Na disputa acirrada pelo consumidor, varejistas incluem streamings no leque de produtos

Com aumento da concorrência, plataformas de vídeo têm ganhado espaço no amplo grupo de produtos vendidos no marketplace

Mariana Zonta d'Ávila

Streaming (Shutterstock)

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SÃO PAULO – Frete grátis, desconto progressivo e, agora, streaming. Na briga pelos consumidores, as varejistas brasileiras têm feito de tudo.

Se antes o foco principal das empresas recaía sobre um conjunto de produtos restritos à marca, hoje esse leque foi ampliado por meio do marketplace, com empresas apostando em novas estratégias para reter o consumidor em um ambiente cada vez mais competitivo.

Um estudo da Mastercard sobre pequenas e médias empresas no mundo mostra que o número de marcas que migraram para o modelo online por mês, durante a pandemia, foi três vezes maior do que nos níveis pré-pandêmicos, com um pico em julho de 2020.

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No Brasil, o número de empresas que fizeram essa migração no ano passado cresceu mais de 200% ante 2019. E a direção que as varejistas optaram por seguir foi a de oferecer de tudo.

“O benefício que a empresa tem ao trabalhar com o marketplace é a recorrência. A possibilidade de ampliar as categorias no portfólio também é ouro nesse mercado”, diz Alexandre Machado, especialista em varejo e sócio diretor do grupo GS&Consult.

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E, diante do aumento da concorrência, com novos players locais e internacionais disputando a atenção e preferência no carrinho do consumidor, serviços de streaming têm contribuído como critério de desempate.

Enquanto a gigante americana Amazon optou por focar em produtos dentro da própria empresa, criando o Amazon Prime para oferecer séries e filmes aos clientes, outras têm feito parcerias com serviços já existentes para ampliar o leque de produtos disponíveis na plataforma.

É o caso do Mercado Livre, que lançou recentemente uma parceria com serviços de streaming como Disney+, Paramount+, HBO Max e Deezer Music, oferecendo desconto de até 100% em assinatura pelo prazo de seis meses.

Julia Rueff, diretora de marketplace do Mercado Livre, conta que a iniciativa faz parte do programa de fidelidade da empresa, o Mercado Pontos, trazendo sinergia entre os serviços já oferecidos e ampliando o engajamento dos clientes. “Nossa missão é ser ‘one stop shop’, oferecendo tudo que o consumidor quiser comprar.”

Gameficação para ampliar engajamento

No Mercado Livre, a estratégia do programa de fidelidade assemelha-se a um jogo, com objetivos e “recompensas”.

À medida que compra, o usuário sobe de nível, podendo chegar até o nível seis, garantido benefícios como frete grátis, atendimento mais rápido, além de assinaturas dos serviços de streaming.

Caso o consumidor não chegue a esse nível com seu volume de compras, pode pagar a assinatura de R$ 13,90 para usufruir dos benefícios. Hoje, as assinaturas dos streamings citados acima variam de R$ 19,90 a R$ 27,90 por mês cada uma.

“É um grande estímulo para que as pessoas continuem usando a plataforma, ampliando a possibilidade de serviços. Só de interagir com o cliente, isso o fideliza”, diz Julia.

A escolha de incluir parcerias com streaming, segundo Julia, foi por conta do crescimento das plataformas ao longo da pandemia de Covid-19, mudanças de comportamento do consumidor – que passou a consumir mais conteúdo via streamings –, e ainda, como forma de ampliar o engajamento do usuário.

Embora não abra números da iniciativa, Julia afirma que a estratégia vem crescendo e tem entregado resultados acima das expectativas iniciais. Não há, no momento, ideias de parcerias com outros streamings, dado que o conjunto, segundo a empresa, já está “completo”.

Mercado Livre não está sozinho

Outras varejistas como Americanas (AMER3) e Via (VIIA3), ex-Via Varejo, também estão apostando em iniciativas nas verticais de entretenimento para ampliar o engajamento com seus clientes.

Na Via, dona das Casas Bahia e Ponto Frio, a estratégia foi fazer uma parceria com a Paramount+, oferecendo o streaming pelos aplicativos da marca, Casas Bahia Play e Ponto+.

Ilca Sierra, Chief Experience Marketing Officer (CXMO) da Via, conta que os serviços disponibilizados aos clientes trazem gratuidades e benefícios promocionais.

Com o Paramount+, parceiro inicial do programa, a Via tem um formato sem assinatura. Para acessar a plataforma, o cliente precisa fazer uma compra de qualquer valor através do app das Casas Bahia, e, no caso do Ponto, em categorias definidas, para ter acesso gratuito ao streaming para consumo em até três dispositivos simultâneos até o final deste ano.

“Queremos que nossas marcas estejam presentes em inúmeros momentos da vida dos nossos clientes e estamos agregando valor nos nossos canais de venda. Capturamos que há um interesse muito grande do nosso cliente nos serviços de streaming e de conteúdo. Nossa estratégia foi unir os dois mundos e dar esse acesso à plataforma. A proposta é sempre trazer novas parcerias estratégicas, conteúdos relevantes de entretenimento e benefícios em serviços”, diz Ilca.

Segundo ela, a resposta do cliente está “muito positiva”; o usuário que interage com o CBPlay tem índices de engajamento, conversão e recorrência em média três vezes maior que os demais, afirma.

Além da atual parceria com a Paramount, clientes que compraram consoles e controles Xbox, em outubro, no Casas Bahia Play e no Ponto Plus, ganharam um mês de Xbox Game Pass Ultimate.

Live Commerce

Também no fronte de entretenimento, mas com foco mais direcionado às vendas, a Americanas lançou em 2020 seu projeto de live commerce: o “Americanas ao Vivo”, no qual apresenta produtos em vídeos ao vivo e possibilita aos clientes a compra imediata pelo app da marca.

O serviço completou um ano de operação em junho de 2021 e já realizou mais de 170 lives, com transmissões no app de segunda a sexta, em horários como às 15h e às 19h.

De acordo com Vitor Monte, head de marketing da Americanas, a estratégia resultou no crescimento de mais de dez vezes na busca dos produtos divulgados durante as lives e em uma conversão de vendas sete vezes maior.

O projeto deu tão certo que, em maio deste ano, a Americanas firmou uma parceria comercial com a OOOOO, plataforma mobile britânica de social commerce, com o objetivo de melhorar a experiência para os clientes e expandir o alcance do negócio.

“Com o conceito de ‘entertainment first, shopping later’, a plataforma OOOOO é uma alternativa ao modelo tradicional de varejo, conectando marcas, criadores e compradores por meio de vídeos e lives interativas”, afirma Monte.

Nesse formato, o vendedor pode ser também um criador de conteúdo, fazendo lives e vídeos de forma autônoma demonstrando seus produtos. Do outro lado da tela, o cliente pode interagir com curtidas e mensagens, seguir o perfil do vendedor na OOOOO como em uma rede social, participar por vídeo para tirar dúvidas, compartilhar o conteúdo, participar de jogos para ganhar descontos e comprar o produto desejado sem sair do app.

Monte conta que na OOOOO as lives ocorrem no app da plataforma e são comandadas por influenciadores e especialistas de diversos segmentos. O aplicativo disponibiliza uma agenda com datas e horários das novas lives, além da opção de “lembretes” para que os clientes recebam alertas sobre demonstrações de sua preferência.

“As lives commerce já são uma realidade na China faz tempo. No Brasil, a pandemia acelerou a utilização desse modelo de vendas, com a mudança nos hábitos de consumo e consequente potencialização das compras online. Com elas, foi possível oferecer uma nova experiência de compra que garantisse aos consumidores uma experimentação ‘real’ dos produtos, muito mais humanizada por meio da demonstração ao vivo dos itens nas lives”, afirma o executivo da Americanas.

E completa: “Enxergamos um enorme potencial neste tipo de projeto, que está ganhando cada vez mais espaço no Brasil e no mundo.”

Obsessão pelo consumidor

Machado, do GS&Consult, explica que por trás da estratégia de ampliar o leque de produtos está a obsessão das empresas pelo usuário, isto é, por atender, fidelizar e tornar o consumidor mais fiel e recorrente nas compras da marca.

“O custo de aquisição do cliente é recorrente e o investimento não acaba”, diz. “Isso porque, pelo fato de o consumidor ser muito disperso e ter uma série de opções disponíveis, a estratégia é ‘bombardeá-lo’ todos os dias com ofertas que possam guiar sua tomada de decisão”.

E, em um cenário de ampla concorrência, aquele que estiver mais presente na vida do consumidor tende a se destacar na decisão final de compra.

“As marcas brigam muito por essa atenção e, se o consumidor souber aproveitar, pode se beneficiar”, diz. Neste ponto, incluem-se promoções, frete grátis, cashback e até desconto em serviços de streaming.

Machado avalia que as parcerias são uma forma de ampliar o ecossistema de negócio. Ele cita como exemplo o Magazine Luiza (MGLU3), que fez uma série de aquisições este ano, ampliando sua relevância e controlando a experiência de ponta a ponta, desde o produto ao relacionamento com cliente, logística, meio de pagamento, dados etc.

No caso das plataformas de vídeos, as parcerias entram como forma de redução de custo e de “pegar carona” no sucesso de seu parceiro. “Quando se cria essa aliança, é possível ter o engajamento das duas marcas para oferecer o melhor serviço”, completa.

Outro exemplo são as empresas de telefonia, que oferecem planos de dados e antenas, mas que também contam com outras fontes de renda, como parcerias com canais exclusivos e até streamings, para expandir sua oferta e conseguir engajar cada vez mais o consumidor, diz o executivo.

“O foco principal é a obsessão pelo consumidor, para que ele não pense nem um minuto em trocar a marca por uma outra.”

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