Fed sinaliza alta de juros em ritmo menor, mas taxa terminal mais alta: bom ou ruim para os mercados?

Enquanto reações iniciais a falas de Jerome Powell foram vistas como negativas, Goldman aponta que indicações do Fed diminuem riscos de calibragem errada

Lara Rizério

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Enquanto a B3 esteve fechada na última quarta-feira (2), os investidores ficaram de olho na última decisão do Federal Open Market Committee (Fomc), que foi em linha com o esperado. Os juros tiveram alta confirmada de 0,75 ponto percentual, para uma banda entre 3,75% e 4% ao ano, enquanto a indicação de possível desaceleração de altas de juros à frente também foi dada.

Se as sinalizações do comunicado a princípio seriam positivas, as falas de Jerome Powell, presidente do Fed, após a decisão derrubaram o mercado na véspera. O índice Dow Jones fechou em queda de 1,55%, a 32.147,76 pontos, o S&P 500 perdeu 2,50%, a 3.759,69 pontos, enquanto o índice de tecnologia Nasdaq Composite recuou 3,36%, a 10.524,80 pontos. O índice Dow Jones Brazil Titans 20 ADR, que reúne as principais empresas brasileiras listadas na B3 com recibos de ações negociados nos Estados Unidos, fechou ontem em queda de  3,46%, aos 17.284 pontos.

Entre as declarações de Powell, a que mais pesou negativamente foi a de que é “muito prematuro” pensar em pausar as altas, o que derrubou as ações. As expectativas de mercado eram de que haveria, além da alta confirmada de 0,75 ponto percentual na quarta-feira, uma alta de 0,5 ponto percentual na reunião agendada para dezembro e, em 2023, os juros permaneceriam estáveis e poderiam mesmo começar a descer se a inflação entrasse nos eixos.

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Assim, a fala de Powell foi como um “balde de água fria” nas expectativas de alívio na política monetária americana, aponta a Levante. “Ainda temos um caminho a percorrer”, afirmou o chair do Fed. Ele não disse “longo”, mas isso ficou implícito, avalia a casa de análise.

Quando perguntado sobre o processo decisório da magnitude do ajuste da reunião de dezembro, Powell sinalizou que não é necessário observar claros sinais de arrefecimento da inflação americana para reduzir o ritmo de altas da taxa de juros. Para o presidente, a velocidade do ajuste de dezembro é uma questão secundária e o verdadeiro foco é determinar a taxa terminal do atual ciclo de alta.

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Entretanto, reforçou que este ponto está cercado de incertezas e que a desaceleração do ritmo de alta pode acontecer na reunião de dezembro ou na subsequente. “Apesar do sinal mais dovish (brando, de desaceleração do ritmo de altas) dado pelo Fed de que a sua campanha para domar a inflação possa estar próxima da sua fase final, o sinal mais hawkish (duro) de que a taxa terminal pode ir ainda mais longe do que o projetado na reunião de setembro é a mensagem que deve prevalecer, impactando os mercados financeiros de maneira negativa e causando queda dos principais índices”, avaliam os analistas.

A XP destaca, também citando o comunicado e as projeções para as próximas reuniões, que o comitê de política monetária avaliará o efeito defasado e cumulativo do aperto monetário sobre a atividade econômica, a inflação e o mercado financeiro do país.

“Acreditamos que esta decisão foi movida pela necessidade de o Fed manter um posicionamento duro para proteger sua credibilidade, e reflete a avaliação do comitê de que o risco de apertos insuficientes supera o risco de apertos excessivos”, avalia. O ritmo de alta de 0,75 ponto percentual representa um aumento agressivo dado o histórico da condução de política monetária nos EUA, e o atual ciclo de aperto tem sido muito mais acelerado comparado com ciclos anteriores. Para a reunião de dezembro, acredita que o Fed irá desacelerar o ritmo de elevação para 0,50 ponto.

Olhando adiante, a necessidade de aumentos adicionais dependerá dos dados de inflação e do mercado de trabalho. Se os números de outubro e novembro mostrarem arrefecimento, o Fed poderá fazer uma pausa após a decisão de dezembro. Por outro lado, se as pressões inflacionárias persistirem e o mercado de trabalho continuar apertado, podemos ver altas sequenciais de 0,25 ponto nas primeiras reuniões de 2023. Para os analistas da casa, o Fed encontrará espaço para começar a cortar a taxa de juros de referência no 4º trimestre de 2023, tendo em vista um cenário de recessão moderada e de avanços no processo de desinflação.

David Kohl, economista-chefe do banco suíço Julius Baer, segue esperando que o Fed suba as taxas em um ritmo mais lento de 50 pontos-base em sua próxima reunião em dezembro, enquanto vê um risco crescente de que o Fed continue subindo as taxas em 2023, apertando severamente a política monetária.

Já Leonardo Pellandini, da equipe de estratégia do banco, aponta que, com a sinalização de menores aumentos à frente, mas  com a taxa terminal mais alta, o caminho para uma aterrissagem econômica suave pode ser mais difícil de alcançar e levanta preocupações sobre o impacto de um maior aperto monetário na economia.

“As esperanças de um pico dos juros mais próximo estão desaparecendo e os investidores agora aguardam que os próximos dados de inflação sejam mais baixos para ver o fim do ciclo de alta. Enquanto isso, a temporada de resultados do terceiro trimestre está quase no fim, com os lucros acumulados 1% abaixo das projeções até agora, o que não é tão ruim quanto muitos investidores temiam, impulsionados por setores cíclicos, como materiais básicos e financeiros. Defensivos, incluindo petróleo e gás, por outro lado, estão entregando surpresas positivas”, avaliam.

Para Pellandini, até agora, não houve grandes mudanças no guidance (projeções) de resultados para o próximo ano. “Consequentemente, é provável que o guidance seja revisado para baixo apenas em dezembro, ou durante a temporada de relatórios do quarto trimestre, quando as empresas precisam trazer suas previsões. Dado o cenário macroeconômico desafiador, continuamos recomendando uma posição defensiva e foco em empresas com alto poder de precificação e geração de fluxo de caixa”, avalia o estrategista sobre o mercado de Wall Street. Uma oportunidade de compra para empresas cíclicas provavelmente surgirá no início do próximo ano, quando os mercados tiverem descontado totalmente os riscos, complementa.

Por outro lado, numa visão contrária, o Goldman Sachs avalia que o Fomc diminuiu um pouco a preocupação dos analistas do banco com o risco de o Fed apertar de forma desnecessária os juros para causar uma recessão no próximo ano, apesar da sugestão de uma taxa terminal mais alta.

“O Fomc apresentou um forte argumento para desacelerar o ritmo de aperto mesmo diante da inflação de serviços teimosamente alta, enquanto Powell reiterou que o objetivo ainda é reduzir a inflação por meio de um período sustentado de crescimento abaixo da tendência, reconhecendo que levará tempo para que o efeito do aumento das taxas sobre a inflação seja plenamente sentido. Powell julgou que a janela para um pouso suave diminuiu porque a taxa de fundos precisa subir mais”, afirma o banco.

O Goldman complementa destacando que vê agora as chances de calibrar incorretamente como um pouco menores porque o Fomc provavelmente se moverá menos rapidamente, sendo que parece menos provável que apertará os juros demais em um cenário em que as causas do problema da inflação já estejam sendo resolvidas, ainda que a inflação de serviços permaneça desconfortavelmente alta por um tempo.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.