Copel (CPLE6), Sabesp (SBSP3) e mais: quanto podem valer as ações das empresas estaduais se elas forem privatizadas?

Tese de desestatização ganhou força para várias estatais estaduais após o governo do Paraná manifestar intenção de sair do controle da Copel

Lara Rizério

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O começo desta semana foi marcado pela notícia de que o governo do Paraná quer desestatizar a Copel (CPLE6) e transformá-la em uma “corporation”.

Apenas na segunda, a Copel viu seus ativos saltarem 22%, mas também impulsionou, em diferentes proporções, os ativos da também paraense Sanepar (SAPR11), além das mineiras de saneamento Copasa (CSMG3), de energia Cemig (CMIG4) e a paulista de saneamento Sabesp (SBSP3). SAPR11 subiu 14,91%, CSMG3 teve ganhos de 5,91%, CMIG4 subiu 7,45% e SBSP3 teve ganhos de 7,59%.

“O mercado parece precificar um caminho parecido para essas empresas”, afirmou Felipe Cima, operador de renda variável da Manchester Investimentos. “Fica claro o quanto o mercado vê ineficiências operacionais nessas empresas que são decorrentes da posição governamental nessas companhias”, complementou. “O que se aprendeu nesses últimos anos é que o mercado é um alocador mais eficiente que o Estado”. A tese ganha força com a eleição em Minas Gerais e em São Paulo de governadores com viés a favor de privatizações, caso de Romeu Zema (para um segundo mandato) e Tarcísio de Freitas, respectivamente.

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Na visão de analistas do mercado, o governo paranaense está avançando surpreendentemente rápido com sua agenda liberal/pró-mercado, sendo que, com os planos de transformar a Copel em uma corporation (ou seja, um empresa sem
controle definido), o estado venderia ações para reduzir sua participação abaixo do controle e seria limitado a um poder de voto máximo de 10%.

O Paraná quer privatizar a Copel em 2023, exigindo a aprovação de projeto de lei específico pelo legislativo estadual para esse fim (maioria simples necessária). Notavelmente, o governador do Paraná reeleito tem um apoio significativo na
legislatura do estado.

“A ideia do governo do estado do Paraná submeter uma proposta de privatização da Copel é muito positiva não apenas pela proposta em si, mas por quem faz e o momento que decidiu levar adiante essa proposta: governador reeleito no primeiro turno, com ampla maioria na câmara estadual e com forte antecedência a recondução do cargo de governador. Em nossa leitura, tais condições demonstram forte interesse do governo do estado do Paraná em seguir adiante com seus planos”, destacou o analista Vitor Sousa, da Genial Investimentos.

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Com a notícia que também impulsionou os papéis das outras estatais estaduais na Bolsa, analistas de mercado fizeram exercícios para saber o quanto valeriam não somente as ações da Copel, mas também das demais companhias estatais estaduais em caso de privatização.

Copel

Na segunda-feira, o JPMorgan projetou que a unit CPLE11 (formada por uma ação ordinária CPLE3 e quatro ações preferenciais classe B CPLE6) em R$ 50 em caso de privatização da companhia, , 28% acima frente o preço-alvo atual da casa e de 23% em relação ao fechamento da véspera.

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Os analistas do banco americano avaliaram que esta é uma grande notícia para a Copel, pois a privatização deve desbloquear ganhos operacionais, financeiros e de governança para a empresa. Eles destacaram que a potencial reclassificação da Copel e a própria visão positiva do banco devem ofuscar o possível overhang (excesso de ações no mercado, pressionando os preços dos ativos para baixo) com a oferta secundária.

Já o Bradesco BBI tem um preço-alvo atual de R$ 11 para os ativos CPLE6, um potencial de alta de 32% em relação ao fechamento de ontem, ponderado por um cenário combinado de 70% privatizado e 30% estatal.

Assumindo a estatal “como está”, o BBI estima o valor justo atual (não 12 meses) em cerca de R$ 7,00 (16% de queda frente o fechamento de terça), o que seria na visão dos analistas o piso de valuation se a privatização for cancelada/paralisada por qualquer motivo. Assim, em caso de privatização, o valor justo aproximado para os ativos PNB seriam de cerca de R$ 12,70, ou avanço de 53% frente o fechamento da véspera.

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Os analistas estimam um valor presente líquido (VPL) atual de R$ 11 por ação assumindo melhorias operacionais na distribuição/geração, mais o VPL da privatização da usina hidrelétrica FDA (Foz do Areia). “Não incluímos a extensão de outras concessões de geração, que poderiam ser incrementais, mas isso depende de negociações com o governo federal”, apontam.

Já o Morgan Stanley estima que, em um cenário de privatização, a ação da Copel iria para R$ 12, implicando em cerca de 70% de valorização em relação ao preço da última sexta-feira e de 44% frente o fechamento da véspera.

No entanto, dado o perfil do modelo de privatização proposto, o preço das ações não deve convergir para o cenário de privatização, avalia o banco. Isso porque a operação envolveria uma oferta pública de distribuição secundária de ações ordinárias e units de emissão da companhia.

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“Semelhante ao que aconteceu com o processo de privatização da Eletrobras ELET3, esperamos que as ações convirjam para o que os participantes do mercado acreditam que seria o preço potencial da transação no mercado de capitais (à medida que o processo de aprovação evolui e a probabilidade de privatização aumenta), permitindo um aumento do valor justo de uma empresa de gestão privada”, avalia o banco.

As principais premissas do cenário de privatização são: i) otimização da estrutura de capital, representando cerca de R$ 0,80 por ação; ii) melhoria do desempenho operacional, principalmente impulsionado por iniciativas de redução de custos e redução de risco de provisões (impacto de R$ 2,30 por ação); iii) um aumento do P/VPA, ou Preço sobre o Valor Patrimonial por Ação de 20 pontos-base para investimentos versus a sua estimativa de 1 vez no caso base (representando R$ 0,30 por ativo); iv) venda da UTE Araucária por valor patrimonial zero (versus valuation negativo de R$ 100 milhões para o ativo), conforme estudos apresentados da Copel.

“Celebramos a notícia e acreditamos que uma potencial privatização poderia liberar valor ao aprimorar a governança corporativa, otimizar a estrutura de capital e melhorar o desempenho operacional”, avalia o Morgan. Contudo, o banco ainda tem recomendação equivalente à neutra para o ativo (ou equalweight, exposição em linha com a média do mercado), com um perfil de risco-recompensa equilibrado em relação a suas outras opções no setor.

A XP destaca que as ações da Copel estavam sendo negociadas a 1,1 vez o EV/RAB (EV = enterprise value, ou valor de mercado + dívida líquida”; RAB = base de ativos regulatórios) antes da alta das ações na segunda.

Se a CPLE6 for precificada em níveis de players similares (1,5 vez o EV/RAB), o preço-alvo da XP, atualmente em R$ 8, aumentaria em 25%, chegando a R$ 10 por ação, ou um potencial de valorização de 20% frente o fechamento da véspera.

“Embora vejamos pouco espaço para melhorias nos indicadores operacionais e redução do PMSO (parcela das despesas que responde pelos itens pessoal, material, serviços de terceiros e outros) as estatais ainda apresentam limitações que podem ser otimizadas após a privatização”, avaliam os analistas, que mantêm recomendação de compra, com preço-alvo de R$ 8 para CPLE6.

Sabesp

As ações da Sabesp também são recorrentemente citadas como case de privatização, que ganhou força também com a eleição de Tarcísio de Freitas (Republicanos) para o governo de São Paulo. Quando ministro no governo de Jair Bolsonaro, Freitas promoveu uma agitada agenda de concessões e privatizações do setor de infraestrutura no Brasil.

Antes do segundo turno, no fim de outubro, analistas do JPMorgan avaliaram que, caso a privatização se concretize, a ação da Sabesp pode valer R$ 100, o que corresponderia a um potencial de valorização de quase 70% em relação ao preço de fechamento da véspera.

Para os analistas Henrique Peretti e Victor Burke, “existem fundamentos legais e institucionais para viabilizar uma privatização”. Contudo, ponderam que estão mais céticos quanto ao potencial ‘timing’ e formato do processo.

Antes do segundo turno, a XP apontou que a recente alta das ações já precifica parcialmente esse aumento da probabilidade de privatização, cenário no qual enxerga a possibilidade de a Sabesp atingir um múltiplo de 1,3 vez o EV/RAB ou aproximadamente R$ 104 (upside de 77%) por ação, mas também ressaltando que o processo de privatização é complexo e demanda tempo. A recomendação atual da casa para SBSP3 é neutra, com preço-alvo de R$ 52 (valor 12% abaixo do fechamento da véspera).

Logo após a eleição, o Bradesco BBI destacou que a ação da empresa pode chegar até R$ 120 (upside de 104%)  se a privatização levar em conta a atual base regulatória e extensão dos contratos de concessão, chegando a um EV/RAB de 1,33 vez.

Os analistas do BBI apontaram que, entre os desafios para a privatização, está a de definição do formato, sendo que o mais provável é que o processo seja feito com um aumento de capital, o que diluiria a fatia de 50,3% do estado de São Paulo. A equipe de análise estima que a operação se daria em 2024 ou 2025, dadas as complexidades e as negociações políticas necessárias.

Na ocasião, o banco elevou o preço-alvo de R$ 70 para R$ 92 por ação (upside de 56%), com recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado) vendo uma probabilidade de 60% de privatização. Caso a companhia siga estatal, o preço para 2023 iria para R$ 55 (queda de 7%). O BBI aponta que, até que a privatização seja materializada, a Sabesp deve recuperar boa parte da eficiência operacional perdida nos últimos trimestres, e a reviravolta parcial pré-privatização da Eletrobras, com reclassificação de ações, é um exemplo a ser seguido.

Sanepar

Apesar do nome da empresa ainda não tiver sido citada nos intuitos de privatização do governo paranaense ,a performance dos papéis da empresa na segunda-feira, de 15%, chamou a atenção do mercado.

A grande questão que passa a ser considerada, avalia a Genial, é observar a própria Sanepar como um segundo possível alvo no caso de privatização de uma empresa – algo interessante e que simplesmente não era considerado nos cases relacionados ao estado do Paraná.

“Em nossa leitura, caso o governo do estado do Paraná resolva seguir adiante com uma privatização da empresa, o potencial de valorização é de mais de 100%”, aponta o analista da Genial, já considerando a alta das ações na segunda-feira.

A interpretação é derivada da seguinte questão: uma empresa privada de saneamento (que opera nos níveis mínimos em termos de eficiencia de custos, qualidade do serviço e expansão) deveria negociar a pelo menos 1 vez a sua Base de Ativos Regulatória (ou seja, a EV/RAB), em uma métrica conservadora.

O analista lembra que players privados de distribuição de energia elétrica (os cases com maior similaridade e regulação com saneamento) chegam a negociar a 2 vezes a 2,5 vezes a sua base de remuneração regulatória. “Em um processo competitivo, achamos pouco provável que a empresa seja vendida por menos de 1 vez o valor da sua base de ativos e valores superiores a estes não devem ser desconsiderados”, aponta a Genial.

Contudo, Vitor Sousa, da Genial, avalia que por enquanto, não vale a pena comprar Sanepar. Ele menciona que existem algumas questões que merecem ser destacadas: a Sanepar tem um valor caso permaneça estatal (por enquanto, o cenário-base da casa) enquanto a Sanepar privatizada tem outro valor.

“À medida que o mercado começa a reprecificar o ativo, uma mudança repentina no humor político do governador ou da assembleia de deputados pode fazer com que o processo seja postergado ou até mesmo cancelado”, citando que essa foi a questão com a Sabesp no mandato do ex governador João Dória (PSDB). Na ocasião, o ativo apresentou um rali muito forte e começou a ser negociado próximo a sua base de ativos (1 vez, cerca de R$60/ação à época) e devolveu todos os ganhos à medida que o a ideia de privatização foi abandonada pelo governo.

“Ou seja, não somos contra comprar uma ação devido a um único gatilho, mas esperamos que essa compra seja em termos atraentes o suficiente para as perdas serem limitadas caso o melhor dos cenários não venha a se materializar”, avalia. Sob esse aspecto, o “cavalo” escolhido pelo analista foi o da Copasa (CSMG3), também destacando que a empresa pode destravar mais de 100% de valor se o cenário de privatização se materializar.

Voltando à Sanepar, o analista da Genial lembra que um eventual projeto de privatização não está sendo discutido, considerado ou sendo proposto à assembleia estadual no momento, à medida que o nome escolhido pelo governo do Estado do Paraná foi a Copel. “Além disso, incertezas quanto a revisão tarifária da Sanepar nos trazem muita dificuldade no processo de avaliação do ativo à medida que não temos clareza em sua estrutura tarifária”, avalia.

Cemig

Já sobre a mineira Cemig, em relatório de 27 de outubro, o Bradesco BBI apontou ser improvável que ocorra uma privatização. Contudo, o novo legislativo estadual pode estar mais aberto a vender a Gasmig (99% de propriedade da Cemig).

O banco lembra que, em 2018, dado o perfil pró-mercado do governador eleito, eram grandes as esperanças de que a Cemig e outros ativos pudessem ser privatizados.

No entanto, a Câmara bloqueou a venda de quaisquer ativos. De lá para cá, o que mudou (além da reeleição do governador Romeu Zema, do Novo) foi também que o legislativo de Minas elegeu um número maior de deputados que podem apoiar seus planos de privatização.

Além disso, seguindo o caminho de menor resistência, MG provavelmente priorizará a venda da mineradora Codemig, da concessionária de saneamento Copasa e da concessionária de gás Gasmig, já que o legislativo estadual e a população local provavelmente serão menos resistentes à venda desses ativos. Assim, o banco não vê a privatização da elétrica mineira como cenário-base, mas segue otimista e tem recomendação de compra para o ativo, com preço-alvo de R$ 15 (ou upside de 35%).

Já a Genial aponta que a Cemig é uma outra empresa que deve ser acompanhada de perto sob o aspecto de uma possível privatização, uma vez que tem características muito similares à Copel e passa por desafios muito semelhantes: uma grande estatal estadual de energia em meio à um mercado restritivo para expansão em novos negócios e com muita exposição à concessões mais curtas – o que traz um risco a própria rentabilidade e sustentabilidade da empresa no longo prazo.

Para tentar simular o impacto de uma privatização na empresa, o analista oscilou seu valuation em algumas variáveis, sendo elas: i) múltiplo EV/RAB da distribuidora em 1,5 vez a 2 vezes (em suas estimativas, considera um RAB de R$ 19 bilhões para o ano de 2023) e ii) um múltiplo de P/VPA em 1,5 vez a 2 vezes para os ativos que julgam mais interessantes da empresa (Gasmig e Aliança Geração) e mantendo o valuation para os ativos de Geração/Transmissão (incluindo a fatia remanescente da empresa na Taesa TAEE11). O cenário otimista da elétrica privatizada levou a um preço de R$ 24,85 para o ativo CMIG4, ou um potencial de alta de 124% frente o fechamento da véspera.

Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.