Fechar Ads

Opinião – Crédito passa dos R$ 5 tri: consumo aquecido ou grito de socorro?

O aumento na busca por crédito é um reflexo do otimismo econômico em relação à deflação dos últimos meses ou do último suspiro de famílias sem orçamento?
Por  Eli Borochovicius -
info_outline

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

De acordo com o Banco Central (BC), o volume das operações de crédito do Sistema Financeiro Nacional alcançou R$ 5,1 trilhões em agosto, um aumento de 1,6% em relação a julho e de 16,8% em relação a agosto de 2021. Foram R$ 3 trilhões para Pessoas Físicas e R$ 2,1 trilhões para Pessoas Jurídicas.

A taxa média de juros das concessões de crédito em agosto foi de 2,1% a.m.. Já nas novas concessões para as famílias, as taxas chegaram a 3,6% a.m.. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) indica que a taxa de juros nas linhas de crédito para Pessoas Físicas cresceu 13,5 pontos percentuais em um ano.

No relatório da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor de setembro, a Divisão de Economia e Inovação da CNC afirmou que o percentual de famílias que relataram ter dívidas a vencer alcançou 79,3% do total de lares no país.

As famílias financeiramente vulneráveis são aquelas que mais recorrem ao crédito, mas chama a atenção que, desde que a pesquisa mensal foi iniciada em janeiro de 2010, a proporção dos endividados com renda inferior a 10 salários mínimos, em relação ao total de consumidores, não era tão alta: superou os 80%. É a máxima histórica.

Seguindo os resultados de 2021, as dívidas com cartão de crédito são disparadamente as maiores: 85,6% do total de consumidores recorrem a essa modalidade de crédito. É simples de usar, no entanto, ressalta-se que o crédito rotativo é aquele que apresenta as maiores taxas do mercado. Nos grandes bancos, passam de 300% a.a. e, em outras instituições, é possível encontrar taxas que excedem absurdos 1.000% a.a..

A pesquisa também mostra que houve aumento do crédito com carnês de loja (de 18,8% para 19,4%), inexpressiva alta com o crédito pessoal (de 9,0% para 9,1%) e ampliação no uso do cheque especial (de 4,6% para 5,2%). Mas também mostra uma redução considerável com dívidas de financiamento de veículos (de 13,2% para 9,6%), com financiamento de moradia (de 9,7% para 7,9%) e com crédito consignado (de 7,1% para 4,9%).

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Taxas de juros altas favorecem o crescimento da inadimplência. Embora o BC afirme que a inadimplência do crédito total do sistema financeiro, que considera os atrasos superiores a 90 dias, permaneceu estável no mês de agosto (2,8%), a pesquisa apontou para o crescimento no volume de consumidores que atrasaram o pagamento de dívidas, alcançando o recorde de 30% de inadimplentes. As dificuldades em honrar os compromissos financeiros são mais perceptíveis entre as famílias de menor renda.

Pode-se observar que, embora tenha havido deflação dos últimos meses, queda na taxa de desemprego e mantida a ajuda do governo federal com o Auxilio Brasil, tem aumentado o número de brasileiros em busca de recursos de terceiros.

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), índice oficial do Governo Federal para medição das metas inflacionárias, apresentou queda de 0,68% em julho, 0,36% em agosto e 0,29% em setembro. Deflação nos três meses.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD-Contínua) do IBGE acompanha a evolução da força de trabalho e apresentou a taxa de desocupação em 8,9%, sensivelmente inferior aos 13,1% do mesmo período de 2021.

O Auxílio Brasil é um programa social que objetiva garantir uma renda básica às famílias em situação de pobreza (renda mensal de até R$ 210,00 por membro da família) e beneficiou 20,65 milhões de famílias em setembro.

Não existem evidências sobre o motivo do aumento na busca por crédito, mas considerando que os preços demoram a ceder em virtude da deflação observada nos últimos três meses, que a queda na taxa de desemprego é recente e que o valor de R$ 600,00 do Auxílio Brasil não permite extravagâncias orçamentárias, pode-se inferir que seja pouco provável que tenha sido causado pelo aumento no consumo.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

As famílias brasileiras ainda estão sentindo os efeitos inflacionários causados pelas secas, pela pandemia e pela guerra entre Rússia e Ucrânia. Parece-me que garantir o pagamento da moradia e da alimentação, sem luxos, não tem sido uma tarefa fácil e talvez, recorrer aos bancos e financeiras seja a luz no fim do túnel para muitas dessas famílias que se preocupam em arcar com as suas responsabilidades. Um grito único e desesperado de socorro.

Eli Borochovicius Eli Borochovicius é docente de finanças na PUC-Campinas. Doutor e Mestre em Educação pela PUC-Campinas, com estágio doutoral na Macquarie University (Austrália). Possui MBA em gestão pela FGV/Babson College (Estados Unidos), Pós-Graduação na USP em Política e Estratégia, graduado em Administração com linha de formação em Comércio Exterior e diplomado pela ADESG. Acumulou mais de 20 anos de experiência na área financeira, tendo ocupado o cargo de CFO no exterior. Possui artigos científicos em Qualis Capes A1 e A2 e é colunista do quadro Descomplicando a Economia da Rádio Brasil Campinas

Compartilhe

Mais de Além do dinheiro