Após dar retorno de 30%, estratégia cripto “morre” com crise no mercado

Muito usada por bancos e grandes gestoras, estratégia movimenta trilhões de dólares mensalmente, mas perdeu força e foi colocada em xeque

Rodrigo Tolotti

(Crédito: Gettyimages)

Publicidade

Apesar de ser a classe de ativos mais nova existente no mercado, as criptomoedas já possuem um sistema de derivativos bastante desenvolvido, com diferentes opções de estratégia na hora de investir. Porém, opções que até ano passado podiam pagar 30% ao ano em juros, agora não dão tanto retorno – e pode demorar para o cenário voltar a ser positivo.

Se antes esse mercado de derivativos cripto estava restrito a investidores de varejo mais experientes, recentemente houve uma grande entrada de bancos, gestoras e grandes instituições, os chamados investidores institucionais, que possuem grandes quantias para operar.

Com essa atuação massiva de institucionais nesse mercado, o volume negociados de derivativos hoje é praticamente três vezes maior que no mercado à vista. Em julho, dados do agregador CryptoCompare mostraram que contratos de derivativos negociaram cerca de US$ 3,2 trilhões, enquanto no spot o volume ficou em US$ 1,4 trilhão, o menor valor desde dezembro de 2020.

Continua depois da publicidade

Derivativo nada mais é que um contrato que deriva seu valor de um ativo subjacente, taxa de referência ou índice. No caso dos criptoativos são usados principalmente os contratos futuros e opções, que oferecem estratégias de investimento com proteção (hedge), em dólar, e que podem dar retornos bem acima de ativos mais tradicionais, como a renda fixa.

Por outro lado, o retorno maior está atrelado ao maior risco desse mercado, além de serem produtos não-regulados. “O mercado de criptoativos tem uma particularidade, ele é muito desenvolvido quando olha para derivativo. Apesar de serem, em sua maioria, produtos não-regulados, são produtos que têm uma sofisticação, tanto na parte de negociação, de gestão de risco, quanto na alavancagem”, explica Guilherme Rebane, Head para América Latina da OSL.

Usar os derivativos é uma forma que investidores encontram de alavancar seus investimentos, e no caso das criptos existe um derivativo específico chamado de swap perpétuo, que é um contrato futuro que não tem data de vencimento. Esse produto segue de perto o preço spot (à vista) da criptomoeda, que na maioria dos casos é o Bitcoin (BTC).

Continua depois da publicidade

Em geral, duas variantes são levadas em conta em uma operação com derivativos: risco e expectativa de preço. Se existe um ativo que tende a valorizar ao longo tempo, o prêmio dos contratos futuros tende a ser maior, assim como a questão do risco: quanto mais arriscado é aquele ativo, maior o retorno que as taxas vão pagar.

“Esse prêmio é uma arbitragem que você pode fazer e que paga uma taxa, que é o que a gente chama de operação de ‘cash and carry’. Eu, enquanto especulador, posso comprar o ativo e vender o contrato futuro, ou seja, meu risco em relação à oscilação do ativo é zero porque eu estou hedgeado, mas eu estou ganhando esse diferencial no tempo, quanto maior esse diferencial, mais eu ganho. Isso é uma taxa de juros implícita”, diz Rebane.

Vacas gordas ficaram para trás

Muito utilizada por grandes instituições e gestores, essa estratégia chegou a pagar altos prêmios em 2021. A combinação de um sentimento positivo sobre os preços futuros, uma demanda ainda baixa, enquanto as taxas de juros nos Estados Unidos estavam próximas de zero e a inflação era de 4%, os ganhos chegaram a superar 25% na Chicago Mercantile Exchange (CME), a maior bolsa de commodities do mundo.

Continua depois da publicidade

Pensando nos grandes bancos e instituições, o retorno fazia sentido já que o custo de captação era baixo: “Basicamente eu pego dinheiro emprestado no banco a 1% ou 2% e invisto, faço uma operação que é totalmente hedgeada e essa operação tem dado 30% em dólar ao ano, é muita coisa”, afirma o executivo da OSL.

No segundo semestre o retorno caiu bastante, mas mesmo assim, operadores que usaram cash and carry ainda embolsaram pelo menos 5% de retorno real no final de outubro e início de novembro. Mas, com a alta de juros este ano e a inflação batendo 8%, os rendimentos reais chegaram a ser negativos em certos momentos do primeiro semestre.

Combinado a tudo isso, o aumento excessivo de investidores usando essas operações também foi derrubando o prêmio, que chegou a ser de 3% em algumas exchanges. Porém, Rebane afirma que o mercado precisa encontrar o chamado “break even”, ou ponto de equilíbrio, onde há um ajuste sobre a demanda e o risco do ativo, mantendo um retorno ainda positivo para quem opera.

Continua depois da publicidade

“Na hora que a gente olha para as taxas, elas estão pagando 3,5% ao ano em algumas exchanges, mas teoricamente é uma taxa que tem que se ajustar ao custo de capital, eu tenho que ajustar a taxa que eu vou pagar de acordo com a taxa de juros livre de risco de acordo com o risco da classe de ativo. Da mesma forma, se há um problema de risco sistêmico, que várias instituições, várias entidades que praticam aluguel começam a quebrar, tem que ter um prêmio muito maior nessa história”, explica ele, dizendo que não faz sentido o retorno ser zero.

Prêmios voltarão a aumentar?

Rebane aponta que nas últimas semanas houve uma queda nas taxas de contratos futuros com vencimentos mais curtos relacionados ao Bitcoin. “Acho que o mercado perdeu um pouco de interesse nessa estratégia e desalavancou um pouco as posições em BTC”.

Segundo ele, isso tem relação não só com a queda do preço da criptomoeda e da maior aversão no mercado, mas também com um maior interesse com a atualização Merge do Ethereum (ETH), prevista para setembro, levando investidores a apostarem mais neste ativo recentemente.

Continua depois da publicidade

Já do lado das taxas mais longas, o retorno está abaixo de 2%, indicando pouco apetite do mercado, puxado principalmente pela queda da demanda de comprador final, principalmente investidor de varejo.

“Dado o cenário macro com muita incerteza, que tem feito os investidores terem cautela em relação aos ativos alternativos, como é o caso das criptomoedas, não esperaria um fluxo comprador considerável a ponto de fazer com que essas taxas se desloquem e venham a abrir para níveis maiores do que vêm negociando esse ano”, avalia o especialista.

“A gente fica dependente de fluxo final, principalmente de varejo, temos visto uma adoção institucional cada vez maior, mas acho que é importante que isso reflita de fato em fluxo vindo do varejo para de fato trazer um viés mais especulativo para o mercado para que ele volte a ter mais prêmio nas taxas”, conclui.

Até onde as criptomoedas vão chegar? Qual a melhor forma de comprá-las? Nós preparamos uma aula gratuita com o passo a passo. Clique aqui para assistir e receber a newsletter de criptoativos do InfoMoney

Rodrigo Tolotti

Repórter de mercados do InfoMoney, escreve matérias sobre ações, câmbio, empresas, economia e política. Responsável pelo programa “Bloco Cripto” e outros assuntos relacionados à criptomoedas.