Consignado do Auxílio Brasil: Caixa teve 206 milhões de acessos no app para empréstimos em 10 dias

Banco diz que, em setembro, foram cerca de 25 milhões de acessos ao Caixa Tem e confirma que novas contratações ficaram suspensas neste último fim de semana

Equipe InfoMoney

A Caixa Econômica Federal não informa quanto já liberou em empréstimos consignados do Auxílio Brasil nem quantos beneficiários já tentaram antecipar pela linha de crédito parte do dinheiro que vai receber no futuro, mas afirma que a demanda é “recorde” e que já teve mais de 206 milhões de acessos no aplicativo Caixa Tem, em apenas 10 dias, para a solicitação de empréstimos.

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“A título de exemplo, entre 11 e 20 de setembro, o banco teve cerca de 25 milhões de acessos ao aplicativo Caixa Tem para solicitação de empréstimos. Já entre 11 e 20 de outubro, período em que a Caixa está operando o empréstimo consignado [do Auxílio Brasil], esse número de acessos no aplicativo saltou para mais de 206 milhões”, afirmou o banco em nota. “Ou seja, em volume numérico é como se quase toda a população do Brasil tivesse interagido com o banco em apenas 10 dias”.

Essa procura pelo empréstimo não inclui os pedidos pelos canais presenciais do banco (são mais de 26 mil em todo o país). Além do aplicativo Caixa Tem, é possível contrair o consignado em mais de 4 mil agências bancárias, 9 mil correspondentes Caixa Aqui e 13 mil lotéricas.

O consignado do Auxílio Brasil tem juros de 3,45% ao mês na Caixa (50,23% ao ano), próximo do limite de 3,50% estabelecido pelo governo federal (51,11% ao ano). A parcela mínima para pagar o empréstimo é de R$ 15 por mês e a máxima, de R$ 160 (veja abaixo todas as condições).

Em meio à alta demanda pelos empréstimos, a Caixa interrompeu o funcionamento da plataforma das 18h de sexta-feira (21) às 7h desta segunda-feira (24), alegando uma “manutenção programada”. Essa suspensão ocorreu em meio a uma avalanche de reclamações de atraso na liberação do dinheiro.

Segundo o jornal “O Estado de S.Paulo”, clientes da Caixa estão sendo avisados de que o prazo para o empréstimo cair na conta, que deveria ser de 2 dias úteis, pode demorar até 15 dias (ou seja, o dinheiro pode ser depositado só depois do segundo turno das eleições).

Os beneficiários que contrataram a linha de crédito também dizem terem sido surpreendidos com taxas e seguro que, juntos, podem ultrapassar R$ 200. Há ainda relatos de cancelamento do consignado (sobretudo de quem o contratou logo nos primeiros dias). O empréstimo, que aparecia como “aprovado” ou “em processamento”, agora aparece como cancelado, sem explicações (veja mais abaixo).

O que diz a Caixa

Apesar de não dizer quanto de crédito foi solicitado (e quanto foi liberado até agora) em números absolutos, nem quantos beneficiários tentaram contratar o empréstimo consignado, a Caixa se limita a dizer que “aproximadamente 80% de todas as solicitações feitas já foram concluídas”.

“A alta demanda nos primeiros dias de contratação do consignado ocasionou lentidão no processamento e inconsistências em alguns casos. Foram implementadas melhorias que tendem a regularizar o tempo de análise e processamento das solicitações”, afirma o banco.

“Neste final de semana, a Dataprev realizou manutenção programada em seu ambiente tecnológico. Com isso, a operação do Consignado Auxílio ficou indisponível de 18h de sexta-feira (21) até 7h desta segunda-feira (24) em todos os canais”, diz a Caixa. “O banco ressalta que, no momento, o sistema está funcionando normalmente”.

MP quer suspensão do consignado

Na semana passada, o Ministério Público (MP) junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) pediu a suspensão de novos empréstimos,  para “impedir sua utilização com finalidade meramente eleitoral”, até que a Corte tome uma decisão definitiva sobre o assunto.

“Há a possibilidade de a empresa pública haver incorrido em flagrante desvio de finalidade pública, utilizando-se indevidamente de seus recursos e de sua estrutura para interferir politicamente nas eleições presidenciais, situação a demandar notoriamente a atuação do TCU”, afirma MP no pedido.

Mas a área técnica do tribunal foi contra o pedido, “em face da relevância social” do tema, e recomendou ao relator do caso no TCU, ministro Aroldo Cedraz, que dê à Caixa 5 dias úteis para se manifestar, antes de uma decisão. Cedraz não se manifestou sobre o pedido do MP até o momento.

O consignado do Auxílio Brasil é uma das medidas do pacote de benefícios sociais do governo para tentar alavancar as intenções de voto do presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), junto às camadas de menor renda da população (veja mais abaixo).

A medida é vista como eleitoreira e criticada por especialistas da área social por ser um estímulo ao endividamento de pessoas que já vivem em condições de alta vulnerabilidade e insegurança alimentar.

Dinheiro em até 15 dias

Famílias que recebem Auxílio Brasil e contrataram o consignado foram informadas pela Caixa que o dinheiro do empréstimo só será depositado na conta do beneficiário após as eleições. O prazo estipulado pelo governo é de até 2 dias úteis, mas o banco tem informado aos clientes que o dinheiro só deve cair na conta em até 15 dias.

A Caixa afirmou ao “O Estado de S.Paulo” que há um “excesso de solicitações” que ocasionou “lentidão nos processamentos”, mas disse que a liberação do crédito se dá em no máximo 5 dias. A reportagem, no entanto, teve acesso a mensagens enviadas a clientes em que o banco diz que o “crédito ocorre entre 2 e 15 dias”. O Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) aponta um prazo ainda maior (e que recebeu relatos de beneficiários para quem o dinheiro do empréstimo foi prometido só para dezembro).

Jenifer Kauane Batista contratou o consignado pela Caixa na terça-feira (11), logo no primeiro dia em que estava disponível nas lotéricas. O empréstimo foi aprovado dois dias depois, e ela foi informada de que o dinheiro seria liberado em 48 horas. Como a transferência não foi feita, ela ligou no SAC do banco e a atendente deu uma outra informação: de que o prazo era, na verdade, de 5 dias. Na quinta-feira (20), ao checar o aplicativo do banco, Jenifer viu que o pedido, que antes constava como “aprovado”, havia voltado para o status “em processamento “.

“Tentei ligar no SAC novamente, mas não atendem. Também estou tentando falar no WhatsApp da Caixa, mas só dá erro. Não sei mais o que eu faço”, conta a beneficiária do Auxílio Brasil, que mora em Paranaguá (PR) com o marido e o filho de 2 anos e contratou um empréstimo de R$ 2,3 mil. “Esse dinheiro iria me ajudar muito para pagar contas atrasadas e comprar coisas para a minha casa”.

Fake news sobre o empréstimo

Além da queixa geral, há muita desinformação nas redes sociais em torno do consignado do Auxílio Brasil. O Estadão acompanhou 7 grupos de beneficiários do programa no WhatsApp, no Facebook e no Telegram. O clima das mensagens é uma mistura de indignação e revolta de quem ainda não conseguiu receber o dinheiro, mesmo após a contratação, e de insegurança com uma enxurrada de fake news.

“Nas redes sociais, encontramos divulgação de fake news informando que, caso a pessoa deixasse de receber o auxílio, o governo iria assumir essa dívida”, diz Ione Amorim, coordenadora do programa de serviços Financeiros do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor). Caso o beneficiário deixe de receber o Auxílio Brasil, independentemente do motivo, será obrigado a continuar pagando as parcelas por conta própria, até o final do contrato, pois o empréstimo não será cancelado (veja mais abaixo).

O Idec vem monitorando reclamações nas redes sociais sobre a nova linha de crédito consignado e, nos últimos dias, notou um aumento expressivo no número de queixas sobre o atraso no pagamento. A demora no período eleitoral tem gerado dúvidas. “Muitos perguntaram se o Lula ganhar a eleição o consignado será suspenso”, afirma Paola Carvalho, diretora institucional da Rede Brasileira de Renda Básica, rede de apoio aos vulneráveis criada durante a pandemia da Covid-19 pelo terceiro setor.

Críticas à Caixa (e ao governo)

Em um dos grupos públicos do Facebook “Empréstimo Caixa Tem – Auxílio Brasil”, com mais de 280 mil membros, a pergunta mais frequente é “Quem conseguiu receber o empréstimo?”, além de críticas à Caixa. “É muito humilhante. Eu tenho um print de quando foi aprovado. A menina da Lotérica disse que aparecia no sistema que eu não tinha mais margem e que significava que o empréstimo deu certo. E hoje me apareceu cancelado”, diz Giovana Verli, de Umuarama, também no Paraná.

Segundo a Caixa, nessas situações é preciso fazer uma nova solicitação. “Temos que cobrar do presidente, desse pessoal que aprovou o empréstimo e da Caixa. Não só eu como outras mulheres dependem do dinheiro”, afirma Giovana, que ouviu de uma atendente do banco que o problema é no suporte técnico, que está muito sobrecarregado com a forte procura pelo empréstimo.

Nos grupos de Facebook e WhatsApp aos quais o jornal “O Estado de S.Paulo” teve acesso, há uma avalanche de reclamações de atraso na liberação do dinheiro. Beneficiários relatam que a Caixa já fala em 15 dias de prazo para o recebimento do crédito, sendo que o prazo informado inicialmente era de 48 horas após a aprovação (a portaria do Ministério da Cidadania determina no máximo 2 dias úteis).

Em uma das mensagens compartilhadas, a Caixa diz a uma beneficiária por WhatsApp que “nesta semana o sistema da Dataprev está congestionado, atrasando o crédito”. Uma outra participante relatou ter sido informada de que só teria acesso ao crédito a partir de 10 de novembro. Há ainda relatos de cancelamento do benefício — sobretudo de pessoas que contrataram o consignado nos primeiros dias. O empréstimo, que aparecia como “aprovado” ou “em processamento”, agora aparece como cancelado.

A Caixa afirma que, quando a solicitação apresenta status de “cancelado” ou “em processamento” há mais de 2 dias, “os beneficiários podem realizar nova solicitação diretamente no Caixa Tem ou nas unidades lotéricas e agências”.

Caixa, Auxílio Brasil e eleição

Desde o início do segundo turno, a Caixa tem anunciado diversas medidas e programas focados nas classes mais baixas e nas mulheres — públicos em que o presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), tem maior rejeição. A Caixa é banco 100% controlado pelo governo federal.

Ela é o único grande banco do país a oferecer o consignado do Auxílio Brasil. Outros 11 bancos e instituições financeiras também foram autorizados a operar a linha de crédito, entre eles o banco Safra e a Crefisa, mas apenas a Pincred e a meutudo/QI estão oferecendo o produto no momento.

Todos os grandes bancos que têm capital aberto — Banco do Brasil (BBAS3), Bradesco (BBDC4), Itaú Unibanco (ITUB4) e Santander Brasil (SANB11) — têm mostrado receio com o produto (considerado arriscado dado o perfil do público-alvo e a situação de fragilidade social de muitos beneficiários).

Entre os anúncios feitos pela Caixa nos últimos dias estão:

O banco também antecipou o pagamento do Auxílio Brasil e do vale-gás em outubro, para o calendário ser concluído até o dia 25 — cinco dias antes do segundo turno, que será disputado no dia 30. Originalmente, o repasse terminaria no dia 31, no dia seguinte ao fim das eleições. A Caixa antecipou também os pagamentos do auxílio caminhoneiro e do auxílio taxista neste mês e anunciou que a quinta e a sexta parcelas dos benefícios também serão antecipadas.

O consignado do Auxílio Brasil

O consignado do Auxílio Brasil tem juros de 3,45% ao mês na Caixa (50,23% ao ano), próximo do limite de 3,50% estabelecido pelo governo federal (51,11% ao ano). A parcela mínima para pagar o empréstimo é de R$ 15 por mês e a máxima, de R$ 160. A duração máxima é de até 24 meses.

O empréstimo pode ser contratado pelo aplicativo Caixa Tem e em mais de 26 mil pontos físicos (mais de 4 mil agências bancárias, mais de 9 mil correspondentes Caixa Aqui e mais de 13 mil lotéricas). O responsável precisa estar recebendo o benefício há mais de 90 dias (3 meses) e não pode ter deixado de comparecer a uma convocação do Ministério da Cidadania.

O teto de juros estipulado pelo governo federal para o consignado do Auxílio Brasil (3,50% ao mês) é superior ao imposto pelos bancos ao consignado do INSS (2,14%). Também está acima do que é cobrado em vários tipos de consignado, segundo dados do Banco Central:

As regras do consignado

As pessoas que recebem o Auxílio Brasil podem comprometer até 40% do valor que recebem por mês para pagar o empréstimo, por um prazo máximo de 24 meses (2 anos). Os juros são limitados a 3,50% ao mês (51,11% ao ano).

O limite de 40% incide sobre o valor permanente do benefício, que é de R$ 400 (os atuais R$ 600 estão garantidos pelo governo federal só até dezembro). Assim, o beneficiário poderá descontar até R$ 160 mensais durante, no máximo, 2 anos.

O pagamento do empréstimo é descontado todos os meses do valor do benefício, diretamente na folha de pagamento, durante o prazo contratado (o desconto é feito antes de o Auxílio Brasil ser depositado na conta da família).

Caso o beneficiário deixe de receber o Auxílio Brasil, independentemente do motivo, ele será obrigado a continuar pagando as parcelas por conta própria, até o final do contrato, pois o empréstimo não será cancelado.

O que é proibido

Os bancos e as instituições financeiras que oferecem o produto não podem cobrar nenhuma taxa além dos juros. Não é permitida a cobrança da Taxa de Abertura de Crédito (TAC) nem taxas administrativas, por exemplo, e as empresas são obrigadas a informar o Custo Efetivo Total (CET) do empréstimo no momento da contratação.

As empresas não podem oferecer ativamente o consignado para beneficiários do Auxílio Brasil, pois a portaria que regulamentou a linha de crédito proíbe qualquer atividade de marketing ativo, oferta comercial, proposta e publicidade direcionada a beneficiário específico ou qualquer tipo de atividade para convencê-lo a assinar os contratos de empréstimo consignado.

Elas também não podem dar prazo de carência para o beneficiário começar a pagar as parcelas, que começarão a ser descontadas do Auxílio Brasil logo após a aprovação do crédito e da liberação do dinheiro.

(Com Estadão Conteúdo)