Gigante varejista Target dá alerta ao revisar projeções ainda mais para baixo: sinal de recessão nos EUA?

Enquanto analista que defende que dados da Target são um sinal forte sobre economia americana, Morgan aponta que varejista é um caso específico

Lara Rizério

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Na última terça-feira (7), a gigante varejista americana Target deu um novo alerta para o mercado. Ela cortou a sua projeção de margem de lucro trimestral após a revisão de projeções para baixo apenas algumas semanas antes – e que já havia abalado o mercado.

Desta vez, ela destacou que oferecerá descontos maiores para limpar o estoque, dado o impacto da inflação na demanda. A companhia espera que a margem de lucro operacional do segundo trimestre fiscal fique em cerca de 2%, em comparação com estimativa anterior de 5,3%.

A empresa disse que pretende reduzir os preços no segundo trimestre, cancelar pedidos com fornecedores, acelerar partes da cadeia de suprimentos e priorizar categorias como alimentos e utensílios domésticos essenciais.

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A Target, assim como o Walmart, anunciou em maio uma queda no lucro do primeiro trimestre de 2022 muito mais acentuada do que a esperada. Ela informou que o estoque havia aumentado 43% ante o ano anterior, à medida que a demanda por itens discricionários de maior margem, como TVs e roupas, diminuiu.

“Agora temos mais indicações de que é uma pressão contínua, não apenas uma questão de um trimestre”, disse Andrea Cicione, chefe de estratégia da TS Lombard, à Reuters.

A estratégia da Target de manter uma grande parte de seus produtos em preços acessíveis em comparação aos rivais também está se mostrando custosa, uma vez que a empresa disse agora que aumentará os preços de alguns itens para compensar os custos de transporte e combustível excepcionalmente altos.

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A Levante Ideias de Investimento reforça a visão de que, a despeito de toda diligência na comunicação para o mercado, as medidas não serão suficientes para sustentar as margens operacionais e lucratividade neste ano. Após o anúncio, as ações chegaram a cair 10% na terça, mas fecharam em queda de 2,31%, bem mais amena.

“Em nossa opinião, as tensões geradas pela guerra na Ucrânia, combinadas com a escalada de juros na economia americana para frear o processo inflacionário e cotação do petróleo em níveis mais altos, restringem parcialmente o consumo, uma vez que em momentos que a cesta de consumo familiar se eleva de preços, sem reajustes salariais proporcionais, ocorre mudanças no padrão de consumo das famílias. E é o que temos visto na prática com a dinâmica entre Target e seus consumidores”, avalia a casa de research.

Neste sentido, enxerga que este ano será extremamente desafiador para a varejista, que deverá sofrer em suas margens a forte dinâmica inflacionária, sem conseguir repassar integralmente, os preços para seu consumidor final.

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Para James Collins, analista contribuidor da Ohmresearch, mais do que mostrar o cenário desafiador para a varejista, o declínio extraordinariamente acentuado nas perspectivas de negócios da Target é um excelente relógio para a economia dos EUA.

Ele destaca que, com as novas revisões para baixo nas margens, haverá uma destruição de valor de US$ 750 milhões. Além disso, com as ações de preços para lidar com os altos custos de combustível e transporte, alguns itens que não estão vendendo serão eliminados para elevar os preços dos produtos. Isso impactará o consumidor americano, já sobrecarregado.

Para Collins, esta é mais uma sinalização: os EUA passam por uma recessão no momento, e com estagflação.

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Já para o Morgan Stanley, o corte nas projeções pode ser mais específico do case da empresa do que um cenário mais amplo sobre a economia americana, ainda que haja muitas incertezas no radar. Porém, caso de configure numa tendência, pode até sinalizar um alívio no impacto inflacionário para a população.

Os analistas da casa ressaltam que as revisões podem ter sido motivadas pela exposição diversificada da Target a categorias discricionárias de alto lucro, pelas ineficiências na cadeia de suprimentos (talvez exacerbadas pelo modelo de atendimento baseado em lojas) e planejamento incorreto de estoque. “Houve poucos sinais desse tipo de interrupção generalizada das empresas durante a temporada de resultados do primeiro trimestre”, avaliam, destacando que talvez o Walmart tenha sido o mais próximo a fazer o mesmo que a Target, mas com uma revisão muito menor da projeção de lucro por ação para o ano inteiro.

“É improvável que qualquer varejista de nossa cobertura veja um corte mais profundo do que a Target – mesmo empresas com exposição às principais categorias como móveis domésticos, artigos esportivos e eletrônicos”, destaca o Morgan, ressaltando que essas empresas estão sofrendo mais no momento atual após a explosão de demanda no início da pandemia.

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O Morgan aponta ainda que há um paradoxo de uma revisão para baixo, uma vez que as remarcações de estoque significam deflação em potencial.

“Há um argumento mais amplo de que a atividade promocional da Target é boa para a economia. Poderia estimular mais descontos no varejo, o que é inerentemente deflacionário. Este é um desenvolvimento/uma dinâmica saudável para qualquer economia, e particularmente em uma que enfrenta inflação alta. A inflação naturalmente mais baixa pode significar que a economia não entrará em uma recessão induzida pela inflação/Fed [Federal Reserve, via alta de juros]”, apontam os analistas. Isto, por sua vez, seria positivo para uma varejista exposta à recessão como a Target.

Por outro lado, avalia o Morgan, há uma certa desconexão (e risco), com um corte forte nas projeções de lucro, mas não de receita, o que pode levar a uma surpresa baixista para a companhia. “O fato da projeção para o Ebit [lucro antes de juros e impostos] ter sido reduzida tão materialmente sem mudanças nas expectativas de vendas desafia a sabedoria convencional do varejo de que as mudanças na lucratividade decorrem principalmente das mudanças nas vendas”, aponta o banco americano.

Para eles, no setor em geral, as empresas que vendem para grupos de renda média ou baixa estão em maior risco, principalmente aquelas com sortimentos discricionários. Por outro lado, o Morgan tem a sensação de que o segmento de mercearia possa ser um caso à parte, com a Target podendo subir os preços principalmente em suas categorias de alimentos/essenciais em que não está fazendo descontos – e onde a demanda permanece forte.

Recessão ou “só” desaceleração? 

Se as revisões dos números da Target geraram um debate sobre o que elas significam para a economia dos EUA, cabe destacar que também há muitas discussões sobre se haverá uma recessão na atividade americana como um todo ou não.

Estas discussões ganham força principalmente após falas de importantes executivos de instituições financeiras e companhias de outros segmentos. Num contexto de inflação ainda persistente e alta de juros, os temores de que o avanço nas taxas leve a uma forte desaceleração da economia americana ganham ainda mais destaque.

O economista-chefe do Deutsche Bank nos EUA, Matthew Luzzetti, que anteriormente tinha uma projeção de recessão até o final de 2023, disse em nota a clientes na quarta-feira que as chances de queda na economia provavelmente aumentarão nos próximos meses. “Nossa principal conclusão é que as probabilidades de recessão provavelmente parecerão muito mais sinistras no final deste ano, à medida que as condições financeiras se apertarem”, escreveu.

Na última semana, Jane Fraser, CEO do Citigroup, destacou em uma conferência com investidores que os Estados Unidos terão dificuldades para evitar uma recessão econômica. “Uma recessão na Europa definitivamente parece mais provável do que o que vemos nos EUA”, destacou. Mas, mesmo nos EUA, uma recessão “não é fácil de evitar”.

Jamie Dimon, presidente do JPMorgan Chase, fez também na semana passada um alerta do que chamou de “furacão” que poderia afetar a economia americana. Segundo Dimon, a economia dos Estados Unidos luta contra uma combinação de desafios sem precedentes, incluindo o aperto da política monetária e a invasão da Ucrânia pela Rússia.

Alguns dias depois, na segunda-feira (6), Bruce Kasman, economista-chefe do próprio JP, foi na contramão. Em uma entrevista à Bloomberg, ele disse esperar uma desaceleração do crescimento econômico americano, mas descartou a hipótese de uma recessão no curto prazo. Juntou-se também mais recentemente ao coro Marko Kolanovic, estrategista global do mesmo banco.

Assim, o questionamento, conforme destaca em análise a Levante, é: “Quem está certo? Quem espera uma recessão ou quem prevê apenas uma desaceleração?”

A casa de research aponta que há sinais fortes de que uma atenuação da economia está a caminho. Em sua última avaliação, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) reduziu sua projeção de crescimento mundial para 3% neste ano, ante os 4,5% esperados anteriormente. Os EUA tiveram sua previsão rebaixada de 3,73% para 2,46%. E o Banco Mundial, que já havia baixado sua projeção para a economia global de alta de 4,1% para 2,9 %, inseriu a palavra “estagflação” em sua avaliação mais recente. Para a atividade americana, a projeção foi cortada de avanço de 3,8% para 2,6%.

“Há sinais fortes de que a economia deve passar por solavancos. Porém, essa é apenas uma parte da história”, aponta a Levante. Se colocados os fatos em perspectiva, pode-se observar que também há indicadores sólidos de que a demanda, o motor das economias, está saudável. O emprego nos Estados Unidos está crescendo menos. Porém, os números se aproximam dos patamares anteriores à pandemia, que já mostravam sinais de aquecimento, avalia a casa.

Alguns bancos centrais, em especial o Federal Reserve, já começaram a elevar os juros, mas ainda há muito dinheiro em circulação no mercado.

A grande incógnita é o apetite do Fed por reduzir seu balanço, que subiu de US$ 4,4 trilhões para cerca de US$ 8,9 trilhões durante a pandemia. A redução já começou. No fim de maio, o balanço era de “apenas” US$ 8,92 trilhões, ante os US$ 8,94 trilhões do fim de março. “Parece irrelevante, mas a retirada de US$ 20 bilhões da economia em apenas dois meses faz diferença até mesmo nos Estados Unidos”, avalia a Levante.

As declarações do Fed são econômicas em detalhes, mas a expectativa é de que, ao fim do processo de encolhimento, o balanço tenha sido reduzido para algo entre US$ 5 trilhões e US$ 5,5 trilhões.

“Ou seja, um trilhão a mais do que antes da pandemia. Assim, a liquidez deixará de ser ‘estimulativa’ na linguagem dos BCs, mas estará longe de ser restritiva. E, diferentemente do que ocorreu na grande crise mais recente, a do subprime em 2008, o sistema financeiro está sólido e capitalizado e os mercados estão azeitados e funcionando perfeitamente”, apontam os analistas da casa de research.

Assim, apontam, não só no caso dos EUA, como globalmente, uma conclusão que se pode ter é de que haverá um momento de desaceleração das economias e que a expansão do consumo e da produção industrial deverá crescer menos do que vinha crescendo. Mas esse cenário é bastante diferente de uma recessão.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.