comenta.
Para emitir um CRA Verde, conforme especialistas, as empresas devem passar por auditoria independente (second party opinion), que emite um parecer sobre a qualificação do projeto ou atividade financiada, monitorando se as metas de sustentabilidade estabelecidas na emissão do título são cumpridas. As certificações verdes e a transparência são cruciais nesse mercado.
Agritech emite CRAs para crescer
A Solinftec, especializada em tecnologias de precisão para o agronegócio – utilizando inteligência artificial e no modelo de software como serviço (SaaS) -, deu início a esse tipo de captação em 2021.
No total, foram três CRAs Verdes que somaram R$ 387,2 milhões, sendo que somente no ano passado, foram captados R$ 150 milhões.
“Realizamos roadshows antes da decisão da primeira emissão. Essa iniciativa foi fundamental para demonstrar nosso compromisso com ESG e inovação”, conta Laís Braido, CFO da Solinftec.
A companhia oferece soluções que contribuem para redução do uso de defensivos agrícolas, eficiência na aplicação de fertilizantes, proteção do solo e redução das emissões de CO2.
Uma das principais ferramentas é o robô Solix, movido a energia solar, que faz o monitoramento agronômico da lavoura e aplicações precisas de herbicidas em plantas daninhas. Segundo Laís, a Solinftec obteve a certificação Climate Bond Initiative (CBI).
Ela conta que os recursos levantados com os títulos estão sendo usados em refinanciamentos e investimentos em desenvolvimento, aquisições, reformas, ampliação das instalações e, principalmente, crescimento das vendas.
Para aquisição de clientes, a empresa precisa dispor de capex na frente. Porém, quando fechados os novos contratos, passa a receber receitas recorrentes de longo prazo.
O desafio é que, apesar de o payback (tempo de retorno do investimento) ser significativo no curso de cada contrato, o dispêndio é elevado no início deles.
“Sendo assim, a estrutura dos CRAs funciona muito bem para financiar a expansão da companhia para novos clientes, dado que toma como garantia os recebíveis de contratos vendidos que são, na média, de 5 a 6 anos, mesmos prazos dos títulos”, explica.
No ano passado, a Solinftec teve receita de R$ 315 milhões e, para esse ano, a previsão é de um avanço de 17% para cerca de R$ 370 milhões.
Alternativa para cooperativa
A Capal Cooperativa Agroindustrial, com sede em Arapoti no Paraná, captou R$ 150 milhões com CRA Verde. A emissão foi em novembro do ano passado.
“No momento do bookbuilding, chegamos a uma sobreoferta de 153% desse valor, mas optamos por manter o nosso objetivo de R$ 150 milhões”, conta Amilton Brambila, diretor financeiro da Capal.
Atualmente, são mais de 3.400 cooperados, em 90 municípios, que atuam na agricultura – soja, milho, trigo, feijão e café – e na produção de suínos, gado de corte e leite, além de rações.
Conforme Brambila, a cooperativa atua dentro de técnicas sustentáveis, como plantio direto, que tem menor intervenção, protege o solo e conta com a rotação de culturas.
“Adotamos controles e rastreabilidade, portanto, garantimos a origem dos grãos, certificamos que essa produção é feita em áreas regulares no que tange meio ambiente, conservação de reservas e áreas livres de trabalho infantil e escravo”, comenta.
A atuação da Capal e a emissão de seu CRA Verde foram chancelados pela certificação ESG da ERM Nint.
“Existe uma limitação para as cooperativas acessarem alguns instrumentos do mercado financeiro, então, o CRA Verde revelou-se uma alternativa. Os recursos estão sendo utilizados como giro, dando condições para os cooperados fazerem uma ótima produção”, destaca o diretor.
Em 2025, a Capal pretende emitir uma nova série de CRA Verde, porém, também com rating de agência de risco.
Pontos de avaliação
Antes de investir em CRAs Verdes, os investidores precisam conversar com profissionais de investimentos e analisar se as características dos ativos estão alinhadas com seus perfis e objetivos.
Entre os pontos de atenção, estão os retornos oferecidos, prazos, liquidez e riscos. A maior parte das emissões rotuladas no Brasil possuem o prazo de 4 a 6 anos.
“Quanto à taxa de remuneração, elas variam muito, de acordo com o risco associado, à qualidade do crédito e às condições gerais de mercado” ressalta Julia Bretz, da JGP.
É essencial buscar entender os projetos e atividades sustentáveis que estão sendo financiados pelos CRAs Verdes, bem como se as empresas e os títulos possuem selos de entidades reconhecidas, como a Climate Bonds Initiative da International Capital Market Association (ICMA).
“Há ainda certificações para produtos que garantem práticas justas para agricultores e trabalhadores, como a Fair Trade Certification ou o selo Forest Stewardship Council (FSC), para empresas que trabalham com produtos florestais garantindo a procedência da madeira de forma sustentável”, afirma Julia.
Segundo ela, tem ainda companhias que alinharam suas estratégias materiais com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU ou aderiram a iniciativas como Science Based Targets Initiative (SBTi) para estabelecer meta de zero emissões líquidas de carbono até 2050 ou antes disso.