Com privatizações à vista, é hora de investir em estatais?

Papéis de empresas públicas passam por um rali na bolsa brasileira, mas analistas dizem que é preciso olhar além disso antes da compra

Anderson Figo

(Shutterstock)

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SÃO PAULO — A lista de privatizações anunciada ontem pelo governo federal está movimentando as ações de estatais na bolsa. Até mesmo aquelas que não entraram no rol oficial de empresas a serem desestatizadas neste ano tiveram forte valorização na B3, como foi o caso da Petrobras (PETR3;PETR4), que chegou a subir até 8% na véspera com a notícia de que o governo quer vendê-la até 2022 (o que não foi confirmado pelo governo).

Enquanto isso, outros ativos registraram uma disparada ainda maior, como foi o caso da Telebras (TELB4), que mais do que dobrou de valor nas duas últimas sessões. Mas este é um bom momento para comprar papéis de empresas públicas?

A resposta vai depender de caso a caso. É inevitável que a possibilidade de privatização anime os investidores, já que as estatais tendem a ser vistas como empresas com menor eficiência, mas esse não deve ser o único ponto observado antes de tomar a decisão de compra. 

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“Não sabemos quanto tempo o rali vai durar. O governo anunciou sua intenção de privatizar empresas, mas esse não é um processo fácil. Ele depende de uma série de aprovações do Congresso e pode durar muito tempo”, diz Eduardo Carlier, sócio-gestor de renda variável da AZ Quest.

“A compra de estatais, no geral, faz sentido porque essas empresas vão se beneficiar do corte de juros, o que alivia suas dívidas. As estatais geralmente são mais alavancadas do que as demais companhias”, explica Carlier. “Mas é preciso olhar uma a uma. Alguns setores são mais delicados que outros.”

Empresa Valor de mercado em 31/12/2018, em R$ milhões Valor de mercado em 21/08/2019, em R$ milhões Variação da ação em 2019, em % Variação da ação em 21/08/2019, em %
Petrobras 316.085 350.208 12,21 5,95 (PETR4)
Banco do Brasil 129.499 131.940 1,85 5,72 (BBAS3)
Eletrobras 33.821 60.869 85,72 12,39 (ELET3)
Sabesp 21.531 37.853 75,81 4,69 (SBSP3)
Cemig 20.781 24.085 10,97 4,06 (CMIG4)
Copel 8.251 14.418 69,95 -0,50 (CPLE6)
Copasa 7.777 9.352 20,25 3,28 (CSMG3)
Banrisul 8.914 9.038 3,13 -1,91 (BRSR3)
Sanepar 6.242 8.459 31,50 3,28 (SAPR11)
Telebras 1.121 1.928 31,30 69,78 (TELB3)

No setor de petróleo, a notícia sobre uma possível privatização da Petrobras foi bem-recebida pelo mercado, mas alguns analistas enxergam baixa probabilidade de o processo ir, de fato, para frente. Essa é a avaliação de Gabriel Fonseca, da XP Investimentos, que ainda assim mantém a recomendação de compra para os papéis da companhia.

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O otimismo do analista tem mais a ver com o cenário de gestão e programa de desinvestimentos do que com qualquer perspectiva de transferência do controle para a iniciativa privada. 

Fonseca espera que a ação preferencial da Petrobras chegue a R$ 36 no fim deste ano, o que corresponde a uma valorização de 41% sobre o patamar atual do papel. 

O case de Petrobras, de acordo com Fonseca, depende muito mais do cenário internacional hoje do que de qualquer política de governo.  “Atualmente, a Petrobras é uma empresa muito mais dependente da direção do preço do petróleo.” 

Da máxima do ano atingida em abril até hoje, o barril do petróleo tipo Brent — usado como referência pela Petrobras — caiu 20%, saindo de US$ 74,57 para US$ 59,77.

“O momento de commodities não está bom. A nossa recomendação se baseia em um petróleo estático em US$ 60, se cair abaixo de US$ 50, o cenário fica bem negativo”, completa o analista da XP.  

Porém, em paralelo ao cenário sobre o petróleo, a recomendação de compra da XP é guiada por outros eventos que, segundo o analista, não estão sendo precificados pelo mercado, como a perspectiva de venda de 8 das suas refinarias, a abertura do mercado brasileiro ao gás natural e a queda do endividamento (veja mais clicando aqui). 

O Bradesco BBI também enxerga alguns fatores que levantam dúvidas sobre a viabilidade da privatização da Petrobras — o principal deles seria a aprovação pelo Congresso. Mesmo assim, o banco afirmou que, caso realmente a empresa seja vendida para a iniciativa privada, suas ações podem dobrar de valor.

“Haveria uma lista de possíveis compradores para esse atraente ativo de classe mundial, que incluiria companhias petrolíferas, agentes financeiros e players do mercado. (…) Qualquer comprador estratégico com um balanço sólido e apetite para crescer nas regiões do pré-sal [ou seja, players que já participam de licitações no pré-sal] podem ser compradores em potencial [da Petrobras]”, afirmou o Bradesco BBI em relatório. 

Já sobre Eletrobras, Fonseca diz que o processo de privatização mais alinhado para acontecer. “O que precisa é de aprovação do Legislativo”, afirma. Ele diz que a ideia de vender a estatal de energia elétrica já amadureceu há algum tempo no Executivo e o que ocorreu ontem foi só uma oficialização. “É uma sinalização boa.”

No início do ano, o analista Miguel Rodrigues, do Morgan Stanley, projetou que a privatização completa da Eletrobras seria o gatilho para o cenário mais positivo possível, no qual o preço-alvo das ações preferenciais seria de R$ 51.

Tomando como base o preço de fechamento dos papéis na véspera, de R$ 45, o potencial de valorização seria de 11%. 

Energia e saneamento

Fora do mainstream das três principais estatais na bolsa brasileira, os papéis de companhias públicas dos setores de saneamento básico e energia elétrica também chamam atenção de analistas e investidores.

No caso de saneamento, os olhos estão voltados para o projeto de lei que institui o novo marco legal do setor. A Câmara dos Deputados instalou ontem uma comissão especial para analisar a proposta. Ela facilita a abertura do setor para a iniciativa privada e a intenção de alguns estados de privatizar ou capitalizar companhias estatais. 

“As sinalizações do Congresso são muito positivas em relação ao novo marco legal do saneamento. Isso deve sair e com certeza vai beneficiar as empresas do setor, resta saber quando e como”, diz Carlier, da AZ Quest. Há uma pressão para que o texto que está em análise seja modificado.

Isso porque os governadores já conseguiram, no Senado, alongar consideravelmente o prazo para que a obrigatoriedade de licitação entre em vigor para valer. Alguns ainda tentam derrubar esse trecho do projeto

Em entrevista ao InfoMoney, o deputado Geninho Zuliani (DEM-SP) criticou as emendas colocadas no texto pelos senadores. Segundo ele, do jeito que está, o texto não levará à universalização dos serviços no Brasil até 2033, como está estabelecido no Plano Nacional do Saneamento Básico. 

Zuliani defendeu a atuação do setor privado em uma área ainda carente de investimentos, com mais de 100 milhões de brasileiros sem acesso à coleta de esgoto e 35 milhões não abastecidos com água potável. “Hoje nós não temos mais direito de ficar discutindo essa questão ideológica. Nós precisamos de R$ 600 bilhões para resolver esse problema e esse dinheiro está na mão do setor privado.”

As ações da Sabesp e da Sanepar já subiram 75% e 31,7%, respectivamente, neste ano. Apenas na sessão de ontem, os papéis tiveram valorizações de 4,7% e 3,3%, nesta ordem. 

No setor elétrico, outra estatal chama atenção com a possibilidade de ser vendida ao setor privado. A Cemig, do governo do estado de Minas Gerais, já viu sua ação subir mais de 9% em 2019. Apenas no pregão de ontem, o papel da companhia teve alta de 4,2%.

“O governo de Minas já demonstrou que tem todo interesse na venda da Cemig. Mas é preciso um trâmite de aprovação em assembleias e outros processos que fazem com que não tenhamos previsão sobre quando a venda será, de fato, realizada. Quem quiser comprar os papéis tem que ter em mente que isso pode demorar”, diz Carlier, da AZ Quest. 

O sócio-gestor acrescenta ainda que neste setor, além das potenciais privatizações, seria interessante olhar para a agenda de concessões. “Se o governo de alguma forma demorar para aprovar a liberação da venda das companhias, mas acelerar a agenda de concessões, isso também pode beneficiar os papéis das empresas.”

Caso à parte

Um caso peculiar é o do Banco do Brasil. Embora ninguém tenha falado em privatização do banco, suas ações subiram quase 6% ontem em meio ao anúncio do governo. 

Os analistas Carlos Gomez-Lopez, Neha Agarwala e Natalie Theodozio, do HSBC, entendem que o BB é a melhor ação devido às expectativas de fortes lucros a partir de uma base de menor que a de seus pares e uma maior alavancagem à retomada econômica. O preço-alvo para as ações BBAS3 é de R$ 55,00 e a recomendação é de compra.

Sobre o patamar de fechamento de quarta, as previsões do HSBC significam uma alta de 17%.

Contudo, apesar da visão positiva, pode haver uma pressão no curto prazo para os papéis: a União confirmou a intenção de venda da participação excedente das ações detidas pelo governo do Banco do Brasil, em uma operação que deve render R$ 1 bilhão, mas que pode levar a um overhang (excesso de papéis no mercado), levando a uma pressão aos papéis.   

Uma maneira alternativa de estar exposto ao movimento das estatais sem ter de escolher as ações sozinho é aplicar em fundos que compram esses papéis. A XP tem um fundo com esse perfil, o Trend Estatais, que foi lançado em abril. 

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