Câmara dos Deputados aprova MP que viabiliza privatização da Eletrobras; texto vai ao Senado

O modelo de privatização prevê a emissão de novas ações a serem vendidas no mercado sem a participação da empresa

Equipe InfoMoney

O plenário da Câmara dos Deputados (Foto: Luis Macedo / Câmara dos Deputados)

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A Câmara dos Deputados aprovou na noite de quarta-feira (19), por 313 a favor a 166 votos contra, o texto-base da Medida Provisória que viabiliza a privatização da Eletrobras (ELET3;ELET6), a MP 1031/21.

Os deputados precisaram rejeitar mais de uma dezena de tentativas de alteração no texto para manter o relatório de Elmar Nascimento e a votação foi concluída de madrugada. O texto agora passa à análise do Senado, onde tem de ser aprovado até o dia 22 de junho para que não perca a validade.

O modelo de privatização prevê a emissão de novas ações a serem vendidas no mercado sem a participação da empresa, resultando na perda do controle acionário de voto mantido atualmente pela União. O governo reduzirá sua fatia nas ações com direito a voto de 61% para 45%.

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Apesar de perder o controle, a União terá uma ação de classe especial (golden share) que lhe garante poder de veto em decisões da assembleia de acionistas a fim de evitar que algum deles ou um grupo de vários detenha mais de 10% do capital votante da Eletrobras.

A sessão foi marcada por debates, com a oposição mobilizada no início da sessão para tentar retirar o item da pauta. Contudo, os deputados rejeitaram requerimentos de retirada do tema e mantiveram a MP da Eletrobras na pauta da Câmara.

A oposição chegou a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar barrar a votação, mas o recurso foi negado.

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O deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) acusou o relator, Elmar Nascimento (DEM-BA), de ter elaborado um relatório que favoreceria o empresário Carlos Suarez, sócio de empresas que atuam na área de gás e também possui projetos de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs).

Os chamados “jabutis” – emendas que mudam o teor da proposta – incluídos pelo relator já foram apresentados em diversos projetos e MPs que já tramitaram nos últimos anos, incluindo o novo marco de gás, mas sempre foram rejeitados.

“Isso é uma vergonha, um escândalo o que está acontecendo aqui”, afirmou Braga. “Isso é uma fraude, um crime, uma operação escandalosa que entrega o controle do sistema elétrico brasileiro, aumentar o preço da conta de luz do conjunto da população para alguns poucos estarem fazendo negócios com isso.”

Nascimento admitiu conhecer Suarez, “como todo o Brasil conhece”, mas negou as acusações. “Nunca recebi um benefício sequer dele ou de quem quer que seja”, disse. “Não faço tráfico de influência.” Sem se alterar, Nascimento disse que, no passado, talvez reagisse de outra forma às acusações feitas por Glauber Braga. “Talvez fosse me entender com deputado Glaber lá fora. Não o farei”, afirmou.

Posteriormente, o relator leu o seu voto, favorável à aprovação da medida provisória e distribuiu nova versão do substitutivo aos líderes, com – segundo ele – pequenas alterações em relação ao texto protocolado e disse estar aberto a discussões de emendas apresentadas.

Houve então obstrução apresentada pela oposição, com pedidos de adiamento da discussão e votação. Os deputados também rejeitaram pedido do MDB para que fosse dada preferência ao texto original da MP em detrimento ao do relator, assim como rejeitaram para pedido semelhante do PT, que tivesse preferência um substitutivo apresentado pelo próprio partido.

O PT pretendia votar uma emenda substitutiva mais enxuta sobre o processo de capitalização, mantendo o controle pelo governo e limitando a 15% o total de energia que a Eletrobras poderia vender no mercado aberto. Já o MDB pretendia votar o texto original da MP, que não continha mudanças feitas pelo relator, como o uso de lucros futuros de Itaipu para programas de transferência de renda e modicidade de tarifa.

O relatório apresentado na véspera por Nascimento havia condicionado a privatização à contratação de 6 mil megawatts de termelétricas em diversas regiões do País e de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), que teriam como consequência o aumento do custo da energia para o consumidor final. Posteriormente, no documento substitutivo, o relator tirou a menção à condicionalidade. O texto ainda mantém a previsão de contratação dessas usinas, mas mudou o texto para que isso não precise mais ocorrer obrigatoriamente antes da desestatização.

O relator da matéria havia apresentado formalmente o seu parecer sobre o tema na última terça-feira (18) após negociações entre o parlamentar e o governo sobre pontos do texto que, na visão de técnicos e de analistas de mercado, inviabilizariam a privatização da estatal caso fossem mantidos.

Assim, o relator buscou em seu texto fazer alterações que, segundo ele, atenderam a demandas do governo e que foram bem recebidas pelos analistas de mercado, ainda que alguns pontos (principalmente sobre a contratação de térmicas) seguissem como alvos de atenção (veja mais clicando aqui). Posteriormente, nesta quarta, mais algumas mudanças no texto foram realizadas no texto.

A entrega na terça-feira do relatório sobre a MP por Nascimento e o agendamento de votação  pelo presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) levaram as ações da Eletrobras a fecharem em máximas históricas, com os papéis preferenciais saltando 3,62%, para R$ 42,41.

Mas o texto do parlamentar acabou gerando preocupações entre especialistas do setor elétrico, e uma entidade que representa associações de empresas de energia, o FASE, disse em manifestação pública que elas “tornavam o projeto desequilibrado, portanto mereceriam ser reavaliadas com o devido cuidado.”

Confira os principais pontos do texto: 

Termelétricas
Antes da votação, Elmar Nascimento reformulou o parecer e retirou, dentre as condições da capitalização da Eletrobras, a contratação de energia de reserva de termelétricas movidas a gás natural em montante equivalente a 1.000 MW em estado do Nordeste que ainda não tenha gasoduto e outros 5 mil MW nas regiões Norte e Centro-Oeste.

Entretanto, segundo o texto aprovado, o governo terá de contratar essas térmicas por 15 anos, com entrega de 1.000 MW em 2026, 2 mil MW em 2027 e 3 mil MW em 2028. O preço será o teto estipulado no leilão de energia da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de 2019 para térmicas a gás natural (leilão A-6).

Garantias
A operação acionária de capitalização da Eletrobras só ocorrerá após a transformação da MP em lei, mas o texto já permite ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) iniciar os estudos para a emissão das novas ações.

Mesmo após a capitalização, as garantias concedidas pela União à Eletrobras e a suas subsidiárias continuarão valendo para os contratos firmados anteriormente.
“Buscamos redirecionar para os pequenos e médios consumidores, e não para os grandes, os principais benefícios dessa importante mudança no marco do setor elétrico”, afirmou o relator.

Eletronuclear e Itaipu
O texto autoriza o governo federal a criar uma empresa pública ou sociedade de economia mista para administrar a Eletronuclear (que controla as usinas de Angra) e a Itaipu Binacional. Por questões constitucionais, ambas devem ficar sob controle da União.

Essa empresa também fará a administração da conta do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel); poderá se associar ao Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel); manterá os direitos e obrigações do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfra); e deverá gerir os contratos de financiamento que utilizaram recursos da Reserva Global de Reversão (RGR) celebrados quando a Eletrobras era responsável por essa reserva.

Em cinco anos, a nova empresa reembolsará a RGR com os pagamentos dos mutuários referentes à amortização, taxa de juros contratual e taxa de reserva de crédito.

Dinheiro de Itaipu
Segundo o texto de Elmar Nascimento, após a quitação, em 2023, das dívidas da Itaipu Binacional, administrada conjuntamente por Brasil e Paraguai, as sobras da empresa que couberem ao País serão repartidas da seguinte forma:

Adicionalmente, recursos dos fundos de energia do Sudeste e do Centro-Oeste (Fesc) e do Nordeste (FEN) não comprometidos com projetos contratados até 23 de fevereiro de 2021 deverão ser revertidos à CDE para modicidade tarifária.

A CDE é uma espécie de fundo sustentado com encargos depositados pelas empresas do setor e repassados em parte ao consumidor final. É usada para financiar energia de fontes alternativas; pagar o combustível usado na geração de energia na região Norte, a fim de diminuir o valor da tarifa; e universalizar a distribuição da energia elétrica, entre outras finalidades.

Rescisão trabalhista
Elmar Nascimento também incluiu dispositivo para permitir aos empregados demitidos na reestruturação da empresa optarem, em até 6 meses da demissão, pela compra de ações com o dinheiro da rescisão trabalhista. O preço da ação a ser vendida, em posse da União, seria aquele de cinco dias antes da edição da MP (em fevereiro deste ano).

A União poderá ainda aproveitar os empregados em outras empresas do setor que continuarem sob seu controle, como Itaipu.

Entretanto, o líder do governo, deputado Ricardo Barros (PP-PR), disse que não há compromisso do Executivo de sancionar esses dispositivos.

Descontos
Com o novo modelo, será concedido prazo de exploração de 30 anos para as usinas do grupo, incluindo aquelas cujo prazo já tenha sido prorrogado pela Lei 12.783/13, no governo Dilma, para Tucuruí, Itumbiara, Sobradinho e Mascarenhas de Moraes. Mas o prazo começa a contar da assinatura dos novos contratos.

A estimativa do governo com a desestatização gira em torno de R$ 100 bilhões pelo novo prazo de outorga. No entanto, do total que a empresa terá de pagar, a ser definido pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), deverão ser deduzidos o custo da mudança do regime de exploração de cotas para produção independente, o custo com o saneamento da empresa para a desestatização e também os valores de:

Do que sobrar para ser pago pelo novo período de contrato, metade será na forma de bônus pela outorga adicional. A outra metade deverá ser direcionada, ao longo do período de concessão, à CDE na forma de contribuição anual.

Segundo o texto aprovado, o dinheiro destinado à CDE deverá ser alocado como crédito para as distribuidoras na mesma proporção da diminuição da energia descontratada pela Eletrobras junto a elas em razão de sua saída do sistema de cotas.

A intenção é manter a modicidade tarifária porque, após a desestatização, a Eletrobras poderá vender energia no mercado livre, diminuindo a oferta de cotas no mercado regulado (residências, comércios e pequenas indústrias), levando a aumento do preço médio.

Por outro lado, o texto determina que a empresa desestatizada mantenha os contratos diretos com o consumidor final (grandes indústrias) previstos na Lei 11.943/09 e na Lei 13.182/15.

Procel
Outra obrigação da empresa será a continuidade de pagamento de contribuições ao Procel por seis anos. O valor da contribuição será igual ao pago em 2019, inclusive para as subsidiárias e, a partir do segundo ano da desestatização, será reduzida em 1/6 ao ano e corrigida pelo IPCA.

Entretanto, durante esses seis anos, a Eletrobras poderá, em vez de pagar ao Procel, direcionar os recursos a projetos de pesquisa e desenvolvimento segundo regulamento da Aneel.

Além disso, a Eletrobras permanecerá responsável por recompor a dívida perante a RGR, que em 2017 passou a ser gerida pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).

Sem uso de bem
A MP 1031/21 dispensa a empresa capitalizada de pagar 2,5% da receita anual que obtiver, ao longo de cinco anos, a título de uso do bem público porque mudou do regime de serviço público para produção independente.

Com a produção independente, a empresa pode vender a energia no mercado livre, cujos contratos podem gerar mais renda. Atualmente, a Eletrobras participa mais do mercado regulado, que atende a maior parte dos consumidores residenciais, comerciais e pequenas indústrias.

São Francisco
Para a revitalização das bacias dos rios São Francisco e Parnaíba, a MP determina o aporte de total de R$ 350 milhões ao ano, corrigido pelo IPCA, para projetos de aumento da recarga do rio por meio das vazões dos afluentes e para projetos de flexibilidade de operação dos reservatórios.

Além do dinheiro, usinas da Eletrobras na região, sob controle da Chesf, deverão fazer contrato com o operador do projeto de integração das bacias do rio São Francisco com as do Nordeste Setentrional a fim de disponibilizar um montante médio anual de 85 MW por 20 anos ao preço de R$ 80,00/MWh corrigido pelo IPCA.

Itaipu
No caso da Amazônia Legal, os R$ 295 milhões anuais servirão para projetos de geração de energia na região, projetos de energia renovável ou a partir de combustível renovável, para as interligações de localidades isoladas e remotas na região Norte e para a navegabilidade do rio Madeira.

Furnas
Quanto às usinas de Furnas, pertencentes ao grupo da Eletrobras, os R$ 230 milhões anuais serão usados em projetos de revitalização das bacias dos rios nos quais estão as usinas, também com foco em ações de aumento da vazão e ampliação da flexibilidade operativa dos reservatórios.

Nos três casos, os recursos serão geridos por um comitê gestor presidido por representante indicado pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, que deverá enviar semestralmente relatórios de prestação de contas ao Tribunal de Contas da União (TCU) e à Controladoria-Geral da União (CGU).

Se houver saldo do dinheiro destinado a todos esses projetos ao fim do prazo de concessão da Eletrobras, ele será revertido à CDE.

(com informações da Agência Câmara, Estadão Conteúdo e Reuters)

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