Eletrobras: os próximos passos para concluir a privatização de até R$ 100 bilhões, a maior já vista no Brasil

Próximas etapas incluem sanção da MP por Jair Bolsonaro, definições do CNPE, estudo do BNDES, homologação da operação pelo TCU e a oferta de ações

Equipe InfoMoney

Eletrobras (Foto: Getty Images)

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SÃO PAULO – A aprovação pelo Congresso da Medida Provisória que abre caminhos para a privatização da Eletrobras (ELET3;ELET6), cuja última etapa foi concluída na segunda-feira com a segunda votação feita pela Câmara dos Deputados, ainda contará com uma série de etapas até ser concluída. A próxima etapa é a sanção pelo presidente Jair Bolsonaro, que deve acontecer em até 15 dias, que se seguirá de avaliações da operação pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES), Tribunal de Contas da União (TCU) e pela própria assembleia de acionistas.

Atualmente, o governo tem cerca de 61% das ações da Eletrobras. Com a capitalização da empresa, esse percentual cairá para 45%.

Durante fala à imprensa nesta terça-feira (22), Diogo Mac Cord, secretário especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados da Economia, destacou as projeções do governo sobre o processo que, conforme apontou, será a “maior privatização já vista no país”, podendo gerar R$ 100 bilhões aos cofres públicos depois que estiver totalmente concluída.

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De acordo com Mac Cord, os R$ 100 bilhões referem-se a i) R$ 20 bilhões esperados com a outorga, ou oferta inicial,  e ii)
R$ 80 bilhões de potenciais ofertas secundárias da venda de ações remanescentes.

“Há a intenção [de vender a participação remanescente]. Agora, como e quando, só a modelagem que vai fazer. A gente não consegue fazer tudo agora, o mercado não tem capacidade de absorção, e a gente quer capturar no momento seguinte o ganho com a melhor gestão”, destacou.

A União estima receber “à vista” da Eletrobras cerca de R$ 20 bilhões como pagamento das outorgas pela renegociação de contratos antigos de hidrelétricas, recursos esses que deverão ser levantados com a oferta primária, em operação que o secretário espera estar concluída até fevereiro do ano que vem.

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Ele lembrou que o próprio processo de privatização, desde que foi oficializado, elevou o valor de mercado da empresa por meio da valorização das ações em R$ 27 bilhões em cerca de quatro meses, para R$ 74,6 bilhões – um valor que o governo espera seguir capturando com as ofertas secundárias subsequentes ao processo.

Durante o processo, haverá a definição da modelagem do negócio pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e conclusão de estudos pelo BNDES.

Então, a operação tem que ser homologada pelo TCU e também passar por aprovação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da assembleia de acionistas da própria Eletrobras.

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Mac Cord acrescentou que, com a privatização, haverá imediatamente injeção de recursos para a “modicidade tarifária” o que, de acordo com o governo, levará à redução de tarifas para o consumidor de energia elétrica. Especialistas do setor, porém, argumentam o contrário, que o negócio pode gerar um aumento no custo para o consumidor.

O Bradesco BBI, em relatório, apontou que a a próxima etapa crítica é finalizar a modelagem da operação de capitalização, liderada pelo BNDES. Para os analistas do banco, assim como de outras casas de análise, esse é um ponto de atenção e que não pode ser postergado levando em conta que, por causa das eleições presidenciais em 2022, muitos no governo veem o primeiro trimestre como um prazo para a privatização da companhia.

Dentre os diversos pontos a serem abordados nesse processo, os analistas veem como principal desafio definir a valoração da usina nuclear de Angra 3, para a qual ainda faltam estudos sobre capex (investimentos) pendentes (estimado em cerca de R$ 15 bilhões) e tarifa final a ser concluída (a subsidiária Eletronuclear, incluindo Angra 1, 2 e o projeto Angra 3, tem que ser “cindida” da ELET antes da privatização).

O BNDES também precisa definir o título de concessão a ser pago pela ELET ao governo federal. Já em relação à análise do TCU, que normalmente poderia ser muito demorada, a Eletrobras vem realizando reuniões semanais com o TCU para mantê-lo informado e facilitar o andamento da aprovação, destacam.

Próximas etapas para a privatização da Eletrobras (estimativa de conclusão do processo no primeiro trimestre de 2022: 
  • Sanção pelo presidente Jair Bolsonaro para converter Medida Provisória em Lei
  • Definição pelo CNPE das premissas fundamentais à modelagem e finalização dos estudos pelo BNDES
  • Operação tem que ser homologada pelo TCU
  • Oferta primária das ações ao mercado

Descotização

O governo estimou em R$ 60 bilhões o valor da chamada “descotização”, como ficou conhecido o processo de mudança de contratos de hidrelétricas antigas da Eletrobras para condições mais vantajosas.

“Os 60 bi [de reais] são um ganho da Eletrobras, ela vai ter que pagar por isso (pelos novos contratos). Ou ela paga à vista ou ela difere, está acontecendo os dois agora, os 20 bi ela paga à vista, e os outros ela está diferindo, em fluxo de investimentos e para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE)”, explicou Mac Cord.

Conforme apresentação feita pelo secretário, dos R$ 60 bilhões, R$ 30 bilhões serão pagos pela Eletrobras ao longo dos anos à CDE, com o objetivo de garantir modicidade tarifária, após a renegociação dos contratos.

Há previsão ainda de R$ 10 bilhões em obrigações de investimentos da Eletrobras, para viabilizar recuperação de reservatórios do Sudeste e Nordeste e reduzir custos de conexão no Norte –o valor total se completa com o pagamento da outorga de R$ 20 bilhões.

Além da parcela referente às outorgas, a CDE vai receber também fluxos do excedente econômico de Itaipu, com a quitação em 2023 de empréstimos que financiaram a construção da usina hidrelétrica binacional.

O valor estimado desses fluxos em 20 anos é de R$ 25 bilhões, sendo que R$ 18 bilhões destinados à CDE para redução de tarifas e R$ 7 bilhões para “programas contra pobreza”.

Considerando os pagamentos da Eletrobras e de Itaipu à CDE, o governo estima, portanto, R$ 48 bilhões  para redução da tarifa dos brasileiros.

O secretário comentou que “nunca foi visto” tal injeção de recursos em prol da modicidade tarifária no país. Ele citou ainda medidas que ajustam a garantia física das usinas, a revitalização das bacias do São Francisco e Furnas, além da redução do chamado risco hidrológico do consumidor.

O secretário citou estudos do Ministério de Minas e Energia que preveem redução de tarifas de 6,34%, em um cenário-base, e de até 7,365% em uma visão mais “arrojada”.

Além disso, ele refutou o que chamou de contas “mirabolantes” que apontaram aumento de tarifas, que segundo ele foram divulgadas para tumultuar o processo.

Entre os fatores de alta nos custos estão a contratação obrigatória de 8 gigawatts em térmicas a gás, até mesmo em áreas não produtoras do insumo, o que garante uma reserva de mercado que ameaça um marco legal que preza pela competição. 

Segundo o secretário, quando o governo realizar os leilões para contratação de térmicas, o mercado vai apresentar diferentes propostas, e o preço-teto terá que ser suficiente para bancar o projeto, com ou sem gasoduto.

O texto como aprovado pelo Congresso Nacional estabelece preço-teto de aproximadamente 360 reais/MWh – mesmo valor do último leilão A-6, de 2019, atualizado.

Com isso, o governo espera que as térmicas a gás sejam capazes de deslocar as termelétricas a óleo diesel, cuja energia custa três vezes mais.

Ele disse que vai ser criada ainda este ano uma estatal para abrigar Eletronuclear e Itaipu, que ficarão fora da nova Eletrobras privatizada. Ele ressaltou que essa empresa nascerá como não dependente, já que são companhias com caixas próprios.

Empregados

O secretário especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados da Economia disse também que o governo vai avaliar todo o conteúdo da Medida Provisória da Eletrobras aprovada na Câmara e poderá propor vetos a alguns dos trechos, especialmente aqueles inconstitucionais, antes da sanção presidencial.

Entre os trechos que podem ser vetados por serem inconstitucionais, os deputados determinaram que o Executivo deverá remanejar empregados da Eletrobras e subsidiárias que forem demitidos sem justa causa nos primeiros 12 meses após o processo de desestatização. Os funcionários deverão ser realocados em cargos de mesma complexidade ou similaridade.

Mac Cord reconheceu que essa emenda é inconstitucional. Ele disse, porém, que os vetos serão definidos pelo governo após ouvir todas as áreas.

Meio Ambiente

Outro trecho que viola a Constituição e que foi fundamental para a obtenção dos votos dos três senadores de Roraima na Casa em que a MP passou com margem de apenas um voto, foi a emenda que atropela o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) no licenciamento para a construção da linha de transmissão de energia Manaus-Boa Vista.

Do total de 721 km do traçado previsto para ser erguido, 125 km passam dentro da terra indígena Waimiri Atroari, onde estão 31 aldeias e vivem 1.600 índios.

Essa proposta pode ser considerada inconstitucional, já que é garantido na Constituição que as comunidades indígenas sejam consultadas sobre o tema, em atendimento a uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) com a qual o Brasil concordou.

Embora haja interpretações de que essa emenda pode atrapalhar os negócios brasileiros e as exportações, dado que prejudica a imagem do Brasil no exterior, Mac Cord, esse assunto será tratado por outras áreas do governo. “Nossa secretaria não se envolve nesse tipo de tema”, disse.

Judicialização no radar

Cabe destacar que já tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) duas ações contra a MP, sob relatoria do ministro Kassio Nunes Marques e que contestam, principalmente, a tramitação da medida no Poder Legislativo.

Partidos políticos prometem entrar com mais processos na Corte contra o conteúdo aprovado pelo Congresso Nacional e na tentativa de impedir a sanção pelo presidente Jair Bolsonaro.  A depender do escopo dos pedidos feitos pelas legendas, é possível que novos processos sejam distribuídos a outros integrantes do STF.

Indicado por Bolsonaro, Nunes Marques tem demonstrado alinhamento com os interesses do governo, e não é esperado que ele tome alguma decisão para barrar ou atrasar o processo de capitalização da estatal, destaca a XP Política. Com ele estão ações que tratam de problemas na tramitação ou na falta de urgência da medida provisória.

Por outro lado, questionamento sobre vantagens e desvantagens de privatizar a empresa neste momento têm chances de terem outro relator.

Caso a presidência do Supremo Tribunal Federal entenda que novos questionamentos devem entrar no sorteio para definir relator, o cenário pode mudar, aponta a XP Política. Entre os que demonstram posição menos alinhada com a política de privatizações do governo estão os ministros Ricardo Lewandowski, Edson Fachin e Marco Aurélio Mello – este com aposentadoria marcada para 12 de julho.

(com Reuters e Estadão Conteúdo)

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