Tenda (TEND3) salta 17% em 2 pregões com notícias positivas, mas ainda cai 73% no ano: hora de ficar otimista com ação?

Analistas ainda seguem cautelosos com papel, apesar de destacarem sinalizações otimistas com CVA, aumento de fatia pela Polo Capital e Investor Day

Lara Rizério

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Com alta de 17% em apenas dois pregões, a semana tem sido positiva para as ações da Tenda (TEND3), que tiveram um desempenho superior inclusive ao índice IMOB da B3, que avançou 6,5% no mesmo período.

Além do alívio na curva de juros com a Proposta de Emenda à Constitucional (PEC) da Transição desidratada na Câmara, favorecendo empresas voltadas à economia doméstica (como construtoras e varejistas), notícias mais direcionadas à Tenda –  que ainda cai 73% no acumulado de 2022 após resultados negativos – levaram a um impulso para os ativos (principalmente na véspera, quando subiu 10,17%).

No fim da semana passada, após reunião extraordinária, o Conselho Curador do FGTS elevou em 5% o valor mínimo para financiamento das unidades do programa Casa Verde e Amarela (CVA), que, na prática, permitem preços unitários mais altos em todas as cidades, com exceções para Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo.

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O Conselho também ampliou, por 6 meses, as taxas de juros vigentes para a faixa de renda no Grupo 3 do programa CVA e linha de crédito pró-cotista (entre 7,66% e 8,16% ao ano). Essas mudanças foram propostas pelo Ministério do Desenvolvimento Regional com a justificativa de que um terço dos imóveis construídos para o programa CVA deveriam
ser para outros grupos devido às dificuldades de financiamento e comercialização, principalmente aqueles fora
de Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo.

Analistas, como do Bradesco BBI, apontaram as notícias positivas para construtoras mais voltadas para a baixa renda, o que inclui a Tenda. Segundo eles, a extensão das reduções das taxas de financiamento pró-cotista e do Grupo 3 (renda de R$
4,4 mil a 8 mil mensais) é positiva também para Cury (CURY3) e Direcional (DIRR3) (os nomes com maior participação em Valor Geral de Vendas provenientes dos Grupos 3 e 4), pois essas taxas temporariamente mais baixas aumentaram a acessibilidade dos compradores de imóveis em cerca de 5 a 7%.

O reajuste de 5% também é importante dado o novo patamar de preços das matérias-primas, mas como os preços máximos não foram elevados (264 mil), o aumento será mais significativo no interior/cidades rurais que estavam longe do teto e,
portanto, deve beneficiar principalmente a Tenda, MRV (MRVE3) e Direcional, que têm um percentual significativo de mix nessas cidades, ajudando a recuperar a indústria de baixa renda como um todo dos gargalos recentes, que
levaram vendas e originações de crédito imobiliário a cair 17% e 12% no ano, respectivamente, aponta o banco.

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Além disso, os investidores repercutiram as notícias de que o número de ações da Tenda detidas pela Polo Capital subiu para 31,3 milhões, o equivalente a 30,8% de participação na empresa. No entanto, a empresa de investimentos garante que a poison pill, mecanismo que existe para impedir que os investidores assumam o controle de uma empresa sem atingir mais de 50% de participação, não foi acionado porque a regra foi retirada no final de outubro pelos acionistas.

O Bradesco BBI destacou que a Polo Capital já tem um papel importante nos negócios da empresa, já que o presidente do Conselho de Administração, Cláudio Carvalho de Andrade, é atualmente sócio da firma, mas a nova participação não deve
atrapalhar mais do que o normal no dia-a-dia dos negócios.

“O desafio de recuperação da Tenda é significativo, incerto, e a ação reflete isso (com forte queda no acumulado do ano), mas achamos que seu maior acionista disposto a aumentar sua participação no mercado secundário (superando 30%) envia uma mensagem positiva. Esse movimento sugere que a administração da Polo Capital (parte do conselho da Tenda) acredita que a Tenda deve ser capaz de superar as preocupações sem necessariamente exigir capital adicional”, avaliou.

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Investor Day e guidance positivos, mas analistas cautelosos

Já na véspera, a construtora divulgou seu guidance para 2023. A empresa espera que sua margem bruta ajustada esteja entre 24-26%, assumindo 5% de inflação de custos de construção (INCC), e que o VGV líquido vendido esteja na faixa de R$ 2,7 – 3 bilhões.

“É importante ver a evolução do processo de recuperação da Tenda, enquanto a orientação está ligeiramente acima de nossas estimativas de uma margem bruta de 23,7% e R$ 2,5 bilhões em vendas líquidas para 2023. O principal risco aqui é outra onda de aumento dos custos de construção que resulta em inflação do INCC acima do cenário base da empresa de 5%, embora vejamos a Tenda no caminho certo com seu processo de turnaround e os números devem melhorar gradualmente à medida que os projetos de 2020-21 (com margens mais baixas) diminuem a participação no mix registrado pela empresa”, apontou o BBI.

A companhia também realizou o seu Investor Day na véspera, trazendo mais detalhes sobre suas estratégias para o próximo ano, além da evolução da marca Alea.

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A XP destacou quatro tópicos principais: (i) a Tenda parece focada em sua mudança de planejamento estratégico; (ii) 2023 ainda deve ter impactos de projetos antigos; (iii) Alea deve acelerar lançamentos para 2023; e (iv) as alavancas de recuperação de rentabilidade parecem mais claras.

Para os analistas da casa, o direcionamento de vendas líquidas e margem bruta ajustada para 2023 foi considerado como positivo, apesar de ter a visão de um posicionamento ligeiramente abaixo do guidance de vendas líquidas, dado o conservadorismo em relação aos riscos de execução, e em linha com o direcionamento de margem bruta ajustada, uma vez que veem a Tenda recuperando gradualmente os níveis de margem bruta ao longo de 2023.

Em relatório chamado, “aprendendo com os erros do passado e abrindo caminho com rentabilidade”, a XP aponta que a Tenda focou sua apresentação na mudança de planejamento estratégico e operacional da companhia desde o estouro de orçamento no quarto trimestre de 2021 (4T21), focando na recuperação da rentabilidade da operação.

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Dito isso, três pontos chamaram a atenção da casa. Em primeiro lugar, a mudança na lógica de orçamentação, reforçando um maior detalhamento em seus orçamentos, principalmente em infraestrutura, incorporando uma inflação projetada anual de cerca de 5%.

Em segundo lugar, a maior seletividade de projetos e desaceleração gradual de VSO (Vendas sobre oferta, patamar entre 25% e 27%), permitindo um maior controle de margens durante o projeto e ganho de preços de venda. O terceiro ponto é a renegociação de 70% do landbank, aplicando a dinâmica de custos atuais e revendo a viabilidade dos projetos em pipeline.

“Com isso, vemos a companhia reduzindo gradualmente a necessidade de aumento do pró-soluto, focando no ganho de preço por ganhos de eficiência e incorporação das atualizações do programa CVA/MCMV”, avalia.

O ano de 2023 ainda deve ter impactos dos projetos de 2021, mas o direcionamento é positivo, complementa. Sobre o guidance, os analistas avaliam que houve uma sinalização de recuperação de rentabilidade da companhia. No entanto, mesmo com a recuperação gradual da margem bruta no próximo ano, as vendas realizadas antes de 2022, que tem margens mais baixas (cerca de 20%), ainda devem ter um efeito de 36% na receita de 2023, “o que em nossa visão poderia levar a uma melhora do lucro líquido, à medida que as vendas feitas em 2022 são contabilizadas”.

A Tenda reforçou a Alea com uma das vias de crescimento de curto e longo prazo da companhia, baseado em um mercado potencial de casas térreas interessante (cerca de R$ 250 bilhões), e um panorama competitivo favorável, com poucos players consolidados atuando no mercado.

No quesito estratégico, a Tenda parece priorizar um aumento consistente de preços de venda versus aumento de volume, porém ainda mantendo o posicionamento de provedor de menor custo, buscando se consolidar nas faixas mais baixas do programa, onde houve uma significativa queda de competitividade dado a recente dinâmica de aumento de preços do setor e a menor participação de players menores. A”lém disso, vemos a incorporação das novas atualizações do CVA (FGTS consignado e aumento do prazo máximo de financiamento para 35 anoa) como uma opção de demanda para a companhia, uma vez que cerca de50% das vendas da Tenda estão concentradas nas faixas abaixo de R$ 2,4 mil de renda familiar”, avalia.

Também para o Itaú BBA, no geral, o management estava otimista sobre a capacidade da empresa de recuperar suas margens, retornar a uma posição confortável de balanço e gerar caixa à frente.

A Eleven também destaca que, ao longo de 2022, o direcionamento estratégico foi na priorização de margem através de incremento de preço com foco em rentabilizar o estoque e novas safras de projetos. A alta velocidade de vendas de seu modelo de negócio impactou o custo de oportunidade dos projetos. Assim, a adequação de VSO dado o trade-off (dilema) de rentabilidade também foi importante para minimizar a queima de caixa e recompor parte da margem bruta no curto prazo. Alinhado a isso, a companhia foi mais seletiva nos projetos, ajustando o modelo de precificação com provisão de inflação no orçamento e se aproximando do acompanhamento das obras.

“Desta forma, a safra de novos projetos já incorpora evolução da rentabilidade. No entanto, ainda há o reflexo da perda de eficiência na DRE (Demonstração do Resultado do Exercício), visto que 82% da composição de margem REF é proveniente do legado, com margem de 22%. As vendas de 2022 apresentaram evolução, mas representam 18% da margem REF,
que atingiu 31%. “A partir de 2023 os novos projetos já apontam melhorias, ainda que esteja em um período transitório”, aponta.

Analistas, apesar de verem progressos na companhia, seguem com visão cautelosa.

A Eleven destacou que, apesar das
mudanças recentes no programa CVA e as evoluções em 2022, mantém recomendação neutra com preço-alvo alterado de R$ 10,00 para R$ 8,00 (ainda um potencial de valorização significativo de 80% frente o fechamento da véspera), com o aumento do custo de capital, mantendo as estimativas de fracos resultados ainda para 2023, mesmo com um macro favorável para o programa habitacional de baixa renda.

O Itaú BBA também segue com visão cautelosa sobre o case, apesar do valuation descontado (0,51 vez o preço sobre o book value, ou valor patrimonial por ação). A recomendação é marketperform (desempenho em linha com a média do mercado, equivalente a neutra), com preço-alvo de R$ 8, como no caso da Eleven. Já o JPMorgan tem recomendação underweight (exposição abaixo da média, equivalente à venda) para os ativos TEND3, com preço-alvo de R$ 5 (ainda um upside de 12,6%).

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.