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Os impactos da quebra das criptomoedas UST e Terra (LUNA) em DeFi e outras stablecoins

Stablecoins são a base dessa nova infraestrutura de mercado. Sem elas fica difícil DeFi extrapolar suas soluções do mundo cripto
Por  Gustavo Cunha -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Se tem uma coisa que ninguém que esteja envolvido com cripto pode reclamar é falta de emoção, até por isso a história dos Bored Apes é tão emblemática e interessante, mas há tempos que não havia uma semana como essa que passou.

Em questão de menos de 5 dias uma das principais expoentes das finanças descentralizadas (DeFi) desde o final do ano passado foi de um valor de mercado de mais de US$ 50 bilhões e um valor de ativos alocados em sua rede (TVL) de aproximadamente US$ 20 bilhões, para ZERO, levando a blockchain da Terra (LUNA) a parar de funcionar.

Para se colocar em perspectiva o impacto disso, a Lehman Brothers que gerou a crise de 2008, que todos sentimos, tinha a época um valor de mercado de US$ 60 bilhões.

A perda de todo o ecossistema cripto nessa semana chegou a ser de US$ 0,5 trilhão.

A Luna/UST estava criando um ecossistema de pagamentos na Ásia que já tinha vários estabelecimentos usando. Sua usabilidade, facilidade, rapidez, custo, entre outros fatores, estavam fazendo com que sua utilização estivesse crescendo de vento em popa em aplicações relativas a meios de pagamento.

Para incentivar a comunidade, através da plataforma Anchor, havia uma rentabilidade de 20% ao ano para quem investisse UST com eles. Uma rentabilidade mais do que atrativa e que se via que não seria sustentável no longo prazo por conta de estar sendo pago como que um incentivo para a popularização da rede. E aqui começa o embrião de todo o problema.

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Dadas as taxas de juros muito baixas praticadas, isso criou um incentivo enorme para que muito capital fluísse para a Terra. Algo como US$ 20 bilhões chegou a ser aplicado nela via UST, sua stablecoin.

A UST é, ou era, uma stablecoin algorítmica, que tinha sua paridade de 1:1 com o dólar dada pela possibilidade de se trocar sempre 1 UST por US$ 1 equivalente no token da plataforma (LUNA).

Esse mecanismo vinha funcionando muito bem em condições normais de temperatura e pressão, mas, e aqui vem o grande mas, em um momento onde todos queiram sair da stablecoin UST para dólar, isso cria uma pressão enorme de venda de LUNA, e com LUNA caindo muito, o mecanismo faz com que sejam emitidos mais LUNAs para serem trocadas por UST, o que dilui quem já é detentor de LUNA, e intensifica a espiral de venda. Se LUNA vai a zero, que é o que aconteceu, não tem como trocar os USTs por US$ 1 equivalente em LUNA, pois LUNA não tem valor.

Essa espiral de queda, descrito como espiral da morte (death spiral), foi o que aconteceu.

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Houve uma dinâmica de ataque especulativo à sua stablecoin e essa não se sustentou. Como começou, porque começou, quem iniciou, será história que o tempo trará. Acredito que poucos sistemas financeiros, cripto ou fiat, tem mecanismos para conter o espiral negativo desse tipo de movimento. A crise de 2008 e inúmeras outras que digam.

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Muito embora, ex-post, consigo ver erros específicos que não ajudaram a conter a espiral, como falta de comunicação recorrente do time à frente da Terra, principalmente do seu CEO, o fato de terem esgotado as reservas de Bitcoin, que serviriam para conter a pressão de venda, rápido demais, a informação de que estavam negociando com um terceiro investidor que não ocorreu, e por aí vai.

Apesar de isso não ter sido a causa, certamente não ajudou na contenção das expectativas, que é um dos principais vetores de estresse de mercado. Nesses momentos o mercado se torna pouco, ou quase nada racional, e muito ou totalmente comportamental.

Vale lembrar que durante essa semana tivemos o Tether (USDT), a maior stablecoin do mercado, com valor de mercado de US$ 80 bilhões, chegando a ser negociada próximo de 0,96 USDT/USD.

O modelo da Tether é outro. Ela é uma stablecoin 100% colateralizada por dólar ou ativos em dólar de baixo risco. Muito já se especulou sobre se esse lastro existe mesmo ou não, e isso continua a ser um dos calcanhares de Aquiles do mundo cripto. Dessa vez, algumas horas depois o USDT voltou para bem próximo do 1:1.

Para quem quiser ir alem em mais detalhes o artigo da Grayscale e da Bankless são boas recomendações.

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A pergunta que fica é como ficará DeFi e as stablecoins após isso?

Não dá para negar que a plataforma da Terra ter quebrado foi um baque enorme para o mercado, e mais que isso, o fato de termos tido a terceira maior stablecoin do mercado indo a zero, deverá gerar aversão a risco e uma retração de investidores nesse mercado.

Stablecoins são a base dessa nova infraestrutura de mercado financeiro global que está sendo montada. Sem elas fica difícil DeFi extrapolar suas soluções do mundo cripto.

Os modelos de stablecoin são muitos, cada qual com seus riscos e vantagens. A UST era uma da categoria algorítmica, sem colateral para dar sustentação. Uma preferência no curto prazo por stablecoins que sejam ou 100% colateralizadas ou mais que isso, como USDC e DAI, parece ser um caminho natural no curto prazo.

Além do uso nos protocolos de DeFi, as stablecoins também cumprem o papel de caixa em uma moeda estável (dólar em geral) para quem quer ficar um período fora da volatilidade das criptos, mas não retirar o dinheiro para o mercado financeiro tradicional. Isso não se altera.

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As stablecoins também transformam nossas moedas fiduciárias em moedas programáveis e esse movimento rumo a termos todas as moedas fiduciárias como moedas programáveis não se altera e sem stablecoins isso hoje não seria possível.

A única razão para que não tenhamos stablecoins de dólar em DeFi como o principal ativo seria termos uma CBDC (Moeda digital de banco central) do dólar, o que ainda está longe de existir e, mesmo assim, há grandes dúvidas sobre questões de privacidade e controle do capital pelas pessoas em relação a essa possível CBDC.

Um outro reflexo deve ser termos um olhar mais atento do regulador nesses modelos, principalmente por conta da interação cada vez maior entre cripto e o mercado financeiro tradicional, do tamanho dessas iniciativas e seu impacto na economia real.

Por fim, DeFi continua firme e a busca por uma stablecoin algorítmica que funcione propriamente segue junto, agora com mais um aprendizado para ser levado em conta.

Onde continuamos:

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Para entender com mais detalhes o que aconteceu:

Grayscale® – Market Byte: What’s Happening to UST?
https://newsletter.banklesshq.com/p/ust-luna-meltdown-what-happened

Links usados nesse artigo:

Stablecoins algorítmicas: como o lastro deu lugar à matemática em criptos de dólar
O 2020 das moedas programáveis – o ano de DEFI, stablecoins e CBDC
News (tether.to)
Terra – powering the innovation of money
Anchor Protocol

Gustavo Cunha Autor do livro A tokenização do Dinheiro, fundador da Fintrender.com, profissional com mais de 20 anos de atuação no mercado financeiro tradicional, tendo sido diretor do Rabobank no Brasil e mais de oito anos de atuação em inovação (majoritariamente cripto e blockchain)

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