Ata “hawkish” ou “dovish”? BC quer concluir alta de juros em maio, mas analistas acham improvável

O mercado aguardava respostas com a minuta da última reunião do Copom, mas ficou ainda mais incerto em relação aos próximos passos da autoridade monetária

Mitchel Diniz

(Fokusiert/Getty Images)

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Depois que o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a taxa de juros em 1 ponto percentual na reunião de março e sinalizou que elevaria a taxa Selic com a mesma magnitude no próximo encontro, em maio, muito se especulou se o Banco Central teria postergado o final do ciclo de aperto monetário.

Até então, os analistas de mercado esperavam que o BC começasse a sinalizar ajustes de menor magnitude a partir da próxima reunião (de maio).

Depois, em meio a pressão inflacionária, agravada pela incerteza com a guerra na Ucrânia, foi apontada uma alta de 1 ponto no próximo encontro (de maio), o que a princípio seria o fim do ciclo de alta. Mas, dada a incerteza corrente, foram descritos cenários alternativos em meio à disparada das commodities, suscitando dúvidas: o Copom vai fazer mais um ajuste de 1 ponto e deixar a Selic terminal em 12,75%? Ou haveria novos ajustes depois do encontro de maio?

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A expectativa era de que a ata da última reunião respondesse a essas perguntas, motivo pelo qual a minuta era aguardada com ansiedade. O texto divulgado hoje pela manhã parece ter dividido ainda mais a visão de economistas e analistas de mercado. Não há consenso sobre qual o tom o BC teria adotado na ata. Alguns dizem que a autoridade monetária foi hawkish, com viés de aperto; outros, afirmam que a ata foi dovish, indicando alívio próximo.

Porém, a maior parte dos analistas aponta que, por mais que o BC tenha indicado intenção de encerrar o ciclo de alta dos juros com uma alta de 1 ponto percentual na próxima reunião, a persistência da inflação deve fazer com que ele estenda as elevações nas taxas.

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Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, avalia que a ata do Copom preparou terreno para uma última alta de juros na reunião de maio. “A ata dá mais sinais de que o Copom pretende encerrar [o ciclo de aperto monetário] com a Selic em 12,75%, mas deixa a porta aberta para ir além”, afirma.

Cruz acredita que há grandes chances da inflação persistir e a autoridade monetária encerrar o ciclo de aperto apenas em junho, aí sim, com “uma alta bem menor”.

“Mas é preciso reconhecer que a ata foi escrita desenhando um cenário mais dovish, para encerrar as altas na próxima reunião de maio”, afirma Cruz.

Os analistas da Levante Ideia de Investimentos dizem que o texto foi duro ao falar sobre a deterioração dos cenário, mas “relativamente” brando nas considerações sobre o movimento de juros. Assim, a Levante acredita que a ata foi um pouco menos hawkish do que os investidores esperavam.

Ao reconhecer a inflação acima do intervalo de tolerância da meta em 2022 e ao redor da meta em 2023, o Copom estaria olhando cautelosamente para o longo prazo, de acordo com a leitura da Levante. “Ou seja, o Copom não enxerga, pelo menos agora, riscos de que a inflação muito elevada deste ano se repita no ano que vem”.

Para Caio Megale, economista-chefe da XP, o Copom reforçou que o cenário mais provável é o de queda dos preços das commodities em relação aos níveis atuais. Logo, a Selic em 12,75%, que já é vista pela autoridade monetária como bastante contracionista, seria suficiente para levar a inflação à meta 2023.

“Porém, o comitê foi bastante claro ao dizer que, caso o cenário prospectivo se mostre mais próximo do observado no cenário de referência, o ciclo de aperto monetário poderá ser ainda mais restritivo – ou seja, Selic terminal mais alta”, destaca Megale.

Em um cenário de referência, as projeções para inflação do Copom subiram para 7,1% em 2022 e 3,4% em 2023. Porém, diante da volatilidade dos preços de commodities, sobretudo dos combustíveis, o Comitê adotou um cenário alternativo, mais ameno, em que preço do barril do petróleo terminaria o ano em US$ 100 e passaria a aumentar 2% ao ano a partir de janeiro de 2023. Para esse cenário, as projeções de inflação do Copom ficam em 6,3% para 2022 e 3,1% para 2023.

“A ata divulgada hoje é consistente com nosso cenário base, com taxa básica de juros de 12,75% em maio – mantida neste patamar até o início de 2023”, afirma o economista-chefe da XP. Megale, no entanto, diz reconhecer que os riscos estão “inclinados para cima”.

Rodrigo Franchini, sócio da Monte Bravo, diz que, com a ata de hoje, o Banco Central “entendeu que o controle dessa inflação não está nas mãos dele”, com o IPCA mais alto por conta do preço dos combustíveis, independentemente do nível de juros. “Parece que o BC entendeu isso e não está mais na ânsia de controlar a inflação de qualquer maneira”, diz.

Bancos revisam projeção de Selic terminal

O Bank of America concorda que a ata aponta para uma conclusão do ciclo de alta de juros, mas não é isso o que deve acontecer na prática. “O Banco Central está pronto para ajustar o ciclo se o cenário se desenvolver de maneira desfavorável, o que é bem provável em nossa visão”, escreveu David Beker, estrategista do banco para América Latina.

O BofA prevê Selic terminal de 13,25% e apenas em junho. Ou seja, além de subir juros em 1 ponto percentual na reunião de maio, o BC faria  um novo ajuste, de 0,5 ponto no encontro seguinte. “Dada a resistência da inflação no curto prazo e nossa projeção acima da meta média para inflação de 2023 [o BofA prevê 4%], ainda esperamos que o BC suba a taxa mais duas vezes”, diz a análise de Beker.

Os analistas do Bradesco BBI acreditam que, na próxima reunião do Copom, há chances do Banco Central considerar apenas o ano de 2023 como horizonte relevante da política monetária. Isso se a regra do ano passado for seguida: no terceiro encontro de 2021, o Copom passou a mencionar apenas 2022 como horizonte relevante.

“Dado o cenário muito incerto (preços do petróleo de outras commodities, conflitos geopolíticos, desafios fiscais, eleições à frente) achamos difícil ver uma posição muito mais benigna em relação às expectativas de inflação, especialmente com as pressões inflacionárias generalizadas em curso”, escreveram os analistas Dalton Gardiman, Ricardo Mauad, Guilherme Zimmermann e Bernardo Keiserman.

O BBI também acredita que o BC vai ter de fazer um último ajuste de 0,5 ponto percentual na Selic na reunião de junho.

O Itaú achou o tom da ata hawkish e revisou para cima as suas previsões. O banco acredita que Selic vai chegar em 13,75% antes de estabilizar e cair. Além de um aumento de 0,5 ponto em junho, o Itaú acredita que o Copom vai fazer outro ajuste de mesma magnitude na reunião seguinte. Anteriormente, o banco enxergava a Selic terminal em 13%, com alta de 1 ponto na reunião de maio e um último ajuste de 0,25 ponto em junho.

“Graças ao aumento dos preços das matérias-primas em um ambiente de repasse permissivo, que trona mais intenso o impacto da inflação do atacado para o varejo, provavelmente veremos uma piora adicional das expectativas de inflação”, diz a análise do Itaú.

No Goldman Sachs, o efeito da ata foi outro: os analistas do banco passaram a ver como menores as chances de uma nova alta na Selic após a reunião de maio. Mas não descartaram de suas projeções uma possível elevação de 0,25 a 0,50 ponto no encontro de junho. “De qualquer maneira, acreditamos que o Copom vai esperar até o começo de 2023 para começar a cortar juros”, diz a análise de Alberto Ramos.

O economista-chefe da Necton, André Perfeito, acredita que a trajetória de cortes só deve ter início no final do primeiro trimestre de 2023, “após ficar claro os planos fiscais do próximo presidente, seja lá quem for”. Para ele, a ata divulgada nesta terça-feira reiterou o tom cauteloso do Banco Central e a tendência é que os próximos comunicados tragam mais referências à dinâmica fiscal do Brasil e a dúvidas que pairam sobre o tema.

“As expectativas de 2022 e especialmente de 2023 estão em alta e não nos parece razoável supor que o BCB irá arriscar não cumprir também a meta no ano que vem”, afirma Perfeito.  A Necton prevê Selic de dois dígitos até o final do ano que vem – a projeção da casa para o final de 2023 é de juros em 10% ao ano.

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Mitchel Diniz

Repórter de Mercados