Primeiros passos no e-commerce: startup recebe US$ 2,2 milhões para digitalizar comerciantes

Fundos globais e anjos de empresas como iFood, Stone, Olist, Viva Real e Paypal estão entre investidores da Dolado. Startup reúne 3,5 mil negócios

Mariana Fonseca

Khalil Yassine, Marcelo Loureiro e Guilherme Freire (Dolado/Divulgação)

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SÃO PAULO – Enquanto comerciantes fechavam as portas, os empreendedores Guilherme Freire, Khalil Yassine e Marcelo Loureiro reescreviam os planos para sua startup. A pandemia trouxe uma nova realidade para quem vivia do fluxo de visitantes em pontos comerciais – e os empreendedores viram a oportunidade de incluir micro e pequenos varejistas no mundo das vendas digitais.

Unindo capacitação presencial, atendimento pelo mensageiro WhatsApp e lojas de administração simples, a Dolado conquistou não apenas 3,5 mil estabelecimentos. A startup anunciou também uma captação semente de US$ 2,2 milhões (na cotação atual, R$ 11,3 milhões). O valor será usado para expansão de equipe – o negócio tem 46 funcionários atualmente – e lançamento de mais recursos para os comerciantes.

Esse primeiro investimento recebido pelo negócio contou com nomes de peso. A rodada foi liderada pelo Valor Capital Group (fundo que investiu em startups como Gympass, Olist e Stone). Foi completada pelos fundos Global Founders Capital (Dafiti, Facebook, LinkedIn), Norte Capital (Lemon, The Coffee, Yuca) e Provence (Acesso, Gympass, Rock Content). Participaram também anjos de empresas como iFood, Stone, Olist, Viva Real e Paypal, além de sócios dos internacionais Expanding Capital/Morgan Stanley (ClassPass, Coinbase) e Lightspeed Ventures (Epic Games, Ripple).

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Pequenos comerciantes vs. tecnologia

Engenheiro formado pelo Insper, Yassine começou sua carreira trabalhando em investment banking. Mas seu desejo profissional era ajudar o pai, que era comerciante. “Via como ele usava um caderno para tudo: estoque, vendas, fluxo de caixa. Não tinha nenhuma tecnologia, que poderia ajudar tanto a vida do meu pai quanto as de outros comerciantes”, conta Yassine ao InfoMoney.

Amigos em comum – como Guilherme Bonifácio, um dos fundadores do aplicativo de entregas iFood – levaram Yassine aos seus futuros sócios. Freire foi cofundador do serviço de bicicletas compartilhadas Grow e do e-commerce de óculos Livo. Loureiro também foi cofundador da Grow.

Em dezembro de 2019, os três se sentaram para executar o primeiro projeto da Dolado: uma plataforma online de otimização de estoque. “Sempre que meu pai precisava reabastecer a loja, ou ia até um centro atacadista ou ligava para um representante de marca que iria até a loja, anotaria os pedidos e repassaria à fábrica. Qualquer um desses processos é demorado e leva a um vício de colocar os mesmos produtos no estoque”, diz Yassine.

Em janeiro de 2020, eles começaram a testar em fábricas e comércios sua plataforma de conexão de mercadorias e compradores. Fornecedores nas periferias ganhavam mais clientes, enquanto os varejistas tinham mais diversidade de produtos e economia de tempo.

Algumas semanas depois, apareceu a tal da Covid-19. E isso destruiu nossas esperanças”, afirma Yassine. As dores dos comerciantes viraram outras: com estabelecimentos fechados, comprar mercadoria não era mais o grande problema. Vender pela internet se tornou a maior necessidade.

Ao longo da pandemia, diversas empresas de tecnologia criaram plataformas com foco em digitalizar os pequenos comerciantes – como a Olist, hoje investidora da Dolado. Mas Yassine afirma que boa parte dos comerciantes vê uma lacuna entre seu conhecimento e o uso dessas ferramentas.

“Falam que é um mercado saturado, mas existe uma boa parte do público ainda não atendida. Os micro e pequenos comerciantes tinham uma loja que sempre vendia e nunca precisaram sair das anotações no caderno, muito menos usar um ERP. Havia uma resistência à tecnologia na rotina — as redes sociais serviam só para comunicação e entretenimento, não para o negócio sobreviver. De repente, as lojas fecharam”, diz Yassine.

A forma encontrada de atender esse público foi investir primeiro em capacitação presencial. A Dolado tem atualmente 20 funcionários que atuam como líderes comunitários. Eles participam de grupos regionais ou batem na porta de comércios em regiões afastadas de São Paulo, como Cidade Tiradentes, Itaquera, São Miguel, Cubatão e Campos dos Goytacazes.

Os líderes comunitários apresentam a proposta da Dolado. Depois de colherem informações como celular e CPF/CNPJ do comerciante, ajudam tirar fotos e a cadastrar os primeiros dez produtos na plataforma de estabelecimentos. “Essa abordagem cria uma relação de confiança, mesmo que eles estejam de máscara e a uma distância segura. Testamos a mesma abordagem por ligação telefônica e a curva de aprendizado era muito menor”, afirma Yassine, que também atuou como líder comunitário.

Os próximos atendimentos são feitos pelo WhatsApp, canal conhecido dos empreendedores. Eles compartilham o link de sua loja com seus contatos e podem decidir receber por cartão de crédito ou por dinheiro na hora da entrega. A logística fica a cargo dos próprios comerciantes, como os consumidores costumam estar próximos.

A Dolado começou a funcionar em julho deste ano neste modelo. A startup atende comerciantes que faturam entre R$ 10 mil e R$ 40 mil por mês, em setores tão diversos quanto alimentação, roupas e utilidades domésticas. São 3,5 mil estabelecimentos cadastrados na plataforma. Desde agosto, a startup tem uma média de crescimento mensal de 77%. O plano é alcançar 5 mil estabelecimentos até o final de 2020.

Novo investimento e planos de expansão

Segundo Yassine, a proposta de longo prazo é tornar a Dolado um “super aplicativo do comerciante, ajudando a fazer uma digitalização de cinco anos em cinco meses”. A meta é similar ao crescimento do próprio e-commerce no Brasil durante os piores meses da pandemia. Segundo um relatório do fundo Atlantico, a penetração do e-commerce no varejo saltou cinco pontos porcentuais entre março e maio deste ano (de 7,2% para 12,6%). Foi um crescimento percentual maior do que o registrado entre 2009 e 2019, de 5,2 pontos percentuais.

Outras startups brasileiras surfaram recentemente no crescimento das compras online. A Intelipost, plataforma de cálculos de frete, recebeu também nesta semana uma rodada série B de R$ 130 milhões do Riverwood Capital. A Olist anunciou em novembro deste ano um aporte série D de R$ 310 milhões, liderado pelo SoftBank.

Os anjos e fundos que investiram na Dolado deverão ajudar na conexão com empresas internacionais que passaram pelas mesmas dificuldades – um exemplo é a indiana Udaan, inspiração dos empreendedores para o projeto de dezembro de 2019.

Já o aporte de US$ 2,2 milhões será usado primeiro para expandir a equipe de produto e tecnologia. A Dolado tem 46 funcionários hoje – 13 deles em produto e tecnologia. As contratações servirão para lançar novos recursos aos comerciantes no primeiro trimestre de 2021. Um exemplo é automatizar informações como faturamento por produto, ticket médio e melhor dia e horário para venda. Outro plano é melhorar o acesso aos fornecedores (a ideia inicial da Dolado).

Depois dos investimentos em tecnologia, será a vez de contratar mais líderes comunitários. A Dolado ainda está crescendo nas regiões atendidas hoje, mas espera expandir após o lançamento dos novos recursos. As próximas áreas de atuação ainda não foram fechadas.

Apenas após todas essas mudanças é que a startup enfrentará o grande desafio de empreendimentos escaláveis, inovadores e tecnológicos em estágio inicial: encontrar a melhor forma de monetização.

O serviço deve continuar gratuito aos comerciantes. A Dolado está testando com parte da base neste momento a entrada de parceiros que pagam para fornecer serviços à rede. Por exemplo, um prestador de conciliação financeira aparece aos lojistas e repassa uma comissão para a Dolado a cada contratação. “Se verificarmos que houve uma criação de valor adicional aos comerciantes, expandiremos a conciliação financeira para toda a rede”, diz Yassine.

“Construímos o avião enquanto ele voava. Achamos que tirar dinheiro de um estabelecimento enquanto ele estava com as portas fechadas não era o momento certo”, completa.

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Mariana Fonseca

Subeditora do InfoMoney, escreve e edita matérias sobre empreendedorismo, gestão e inovação. Coapresentadora do podcast e dos vídeos da marca Do Zero Ao Topo.